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Delito de Opinião

A maldição do caminho único

José Maria Gui Pimentel, 27.02.12

 

Tenho a tentação de simpatizar com a corrente de opinião que defende que Passos Coelho deveria procurar contrariar a postura pró-austeridade defendida pelo governo alemão, no fundo deixando a posição irritante de cachorrinho mor de Angela Merkel. No mínimo, como pede Daniel Oliveira, que se junte ao manifesto pró-crescimento económico encabeçado por David Cameron. Pessoalmente, não concordando com a visão de Daniel Oliveira, nem com as propostas vagas de Seguro (“austeridade inteligente”), tenho todo o apreço por aquilo que o referido documento defende. Todavia, não creio que o Primeiro-Ministro tenha, neste momento, verdadeiramente alternativas. A iniciativa para um abrandamento das medidas de austeridade terá sempre que vir alternativamente da parte destes países ou da própria Alemanha (e França). Portugal deve limitar-se a uma diplomacia cautelosa, à espera de uma brecha (que aparentemente, embora se desconheça a sua dimensão, poderá ocorrer). Foi a este caminho único de curto-prazo que, bem ou mal, nos condenámos quando pedimos ajuda externa. Numa altura em que a Grécia sepulta cada vez mais a cabeça no chapéu do aluno mal comportado, Portugal não tem outra solução senão tentar a todo custo ser o totó bem comportado da turma. Sim, reconheço que é uma postura irritante, sobretudo num país que se tem colocado nessa posição muitas vezes nos últimos anos. Porém, a alternativa é o país afundar-se agarrado à Grécia. E isso, parece-me, é algo que ninguém deseja. É pois apenas prosseguindo o caminho actual que se poderá chegar a um plano estável em que, aí sim, as diferentes perspectivas para o país podem e devem (a bem da democracia) ser equacionadas. 

Paizinho Krugman falou

Rui Rocha, 23.02.12

 

O que pode Passos Coelho fazer? Promover o crescimento, dizem alguns enquanto põem uma velinha a São Paul Krugman. Estimular a economia, gritam outros enquanto beijam a medalhinha de São Krugman que trazem ao peito. Adoptar medidas anti-ciclicas, berram aqueles que, de joelhos, se dirigem para a capelinha das aparições de São Krugman em pleno New York Times. Pois vai-se a ver e o próprio santinho milagreiro não anda muito convencido disso. De acordo com um post fresquinho, o todo poderoso e omnisciente acaba de comunicar aos devotos que aos países periféricos da Zona Euro que se arrastam em lenta agonia restam as seguintes soluções:

  • Implorar que a Troika torne as medidas de austeridade menos severas (importa recordar que a tábua quarta dos mandamentos das crendices e mezinhas prescreve que ali onde o mestre escreveu austeridade menos severa não deve o fiel discípulo entender coisa diferente);
  • Fazer o que for possível para estimular a competitividade (estimular a competitividade e não qualquer outra coisa - recordo a propósito a já referida tábua quarta), sendo certo que o mestre pensa não se poder fazer grande coisa;
  • Esperar que as coisas melhorem aos poucos por via da desvalorização interna (yes, I am afraid he said it again, pelo que os caríssimos apaniguados podem desde já preparar os raminhos para vergastarem as costas) ou que piorem (situação que pode preparar o contexto económico e politico para uma saída do euro).

Ah, paizinho Krugman também refere que não vê balas mágicas ou soluçõezinhas milagreiras. Rotundazinhas e pontezinhas, investimentozinho do Estado que era tão bom, viste-o nem eu. Agora ide, fieis discípulos do santinho. Ide ler. E orai e  fazei penitência se a tanto vos sentirdes obrigados. 

Aventuras políticas e tiros no escuro

Rui Rocha, 28.04.11

O Senhor Primeiro-Ministro está demissionário, mas mantém-se igual a si próprio. Ou, melhor dito, varia conforme a sua semelhança. Em essência, é incompetente e irresponsável e especializou-se em manipular, ocultar, omitir e negar a realidade. Sendo estas características permanentes, a intensidade com que as pratica aumenta em função da vontade que vai detectando nos que o rodeiam para lhe aparar o jogo. O facto de ter um partido submisso e aparentemente entusiástico dá-lhe forças renovadas. Sondagens que não o colocam ao nível rasteiro onde ele sabe que devia estar dão asas às suas piores qualidades. Só este contexto em que, aparentemente, tudo lhe foi e é permitido, sem qualquer responsabilização, justifica o topete de apresentar um programa eleitoral que assenta em falsidades e em mistificações. Tudo isto é tanto mais grave quanto é certo que este é o ainda líder do governo. E que, nessa qualidade, está a negociar condições da ajuda externa que, como o próprio reconhece, serão completamente diferentes daquelas que constam do programa eleitoral e que foram decalcadas do PEC IV. Ora, perante tamanha desfaçatez e a aparente indiferença e permissividade de um grupo significativo de portugueses, importa deixar claro a José Sócrates que nem todos, apesar de tudo, estamos disponíveis para dar cobertura às suas trampolinices. Aqui fica o registo de algumas vozes que ajudam a perceber onde estão as aventuras políticas e os tiros no escuro a que Sócrates se refere:

