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Delito de Opinião

Esquemas, uma nova ou velha tendência?

Joana Nave, 27.06.22

O mundo dos esquemas é vasto e abarca as mais variadas vertentes. Há esquemas para todos os gostos, para todas as necessidades e ao serviço da imaginação de cada um. Criar um esquema pode ser fácil, se o for apenas conseguir atingir uma meta seguindo exemplos alheios, porém um esquema que pretenda alcançar um patamar superior, que não pareça o que é até atingir o fim a que se destina, já requer perícia, estudo e empenho por parte do seu criador.

Os esquemas não seguem as normas da sociedade, mas têm procedimentos que os associam e identificam como tal. São, regra geral, formas de beneficiar um ou mais indivíduos por meio de estratégias ilícitas, fraudulentas e enganadoras. O esquema não é necessariamente uma forma fácil de atingir um determinado fim, pode até ser um caminho mais ardiloso e com consequências nefastas, mas os proveitos são certamente maiores e forçosamente tentadores para que o caminho escolhido seja o do esquema e não o do trabalho comum.

Usar um esquema é uma forma de tentar ser e ter algo que de outra forma muito dificilmente conseguiríamos. Não é fácil, e não está ao alcance de todos, ser rico, famoso, bem sucedido, reconhecido, ter posses acima da média, e acima de tudo influência sobre os demais. Enveredar num esquema é um deslumbramento, quer para quem o cria, quer para quem o segue.

Um dos primeiros esquemas que conheci foi a famosa cábula escolar, que era usada para compensar a falta de estudo no aproveitamento das provas de avaliação. Os alunos tornaram-se cada vez mais criativos à medida que os professores percebiam o método e aplicavam restrições com o intuito de inibir esta prática.

Na procura de trabalho também há muitas pessoas que dizem ter conhecimentos que não têm, experiências e cargos empolados, que ficam bem numa apresentação, mas que na prática são apenas mais uma mentira com vista a conseguir o emprego para o qual se estão a candidatar.

A sociedade está cheia de mentiras, de pessoas que querem ser algo que não são. Nós podemos ser tudo o que quisermos, mas esse é o prémio do esforço, do empenho, da dedicação, a meta para quem luta e segue os seus sonhos de forma correta, justa e sem enganar ninguém, principalmente a si próprio.

Ser mulher na sociedade actual

Joana Nave, 17.11.21

A luta pela igualdade de género em direitos e liberdade é antiga e actual, dependendo do contexto social em que vivemos. Sabemos que as mulheres ainda são muito discriminadas em países subdesenvolvidos ou países onde há uma predominância machista, sendo que esta última é sem dúvida a que tem maior relevo. Países altamente desenvolvidos e industrializados como a Coreia do Sul vêem a mulher como mãe e cuidadora, a profissional é crucificada aos olhos da crítica social, que diminui o papel da mulher instruída e liberal, subjugando-a a uma cultura que está fundamentalmente centrada no papel do homem, o pilar da família, que trabalha para a sustentar e que deve ser servido.

Em Portugal há uma grande defesa em torno do papel da mulher emancipada, com igual oportunidade de ascender a cargos de chefia e de destaque, que muitas empresas até publicitam como forma de promoverem o seu bom exemplo nesta matéria. As mulheres vão tendo relevo e notoriedade em todas as áreas, mesmo nas que antes eram sobretudo dominadas por homens.

Apesar de todos os avanços sociais não há forma de contrariar a natureza, é a mulher que engravida, que durante cerca de nove meses passa pela evolução gestacional, que está activamente no parto e no pós-parto e de quem mais o recém-nascido necessita pela parte da alimentação e da ligação estabelecida desde a concepção. É a mulher que tem uma limitação etária para procriar, assim como a que está mais sujeita ao escrutínio social quando a idade avança e permanece solteira e sem filhos.

No mundo actual e em países como o nosso é comum as mulheres serem mais liberais, dedicadas à carreira, não saberem cozinhar e optarem por não ter filhos. Estas mulheres são criticadas tanto por homens como por outras mulheres. As mulheres são condicionadas no seu papel desde a criação, em que a mulher se juntou ao homem para que este não estivesse sozinho e foi criada a partir de uma costela dele. Esta versão bíblica é advogada no papel acessório e secundário da mulher e persegue-a como uma herança de vida.

