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Delito de Opinião

O melhor deputado

Carlos Guimarães Pinto, da Iniciativa Liberal

Pedro Correia, 15.02.24

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Há um mês, perguntei ao leitores do DELITO DE OPINIÃO quem consideravam ter sido o melhor deputado da legislatura que agora acaba. Foram recebidas várias respostas, cada um votou como quis. E podia ter até votado em mais do que um, como em diversos casos aconteceu.

O primeiro lugar foi para Carlos Guimarães Pinto, da Iniciativa Liberal. Recebeu cinco votos. Por mera coincidência, alguém que chegou a escrever neste blogue, como convidado especial, em Julho de 2017. E que teve a amabilidade de ajudar a promover o nosso livro, nesse mesmo ano, no Blasfémias.

Em Outubro de 2019, era ele presidente da IL, saudei-o por ter visto eleger o primeiro deputado deste jovem partido, Cotrim Figueiredo. Com estas palavras que voltaria a subscrever, naturalmente: «Portugal era até agora o único país europeu sem uma força assumidamente liberal no seu parlamento. Esta lacuna acaba de ser preenchida. Apesar de a IL ter sido ignorada pela generalidade dos órgãos de comunicação social durante a campanha - designadamente pelas televisões, que voltaram a mostrar-se incapazes de seguir novos trilhos informativos, apostando sempre e só nos consagrados.»

 

Aqui fica, por ordem decrescente, a lista dos restantes votados:

João Cotrim Figueiredo (IL): 4

Bernardo Blanco (IL): 3

Rita Matias (Chega): 3

André Ventura (Chega): 2

Carla Castro (IL): 2

Inês Sousa Real (PAN): 2

Bruno Dias (PCP): 1

Bruno Nunes (Chega): 1

Joaquim Miranda Sarmento (PSD): 1

Paula Santos (PCP): 1

Paulo Moniz (PSD): 1

Pedro Nuno Santos (PS): 1

 

Fica a promessa de que no final da próxima sessão legislativa voltarei a fazer a mesma pergunta a quem nos lê. Espero receber tantas ou mais respostas.

Marxista no Chega, tendência Groucho

Pedro Correia, 25.01.24

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«Se os meus princípios não vos agradam, arranjo outros.» (Groucho Marx)

 

«Com uma proposta de governo liderada pelo futuro primeiro-ministro, Luís Montenegro, a vitória do PSD é a mudança necessária e imprescindível para defender um SNS verdadeiramente ao serviço das pessoas e para seguirmos no rumo de mais progresso e mais justiça para Portugal. Portanto Portugal está à espera e precisa de Luís Montenegro.»

Deputado Rui Cristina, em intervenção no 41.º Congresso Nacional do PSD (25 de Novembro 2023)

 

«Fica patente existir na actual liderança do PSD uma maior preocupação com ajustes de contas internos, imposição de egos que na essência não assumem compromissos sérios com o partido. (...) Após uma reflexão profunda e amadurecida pela dor e sofrimento das consequências da mesma, não encontro alternativa que não seja uma rotura para com as decisões tomadas pela direção do partido.»

Deputado Rui Cristina, em carta dirigida ao secretário-geral do PSD (22 de Janeiro de 2024)

 

«Rui Cristina, actual deputado social-democrata, sai do PSD e está prestes ser anunciado como cabeça de lista do Chega pelo distrito de Évora, revelou fonte do partido à SIC. O anúncio está previsto para os próximos dias.»

Notícia da SIC (22 de Janeiro de 2024)

Quem foram os melhores deputados?

Pedro Correia, 12.01.24

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Agora que os trabalhos parlamentares chegaram ao fim, com a Assembleia da República a ser formalmente dissolvida na próxima segunda-feira, venho perguntar-vos quem consideram ter sido os melhores deputados desta breve legislatura, iniciada em 29 de Março de 2022.

Podem indicar mais de um deputado, claro. E de vários partidos, como é evidente. Estou curioso por saber quais são as vossas escolhas.

Dois deputados que deixaram saudades

Pedro Correia, 26.04.23

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O 25 de Abril fez-se para fundar uma democracia representativa em Portugal, sufragada pelo voto universal e livre dos cidadãos. Mas raras vezes, ano após ano, vejo homenagear esse órgão concreto da democracia - com o qual tantos sonharam durante gerações - que é a Assembleia da República, símbolo supremo do nosso regime constitucional.

