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Delito de Opinião

O propagandista do Kremlin

Pedro Correia, 03.12.24

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«A Rússia vai crescer 3,6%. Não está mal, pois não?»

 

«Putin disse esta semana que faz dez vezes mais mísseis do que todo o Ocidente junto e vai aumentar 25%.»

 

«A Rússia faz mais em três meses, em termos de material de guerra, equipamento e armamento, do que toda a Europa num ano.»

 

«A Rússia tem pleno emprego. O desemprego está menor do que na Europa. A inflação também.»

 

«A Rússia está praticamente imune às sanções ocidentais.»

 

«A população da Ucrânia está cansada de Zelenski.»

 

Ontem, na CNN Portugal. Quando se sabe que um terço do orçamento do Estado da Rússia para 2025 está reservado a despesas militares - facto inédito no país.

Convém levar Putin a sério e ouvir Trump

Pedro Correia, 13.09.24

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COGUMELOS NUCLEARES NAS CIDADES DOS EUA

«Convém levar a sério, de uma vez por todas, Vladimir Putin. Convém ouvir o que diz o próprio Trump neste debate com Kamala Harris: estamos a enfrentar uma potência nuclear, uma superpotência, e estamos completamente tranquilos como se nada se passasse. O que diz Putin - e é capaz de ter muita razão - é que estas armas de longo alcance (que não têm tanto longo alcance quanto isso) dentro do território da Rússia faz[em] da NATO parte do conflito. Muda a natureza e muda a essência deste conflito.

Portanto, quem quiser entrar em guerra com a Rússia, faça o favor. O Reino Unido quer entrar em guerra com a Rússia? Tenha a bondade. Basta um míssil Sarmat para destruir o Reino Unido. Basta um!

A utilização destes mísseis pode ser interpretada pela Rússia como um primeiro passo para um ataque preventivo, a resposta é nuclear estratégica, aliás disse-o [o MNE russo] Lavrov, não é na Europa: é directamente para os Estados Unidos. E os Estados Unidos não estão minimamente interessados, em ter, a um mês das eleições, cogumelos nucleares nas suas cidades! Nem certamente o Reino Unido. Nem certamente a França, muito menos o Presidente Macron, que nem consegue nomear um primeiro-ministro.»

 

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A UCRÂNIA JÁ PERDEU E O OCIDENTE ESTÁ A PROVOCAR MOSCOVO

«O que é absolutamente ridiculo é pensarmos que se pode provocar sistematicamente uma potência nuclear, provocar a maior potência nuclear, que já fez o upgrade da sua capacidade bélica, ao contrário do Ocidente... 

A questão é sabermos se é apenas a Ucrânia que vai sair derrotada desta guerra ou se sai a NATO toda! E os Estados Unidos têm a percepção disso.

Esta operação [em Kursk] foi o maior erro estratégico operacional que a Ucrânia, assessorada pelo Ocidente, pôde fazer. Os resultados estão à vista em Kursk. E no Donbass a situação é catastrófica para as forças ucranianas. Neste momento a Ucrânia está numa situação de emergência. O risco neste momento não é se a Ucrânia vai perder - é quando a Ucrânia vai perder, como vai perder e onde é que param os russos. Esta é que é a realidade dos factos.»

 

Major-general Agostinho Costa, ontem à noite, na CNN Portugal. O mesmo que em 25 de Fevereiro de 2022 proclamava na pantalha: «Os russos já estão em Kiev!»

O infatigável major-general putinista

Agostinho Costa anda há dois anos e meio a profetizar a derrota da Ucrânia

Pedro Correia, 22.08.24

A Terra é plana

Pedro Correia, 05.02.24

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«A CDU tem aqui um resultado que não parece tão mau como as sondagens indicavam. A CDU foi o terceiro partido mais eleito entre estes círculos - Flores, São Jorge e Faial. A CDU é um partido fundamental, com muita importância.»