"Quando me dizem que é com o Fundo Monetário Internacional que o Estado Social vai ser posto em causa - não. Foi agora que o Estado Social foi posto em causa, pelas pessoas que resolveram fazer estádios de futebol - dez quando chegavam oito - e tantas autoestradas". (...) Os actuais defensores do Estado Social foram os maiores responsáveis pelos problemas estruturais do país. (...)Temos de perder as ilusões. Com certeza que os tempos que vêm aí vão ser violentos".

Estela Barbot (FMI)

 

"O objectivo de atingir um saldo orçamental próximo do equilíbrio foi sistematicamente reiterado nos nossos diferentes Programas de Estabilidade e Crescimento mas foi sempre adiado para o final do horizonte do programa seguinte, isto é, não nos esquecemos da regra mas nunca a respeitamos ou aplicamos".

 

Nos últimos 12 anos os Estados e os Governos à frente dos destinos do país não foram prudentes. Endividaram-se e não quiseram cumprir regras europeias, de manter o défice abaixo dos 3%, ou de simples bom senso.

 

“É crucial que os decisores de política e os gestores públicos prestem contas e sejam responsabilizados pela utilização que fazem dos recursos postos à sua disposição pelos contribuintes”.
Carlos Costa (Governador do Banco de Portugal)

Crisis 'R' Us

Rui Rocha, 24.03.11

Estamos então como antes. Pobres e endividados. A diferença é que agora não temos governo e antes estávamos desgovernados. A crise política, diz-se por aí, pode precipitar o pedido de ajuda externa e a intervenção do FMI. Imagino que o FMI seja como o Pai Natal, mas ao contrário. O Pai Natal traz prendinhas aos meninos que se portaram bem durante o ano. O FMI traz medidas duras aos países que fizeram asneiras durante anos. É importante ter isto presente no momento de repartir responsabilidades pela situação actual. O que tínhamos era um copo cheio. E não existem grandes dúvidas sobre quem o encheu. Seis anos consecutivos de governação não podem passar em claro. A crise política que se vive terá então, quando muito, o significado de o fazer transbordar. A culpa é de Sócrates ou de Passos Coelho? Não faltam por aí as teorias mais variadas. Não devemos, todavia, perder a noção da realidade. A importância destas teorias deve reconduzir-se à dimensão que lhes cabe: a de reflexões sobre uma gota de água. E existem ainda outros pontos que importa sublinhar. O primeiro é o da certeza, fundada numa sucessão prolongada de factos desastrosos, de que aqueles que encheram o copo continuariam, independentemente da crise política, a meter água até o fazerem transbordar. O segundo é da convicção, também baseada em atitudes ostensivas e reiteradas, de que o copo já teria transbordado há muito se as contas públicas reflectissem com rigor o estado actual do país, tal como não aconteceu em 2010. Cada um de nós é livre de acreditar no que lhe for conveniente. Mas, nem Sócrates e Teixeira dos Santos, com toda a sua incompetência, seriam capazes de abrir um buraco de 80 mil milhões de euros de profundidade se só tivessem começado a cavar depois das 21h00 do dia 23 de Março de 2011.

Pois, pois, e eu sou o homem-aranha...

Rui Rocha, 17.01.11

O Primeiro-Ministro de um país nada distante  declara não estar no Qatar para tratar da venda de dívida. O Ministro dos Negócios Estrangeiros do mesmo Governo desse país bastante próximo manifesta a sua convicção de que um dos assuntos tratados nessa mesma visita é a venda da dívida. Admita, por mero absurdo, que se trata de membros do Governo de Portugal. Perante estas afirmações, quem estará a dizer verdade:

a) O Primeiro-Ministro, que tem tido uma relação difícil com a realidade e que está absolutamente descredibilizado?

b) O Ministro que tem apresentado sentido de estado e bom senso, distinguindo-se dos restantes membros do Governo pela sua competência e credibilidade?

Na sua resposta, tenha em conta que o Primeiro-Ministro jura a pés juntos que anda a falar de sol, água e vento (energias renováveis em português técnico) e considere, como factor de desempate (irra!), a sua percepção pessoal sobre qual dos dois mereceria confiança como vendedor de viaturas em segunda-mão.

Em caso de dúvida persistente, consulte o seu médico ou farmacêutico (é que não deve esperar nem mais um minuto!).