Espero que este lapso seja corrigido e que em 25 de Abril de 2024, quando a Revolução dos Cravos comemorar meio século, possam ser homenageados 50 deputados, de diferentes partidos. Deputados que nunca foram ministros nem secretários de Estado nem presidentes de câmara nem presidentes de governos regionais: apenas deputados. Seria uma excelente forma de assinalar a instituição máxima da democracia portuguesa.

 

Fui repórter parlamentar do Diário de Notícias durante cinco anos e, nessa qualidade, tive o privilégio de conhecer competentíssimos deputados em todas as bancadas. A pretexto do 25 de Abril, quero distinguir dois desses parlamentares que conheci pessoalmente: Maria José Nogueira Pinto e João Amaral. Ela claramente de direita, ele inequivocamente de esquerda.

Em legislaturas marcadas por fortes combates políticos, nenhum dos dois alguma vez cessou de tomar partido, envolvendo-se convictamente no confronto de ideias que é função cimeira do órgão parlamentar: sabia-se ao que vinham, por que vinham, que causas subscreviam e que bandeiras ideológicas sustentavam. Mas também sempre vi neles capacidade para analisar os argumentos contrários, com elegância e lealdade institucional, sem nunca deixarem as clivagens partidárias contaminarem as saudáveis relações de amizade que souberam travar com adversários políticos.

Porque a democracia também é isto: saber escutar os outros, saber conviver com quem não pensa como nós.

 

Lembro-me deles com frequência. Como me lembro das sábias palavras que Giorgio Napolitano proferiu em 2013, ao tomar posse no segundo mandato como Presidente italiano. «O facto de se estar a difundir uma espécie de horror a todas as hipóteses de compromisso, aliança, mediações e convergência de forças políticas é um sinal de regressão», declarou neste notável discurso Napolitano, que aos 97 anos ainda é um dos políticos mais respeitados da turbulenta e caótica Itália.

Palavras que deviam suscitar meditação entre nós. Palavras que a conservadora Maria José Nogueira Pinto e o comunista João Amaral decerto entenderiam - desde logo porque sempre souberam pôr os interesses do País acima de tacticismos políticos.

Quis o destino, tantas vezes cruel, que já não se encontrem fisicamente entre nós. Mas o exemplo de ambos perdura, como símbolo de convicções fortes que - precisamente por isso - são capazes de servir de cimento para edificar pontes. E talvez nunca tenhamos precisado tanto dessas pontes como agora.

Acerca dos deputados do nosso Parlamento

beatriz j a, 11.02.22

O Presidente da direcção da Associação sindical dos juízes Portugueses escreve hoje um artigo, "Os deputados do nosso Parlamento" onde defende que o nosso Parlamento nem sempre elege os mais capazes porque premeia a fidelidade partidária à frente da competência, que vota-se nos partidos e não nas pessoas que nos representam, que o Parlamento tem défice de representatividade, que tem excesso de juristas e licenciados em geral e que deixa de fora o povo (agricultores, artistas, operários, desempregados, etc.) e outras pessoas que pensam "fora da caixa".

- O nosso Parlamento nem sempre elege os mais capazes porque premeia a fidelidade partidária acima de tudo? Se os partidos escolhessem deputados que não lhes fossem fiéis, deixavam de ter significado enquanto partidos políticos. O problema não está em escolherem pessoas fiéis ao partido mas em escolherem pessoas fiéis apenas ao líder partidário do momento e, desta maneira, porem um certo líder à frente da fidelidade ao programa do partido e à representação dos que os elegeram. Também me parece que os votos deviam ser contados de maneira a não serem agregados pelos dois grandes partidos em detrimento dos outros. O nosso Parlamento, desde as primeiras eleições pós-25 de Abril tem tido uma média de 7 a 10 partidos na AR. Parece-me bem ter diversas sensibilidades políticas representadas na AR. Ter grandes maiorias absolutas não tem trazido benefícios de boa governação ao país, só grande corrupção e, ter mais pessoas nos pequenos partidos não tem sido factor de instabilidade. Essa instabilidade tem mais que ver com as pessoas dos partidos do que com o seu número: Ventura sozinho faz um vendaval no Parlamento. O PCP nunca fez gritaria, com muitos ou poucos deputados, não é o seu estilo. Já Louçã, quando lá estava, fazia-as.

