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Delito de Opinião

A crise política na Madeira.

Luís Menezes Leitão, 27.01.24

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Tenho visto aparecer afirmações sobre a resolução da crise política na Madeira praticamente decalcadas da péssima solução que Marcelo Rebelo de Sousa adoptou para o país, que se baseou em adiar, quer a demissão do Governo, quer a dissolução do Parlamento para permitir a aprovação do orçamento. Isto implicou que o país esteja a viver num limbo durante quatro meses, em que as instituições se vão degradando à vista de todos, sem que ninguém faça nada para resolver os problemas.

Na Madeira, no entanto, esta solução não é replicável por uma razão muito simples: É que nas Regiões Autónomas vigora um regime parlamentar puro, enquanto que na República o regime é semipresidencialista. Tal leva a que grande parte do que foi feito no país não possa ser repetido na Madeira.

Assim, em primeiro lugar, não há qualquer possibilidade de o Presidente do Governo Regional apresentar a demissão e a mesma não ser logo aceite, uma vez que o art. 62º, nº1, b) do Estatuto Político-Administrativo da Madeira refere expressamente que implica a demissão do Governo Regional a apresentação pelo Presidente do Governo Regional do pedido de exoneração. Ou seja, é logo no momento da apresentação do pedido de exoneração que se verifica a demissão do Governo Regional, não podendo a mesma ser adiada, pois não é necessário qualquer acto de aceitação.

Para além disso, ao contrário do que sucede na República, onde o Programa do Governo é discutido, mas não votado, só podendo o Governo cair se for apresentada uma moção de rejeição, na Madeira o Programa do Governo Regional implica a apresentação de uma moção de confiança (art. 59º, nº1, EPAM), pelo que sem a Assembleia Regional aprovar o seu Programa, o Governo Regional ficará em gestão (art. 63º, nº1, EPAM). Assim, qualquer substituto de Miguel Albuquerque terá que ter necessariamente desde o início a confiança da maioria da Assembleia Regional.

Em qualquer caso, como a Assembleia Regional ainda não fez seis meses sobre a sua eleição, a mesma não poderá ser dissolvida pelo Presidente da República a não ser daqui a dois meses. Não parece, porém, que possa ter seguimento a evidente tentativa do Presidente da República de manter o actual Governo Regional em plenitude de funções até esse momento. Basta que algumas das anunciadas moções de censura seja aprovada para que tal já não seja possível.

Aguardemos assim pelas cenas dos próximos capítulos.

O poder tem a saia curta

Teresa Ribeiro, 08.11.23

Há 191 políticos a braços com a justiça desde 2017, noticiou a CNN Portugal em maio passado. Sem surpresa, a peça revelou que é entre o PS e o PSD que há mais casos. Agora, na campanha eleitoral que se avizinha, vai andar tudo doido, a começar pelos que ainda estão virgens, e sonham ter a experiência. O resto, como diria a Teresa Guilherme na Casa dos Segredos, "não interessa nada".

Bem vistas as coisas, podia ter sido bem pior

João Sousa, 04.05.23

«Marcelo filmado a comer um gelado em Belém

O Presidente da República disse hoje que "é preciso ter calma, não dar o corpo pela alma", rodeado por comunicação social, junto ao Palácio de Belém, em Lisboa, e filmado pelas televisões enquanto comia um gelado. (...)

O chefe de Estado também não quis fazer analogias entre os sabores do seu gelado, "limão, framboesa e chocolate", e a situação política nacional ou as opções que tem em cima da mesa, depois de o primeiro-ministro ter decidido manter João Galamba como ministro das Infraestruturas, contra a sua opinião.» - Sapo

 

Ainda bem (ainda bem!!!) que Marcelo teve a sensatez de não se deixar filmar com um Calippo: estremeço só de pensar nas "analogias" ou "leituras" que se tentariam fazer.

É a cultura, estúpidos

Teresa Ribeiro, 13.01.23

O slogan da campanha de Clinton, devidamente adaptado, assenta que nem uma luva a esta cascata de casos e casinhos que acabam em demissões. Começou por ser desleixo, pois durante muito tempo a experiência era a de que estas incompatibilidadezinhas, estes desvios éticos, passavam pelos intervalos dos media, agora acredito que já não é. Só que o sistema está tão saturado, que se torna cada vez mais difícil encontrar alguém impoluto. É este o drama. O sistema ensopou. Torce-se e só deita amigos,  primos, boys ou girls. Porque isto é, e sempre foi, uma sociedade governada por castas. Não é o PS, ou o centrão é já uma maneira de ser. Leiam o Eça.

A diferença, agora, é que se sabe. Com uma facilidade que deixa tontos os que até agora conseguiam governar e governar-se a si e aos seus, em sossego.

