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Delito de Opinião

Uma enorme e rematada estupidez

Pedro Correia, 18.05.24

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A acusação de "traição à pátria" ao Presidente da República era tão delirante que nem pode ser classificada de populista.

Tratou-se de uma enorme e rematada estupidez.

Marcelo Rebelo de Sousa talvez até deva agradecer o dislate de André Ventura, que nenhum jurista digno desse nome se atreveu a validar. E que cobriu de ridículo o líder do Chega perante a larga maioria dos portugueses.

 

As declarações do Presidente, mais papista do que o papa, a propósito das supostas "reparações" às antigas parcelas do nosso território ultra-periférico (como se diz em jargão eurocrático) são mais do que criticáveis. Eu próprio o fiz aqui, em tom jocoso. Daí a considerá-lo "traidor à pátria" e mobilizar 50 deputados para tentarem cavalgar a desbragada onda com horas extra de espaço noticioso é patetice tão grande que quase tresanda a desespero.

Não devia valer tudo para garantir lugar cativo nos telediários que adoram circo em sessões contínuas. Mas pelos vistos vale.

Quem vive na política assim, morre na política também assim. Porque há sempre outro demagogo ainda mais alucinado ao virar de uma esquina. Estes tiros acabam por fazer ricochete, como na velha história do aprendiz de feiticeiro, obviamente sem final feliz.

Besteira mesmo

Sérgio de Almeida Correia, 13.09.23

Em Fevereiro de 2000, o Brasil assinou o compromisso de adesão ao Tribunal Penal Internacional, cujo estatuto foi depois publicado e entrou em vigor na ordem interna brasileira pelo Decreto 4388, de 25 de Setembro de 2002, assinado pelo então Presidente Fernando Henrique Cardoso. Ou seja, há mais de 20 anos que o Estatuto de Roma se aplica no Brasil.

Entre 1 de Janeiro de 2003 e 1 de Janeiro de 2011, Lula da Silva foi presidente do Brasil. E este ano voltou a tomar posse para um novo mandato.

As declarações que proferiu, ignorando o princípio da separação de poderes e o Estado de direito, e as dúvidas que levantou, não só não dignificam o Presidente da República Federativa do Brasil, como o diminuem, bem como ao país, passando uma versão cada vez mais básica e atrozmente ignorante de quem ascendeu ao cargo.

A adesão ao TPI não é uma questão de "Maria vai com as outras". E não é pelo facto de outros não aderirem, por razões egoístas e de puro e recalcado nacionalismo, que deve orientar as escolhas racionais de estados soberanos civilizados que respeitam o Direito Internacional Público.  

O chorrilho de inanidades que tem vindo a ser debitado por Lula da Silva, que ainda não está senil, começa a parecer acompanhar o nível dos seus amigos Maduro e Putin; mas o mais grave nem é isso.

O pior é o Brasil ter-se libertado do cabo de esquadra Bolsonaro, visando recuperar a sua dignidade e o respeito internacional, e para isso reelegeu Lula da Silva, para se colocar agora, quase diariamente, na esquina errada da democracia, dos direitos humanos, do conhecimento, da civilização, do progresso e do desenvolvimento, enveredando pela mais aberrante a aterradora das versões populistas.

Não sei o que Lula deve ao ditador e facínora Putin, mas mais de duzentos anos após ter conquistado a sua independência, o Brasil não merecia tão grande enxovalho.

Eu Sou o Desconforto!

jpt, 30.11.19

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"Eu sou o desconforto" (falta ao título jornalístico o óbvio ponto de exclamação) não é apenas o catasfioresco trinado "rio-me de me ver tão bela neste espelho". É mesmo uma proclamação bíblica, a sublinhar uma desmesurada autopercepção.

Desde Bruno de Carvalho que o país não tinha uma personagem destas. A imprensa delira, as redes sociais fervilham. Alguns demagogos (ainda) rejubilam. Vem aí o Natal. Depois o delírio continuará. Até (nos) cansar.