- Vota-se nos partidos e não nas pessoas que nos representam? Não vejo problema em que se vote nos partidos, pois cada partido representa uma proposta de organização social baseada numa certa ideologia, de maneira que as pessoas votam na orientação político-social que lhes parece melhor para o país e mais de acordo com os seus valores. Agora, também considero que nem todos os deputados deviam ser escolhidos pelo partido e, em cada partido, devia haver um número de deputados eleitos directamente por aqueles que vão representar. Isso obrigava a que, pelos menos esses, não pusessem a lealdade ao líder do momento, acima de todos os princípios e deveres que os obrigam.

- O Parlamento tem défice de representatividade? Sim, parece-me que sim. Sabemos pela análise do passado que onde não há mulheres, os homens, grosso modo, não sabem representá-las nos seus problemas específicos. Da mesma maneira que os problemas das minorias étnicas, como se diz, também não são atendidos, grosso modo, nos grupos onde não estão presentes.

- O Parlamento tem excesso de juristas e licenciados em geral e deixa de fora o povo (artistas, agricultores, operários, desempregados, etc.) e outras pessoas que pensam "fora da caixa"? Cabe aos partidos escolherem pessoas diversificadas para a AR e isso, em parte, resolvia-se, se pudéssemos eleger/recusar alguns dos deputados, directamente. Não me parece mal que a AR tenha um número significativo de juristas, visto que é lá que se fazem as leis. Discordo completamente da ideia de que o Parlamento tem licenciados a mais que não representam aquele povo, academicamente pouco habilitado. Em que sentido pessoas pouco habilitadas academicamente e sem conhecimentos adequados para os problemas complexos que vão ao Parlamento seriam melhores a representar o povo? Queremos pessoas mais educadas e não menos. Os deputados não têm que ser um espelho do povo, nem têm que ser do [desse] povo, eles têm é que ser pelo povo. Por isso era importante poder escolher alguns dos deputados que representam cada região directamente - dessa maneira exercia-se o poder de afastar aqueles que mostrassem ser apenas por si mesmos e pelo seu líder e não, pelo povo.

(também publicado no blog azul)

O líder parlamentar que faz Costa sorrir

Adão Silva

Pedro Correia, 04.08.21

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Esta foi a semana em que o PSD voltou a cobrir-se de ridículo ao aprovar um relatório, na comissão parlamentar de inquérito às perdas do Novo Banco, em que se acusa o Governo de Pedro Passos Coelho de ter cometido «fraude política» no Verão de 2014, quando deu luz verde ao Banco de Portugal para intervir no Banco Espírito Santo. Os sociais-democratas alinharam, na votação final do documento, com os deputados do PCP e do Bloco de Esquerda.

Assim culminaram oito dias de perfeito desnorte para a bancada parlamentar laranja e para o seu presidente. Adão José Fonseca Silva, de 63 anos, tinha sido derrotado em toda a linha na semana anterior pelo primeiro-ministro no debate mais importante do ano na Assembleia da República – o do chamado “estado da nação”.

Bastou António Costa abrir a boca para reduzir à insignificância o deputado que Rui Rio escolheu para chefiar o seu grupo parlamentar. Podendo dizer-se, neste caso, que um funciona como réplica do outro.

 

Adão Silva, tal como Rio, parece lidar muito mal com o legado do Executivo de coligação PSD/CDS que governou Portugal num dos piores períodos da nossa história democrática. Quando, no debate que encerrou a sessão legislativa, Costa se gabou repetidamente de haver hoje uma taxa de desemprego inferior à que existia em 2014, o líder parlamentar foi incapaz de lhe dar a resposta que se impunha: os socialistas iniciaram funções governativas, há seis anos, em condições incomparavelmente mais favoráveis do que o PSD de Passos quando sucedeu ao PS de José Sócrates. Em 2015, o país crescia; em 2011, o país afundava-se.

Naquele momento em que o primeiro-ministro o atirou metaforicamente ao tapete, o deputado transmontano que ainda lidera a bancada parlamentar do PSD confirmou não ter aptidão para tal cargo. O que acentua as suspeitas de que Rio só lhe confiou tão relevante função por ter a garantia de receber em troca obediência cega. Mesmo à custa do prestígio do partido, que conta com vários deputados mais qualificados para chefiar a bancada parlamentar embora sejam eventualmente menos fiéis ao líder.

 

A confrangedora prestação de Adão Silva no confronto com António Costa em São Bento permite também lançar alguma luz sobre a surpreendente decisão do PSD de reduzir drasticamente o número de sessões de fiscalização parlamentar ao Governo: eram quinzenais, passaram a bimestrais em 2020. Iniciativa inédita no historial de um partido da oposição que o PS prontamente acolheu. Na altura, Rio justificou-a desta forma: «O primeiro-ministro não pode passar a vida em debates quinzenais. Tem é de trabalhar.» Como se prestar contas à nação através do parlamento não fizesse parte das tarefas inadiáveis do chefe do Governo.

