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Delito de Opinião

Uma lição de vida

Pedro Correia, 30.06.20

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Por vezes, no mais inesperado dos lugares, despertam inimagináveis vocações. Aconteceu com José Saramago, o que é um - entre tantos outros - aspecto memorável da sua biografia. Impossibilitado de prosseguir os estudos para além do curso profissional de serralharia mecânica na escola industrial Afonso Domingues, o jovem Saramago passava os tempos livres recolhido na biblioteca municipal de Lisboa, no Palácio Galveias, ao Campo Pequeno. Enquanto os seus parceiros de geração optavam por folguedos, bailaricos e comezainas, ele cultivava-se com esmero, persistência e determinação naquelas salas austeras que lhe propiciaram o equivalente à formação universitária que formalmente nunca chegou a ter.

O Nobel de 1998 recorda esse período num admirável prefácio escrito para o livro De Volcanas Llena: Biblioteca y Compromiso Social (Gijón, Trea, 2007). «Era um lugar em que o tempo parecia ter parado, com estantes que cobriam as paredes do chão até quase ao tecto, as mesas à espera dos leitores, que nunca eram muitos (...). Não posso recordar com exactidão quanto durou esta aventura, mas o que sei, sem sombra de dúvida, é que se não fosse aquela biblioteca antiga, escura, quase triste, eu não seria o escritor que sou. Ali começaram a escrever-se os meus livros», anotou Saramago, lembrando os dias, meses e anos ali passados.

Uma lição de vida.

Vai estudar, Passos!

João André, 05.06.14
 

Já se percebeu que este governo não convive bem com opiniões diferentes. Os manifestos são atacados ad hominem e os dados são desmentidos com mentiras ou fantasias. Por isso mesmo também não percebe bem porque razão outros poderão opôr-se às suas medidas. Há já 3 anos que anda sistematicamente a avançar medidas de "contenção de défice" (as aspas estão ali propositadamente) que são sistematicamente chumbadas pelo Tribunal Constitucional. O TC não existe para fazer política (o que não é o mesmo que dizer que é apolítico), antes existe para fazer cumprir a lei fundamental do país. Por isso, quando esta é conhecida de todos (ou deveria) e quando é estudada (suponho que) a fundo na universidade, querer adoptar medida após medida que com ela chocam é teimosia, estupidez ou cálculo político.

 

De forma clara: o governo não gosta da constituição? Pode propôr a sua revisão. Não gosta da forma como os juízes são escolhidos? Também pode apresentar alternativas. Aquilo que não pode é fazer ataques como este sem ligar às consequências. O TC está previsto nas leis portuguesas (as quais resultam também de legitimidade democrática de forma indirecta) e os juízes são em grande parte escolhidos pelos partidos no parlamento e como tal até têm legitimidade democrática. No entanto as declarações de Passos Coelho demonstram a sua ignorância e profunda falta de inteligência e espírito democrático.

 

Se um tribunal guardião da constituição necessita de alguma legitimidade democrática, não é menos verdade que, uma vez escolhido, tem que ser independente da política. É por isso que os juízes no supremo tribunal dos EUA têm cargos vitalícios após serem aprovados pelo congresso. Isto, contudo, não quer dizer que os juízes, como qualquer pessoa, têm opiniões e visões distintas. Se assim não fosse bastaria ter um computador a debitar resultados. Os juízes devem ser apolíticos, mas isso não os torna acríticos às leis que lhes chegam às mãos.

 

Passos Coelho não entende nada disto. Não entende que a Constituição pode ser mudada mas tem que ser respeitada. Não entende que o TC tem legitimidade democrática a vários níveis. Não entende que os juízes têm direito a ter opiniões e que estas podem ser dierentes da sua. Não entende que os juízes têm que ser independentes do poder político. Não entende, no fundo, as regras democráticas nem o que é um estado de direito. Não as entende porque não tem estudos (mesmo informais) e não os compensa porque não tem inteligência para tal. E não entende nada disto, no fundo, porque ele próprio não tem qualquer independência face aos poderes exteriores a ele. Enquanto isto assim permanecer Portugal não irá mesmo a lado nenhum. Com ou sem austeridade.

estudar

Patrícia Reis, 01.05.14

É o nono ano. A gramática? Não é nada parecida com o que estudei e os nomes? É para esquecer. Mais vale dizer que "bacia" também pode ser "anca" e "penico" e depois o miúdo lá entende que é uma qualquer coisa acabada em "minia" ou assim.

Não há nada mais frustrante do que ter de empinar a gramática sem a entender verdadeiramente e depois ver como faz bilharetes na interpretação, na composição, na riqueza de vocabulário. No fim, diz

 

Bom, pode ser que me safe se for sobre os Lusíadas ou sobre o Alto da Barca do Inferno.

 

E depois acrescenta

 

Ainda bem que o Vasco Graça Moura escreveu o livro a explicar os Lusíadas. É pena que já tenha morrido, se fizesse um livro sobre a gramática podia ser que fosse mais fácil.

 

De resto? O costume. O professor que manda para a rua, a professora que considera um determinado comentário insolente. E eu a desvalorizar, a dizer que os professores têm os seus dias e tal, sempre a defender, e o mundo não é justo e as pessoas não são máquinas, blá, blá, blá. Seja. Remate final

 

O pior é quando nos perguntam se queremos ser expulsos.

 

Como? Sem comentários.

(Fr)agilizar

Ana Cláudia Vicente, 24.05.11

Soube nestes dias notícia de um formador que participou ao Centro de Novas Oportunidades [CNO] onde trabalhava a sua indisponibilidade para renovar contrato lectivo. Não estamos a falar de algum profissional jovem, sem compromissos familiares nem financeiros, pelo contrário. Falamos de alguém que deixou de aguentar a pressão para caucionar aprendizagens mínimas, (rare)feitas em menos de uma mão cheia de meses. Há tempos ouvi também a descrição de um outro professor/formador acerca de como era instado a agilizar os processos de certificação sob sua alçada. Agilizar.

Como tantos no país, ao longo do séc. XX, uma boa parte da minha família estudou em regime nocturno, anos a fio, depois de trabalhar. Ninguém lhes agilizou coisa nenhuma, porque niguém entendia a condição de estudante como a de um freguês a quem era necessário simplesmente agradar. Qual agilizar.