 

Demagogia

jpt, 14.10.19

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Leio num jornal que provavelmente a actual ministra da justiça sairá do governo e irá para o Tribunal Constitucional, sendo previsível que passará a presidi-lo daqui a algum tempo.

Entretanto, nestes últimos dias, continuo a ler um enorme chorrilho de patacoadas sobre o extraordinário significado da ascensão ao parlamento de gentes oriundas do bloguismo mais demagógico do início dos 2000s. Uma verdadeira orgia de jargão, um frenesim orgástico. E, espertalhões que são, as pessoas dão-lhes atenção. 

“Realejo de disparates”

Diogo Noivo, 02.04.18

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A existência de presos políticos pressupõe a inexistência de separação de poderes. Dito de outra forma, e concretizando, para haver presos políticos significa que o poder judicial é instrumentalizado (to say the least) pelo poder político. Assim, quando PCP, Bloco de Esquerda e alguns deputados socialistas quiseram aprovar no Parlamento um voto de condenação à existência de presos políticos em Espanha – referiam-se, evidentemente, aos políticos independentistas detidos após a tentativa de secessão unilateral e inconstitucional da Catalunha – estavam a afirmar que os Tribunais espanhóis estão ao serviço do Governo do Partido Popular (PP).

 

Tal pressuposto enferma de dois males. O primeiro consiste num entendimento deficiente do Estado de Direito e da centralidade de uma Constituição democrática para a defesa de direitos, liberdades e garantias. Olhando para o tipo de regimes com os quais comunistas e bloquistas simpatizam, aprofundar este argumento é tempo perdido. O segundo mal passa por ignorar a actuação dos Tribunais espanhóis nos últimos anos, sobretudo no que respeita à relação com o poder incumbente. Neste aspecto, puramente empírico, talvez valha a pena insistir. Em 2016, a Justiça espanhola constituiu o PP arguido (imputado) por um alegado acto de destruição de provas num caso de corrupção e de branqueamento. Foi a primeira vez – e, até ver, a única – que um partido político foi submetido a este estatuto na Espanha pós-1978. Antes, já os tribunais espanhóis tinham acusado e condenado vários políticos do PP em processos por corrupção, apropriação indevida e branqueamento. Em Maio de 2016 eram mais de 800 os militantes populares na lista de investigados – uma lista que continua a aumentar. Nomes como Rita Barberá, Rodrigo Rato, Ángel Acebes, Francisco Granados, Francisco Camps, Jaume Matas, Álvaro Lapuerta e Luis Bárcenas demonstram que a Justiça não se ficou por peixe-miúdo e foi atrás de gente com elevado perfil público e grande influência política. Isto chega para perceber o quão desonesta, porque completamente distanciada da realidade, é a crença de que os Tribunais estão ao serviço do Executivo presidido por Mariano Rajoy. É também ignorante porque opta por não ouvir o que dizem aqueles que, de facto, foram presos políticos em Espanha. Actualmente, o drama de Espanha é a falta de política, não o excesso.

 

O exercício tentado na Assembleia da República tem subjacente uma profunda desonestidade intelectual. Razão tem Sérgio Sousa Pinto, deputado do PS e presidente da Comissão Parlamentar de Negócios Estrangeiros, quando diz que em matéria de política externa a Assembleia da República é cada vez mais um “realejo de disparates”. O problema, creio, é que não são apenas disparates. Tendo em conta as loas a regimes despóticos onde há efectiva opressão da oposição, ou pelo menos os esforços titânicos para não os condenar (vide Venezuela e Rússia), parece emergir no Parlamento português uma mundivisão cegamente leal àqueles com quem tem afinidades ideológicas e persecutória em relação a todos os outros. Em boa verdade, esta forma de ver a política não é nova, mas a sua promoção por parte de partidos próximos do poder é inaudita. Estamos, em suma, a assistir ao esboroar do cordão de decência criado por Mário Soares para garantir que a arena política portuguesa era composta por democratas: de esquerda e de direita, liberais e conservadores, nacionalistas e estrangeirados, mas todos democratas. No curto prazo será de borla, mas a longo prazo o preço deste “realejo de disparates” será elevado – o custo do Novo Banco serão trocos para café e tabaco quando comparados com isto.