Carmo Afonso (RTP 3, ontem, às 22.32)

 

(O Partido Comunista Português, uma vez mais, não conseguiu eleger qualquer deputado nos Açores: a última vez que isso aconteceu foi em 2012. Flores, São Jorge e Faial são ilhas, mas não formam nenhum "círculo". A CDU nem sequer é partido, excepto na República Federal da Alemanha)

A história repete-se

Pedro Correia, 08.12.23

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«Nas próximas presidenciais uma segunda volta é, assim, praticamente inevitável. Não era esse o seu objectivo, mas Nobre e Alegre abriram um caminho que não se volta a fechar.»

Ricardo Costa (Expresso, 29 de Janeiro de 2011)

 

«Eu acho que as próximas presidenciais vão ser a duas voltas. Nós estamos pouco habituados a isso porque a última vez que houve presidenciais a duas voltas foi em 1986.»

Ricardo Costa (SIC Notícias, 9 de Outubro de 2023)

Parece que foi combinado...

Pedro Correia, 11.10.23

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... mas garanto que não foi. Isabel Moreira, insuspeita de ser hostil para Pedro Nuno Santos, seu companheiro de bancada parlamentar, também se espantava ontem numa rede social - tal como eu aqui - contra esta moda, inaugurada na SIC Notícias, de ter em estúdio comentadores encarregados de comentar outros comentadores da mesma estação. Dividindo-os assim entre comentadores de primeira (os que são comentados) e os de segunda ou quinta categoria (quem não usufrui desse insólito privilégio).

Muito endogâmico: a bolha dentro da bolha dentro da bolha. Tal como se comprova igualmente no facto de agora quase todos se tratarem por tu durante a palração televisiva: formam a selecta irmandade da pantalha. 

Quanto mais íntimos parecem, mais põem os telespectadores à distância. Depois não se queixem das fracas audiências. Nada disso acontece por acaso.

O grão-vizir que sonha ser califa

Pedro Correia, 10.10.23

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Diz-se que este senhor «faz tremer a direita». É um manifesto exagero. Parece que se estreou ontem como comentador da SIC Notícias sem fazer tremer ninguém - nem sequer de frio, com estas temperaturas quase de Verão. 

«Fazer tremer» é, aliás, uma frase a que deviam evitar associá-lo. Evoca de imediato aquele dia de 2011 em que o próprio, enquanto vice-presidente da bancada parlamentar do PS, proferiu esta bravata: «Estou marimbando-me para os bancos alemães que nos emprestaram dinheiro nas condições em que nos emprestaram. Estou marimbando-me que nos chamem irresponsáveis. Nós temos uma bomba atómica que podemos usar na cara dos alemães e dos franceses. "Ou os senhores se põem finos ou nós não pagamos a dívida." Se o fizermos, as pernas dos banqueiros alemães até tremem.»

Não consta que nenhum banqueiro germânico tenha tremido - ou que tenha sequer tomado nota de tais declarações, mais próprias de algum membro de associação de estudantes do que de um deputado e futuro ministro da nação.

Quem certamente tremeu, mas de indignação, foi António Costa a 30 de Junho de 2022, quando lhe revogou um despacho sobre o plano de ampliação do aeroporto de Lisboa que apenas vigorou por 24 horas. Fazendo perder a face ao então titular das Infraestruturas. Que não tardou a perder também o posto governativo: durou só mais seis meses no lugar. Como activo tóxico do Executivo socialista.

Não vi a prestação televisiva do grão-vizir que sonha ser califa do PS nesta sua estreia como residente na pantalha. Dizem-me que, depois da homilia, logo várias sumidades surgiram em antena a perorar sobre o que ele pregara. Extraordinária endogamia televisiva: comentadores a comentarem o comentador.