Para o actual PSD, teve uma vantagem: assim a fragilidade e a inépcia desta oposição nota-se um pouco menos. Mesmo que o sorriso de António Costa seja cada vez maior.

 

Texto publicado no semanário Novo

A honra perdida do PSD

Pedro Correia, 30.07.20

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Foto: Filipe Farinha / Lusa

 

Rui Rio prepara-se para accionar disciplinarmente os sete deputados do PSD que ousaram votar contra o vergonhoso pacto com o PS para trocar a presença quinzenal obrigatória do primeiro-ministro na Assembleia da República por deslocações bimestrais de Sua Excelência ao hemiciclo.

Tão vergonhoso foi esse pacto que 28 deputados socialistas também votaram contra, incluindo vários ex-ministros e ex-secretários de Estado: Ana Paula Vitorino, Ascenso Simões, Bruno Aragão, Capoulas Santos, Carla Sousa, Cláudia Santos, Eduardo Barroco de Melo, Fernando Anastácio, Filipe Neto Brandão, Francisco Rocha, Hugo Oliveira, Isabel Moreira, Joana Sá Pereira, João Paulo Pedrosa, Jorge Lacão, José Magalhães, Marcos Perestrello, Maria Begonha, Marta Freitas, Miguel Matos, Nuno Fazenda, Olavo Câmara, Pedro Bacelar de Vasconcelos, Sérgio Sousa Pinto, Sónia Fertuzinhos, Susana Correia, Tiago Barbosa Ribeiro, Tiago Martins. E cinco abstiveram-se: António Gameiro, Diogo Leão, Elza Pais, Rosário Gamboa e Pedro Delgado Alves. Além dos representantes de todas as restantes bancadas parlamentares - BE, PCP, CDS, PAN, PEV, IL e Chega.

 

A diferença entre as duas metades do bloco central é que os socialistas dispuseram da liberdade de voto que Rio cerceou na bancada laranja - apesar de só o PS ser partido de governo e a alteração agora introduzida ao regimento da Assembleia da República apenas beneficiar o primeiro-ministro enquanto lesa os direitos da oposição parlamentar da qual nominalmente o PSD ainda faz parte.

Assistimos, portanto, a este facto extraordinário: enquanto se comporta como serviçal do Governo, Rio dirige a sanha persecutória contra os sete rebeldes do seu próprio partido que agiram em consciência quando se insurgiram contra a honra perdida do PSD no momento da votação - entre eles o novo líder da JSD, Alexandre Poço, e a líder cessante, Margarida Balseiro Lopes.

Procura assim, com esta absurda ameaça de processos disciplinares, quebrar os últimos vestígios de dissidência no grupo parlamentar: 

 

Marcelo Rebelo de Sousa poderia dizer-lhe como se dirige um partido tolerando a autonomia de decisão dos deputados. Quando o actual Presidente da República liderava o PSD, as bancadas socialista e comunista tomaram a iniciativa de apresentar projectos de lei que ampliavam as circunstâncias legais da prática do aborto. Marcelo era contra, tal como a esmagadora maioria dos parlamentares do PSD. Mas não houve disciplina de voto nem monolitismo. Assim, no momento da votação, três deputados - José Pacheco Pereira, José Silva Marques e Rui Rio -  divergiram do líder sem recearem consequências disciplinares.

Foi em 1998. Rio não hesitou então em colidir com o presidente do partido enquanto deputado. Mas agora, na posição que Marcelo ocupava há 22 anos, procede precisamente ao contrário. Prestando assim mais um favor aos socialistas: o de os distinguir, por contraste, como campeões da liberdade individual. 

Um favor que António Costa nem sequer se dará ao incómodo de lhe agradecer.

A casta

Pedro Correia, 20.04.20

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Eis um "estado de emergência" à portuguesa: os políticos, em vez de darem o exemplo de respeito pelas normas que impõem aos outros, assumem-se como casta separada do conjunto dos portugueses, preparando-se para comemorar o 25 de Abril em sessão solene da Assembleia da República. Violando assim as regras de drástico confinamento que aprovaram naquele mesmo local.

Voltamos, assim, a ter dois países dentro do País. O país que manda e o país que obedece.