O eucalipto e a luta de classes

Pedro Correia, 22.07.17

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A história dos eucaliptos, no discurso geringoncês, substituiu o tradicional paleio da "luta de classes" com essas árvores a representarem a "classe opressora" e as putativas espécies autóctones a figurarem como "classe oprimida", ressaltando-se a necessidade de plantar uma floresta "patriótica e de esquerda" que expulse e puna a espécie invasora.

Vai daí, ensaia-se o assalto ao palácio de Inverno em plena canícula, com aquelas árvores folhosas a fazerem o papel do czar derrubado pelo proletariado em luta. São árvores colonialistas e capitalistas: além de serem originárias da Austrália, servem fundamentalmente para produzir pasta de celulose, utilizada no fabrico de papel: é um grande negócio para a indústria do sector, aliás elogiadíssima por Sua Excelência o primeiro-ministro.

«Tal como está previsto desde 2015, na estratégia florestal nacional, a área prevista para a plantação de eucaliptos permitirá responder àquilo que é a procura crescente por parte da indústria, permitindo aumentar a produção de pasta e de papel» , declarou há seis meses António Costa. Não há seis anos, notem, mas apenas há seis meses.

O eucalipto alimenta o segundo maior circuito exportador português, que tem como destinatários 118 países - motivo acrescido para ser combatido e dar espaço a árvores proletárias, portuguesas de gema. Árvores como o carvalho, que produz a deliciosa bolota - produto comestível e talvez (quem sabe?) de elevado valor nutritivo também para o sector exportador nacional.

 

É curioso verificar como estas coisas mudam. No século XIX, quando começaram a ser plantados os primeiros eucaliptos em Portugal, dizia-se que eram árvores quase milagrosas. Como em 1920 anotava Jaime de Magalhães Lima, botânico e pioneiro do  vegetarianismo em Portugal, era vista como uma espécie que «crescia rapidamente, multiplicaria milagrosamente a riqueza florestal em proporções descomunais, povoava os desertos, sofria toda a inclemência da atmosfera e do solo, purificava os lugares insalubres, livrava das febres paludosas, dava madeira excelente para todos os fins, rebelde à podridão, e destilava óleos, essências e medicamentos preciosos».

há cem anos, segundo o mesmo especialista, «a cultura do eucalipto» se havia tornado «corrente» em Portugal: «Hoje, o eucalipto vende-se nas feiras à dúzia e ao cento como as couves, enterra-se depois pelo meio dos matos em covachos abertos a esmo, e nesta barbárie, com estes cuidados elementares por demais resumidos, vinga, se o terreno lhe agrada e a humidade atmosférica o favorece».

Nos dias que correm, noutras paragens, não falta quem elogie o eucalipto por ser um instrumento activo de combate ao efeito de estufa devido à sua capacidade de reter dióxido de carbono: cada árvore "sequestra" 20 quilos anuais de CO2 e um hectare de eucaliptal jovem retém cerca de 35 toneladas de gás carbono por ano. O que talvez devesse reponderar algumas posições de ambientalistas, mais vermelhos que verdes, que o encaram como sinistro símbolo da exploração florestal.

 

Alguns alimentam até a fábula que os incêndios em Portugal só ocorrem onde existem eucaliptos.

O problema, como acontece com muitas fábulas, é a sua falta de adequação à realidade.

Há uma semana houve um grande incêndio em Moura, no Alentejo, numa zona onde não há eucaliptos e o sobreiro é a árvore largamente dominante.

Logo a seguir, o brutal incêndio de Alijó, em Trás-os-Montes, confirmou como o fogo arde também de forma devastadora onde não há eucaliptos.