Ponham-se finos, senão ele zanga-se. Parece que tem frequentes crises de mau humor. Como o outro, que se dizia «animal feroz».

salve-se quem puder

Pedro Correia, 26.07.23

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Análise política (parte 1)

a política portuguesa está transformada num conjunto de declarações hipócritas e carregada de promessas vãs. os deputados dão diariamente um espectáculo deplorável ao país com divergências e incompatibilidades que não conduzem a lado nenhum. o governo está morto só falta fazerem-lhe o funeral e é bom que isso aconteça rapidamente porque já não se aguenta o mau cheiro. as sucessivas trapalhadas condenaram o executivo ao fracasso ao ponto de todos sentirmos muitas saudades do santana lopes. ninguém percebe por que motivo o primeiro-ministro ainda não se demitiu. os políticos não conseguem apresentar uma solução coerente aos cidadãos. o presidente da república é um incapaz. enterrou o governo mas já se percebeu que não tem nada para dizer. ninguém percebe por que motivo o presidente da república ainda não se demitiu. ele e os outros todos só são capazes de fazer jogos florais. todos os partidos chegaram a um estado de degradação lamentável. a oposição também é péssima. a política falhou. a classe política enlouqueceu. ninguém percebe por que motivo os líderes dos partidos da oposição ainda não se demitiram. não há soluções boas nem más. agora só há soluções péssimas. o país já foi ao fundo.

salve-se quem puder.

 

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Análise política (parte 2)

os políticos não conseguem apresentar uma solução coerente aos cidadãos. o presidente da república é um incapaz. enterrou o governo mas já se percebeu que não tem nada para dizer. ninguém percebe por que motivo o presidente da república ainda não se demitiu. ele e os outros todos só são capazes de fazer jogos florais. todos os partidos chegaram a um estado de degradação lamentável. a oposição também é péssima. a política falhou. a classe política enlouqueceu. ninguém percebe por que motivo os líderes dos partidos da oposição ainda não se demitiram. não há soluções boas nem más. agora só há soluções péssimas. o país já foi ao fundo. a política portuguesa está transformada num conjunto de declarações hipócritas e carregada de promessas vãs. os deputados dão diariamente um espectáculo deplorável ao país com divergências e incompatibilidades que não conduzem a lado nenhum. o governo está morto só falta fazerem-lhe o funeral e é bom que isso aconteça rapidamente porque já não se aguenta o mau cheiro. ninguém percebe por que motivo o primeiro-ministro ainda não se demitiu. as sucessivas trapalhadas condenaram o executivo ao fracasso ao ponto de todos sentirmos muitas saudades do santana lopes.

salve-se quem puder.

 

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Análise política (parte 3)

ninguém percebe por que motivo o primeiro-ministro ainda não se demitiu. as sucessivas trapalhadas condenaram o executivo ao fracasso ao ponto de todos sentirmos muitas saudades do santana lopes. os políticos não conseguem apresentar uma solução coerente aos cidadãos. o presidente da república é um incapaz. enterrou o governo mas já se percebeu que não tem nada para dizer. ninguém percebe por que motivo o presidente da república ainda não se demitiu. ele e os outros todos só são capazes de fazer jogos florais. todos os partidos chegaram a um estado de degradação lamentável. a oposição também é péssima. a política falhou. a classe política enlouqueceu. ninguém percebe por que motivo os líderes dos partidos da oposição ainda não se demitiram. não há soluções boas nem más. agora só há soluções péssimas. o país já foi ao fundo. a política portuguesa está transformada num conjunto de declarações hipócritas e carregada de promessas vãs. os deputados dão diariamente um espectáculo deplorável ao país com divergências e incompatibilidades que não conduzem a lado nenhum. o governo está morto só falta fazerem-lhe o funeral e é bom que isso aconteça rapidamente porque já não se aguenta o mau cheiro.

salve-se quem puder.

Abjecto

Pedro Correia, 25.06.23

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Diálogo ontem à noite, na CNN Portugal:

Jornalista - Aqui neste mesmo estúdio, quando começaram os problemas entre o ministério russo da Defesa e o grupo Wagner, perguntei-lhe se havia ou não dissonâncias entre estes dois. E respondeu-me que não: «Isso são fantasias.» Enganou-se nesta análise?

Major-general Agostinho Costa - Não. Uma coisa é o que parece. Outra coisa é o que é. (...) Temos de analisar e não nos iludirmos pelas aparências. Então temos um golpe de Estado e o cabecilha do golpe de Estado vai passar férias para a Bielorrússia? 

