Quero lá saber do Parlamento Europeu: Não sei bem quais são os 21 Portugueses que lá estão (na verdade, de cor, só sei referir quatro ou cinco, e não mais de quinze ou vinte se contar os que me lembro de já por lá terem passado), e dos outros 684 notei um ou outro ocasionalmente porque sobressaíam (como Nigel Farage por exemplo). Da actual Presidente sei que é Maltesa, tem excelente aspecto e diz ocasionalmente coisas boazinhas. Também não ignoro, porque tenho uma cultura política acima da média, que lá há partidos onde se vão encaixar (e diluir, que ligeiramente menos de 3% dos deputados não dá para grandes voos de influência) os “nossos” representantes. Aspei porque, em teoria, os deputados tratam da União no seu conjunto.
Aquilo não é bem um Parlamento: não tem competência para iniciativas legislativas, ou talvez tenha em casos contados segundo a baralhada dos Tratados, o órgão mais relevante é a Comissão, não o Parlamento, reúne habitualmente em Bruxelas mas as sessões plenárias são em Estrasburgo, e mete o bedelho na nomeação de dirigentes para uma floresta de organismos, incluindo o Banco Central Europeu e os membros da própria Comissão, podendo rejeitar um ou outro que por qualquer razão não esteja em odor de santidade.
Sabe-se que estar lá é um exílio dourado – os deputados ganham um múltiplo dos do nosso Parlamento e também, suponho (não fui conferir), dos da maioria dos outros países. E do que andam por lá a fazer (ou, mais provavelmente, a não fazer) vivemos numa abençoada ignorância. Nem por isso, todavia, deixam de chegar cá as famosas Directivas, em catadupa, cozinhadas num complicado e opaco processo só acessível a quem o acompanhe, por dever de ofício ou por interesse profissional de lobbying, e outras variantes legislativas e regulamentares.
Gente de fortes sentimentos europeístas acha que as quatro liberdades (de circulação de pessoas, bens, serviços e capitais) requerem extensas prateleiras burocráticas; que decisões de ignotos especialistas são mais merecedoras de confiança que as tomadas à luz da luta política em cada país; e que um terreno plano em que legislação cada vez mais minuciosa se aplica em todo o espaço da União é do que se precisa para a convergência dos rendimentos e a construção de um baluarte de paz, prosperidade e influência no mundo.
Não acho nada disto e pelo contrário entendo que todas, todas as burocracias sem excepção, entregues a elas próprias reforçam o seu poder porque lhes está na natureza. E é isto que faz com que em numerosos países (não no nosso) haja uma larvar reacção à terraplanagem, que prejudica uns e ofende outros, das diferenças, em nome de um fundo comum da cultura judaico-cristã e alguns valores civilizacionais, como a democracia, o Estado de Direito e a igualdade entre os sexos. Fundo comum que tem as costas largas, se à boleia dele se quiser fazer passar de contrabando ideias políticas, convertidas em leis, que vão muito para além do cervo indiscutível da União, como é o caso do direito ao aborto promovido à consagração na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e seria a constituição de um Exército Europeu ou uma política externa assumidamente comum, como se os interesses permanentes de todos os Estados fossem os mesmos.
Foi esta deriva que levou ao Brexit, e é ela que explica o sobressalto nacionalista em não poucos países e a correspondente ascensão de partidos ditos de extrema-direita, aliás muito diferentes entre si por somarem outras preocupações, et pour cause.
Também cá temos disso, o Chega – tudo chega às nossas praias, é o caso de dizer. E poder-se-ia julgar que, dados os meus pontos de vista, seria esta agremiação a que me conviria. Mas não, aquilo é uma manta de retalhos contraditórios, e oportunistas também, como se tem visto nas recentes alianças demagógicas com o PS. E depois comecei por dizer que “quero lá saber etc.”, mas se do Parlamento Europeu não quero saber, do que se passa no nosso país quero.
Sucede que entre nós governa a direita possível e, pelas mesmíssimas razões que estas eleições não são realmente para um organismo que represente o sentir colectivo de uma Nação, a leitura do resultado que se fará será, para o eleitorado que não para os comentadores mais inteligentes do que o que há para inteligir, nacional.
Tenho vários amigos que, por um complexo de razões que abrangem em parte as acimas elencadas, a que somam outras, são militantes abstencionistas nestas eleições. Vaidosos e pouco práticos: o voto de cada qual vale nada, é certo, mas se toda a gente assim raciocinar fechamos a porta da democracia; e se as eleições são aqui, e vão ser lidas à luz do nosso quintal, então o que pensamos sobre os caminhos da União mais vale guardar para artigos de opinião.
O que faz com que, tudo visto e ponderado, nestas como nas últimas, voto AD.