«Desta vez, o Governo não vai poder desvalorizar o incêndio de Alijó com a mesma negligência com que menorizou o assalto em Tancos. O pinhal que este fim-de-semana foi destruído no planalto do meu concelho era feito de árvores antigas, grandes, de enorme valor económico e ecológico. Era o pulmão verde da região, onde passei muitas tardes de Outono a apanhar cogumelos silvestres caminhando sobre uma manta húmida e fofa de musgos, onde as giestas e os tojos tinham por vezes dificuldade em sobreviver na penumbra permanente das copas frondosas», escreveu Manuel Carvalho no PúblicoUm artigo que devia ser lido por todos quantos, confortavelmente instalados em Lisboa, pretendem "reorganizar" a floresta portuguesa a partir de preconceitos ideológicos e lugares-comuns. E que, com toda a coerência de que um lisboeta é capaz nesta matéria, olham para as árvores apenas como espécies decorativas, destinadas a "embelezar a paisagem", dissociando-as por completo do seu potencial económico e do seu valor comercial como fonte de receitas e de emprego em regiões pobres e deprimidas do País.

O discurso anti-eucalipto tem servido para os cabeçalhos da imprensa e a mais desenfreada demagogia política em voga neste Verão. Mas nenhuma verdadeira reforma da floresta pode ser feita assim em Portugal.

E isto para não chegar a lado nenhum

Bandeira, 18.04.16

José Bandeira - Pilos, Messénia, Grécia
Região de Pilos, Messénia, Grécia (Foto José Bandeira) 


Garantir que os gregos não inventaram a democracia como hoje a conhecemos é dizer que os sumérios não inventaram a jante de liga leve. Depois de uns Bushmills dá para aceitar, mas há necessidade? Fiel a mim mesmo, serei pedante e lembrarei que até os romanos, cuja civilização em certa medida se construiu contra a dos gregos (leia a Eneida outra vez, vá), perceberam a relevância do tremendo legado. E se Popper apodou Platão de totalitarista, não deixou de escrever também que a primeira filosofia grega era quase “demasiado boa para ser verdade”.

 

Em Os Cavaleiros, o poeta (muito) cómico Aristófanes arrasa Cléon, o grande demagogo da democracia ateniense. Eleito em acalorada discussão comandante militar, Cléon acabara de chegar de Pilos com mais de trezentos espartanos acorrentados e, sobretudo, humilhados; gente nada habituada a tratos de polé. Eis que a cidade se vê já a vencer a guerra (se quer saber, não a venceu) mas Aristófanes arrasa o seu próprio líder, ao mesmo tempo que retrata os seus conterrâneos, o povão ateniense, com condescendência aristocrática (quase todas as fontes que nos chegaram do período democrático, incluindo Aristófanes, são de certa forma hostis à democracia, quando não admiradoras confessas do regime totalitário em vigor em Esparta). Superando uma ou outra dificuldade – o autor queixa-se de não ter encontrado quem se dispusesse, com receio de represálias, a fazer-lhe uma máscara de Cléon –, a peça foi a concurso no teatro de Dioniso e ganhou o primeiro prémio.

 

O primeiro prémio! Mas então esse Cléon, tratado na aba da Acrópole de corrupto e ladrão por um poeta cómico aplaudido por uma multidão em delírio, perdeu o poder, certo? É claro que não. O mesmo povo que deu o primeiro prémio a Aristófanes colou as costas do seu demagogo ao espaldar da cadeira do poder. Pelos padrões de hoje, tudo perfeitamente normal. Até na parte em que Aristófanes, apesar de um processo ou outro nos tribunais, se permitia usar de liberdade de expressão, uma coisa que a gente se habituou a achar muito recente, muito nossa, muito luxo de primeiro mundo.