Jornalista - Mas também referiu que o grupo Wagner «é uma concepção de Gerassimov [comandante das forças armadas russas], é preciso ler a doutrina de guerra híbrida, e está a funcionar muito bem.» Está?

Major-general Agostinho Costa - Está.

Jornalista - Isto tem aparência de normal funcionamento?

Major-general Agostinho Costa - Reitero tudo quanto disse. Reitero tudo quanto disse. 

Jornalista - Também referiu aqui que «o grupo Wagner corresponde, na Rússia, às forças especiais norte-americanas, é mais ou menos a mesma coisa». Foi isso que referiu neste estúdio. Arrepende-se de comparar o grupo Wagner a exércitos regulares?

Major-general Agostinho Costa - De maneira nenhuma!

Jornalista - O Wagner não é uma força regular. 

Major-general Agostinho Costa - É uma força de assalto. É uma força especial de assalto. As forças de assalto têm várias missões. O Wagner, quando é enviado para o exterior, combate ao lado dos países para onde vai. Por isso é que tem tido este sucesso.

Jornalista - Há ou não, nestas últimas 24 horas, um dano reputacional para Vladimir Putin, bastante visível à própria opinião pública russa?

Major-general Agostinho Costa - Não o acompanho, não o acompanho. 

Ser ministro para deixar de o ser

Pedro Correia, 11.10.22

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Qual a vantagem de ser ministro das Finanças?

Em Portugal, só vejo uma: é a única forma de adquirir o estatuto de ex-ministro das Finanças, algo que parece conferir aos seus portadores uma aura exclusiva, misto de senador romano e de profeta hebreu. A toda a hora uma legião de ex-ministros perora em tudo quanto é palco mediático, com ar solene e pose grave, traçando implacáveis vaticínios. Sai um de barbas de oráculo, logo surge outro com cãs de erudito que por sua vez dá lugar a uma altiva dama com fumos de pitonisa. Todos com receitas mágicas para o futuro da nação - receitas que, por sinal, nenhum aplicou quando teve oportunidade efectiva para o efeito.

Gabo a paciência dos jornalistas que vão recolhendo as copiosas declarações desta prolixa tribo intuindo tal como eu que na maior parte dos casos a sabedoria real de tão ilustres sumidades é muito inferior ao generoso tempo de antena de que dispõem. E apenas lamento que não aproveitem ao menos uma vez para recordar aos indígenas o legado dessas sumidades - em (de)crescimento económico, despesa primária, dívida externa e défice real das contas públicas, por exemplo.

Depois era só comparar o que fizeram com o que propõem agora. Muita gente era capaz de ficar surpreendida. Ou talvez não.

Treinadores de bancada

Pedro Correia, 31.05.21

De treinadores de bancada, excelentes cérebros de ideias infalíveis para salvar a pátria, está este país tão cheio que se os exportássemos equilibraríamos por muitos e bons anos a nossa balança de pagamentos.

O problema é que tais sumidades, quando têm finalmente a possibilidade de pôr em prática o seu caudal de virtudes, muitas vezes se revelam monumentais fiascos.

Presente de Natal aos comentadores

jpt, 22.12.20

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Sim, por vezes sou arisco e respondão diante dos nossos comentadores, principalmente os conhecidos anónimos. Mas, até por este pequeníssimo incidente entre-comentadores no meu último postal, aqui deixo uma oferta natalícia ao habitual comentador Balio - sobre o qual há (justificadas?) suspeitas de ser um avatar de um outro (e anterior?) conhecido comentador institucional do DO. Com esta oferta, sita aqui mesmo na estante da secretária, quero simbolizar o amoroso espírito natalício que congrega bloguistas e comentadores, dos mais irritantes aos mais irritadiços, passando pelos plácidos.

Quanto a Balio, se não apreciar esta oferta ... olhe, vá à Worten trocá-la.