O meu super ídolo

Joana Nave, 21.07.21

Quando nascemos não vemos logo todos as cores, nem de forma nítida e só focamos a uma distância reduzida. À medida que crescemos a visão torna-se mais colorida, límpida e abrangente. Os nossos pais ou cuidadores são as pessoas que vemos diariamente e em quem depositamos a nossa confiança e amor. Depois, vamos alargando o leque e trazendo para o círculo dos afectos aqueles que duma forma ou doutra nos cativam.

É normal que as crianças desenvolvam especial carinho pelos educadores, professores, treinadores, e por aí fora. À medida que vamos frequentando grupos, também aí tendemos a desenvolver laços de amizade com várias pessoas. A pessoa que dirige é aquela que mais amamos ou odiamos, consoante o grau de admiração. Estas pessoas têm um papel fundamental na educação e formação das crianças, mas também enquanto adolescentes e jovens, e até como adultos. O líder de um grupo é responsável pela orientação e formação de valores e crenças, seja um grupo desportivo, de teatro, xadrez, música, religião, entre muitos outros. Quando esse líder abusa do seu poder de influência, através da manipulação, usurpação, mentira, humilhação e força, estamos perante uma perturbação grave da formação do indivíduo.

A experiência que decorre de situações desta natureza provoca distúrbios de aceitação, confiança e aprendizagem, porque são associados a uma natureza negativa, que é maléfica ao desenvolvimento do ser humano. Somos seres sociais e precisamos do nosso contexto social para crescermos de forma sólida e estruturada, mas quando as bases são abaladas a construção tende a desmoronar e o renascer dos escombros pode ser muito difícil e tortuoso. Acredito que é por terem receio de como enfrentar esta tão grande adversidade no caminho, o colocar em causa escolhas e crenças enraizadas, o investimento de tempo e dinheiro em causas que se revelam infrutíferas, que tantas pessoas adiam a decisão inevitável, que negam os factos que têm diante de si e preferem não ver o óbvio, porque a dura realidade é cruel e é preciso um esforço muito maior do que continuar a subjugar a vida aos interesses dos outros.

Não sendo fácil abraçar a mudança, é inegável que ela é necessária, que é a única via libertadora da opressão, que é a força motriz única e necessária para abraçar novos desafios, que são escolhas livres das amarras que antes foram impostas. Ser livre para escolher, decidir e usufruir dos frutos dessas verdades. Se não há liberdade de pensamento, se a opinião individual não é tida em consideração, se em vez de um círculo temos uma pirâmide, em que ouvimos a cascata cadente, em vez de elevar a cúpula pelos degraus trilhados, então não pode ser verdadeiro.

A dieta que funciona

Joana Nave, 14.07.21

Dizem que os algoritmos captam títulos sonantes, por isso resolvi dar a este texto um título que o tornasse apelativo aos mais cépticos, aos menos curiosos e aos que se estão nas tintas.

Se ainda estão a ler, não fiquem desiludidos porque não vou falar de dietas, ou de alimentação saudável, porque não tenho formação na área e não quero iludir ninguém, vou apenas especular um pouco sobre vários conceitos que acho interessantes e que estão relacionados com o comportamento alimentar.

Quando eu era criança a regra era comer, e se não comesse era um verdadeiro sarilho, porque barriga cheia era sinal de saúde e o contrário não, a falta de apetite era logo sinónimo de doença. Entenda-se ainda por comer, não comer pouco ou o suficiente, mas o chamado comer bem, ou seja, comer muito. Em termos de diversidade alimentar tudo estava bem desde que se fosse alternando religiosamente entre peixe e carne.

Com o passar dos anos muita coisa mudou, a roda dos alimentos ajustou-se a novas realidades, surgiram doenças associadas a hábitos alimentares e a certo tipo de alimentos, e difundiu-se uma forma de comer mais natural, por oposição aos muitos descuidos alimentares que uma sociedade em desenvolvimento, principalmente tecnológico, fomenta por nos roubar tempo para os tachos.

O leque de opções actuais é vastíssimo e vou enumerar apenas algumas das que conheço: vegetarianismo, veganismo, plant-based, paleo, mediterrâneo, entre muitas outras. Há quem não queira colocar a si próprio o rótulo, mas opte predominantemente por um estilo de alimentação, e depois há as pessoas que comem de tudo, mas que não comem alimentos com glúten, ou lactose, ou processados, e por aí fora.