 

No país que obedece, há cidadãos a ser detidos por "crime de desobediência" - por recusarem levantar-se de um banco público onde estão sentados sem ninguém ao lado, por caminharem solitariamente junto à praia.

No país que obedece, vemos compatriotas submetidos a "cercas sanitárias" impostas por autarcas armados em xerifes ou líderes regionais sequiosos de palco público em concelhos onde existem "dez novos casos" (!) de infectados.

No país que obedece, milhares de pessoas são impedidas de assistir a funerais de familiares e amigos, em nome das drásticas regras sanitárias, e há gente que chora por não ter sido autorizada a despedir-se de um ente querido. Nunca terão segunda oportunidade para o fazerem.

 

Entretanto, no país que manda, a casta - integrando largas dezenas de pessoas pertencentes a grupos de risco - prepara-se para reunir, à porta fechada, em festiva violação das normas que parecem dirigir-se só aos outros, entre despropositadas e até insultuosas loas retóricas à "liberdade" em pleno estado de emergência. Num momento da vida nacional e mundial que devia ser de recolhimento e luto, não de celebração seja do que for.

Depois lamentem-se de haver por aí muitos "populistas", fartos de verem dois países dentro do País. João Soares foi o primeiro a perceber isto: leiam e meditem no alerta dele.

 

Leitura complementar:

Pandemia(7): O 25 de Abril é de todos! De Vital Moreira, na Causa Nossa.

Pandemia (9): Democracia celebratória. De Vital Moreira, na Causa Nossa.

De mordaça e cravo

Pedro Correia, 18.04.20

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Há duas semanas, o presidente da Assembleia da República enfureceu-se com um vice-presidente da bancada do PSD porque este partido tinha "deputados a mais" na sala de sessões do parlamento. Há dois dias, com uma rispidez muito semelhante, o mesmo Ferro Rodrigues insurgiu-se contra um deputado do CDS que protestava contra a anunciada presença de mais de duas centenas de pessoas no mesmíssimo local, a pretexto da celebração do 25 de Abril. Praticamente mandando calar o deputado, sob a alegação de que aquele tema não era para tratar ali. Como se entre as competências da segunda figura da hierarquia do Estado estivesse a de fornecer guiões aos deputados para falarem daquilo que ele considere politicamente correcto.

É inaceitável que para o trabalho regular no hemiciclo apenas um quinto das bancadas devam estar preenchidas, alegando-se grave risco sanitário, mas para celebrar o feriado esse risco esmoreça ao ponto de ser expressamente ali autorizada a presença de um terço dos deputados. Com o alto patrocínio do Presidente da República, que há quase um mês se apressou (e bem) a cancelar as cerimónias do 10 de Junho, Dia de Portugal. E no preciso local onde por esmagadora maioria já se autorizou por três vezes um estado de emergência que impõe a clausura compulsiva dos cidadãos e a supressão de vários direitos e liberdades. Incluindo o direito de manifestação, o direito de reunião, o direito de resistência, o direito à greve, a liberdade de circulação, a liberdade de emigração e a liberdade de culto.

Irão suas excelências comparecer de mordaça (perdão, de máscara) e cravo? Eis uma original forma de "celebrar Abril".

Tábuas em vez de livros

Pedro Correia, 16.04.20

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Uns preferem rodear-se de livros: parece bem e confere um toque acrescido de autoridade intelectual, verdadeira ou postiça.

Mas há quem opte, também nisto, por vias fracturantes. É o caso desta deputada do Bloco de Esquerda, que mandou os livros às malvas e se fez filmar no interior de uma choupana, sem adereços burgueses nem elementos decorativos indignos da "verdadeira esquerda" - a que tresanda a realismo socialista vintage, o último grito da moda dos loucos anos 30 do século passado.

Assenta-lhe bem este visual: em vez de lombadas, tábuas carcomidas pelo caruncho. Sinal inequívoco de que a revolução está para chegar.

Será racismo? Será misoginia?

Pedro Correia, 31.01.20

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O Livre, que foi uma das grandes novidades eleitorais a 6 de Outubro de 2019, aliás celebrada com incontáveis expressões de exultação e júbilo, acaba de perder a sua única deputada na Assembleia da República: Joacine Katar Moreira manterá o lugar no hemiciclo, para o qual foi eleita com toda a legitimidade, mas já sem representar o partido.