Da importância das lombadas

Pedro Correia, 14.04.20

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Vejo na Netflix uma série islandesa de que estou a gostar muito: Os Crimes de Valhalla. Numa cena do terceiro episódio, um investigador da polícia entra na casa deserta de uma mulher de classe média que foi assassinada. Uma das primeiras coisas que vê - e nós com ele - é uma estante cheia de livros ocupando quase por inteiro uma das paredes da sala. 

Para quem esteja atento, os cenários aparentemente irrelevantes nas séries de qualidade podem dizer-nos muito sobre as características de um país. Esta diz-nos, desde logo, que existem hábitos de leitura na Islândia muito superiores aos nossos. Em que série, filme ou telenovela veríamos "adereço" semelhante numa casa portuguesa de classe média? Façam o teste e verão. As estatísticas confirmam o que a experiência empírica nos sugere: mais de dois terços dos nossos compatriotas passa um ano inteiro sem ler um livro: 67%. Lideramos o triste pódio europeu nesta matéria, superando Grécia (54%) e Espanha (53%). Em proporção inversa ao que ocorre na Suécia (28%), Finlândia (35%) ou Reino Unido (37%).

 

Talvez para marcar o contraste com esta idiossincrasia nacional, por estes dias não faltam políticos, comentadores e simples bitaiteiros que persistem em prestar depoimentos televisivos recolhidos em casa, escolhendo lombadas de livros a servir-lhes de moldura. São tantos os casos que não pode tratar-se de mera coincidência: entre nós, o livro continua a servir de elemento acrescido de autoridade natural a quem produz opinião, o que não deixa de ser irónico numa sociedade onde a norma é não ler.

Não vou presumir sobre os genuínos hábitos de leitura das personalidades que, devido à pandemia, nos vão desvendando ínfimos recantos dos seus lares. Mas aproveito para deixar a sugestão aos meus amigos editores - Francisco José Viegas, Guilherme Valente, Hugo Xavier, Inês Pedrosa, Manuel S. Fonseca e Rui Couceiro, entre outros - para transformarem estas imagens que começam a tornar-se familiares entre nós numa vasta campanha publicitária de promoção da leitura. Com a chancela institucional do Ministério da Cultura e parte da choruda verba que não chegou a ser gasta no abortado TV Fest. Faz sentido, numa altura em que o sector vai de mal a pior: a venda de livros caiu 83%, com milhares de pessoas em lay-off ou sem trabalho.

Deixo aqui algumas sugestões de figuras que poderiam figurar nessa campanha de promoção do livro. Com certeza os visados aprovariam. 

 

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Vai fazer-nos muita falta

Pedro Correia, 22.02.20

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Vasco Pulido Valente era o melhor. Em quase tudo. Também na capacidade de inspirar epígonos que ia influenciando por geração espontânea e foram irrompendo como cogumelos - todos com menos talento que ele.
 
Era bom a pensar, a escrever, a polemizar.
Nunca lhe faltou a coragem para dar expressão pública ao pensamento. Nem vocação para escolher sempre as palavras mais adequadas à elegância formal que jamais cessou de procurar.
Sem atender a conivências nem a conveniências, criticou quase tudo e quase todos. Por vezes com um desassombro que alguns confundiam com arrogância ou cinismo. Por vezes com incoerências, naturais num percurso tão vasto, que se espraiou por seis décadas: era o comentador político português que exercia o ofício há mais tempo em permanência.
Vinha do pioneiro Almanaque, remontava ao antigo O Tempo e o Modo - publicações que hoje já quase ninguém sabe o que significaram na estreita sociedade portuguesa daquele tempo em que a censura estava inscrita no quotidiano mental das elites bem-pensantes.
Nem sempre fez os juízos certos sobre todas as figuras públicas que foi visando com a sua pena cáustica, pontualmente repassada de sarcasmo. Mas acertou na maior parte das vezes - em quase tudo quanto era essencial no catálogo de ideias que professava e foi sedimentando desde que estudou em Oxford, na primeira metade dos anos 70. A necessidade imperiosa de aproximar Portugal dos padrões de civilidade europeia, por exemplo.