Estranhos companheiros de caminho

Pedro Correia, 01.11.21

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António CostaRui Rio e Francisco Rodrigues dos Santos revelaram convergência total na mensagem que dirigiram em separado ao Presidente de República: há que organizar eleições legislativas «tão cedo quanto possível». Rio e Santos foram ao ponto de defendê-las já para 9 de Janeiro. O que implicaria o início da campanha eleitoral a 26 de Dezembro e a impossibilidade de realizar debates televisivos. Além de inviabilizarem qualquer hipótese à oposição interna, quando ambos os partidos estão envolvidos em processos eleitorais intramuros - aparentemente já abortado, no caso do CDS, que se proclama anti-aborto. Outro pormenor: as listas eleitorais teriam de ser fechadas a 6 de Dezembro, 48 horas após a realização das directas previstas no PSD.

Uma campanha quase clandestina, em plena quadra festiva, só favorece Costa. Quanto menos escrutinado for, na óptica dele, tanto melhor. Quanto menos debates se travarem durante a campanha, perfeito. Quanto mais abalada por falta de democracia interna estiver a oposição à direita, isso é música para os ouvidos dele. 

 

Em entrevista à SIC, na sexta-feira, Rio insistiu na mesma tecla: legislativas já a 9 de Janeiro. Ou, o mais tardar, no dia 16. Sabe que isso favorece os socialistas, mas só surpreende os incautos: os seus quase quatro anos de desempenho à frente do PSD demonstram que, com ele, Costa pode permanecer descansado.

Quando Rio tomou a iniciativa de suprimir os debates quinzenais com o chefe do Governo na Assembleia da República, sob a alegação de que era importante «deixar o primeiro-ministro trabalhar»Costa passou ali a prestar contas menos 30% em relação ao período anterior e o próprio presidente do PSD teve a sua intervenção reduzida para cerca de um quinto do tempo de intervenção parlamentar.

 

O mesmo Rio que tem tanta pressa em ir a legislativas, trava a fundo nas eleições directas: qualifica-as de "balbúrdia" - algo impensável num democrata consequente. Contar votos no País sem contar votos no partido, em processo eleitoral regular e ordinário, no estrito cumprimento dos estatutos? Nem por um momento imagino o Presidente da República - a quem, nos termos constitucionais, compete em exclusivo a marcação do calendário eleitoral - a caucionar tão grave entorse à democracia interna num partido que se propõe como alternativa de poder.

Com esta sucessão de declarações, o presidente do PSD demonstra ter medo de enfrentar o seu competidor, Paulo Rangel - ainda por cima num processo eleitoral por ele mesmo desencadeado a 28 de Setembro, dois dias após a realização das autárquicas.

E quer chegar ao poder para quê? Para «dialogar» com o PS «em nome do interesse nacional».

Uma vez mais, de chapéu na mão, mendigando a esmola de uma atenção de Costa - algo que o líder socialista sempre recusou desde 2015, ao ponto de ter declarado categoricamente, há pouco mais de um ano: «No dia em que a sua subsistência depender do voto do PSD, este governo acabou.»

 

Impossível revelar maior arrogância. E, no entanto, é com um suposto interlocutor destes, assumidamente surdo aos rogos que lhe chegam da direita, que Rio insiste em «dialogar». A política gera insólitos companheiros de caminho. Mas não deixa de ser estranho que alguém insista em caminhar com quem o vem enxotando o tempo todo sem reservas nem remorsos.

Espero que tudo isto mereça análise e reflexão no PSD. A menos que o homem que suprimiu os debates quinzenais no parlamento consiga também pôr fim às eleições internas no partido para se agarrar desesperadamente à função simbólica que ainda exerce. Já vi tanta coisa que quase nada me surpreende.

 

ADENDA: Vice-presidente de Rio ataca violentamente Marcelo. Eis todo um padrão: a Direcção laranja só não endurece quando é o Governo a estar em causa.

O palácio a arder

João André, 29.06.15

Quando o Syryza foi eleito governo terão soado as campainhas de alarme em Bruxelas e Berlim (e Amesterdão, já agora). Quando Tsipras e Varufakis andaram a passear ideias limite pela Europa em alegres passeios, as reuniões terão começado com um objectivo: trazê-los à terra. Havia esperanças e um ou outro sinal de abertura iriam nesse sentido. Quando Tsipras e Varufakis demonstraram a sua completa inabilidade política e diplomática, o objectivo tornou-se um e um só: fazer um exemplo da Grécia.
Que tipo de exemplo não faz muita diferença, na realidade. Ou os gregos aceitariam as propostas iniciais das "instituições" sem qualquer alteração e assim levariam à queda de tão radical governo; ou então deixar-se-ia cair o próprio país. Foi esta opção que, com a colaboração de Tsipras, acabou "escolhida".
A esmagadora maioria dos comentários que leio vão no sentido de culpar a "Europa" (pode até ser o FMI, ou o BCE, ou Merkel, ou o senhor X que fez a folha de Excel) ou de culpar os gregos (os extremistas do Syryza, os abusadores do passado, os radicais disto ou aquilo). (In)felizmente existe culpa suficiente para distribuir: das "instituições" por tratarem a Grécia como uma folha de Excel onde as pessoas serão pouco menos que células; dos líderes europeus que nunca se preocuparam com a Europa em si mesmo mas apenas e só com a próxima eleição; do acutal governo grego que julgou que a Europa era uma manif mas em grande e com alguns tipos de gravata; dos governos gregos antigos que fizeram pela vida dos amigos e trataram a UE como uma cornucópia; dos diversos líderes europeus dos últimos 20 anos que não souberam assumir a construção europeia como ela precisava de ser assumida; (continuem a preencher, isto pode levar muitos outros alvos e nem importa de que lado vocês se posicionem, a vossa atribuição de culpas estará muito provavelmente correcta).
No meio disto tudo há um povo que será culpado de ter feito pela sua vida perante as circunstâncias que lhes eram oferecidas. Culpar os gregos não faz muito sentido: seria como culpar quem faz compras numa loja que anuncia dumping. Só que é esse mesmo povo que agora irá sofrer com a estupidez, ganância e mesquinhez dos líderes europeus (incluindo os seus próprios). Estas cimeiras deveriam ter sido feitas com a intenção de lhes minorar esse sofrimento. Não houve essa preocupação. Agora que o palácio está em chamas, ninguém se preocupa com os habitantes, apenas com quem deixou o gás ligado e a tostadeira ligada.
E agora? pelo que tenho lido de toda a gente que faz previsões: ninguém sabe. Podem uns, outros ou ninguém ter razão. Da minha parte não faço ideia. Sei que haverá quem lamba os beiços e quem avalie os méritos da varanda do quinto andar e cobice acesso à do décimo. A ver vamos onde chegarão as chamas e se haverá bombeiros disponíveis.