A decisão foi tomada por 34 dos 41 membros do chamado Grupo de Contacto - o órgão directivo do Livre - e produz, como consequência imediata, o fim da representação parlamentar do partido, que abdica da deputada, eleita por Lisboa. Um sério revés para o primeiro agrupamento político português que adoptara a introdução de «quotas étnico-raciais» em listas eleitorais.

Subsistem legítimas dúvidas sobre a bondade desta decisão, não faltando quem considere que terá sido meticulosamente orquestrada por gente que recebeu mal a inesperada popularidade de uma deputada capaz de «introduzir diversidade» no Parlamento.

Pertencendo a doutora Katar Moreira, enquanto «presidenta», ao núcleo duro do Instituto da Mulher Negra em Portugal, assumida «entidade anti-racista e feminista interseccional» apostada no combate a quem ouse «retirar ao sujeito negro o lugar de multiplicidade», mais se enraíza em muita gente a convicção de que na origem deste expurgo estarão motivações de índole racista e sexista.

Não será indiferente a tais suspeitas o facto de o fundador do Livre ser homem, caucasiano e agora docente em Harvard - selecto viveiro da classe dominante norte-americana, reduto das elites capitalistas. Já dizia o outro: isto anda tudo ligado.

Solidariedade muito selectiva

Pedro Correia, 23.11.19

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A propósito da indignação que ontem aqui expressei pela recusa da Assembleia da República em exprimir solidariedade a Bernardo Silva, jogador titular da selecção nacional injustamente acusado de práticas racistas pela Federação Inglesa de Futebol, recordo alguns votos solidários que o mesmo órgão institucional aprovou num passado nada distante:

- Solidariedade com a operária corticeira Cristina Tavares:

- Solidariedade com os presos políticos sahrauis;

- Solidariedade com os presos políticos palestinos;

- Solidariedade com Cuba, exigindo o fim do bloqueio comercial;

- Solidariedade com a "comunidade trans".

Para que os leitores ajuízem do contraste. Como se os deputados, em vez de representarem todos os portugueses nos termos em que a Constituição da República determina, representassem só alguns.

Azar do Bernardo, não ser operário corticeiro nem membro da "comunidade trans".

Inqualificável

Pedro Correia, 22.11.19

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Bernardo Silva e Mendy, companheiros e amigos

 

O PS, indo a reboque do Bloco de Esquerda e da deputada do Livre, recusou exprimir solidariedade na Assembleia da República a um dos melhores jogadores portugueses da actualidade, titular absoluto da selecção nacional de futebol, alvo de uma infame acusação de racismo sem o menor fundamento.

Foi um acto de inqualificável cobardia política dos socialistas, talvez com receio de serem apontados a dedo pelos seus companheiros de estrada.

 

Como há dois meses assinalei aqui, Bernardo Silva - que alinha no Manchester City, acaba de ser eleito melhor médio ofensivo do mundo e tem lugar cativo no onze da equipa das quinas com presença garantida no Europeu de futebol - limitou-se a fazer uma piadola no Twitter com um colega de equipa, que é seu grande amigo. Acontece que este colega, o francês Mendy, tem um tom de pele mais escuro do que a do Bernardo: foi quanto bastou para se levantem clamores histéricos contra o internacional português, acusando-o de racismo.

Uma organização denominada Kick It Out apressou-se a exigir a adopção imediata de medidas punitivas contra o «comportamento ofensivo» do nosso compatriota, pressionando a Federação Inglesa de Futebol. E esta cedeu aos clamores da correcção política: Bernardo foi condenado a um jogo de suspensão, ao pagamento de uma multa de quase 60 mil euros e ao cumprimento de um programa comunitário de educação presencial para o descontaminar do putativo vírus racista.

Sublinhe-se que em momento algum Mendy se mostrou ofendido ou apresentou queixa contra o colega.

 

Hoje, no parlamento, PS, BE e Livre cerraram fileiras, recusando o voto de solidariedade com Bernardo proposto pelo CDS. Vários destes parlamentares - sobretudo os socialistas - adoram acotovelar-se nas tribunas dos estádios em aplausos frenéticos à selecção nacional e farão tudo para conseguirem ver in loco os jogos do Europeu, que se disputam em diversas capitais europeias. Alguns, imagine-se, até são comentadores de futebol na rádio e na televisão.

Felizmente para eles, a hipocrisia justifica reparos morais mas ainda não merece censura penal. Ficam assim dispensados de frequentar programas comunitários e de pagar qualquer multa, ao contrário do talentoso futebolista a quem acabam de negar o voto solidário que se impunha. Convicto como estou que nesta matéria pensam inteiramente como eu: é profundamente injusto e vergonhoso rotular Bernardo Silva de racista.