 

Aos papéis

João Campos, 15.04.16

A história dos Panama Papers promete ser longa (até porque por cá o Expresso e a TVI parecem querer fazer render o peixe enquanto a montanha dá à luz uma ninhada de ratos), sinuosa e particularmente dada à demagogia - o assunto será decerto mais complexo para as perspectivas a preto e branco da maioria dos paineleirostudólogos da televisão portuguesa. Claro que noções de complexidade e de nuance são coisas que pelos vistos escapam à TVI, aparentemente determinada em falar do caso nos mesmos moldes, mas com linguagem menos refinada, dos programas de comentário futebolístico que infestam os três canais de notícias do cabo. Faz lembrar aquela bela expressão inglesa: if you can't dazzle them with brilliance, baffle them with bullshit. É mesmo a única explicação que encontro para a emissora de Queluz se ter lembrado, para comentar o caso em horário nobre, de Marinho Pinto e Raquel Varela. 

Perfeitos demagogos

Sérgio de Almeida Correia, 15.03.15

Creio que se há coisa que os portugueses abominem, daquilo que conheço deles, é que os políticos queiram fazer deles uns trouxas sempre prontos a engolirem todas as baboseiras que lhes digam. Em períodos eleitorais as medidas dos incumbentes que estão de partida reproduzem-se como cogumelos. Um verdadeiro maná que de se repete antes de cada ciclo eleitoral.

Deixarei a discussão dos méritos e deméritos do Programa VEM, que talvez devesse antes chamar-se "VEM E VAI", para os especialistas. Como cidadão aquilo que me chamou mais a atenção foi a forma como se anunciou, qual pote de ouro no final do arco-íris, uma rubrica dedicada aos portugueses emigrados que se encontram em situação de desemprego de longa duração num país terceiro.

O apoio a esses nossos compatriotas não é despiciendo e bom seria que todos pudessem ser apoiados. Porém, o que de todo me intriga e não percebo é outra coisa. Sabendo que a maior parte desses portugueses que estão situação vulnerável no estrangeiro são, em regra, pessoas pouco qualificadas de sectores como a construção civil, restaurantes ou serviços de limpeza, que estão inscritos em centros de emprego, muitos em países que pagam generosos subsídios de desemprego, que sentido tem fazê-los regressar nas condições propostas? Para irem fazer cursos de seis meses enquanto se alojam em casas de familiares? Certamente não se ignora que muitos desses deixaram de pagar as prestações dos empréstimos aos bancos, ficaram sem casa e sem dinheiro. E depois de concluído o Reactivar regressam à situação anterior se não encontrarem trabalho? E ao fim dos seis meses, após as legislativas, voltam a engrossar as estatísticas do desemprego? De maneira a que o aumento desses números sobre para a factura dos que se seguirão? Ou o Governo pensou também numa solução para no final dos seis meses os fazer de novo sair do país?

De facto, é preciso ter muita falta de vergonha para depois de ter deixado o desemprego em Portugal atingir os números que atingiu, não havendo até agora uma redução substancial desse número, pelos menos para os níveis de há meia dúzia de anos, ainda haja quem se proponha de forma tão leviana e demagoga, com a maior desfaçatez do mundo, resolver os problemas laborais dos que tiveram de sair do país por falta de trabalho sem antes se encontrar uma solução aceitável para que os ficaram.

Sim, porque em relação aos qualificados com trabalho ninguém troca uma situação confortável numa empresa ou universidade estrangeira para ir estiolar a contar o que sobra para pagar impostos e contribuições numa qualquer tabanca nacional em que até as compressas, as seringas, o papel e as fotocópias são a conta-gotas e controlados por um qualquer burocrata lá colocado pelo partido.    

Olha, o Manolis Glezos (Syriza) veio escrever no Delito

Rui Rocha, 22.02.15

Pudor

Pedro Correia, 08.01.15

Há sempre um sociólogo pronto a invocar causas "sociais" como factor atenuante para os autores dos crimes mais sórdidos. Se o sociólogo estiver de folga, avança o psicólogo de plantão, evocando os traumas sofridos na infância como caução moral dos actos criminosos cometidos na idade adulta.

Na ausência episódica de ambos, logo emerge uma voz oriunda da classe política a dizer não importa o quê numa resignada complacência perante a barbárie. Ontem, nesta ronda, coube o turno à eurodeputada Ana Gomes. A responsabilidade dos homicídios que semearam o terror em Paris, garante a intrépida socialista, dilui-se nas "políticas de austeridade anti-europeias".

