O pesadelo cubano
65 anos de ditadura comunista, sem pão nem liberdade
Leonardo Padura: «Mais de um milhão de cubanos abandonaram o país nos últimos anos»
Leonardo Padura é o maior escritor cubano contemporâneo. Vive exilado na sua própria terra. Não lhe fazem referências nos jornais, está impedido de aparecer na televisão, nenhum dos seus livros mais recentes foi sequer editado no país submetido há 65 anos a uma ditadura comunista.
O autor de Adiós Hemingway e El Hombre que Amaba a los Perros acaba de dar uma impressionante entrevista ao El Mundo em que confessa a sua amargura pelo cenário de estagnação e pobreza, moral e material, da sua Cuba natal, carente de pão e democracia. Onde as pessoas só podem votar de uma forma: com os pés. É isso que vão fazendo, em número crescente: êxodo em busca de liberdade.
Partilho convosco alguns dos excertos mais relevantes:
«Em Cuba falta comida e electricidade, mas acima de tudo falta esperança.»
«É doloroso saber que os meus livros podem ser encontrados nas livrarias de qualquer país de língua espanhola, menos no meu.»
«Vivemos a maior vaga migratória da história de Cuba. Nos últimos três ou quatro anos, só para os Estados Unidos, partiram mais de 800 mil cubanos. Somam-se aos que estão no México em fila de espera, aos que foram para Espanha - cerca de 200 mil -, Brasil ou Uruguai... Mais de um milhão de cubanos, 10% da população, abandonaram a ilha.»
«Não é só a repressão política: também há repressão judicial. Por quebrar um vidro de uma loja, alguns [jovens] manifestantes foram condenados a dez anos de prisão. Ninguém sai à rua em protesto, sabendo que pode passar uma década atrás das grades.»
«Já ninguém acredita num ideal tornado obsoleto nem num futuro melhor.»
Palavras contundentes e desassombradas. Padura, com 69 anos recém-completados, arrisca - também ele - ser detido pelos esbirros da tirania instalada em 1959, ainda ele nem frequentava a escola primária. Porque em Cuba vigora o delito de opinião: não faltam ali prisioneiros de consciência. Há mais de mil nos cárceres castristas, 30 dos quais ainda menores.
Vale-lhe, em parte, ter dupla nacionalidade: em 2011, foi-lhe concedida a cidadania espanhola. Isto não lhe diminui a angústia de se ver cada vez mais isolado no bairro de Havana onde tem passado toda a vida. Porque - outra revelação ao El Mundo - agora não partem só os jovens: também muitos velhos vão virando costas à ilha, deixando-o mergulhado numa solidão que dói como ferida funda.
Como diria o anti-herói dos seus romances policiais, o detective Mario Conde, «desde o infantário até ao túmulo que nos vai calhar na rifa, escolheram tudo, sem nos perguntarem nunca nem de que doença gostaríamos de morrer.»
Após décadas de pesadelo que continua sem ter fim.