Enfim, um deputado liberal

Pedro Correia, 08.10.19

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Está de parabéns o Carlos Guimarães Pinto. Não foi eleito deputado mas viu a sua Iniciativa Liberal chegar à Assembleia da República logo à primeira tentativa, com um representante por Lisboa. Portugal era até agora o único país europeu sem uma força assumidamente liberal no seu parlamento. Esta lacuna acaba de ser preenchida. Apesar de a IL ter sido ignorada pela generalidade dos órgãos de comunicação social durante a campanha - designadamente pelas televisões, que voltaram a mostrar-se incapazes de seguir novos trilhos informativos, apostando sempre e só nos consagrados.

Tenho grande apreço pelo Carlos, que já escreveu como convidado especial no DELITO DE OPINIÃO e teve a amabilidade de ajudar a promover o nosso livro. Daqui lhe mando um forte e merecido abraço.

Um destes dias Marat ressuscita

Sérgio de Almeida Correia, 11.05.19

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(foto daqui, da Sábado)

Apesar de estar muito longe, e de hoje em dia raramente escrever sobre o que se passa na política nacional, não posso deixar de dizer duas palavras sobre o indecoroso espectáculo a que me foi dado assistir pela televisão a propósito da visita de um tal de Joe Berardo a uma comissão parlamentar da Assembleia da República.

Confesso que não é fácil encontrar palavras que descrevam o que ali se passou, mas grotesco será o mínimo.

E tudo acontece na mesma semana em que as revistas Sábado e Visão mostraram aos portugueses como é possível a um conjunto de pseudo-empresários, pseudo-banqueiros, gestores incompetentes e devedores relapsos levarem vidas milionárias, depois de terem derretido milhões em negócios ruinosos à custa da banca nacional, pública e privada, não pagando a dívida que geraram e deixando os prejuízos para os outros.

No entanto, a avaliar pelas vidas que levam, todos se fizeram pagar pela criatividade da sua gestão, enquanto lhes foi possível, sendo certo que os prejuízos estão a ser, e continuarão, a ser pagos pelos zés-ninguém que sustentam a gula da máquina fiscal e dos bancos que temos.

A imagem de gozo de Berardo no Parlamento, onde se fez acompanhar por um advogado que fazia de ponto, e ao qual condescendentemente o presidente da Comissão deixou que fosse falando e segredando as respostas que o seu constituinte deveria dar, ultrapassou todos os limites.

Depois, o estilo sobranceiro do depoente, as interjeições que foi fazendo, a risada alarve, as respostas irónicas a questões sérias, denunciavam o chico-esperto que a democracia, o Estado de Direito e os nossos sistemas jurídico e judicial fomentaram em quarenta e cinco anos de liberdade com o aval do poder político e da elite dos banqueiros nacionais.

Com tudo o que ouvi, continuo sem saber o que foi verdade e o que é mentira, e também já não tenho esperança de algum dia vir a saber.  Sei é que a dislexia não impediu o cavalheiro de sacar milhões, de continuar a fugir às notificações e de agora gozar com o pagode. Deputados incluídos.

Porém, houve algo que retive, para além do facto do cavalheiro não ter dívidas pessoais. O modo como depois de tudo o que aconteceu se permitiu dizer que tentou “ajudar” a banca nacional, mantendo nos dias que correm um padrão de vida incompatível com a escassez de bens que refere possuir, é um insulto a qualquer cidadão trabalhador e cumpridor das suas obrigações.

O presidente da "Comissão Parlamentar de Inquérito à Recapitalização da Caixa Geral de Depósitos e à Gestão do Banco" (só o nome diz tudo) e os senhores deputados podem não chegar a conclusão alguma. Ninguém estranhará depois da triste figura que fizeram e daquilo que nas suas barbas permitiram que acontecesse.

E até poderemos ter mais uma dúzia de comissões, na linha do que se passou com a avioneta que caiu em Camarate, por exemplo, para investigarem a CGD e as negociatas a que este banco se prestou, para que agora os seus depositantes estejam a pagar o ordenado dos senhores deputados e dos supervisores do Banco de Portugal e, ainda, os prémios que a CGD irá continuar a oferecer aos seus administradores pelas asneiras, a irresponsabilidade e a desfaçatez com que gerem o dinheiro dos outros e impõem comissões bancárias sem que quem governa coloque um travão aos sucessivos insultos.