Ainda nauseados pelos ecos do brutal atentado perpretado no coração da pátria do racionalismo por elementos da guarda avançada do terror, testemunhamos o protagonismo de quem se aproveita dos cadáveres de mártires da liberdade de expressão para difundir a demagogia mais rasteira.

Nestes momentos em que somos confrontados com a face do mal no seu horror absoluto apetece implorar a certas vozes que se calem em nome do mais elementar, recomendável e misericordioso pudor.

Fernando, o comendador polivalente

Sérgio de Almeida Correia, 22.05.14

Fernando Seara anunciou a sua candidatura à Liga de Clubes. Ainda não fez um ano que foi eleito para exercer o lugar de vereador da Câmara de Lisboa para um mandato de quatro anos e já está a preparar-se para dar o salto, uma vez mais deixando enganados os eleitores que o elegeram para cumprir o mandato, depois de ter jurado a pés juntos que iria ficar na autarquia.

O homem que desde há anos é especialista em todas as áreas, nunca dando o dito por não dito, do comentário televisivo futebolístico à presença assídua em jornais, sem esquecer a militância política, primeiro no CDS, depois no PSD, passando pelo exercício de cargos partidários, parlamentares e autárquicos, a advocacia, gabinetes ministeriais, o exercício da docência e o conselho de opinião da RTP; e que ficou ultimamente conhecido por liderar o "comboios dos parolos" no Copacabana Palace, predispôs-se agora a ocupar a presidência da Liga de Clubes.

Os benfiquistas até podiam ter razões para estarem satisfeitos. Eu desconfiaria. O candidato é a imagem acabada da demagogia populista e um espelho da proximidade entre a política, a bola, a construção civil e a comunicação social. Por mais sério que seja, e consta que nesse aspecto é irrepreensível, é um daqueles casos em que a personalidade pública e o currículo académico, profissional e político acabam por falar contra si. Não por ser irrelevante, mas pela polivalência. Pela facilidade com que num estilo moluscóide salta de um lugar para outro e a tudo se adapta com um sorriso e uma palavra simpática. Se a tudo isso juntarmos uma passagem por um colégio universitário ligado aos franciscanos e uma escola militar, está encontrado o homem ideal para nadar no pântano do futebol nacional, fazendo acordos com o mesmo à-vontade a norte e a sul, no interior e no litoral.

Pelo menos desta vez não corre o risco de voltar a ser humilhado nas urnas com a camisola do PSD. Basta-lhe fazer as habituais promessas e negociar apoios, coisa que já começou a fazer prometendo um rendimento mínimo para os clubes e um pacote fiscal, tanto mais que a troika já fez as malas. Para quem diz que vai unir e credibilizar parece-me um mau começo. Ou bom, dependendo da perspectiva. Unir é capaz de conseguir, nem que seja pela distribuição de euros em tempo de vacas magras. Credibilizar, com o seu currículo e exemplos recentes, é que será outra conversa. Se no fim faltarem os euros para distribuir a culpa será do Governo, dos clubes, de alguém lá mais para a frente. E assim se vai perdendo o talento e o que ainda restava de simpatia pela personagem.

Ai, a demagogia.

Luís M. Jorge, 21.09.11

No Público de hoje a coisa atingiu níveis nunca antes alcançados (o que não é dizer pouco, porque lá escreve a Helena Matos) graças a uma crónica do Rui Tavares em que ele sugere que a ausência de Governo na Bélgica impediu as políticas de austeridade, o que terá feito crescer a economia.

 

Está bem, abelha.

 

Se o Rui Tavares quisesse abordar estes assuntos com algum rigor repararia que a ausência de Governo na Bélgica também impediu as políticas expansionistas, assentes no investimento público e no incremento da dívida, o que se calhar fez crescer a economia.

 

Portanto, ficamos assim.