O desacordo de perdição nacional.

Luís Menezes Leitão, 19.07.13

 

Sempre me pareceu que este desfecho era inevitável. É por isso óbvio que os partidos fizeram uma triste figura em aceitar a imposição do presidente para uma reunião tripartida, na qual acho que nem sequer ele acreditava. Na verdade, parece-me que tudo isto não passou de uma encenação para Cavaco demonstrar que não assinava de cruz a proposta de remodelação do Governo.

 

Como bem foi salientado por inúmeros militantes, o PS não podia aceitar agora dar a mão ao governo, a não ser que a sua direcção se quisesse suicidar. Ao contrário do que Soares afirmou, nunca esteve em causa uma cisão no PS, mas apenas a defenestração de Seguro, inevitável se este subscrevesse o acordo. A saída de inúmeros deputados depois da votação da moção de censura foi aliás um recado claro sobre o que se iria passar a seguir.

 

O PSD e o CDS também não podiam aceitar o presente envenenado que Cavaco queria dar a Seguro de marcar eleições no prazo de um ano. Efectivamente, nessas condições ninguém quereria ir para o Governo, nem o Governo teria coragem de fazer as reformas absolutamente necessárias e que já há muito deveriam ter sido feitas. Acresce que, se houvesse acordo, daqui a um ano seria provavelmente António Costa quem lideraria o PS, combatendo sem quartel os partidos da maioria a partir de Lisboa.

 

É por isso que um acordo entre os três maiores partidos seria sempre impossível, pelo menos nos termos que Cavaco queria. Os três partidos, no entanto, não quiseram ficar mal na fotografia e envolveram-se nestes últimos dias num verdadeiro jogo de sombras, simulando uma negociação que já se sabia que não iria dar em nada, apenas para tentar atirar para o outro as culpas do fracasso.

 

Custa-me ver, no entanto, o Presidente e os partidos a fazerem os eleitores de parvos. Nunca o Presidente deveria ter proposto semelhante aberração política e, se o tivesse efeito, os partidos deveriam tê-la liminarmente rejeitado. E não é por se chamar de salvação nacional que este compromisso mereceria a mínima credibilidade. A seguir ao 25 de Abril também se constituiu uma Junta de Salvação Nacional. A mesma foi logo substituída por um Conselho da Revolução que mergulhou o país no PREC.

A coisa aqui está preta.

Luís Menezes Leitão, 18.07.13

 

Os acontecimentos dos últimos tempos fazem-nos perguntar se é possível existir um país assim.

 

Primeiro o Presidente não aceita uma remodelação governamental e propõe eleições a prazo, mas ao mesmo tempo propõe qie cheguem a acordo três partidos que ultimamente não se têm entendido sobre coisa nenhuma.

 

Um partido que não existe, e só tem dois deputados, apresenta uma moção de censura no Parlamento. Quer a maioria quer a oposição aplaudem a iniciativa que consideram clarificadora. O maior partido da oposição acha normal estar simultaneamente a negociar com os partidos do Governo e a censurar o Governo. Já o Governo acha que a moção de censura do partido inexistente reforça a sua legitimidade.

 

Entretanto o Presidente mostra que tem outras prioridades. Afasta-se da confusão do continente e vai para as Selvagens agarrar calca-mares e anilhar cagarras. A não ser que a iniciativa seja um estágio para aprender a agarrar os partidos e anilhar os seus dirigentes, não se percebe a sua utilidade neste momento. Mas os Portugueses já se habituaram a considerar insondáveis os desígnios do Presidente.

 

Como cantava o Chico Buarque: "Uns dias chove, noutros dias bate o sol. Mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui está preta". Alguém transmita esse recado ao Presidente.