Não obstante, há uma coisa de que todos temos já a certeza: a de que à sombra da liberdade, da democracia e do Estado de Direito, num país envelhecido e em acelerada regressão demográfica, um poder político estruturalmente mal formado e manipulado por partidos ainda mais sofríveis, promoveu o aparecimento e a reprodução de múltiplos Berardos. De muitos “Joe”. Na banca, nos partidos, nos sindicatos, nas empresas, nas escolas, no futebol, nas autarquias, nas forças armadas, nas universidades, em todo o lado e em todas as instituições. Como se tivéssemos sido invadidos por uma espécie de formiga branca semi-analfabeta, bem falante e bem vestida, alimentada pelos contribuintes e protegida pela classe política, pelos banqueiros e pelo Estado de Direito.

Pena é que em vez de terem alimentado a canalhada que nos roubou não tivessem andado a produzir mel para oferecer a ursos. Fizessem deles comendadores. Como fizeram a tantos outros ursos. Num Dez de Junho. Teria saído muito mais barato, ter-se-ia podido proteger a natureza e haveria a certeza de que depois de saciados, estes ursos, mesmo sendo comendadores, não iriam para o Parlamento arrotar o mel, rir-se na nossa cara e fugir calçada abaixo das notificações dos agentes de execução.

Enfim, o importante agora é garantir que o circo possa continuar. Em directo e a cores. Com os colaterais que o fisco se encarregará de periodicamente sacar a todos nós, indistintamente, residentes e emigrados. Sem um ui. Aos que conseguiram ficar e aos que foram empurrados para fora da sua zona de conforto. E que mesmo fora não escapam ao linchamento fiscal vitalício, continuando a cumprir. Até um dia.

Deputação

Pedro Correia, 20.07.18

A que propósito é que o chamado "núcleo de deputados sportinguistas na Assembleia da República" recebe com pompa o presidente destituído do Sporting Clube de Portugal, no Palácio de São Bento, dando-lhe um crédito que ele não justifica nem merece? Será que os senhores legisladores não têm mesmo mais nada para fazer?

Ética republicana.

Luís Menezes Leitão, 29.06.18

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Um exemplo típico da ética republicana é este parecer do parlamento, a dizer que os deputados podem declarar a morada que quiserem para efeitos de receber subsídio de deslocação, que ninguém se vai dar ao trabalho de os fiscalizar. Não me espantaria que a esmagadora maioria dos deputados passasse de repente, em consequência deste parecer, a residir na Ilha do Corvo. O que o país sabe hoje sobre os nossos políticos é apenas isto: que não há limites para a sua falta de vergonha.

Um exemplo de altruísmo.

Luís Menezes Leitão, 05.05.18

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Há umas décadas passou na RTP um célebre concurso de talentos, apresentado por Raúl Solnado, que se chamava A Visita da Cornélia, onde os candidatos eram examinados por um júri, cujos membros tomavam frequentemente decisões polémicas. Um desses membros era o escritor Luís de Sttau Monteiro. Um dia informou os telespectadores de que estava a receber uma série de cartas anónimas insultuosas devido às suas decisões no concurso. Disse logo que não iria alterar o seu procedimento, e que se lhe queriam dirigir correspondência, os telespectadores fariam melhor em mandar-lhe bacalhau, que pelo menos era comestível.

 

Apesar de naquele tempo não existirem redes sociais, aquela mensagem no único canal de televisão tornou-se viral e ele foi literalmente bombardeado com envio de encomendas de bacalhau para sua casa, ficando assim com um abastecimento considerável. No programa seguinte exibiu algum do bacalhau que tinha recebido, mas avisou logo que lhe parecia que não era correcto ele ficar com todo aquele bacalhau em virtude de ser membro do júri do concurso. E concluiu: "Por conseguinte, decidi oferecê-lo todo a uma família necessitada: A minha".

 

Foi disto que me lembrei quando vi esta atitude de elevada solidariedade do deputado do Bloco de Esquerda Paulino Ascensão que decidiu doar o dinheiro das viagens que recebeu do Parlamento a favor de uma associação de cujos corpos sociais faz parte. Afinal de contas, se está em causa a solidariedade e o altruísmo, por que razão não se hão de beneficiar os que nos são mais próximos? Assim se consegue o enorme benefício de termos uma solidariedade e altruísmo em circuito fechado. O deputado Paulino Ascensão é um exemplo para toda a nossa classe política.