Uma das ideias que mais confusão me fazem, e esclareço desde já que é apenas a minha opinião, baseada na minha experiência, é a questão do jejum intermitente. Percebo a ideia de que a redução de calorias, por saltar uma ou várias refeições e ter o cuidado de não compensar nas seguintes, promove o emagrecimento, mas não entendo os benefícios defendidos pelas pessoas que o praticam. Em termos de comportamento alimentar parece-me um risco, porque exige uma auto-disciplina muito grande e um esforço físico e mental que não são sustentáveis a médio e longo prazo, porque não proporcionam equilíbrio. Esta ideia é ainda completamente antagónica da que defende que não devemos saltar refeições, que o pequeno-almoço é a refeição mais importante do dia, que não almoçar e depois comer muitos snacks ou um jantar pesado faz mal, entre outras.

Por tudo isto, defendo que a melhor dieta é a que funciona para cada um. Gosto da expressão reeducação alimentar e acho que faz sentido. Acredito que o melhor de tudo é o equilíbrio, escutar o nosso corpo e comer o mais natural possível, com respeito e harmonia por nós, pelos outros e pelo planeta. Claro que nem sempre é possível e está tudo bem, desde que a consciência esteja sempre presente nas escolhas que fazemos, que aceitemos que há dias e fases menos boas, mas que depois podemos voltar ao nosso ritmo, com tranquilidade. Eu tenho fases em que podia comer o pequeno-almoço ao almoço e ao jantar, fases em que não consigo comer peixe, nem carne, em que podia comer só fruta. Tenho fases em que cozinho tudo de raiz e outras em que coloco no forno pizzas, rissóis, croquetes, ou então como apenas uma torrada. Acredito que o que faz bem é o que me faz bem a mim e não aos outros, por isso aceito quem só bebe líquidos, quem não come, quem se mata a fazer exercício físico para queimar calorias, porque este templo que nos deram para cuidar só depende de nós e, ainda que o partilhemos, nascemos e morremos com ele e a responsabilidade é inteiramente nossa.

Viver devagar

Joana Nave, 23.06.21

Viver devagar. Abrandar o ritmo, saborear cada momento, colocar intenção e atenção em tudo o que fazemos. Parece tão simples, como utópico. Tão próximo, como distante. Talvez seja a realidade de quem vive fora das grandes cidades, tenha um trabalho em part-time, ou tenha uma rede de suporte muito grande e organizada, que lhe permita não ter de ocupar o tempo livre com tarefas domésticas e afins.

Sempre procurei ser consciente em relação a tudo o que faço, respirar lentamente, sentir os cheiros, degustar os aromas e estar em contacto com a natureza, sempre que possível. Procurei instruir-me de forma abrangente, ler muito, ouvir música e escrever sobre o que estava a sentir. No entanto, a sensação de frustração, de correria constante, de pressa em vez de vagar, de pouca ou nenhuma atenção ao pormenor, é avassaladora. Vivemos tempos agitados, mesmo quando somos obrigados a parar a mente teima em preencher os espaços em branco, em estar permanentemente numa busca constante por algo que a ocupe, porque a mente é traiçoeira e quer estar sempre em vantagem.

O Yoga e a meditação ajudam, mas apenas se lhes dermos espaço para fazerem parte do nosso dia-a-dia, interiorizando a prática como uma rotina e não apenas como mais uma tarefa na lista de afazeres. Cada pessoa tem a sua forma de relaxar, tirar prazer da vida, mas é muito comum não darmos prioridade aos momentos prazenteiros, com a desculpa de que é só mais um esforço e depois já vamos ter todo o tempo do mundo para nos dedicarmos ao que realmente gostamos de fazer.

Querer estar mais presente, ter um espaço limpo, organizado e minimalista dá imenso trabalho, pelo que o ideal é traçar esses objectivos e ir com calma no caminho para os atingir. Ir fazendo tudo aos poucos, pequenas tarefas de cada vez, sem pressa de chegar, caminhando passo a passo, com a lentidão própria de quem quer sentir que a vida flui com calma e ligeireza. É com foco no momento que se vai vivendo devagar, que se vai tirando prazer das pequenas coisas e enriquecendo uma vida singular.

Ser criança no mundo actual

Joana Nave, 02.06.21

Ser criança é um dom, ser criança em espírito, quando a armadura que a reveste se vai tornando mais sólida, mais definida, mais conhecedora. A criança é um estado de espírito que habita em nós, que influencia a percepção das coisas que vemos e sentimos.

No mundo ser criança é um verdadeiro desafio, daqueles que nos fazem tropeçar a cada instante. Cair, levantar, erguer a cabeça e seguir em frente. Abraçar o desconhecido com a alegria contagiante da descoberta, da primeira vez. Subir ao cume, sem olhar para trás, sonhar cada vez mais alto.

As distracções aprisionam a criança, tornam-na preguiçosa, vulnerável, à mercê do que é instantâneo e efémero. A comparação, a cobiça, destroem a essência, a pureza.  A vontade nem sempre é inata, nem sempre assoma quando mais precisamos, é preciso relembra-la e cuida-la como o nosso bem mais precioso. É a vontade que guia os nossos passos, que semeia o desejo que faz nascer a energia de que necessitamos para viver cada dia. E é na alegria, a mais genuína e verdadeira, a que nos leva às lágrimas de emoção, à dor de barriga comprimida com o riso contagiante, que encontramos a única criança interior que jamais nos abandona, mas que pede a todo o instante a nossa máxima atenção e cuidado.

Ser criança é uma verdadeira dádiva, que devemos homenagear diariamente, enaltecer e louvar, permitir que se liberte, que encontre o seu semelhante em cada gesto e sorriso que a despertam para a vida.

Faço 40, e agora?

Joana Nave, 26.05.21

Cada ano que passa surge como uma nova oportunidade, de fazer mais, melhor, ou apenas tentar manter o nível. Não me recordo exactamente dos primeiros anos de vida e da forma como me senti quando celebrei os meus primeiros aniversários. As fotografias imortalizaram os sorrisos, os bolos, as roupas, mas não captaram a essência.

Quando olho para os meus filhos vejo neles toda a energia e vontade de crescer, de passar para o nível seguinte. É tão importante ser crescido, ter direito à sua própria voz, tomar decisões sem limites, fazer escolhas arrojadas sem o sermão da advertência, castrador. Lembro-me de querer o mesmo que eles, avançar, seguir em frente, ter o meu destino nas minhas mãos, arriscar sem receio, lutar pelos meus sonhos e ideais. De querer tanto abraçar o futuro, fui-me esquecendo de viver o presente, que se ia escapando por entre os dedos, a correria desenfreada de querer sempre mais, de acumular experiências e também coisas. Passei três décadas neste estilo de querer e, só na viragem da última década, me apercebi que muitas coisas eram um verdadeiro contrassenso, porque à medida que ia tomando consciência dos problemas ambientais, da saúde mental, das relações, fui continuando a encher o baú das recordações, para me manter segura com o peso da minha bagagem.

Foi preciso ser mãe, de um e mais um, para perceber que a vida nos desafia constantemente a sair da nossa zona de conforto para abraçarmos a verdadeira felicidade, que só se encontra na liberdade. Esta liberdade é a que nos liberta das amarras dos preconceitos, do peso que carregamos. Quando somos brutalmente desafiados a lutar contra nós próprios, contra crenças enraizadas profundamente, começamos a questionar o que nos rodeia. Primeiro, a dependência, sabermos que não podemos olhar só para nós, porque outros, seres imaturos, indefesos, desprotegidos, precisam de nós, dos nossos cuidados, atenção e sobretudo amor. Depois, o espaço, aprender a ter o nosso espaço dentro do colectivo, adaptarmos as nossas vidas a novas necessidades. Claro que podemos não aprender nada com isto, ganhar muito dinheiro, arranjar uma boa ama, uma empregada e uma casa maior.

No entanto, o verdadeiro desafio é a mudança, criar espaço dentro do que já existe, simplificar, deixar para trás, organizar horários, criar rotinas e novos hábitos. Quando chegamos a este ponto estamos verdadeiramente preparados para viver a restante metade das nossas vidas, pelo menos a expectável e com qualidade mental. Sabemos o que nos agrada, o que nos faz sentir bem, o que nos perturba e o que devemos evitar. Sabemos as horas de sono que devemos dormir, a quantidade óptima de exercício, o que vestir nas várias ocasiões, o que dizer, o que queremos ouvir, e acima de tudo sabemos aceitar.

Não me sinto mais sábia, mais ponderada ou determinada, como também não sinto que tenha desperdiçado o meu precioso tempo de juventude, sinto que estive num processo de aprendizagem, que é contínua, aprendi muito, umas vezes acertei, muitas outras errei, mas continuo a querer fazer mais e melhor, com mais leveza, com mais certeza que o caminho é o que realmente importa e não tanto os objectivos que o definem.