Faltou-lhe escrever um romance. Ensaiou essa peça de ficção durante décadas, em versões diversas, mas era tão exigente com ele próprio que acabou por nunca publicar nenhuma.
Tentou uma aproximação ao género, com Glória, mas saiu-lhe afinal um ensaio histórico, aliás não destituído de brilhantismo. Com duas características essenciais: devolveu aos leitores o prazer do reencontro com a escrita narrativa, reaproximando a História da Literatura, e recuperou a biografia como peça fundamental da investigação histórica numa altura em que os cânones académicos menosprezavam o género.
No campo da historiografia, o título imbatível do seu legado foi o primeiro: O Poder e o Povo, que derrubou para sempre vários mitos beatíficos sobre a I República. Pena também esta investigação ter ficado incompleta, pois só abarca um período circunscrito deste ciclo histórico que antes dele era descrito com inúmeras omissões factuais.
 
Sentiu-se por duas vezes atraído pela política activa, nas décadas de 70 e 90, mas depressa concluiu que não era aquele o seu mundo e soube retirar-se muito a tempo. Também a comunicação radiofónica e televisiva estava longe de constituir o seu domínio de eleição, que era o da escrita.
 
Tinha este dom - e soube exercê-lo. Graças a ele, ensinou muitos de nós a reflectir, a ponderar, a argumentar, a desafiar os bonzos da opinião, a questionar os dogmas soprados no vento, a ripostar sem medo.
Por vezes à custa de si próprio, pois consumiu-se sem remissão na contingente espuma dos dias, que lhe roubava tempo e paciência para outros projectos, mais adequados ao seu engenho.
Eis o fardo insustentável de um comentador - mesmo o melhor de todos, como VPV. Não vejo hoje ninguém que possa equiparar-se a ele. Vai fazer-nos muita falta.

O "exclusivo" de Marcelo na SIC

Pedro Correia, 15.10.19

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Marcelo Rebelo de Sousa revelou à SIC uma das cachas políticas do ano: vai submeter-se a um cataterismo, para avaliar eventuais danos cardíacos e deste exame clínico dependerá uma decisão sua sobre a recandidatura à Presidência da República.

Acontece que a entrevista em que o Chefe do Estado fez esta e outras revelações não foi conduzida por um jornalista, munido do respectivo título profissional, mas pelo director-geral de entretenimento da estação outrora sediada em Carnaxide. O que constitui mais um significativo sinal da desvalorização do papel social dos jornalistas e da sua progressiva irrelevância no circuitos comunicacionais contemporâneos.

Que a SIC, onde trabalham dezenas de jornalistas qualificados e prestigiados, tenha prescindido deles para a obtenção desta informação em exclusivo e que o próprio Presidente da República elegesse como emissário desta novidade alguém ligado à área do entretenimento diz muito sobre a degradação de um ofício hoje invadido a todo o momento por gente que não se inibe de divulgar matéria supostamente noticiosa sem sujeitar o que supõe saber ao crivo do contraditório nem cumprir outras normas deontológicas que só vinculam os portadores da carteira profissional de jornalista.

 

Não passa praticamente um dia sem que, neste ou noutros canais, escutemos comentadores da política ou do desporto difundirem em antena "notícias exclusivas" que muitas vezes são meros rumores, à revelia das respectivas direcções de informação. O caso mais flagrante acontece na área do futebol - a tal ponto que me questiono se continuam a existir jornalistas habilitados a pronunciar-se na área do desporto em qualquer destes canais. Mesmo que a resposta seja afirmativa, o facto é que qualquer deles pouco mais servirá do que para estender um microfone, muitas vezes em "conferências de imprensa" onde não se escuta uma verdadeira pergunta digna desse nome.

Tudo isto deveria preocupar a estrutura dirigente dos jornalistas - se ela existisse. Acontece que esta é a única actividade abrangida por um código deontológico que não está organizada enquanto ordem profissional. Condenados à proletarização, sem condições mínimas para exercer o trabalho, desconsiderados pelas empresas onde prestam serviço e ultrapassados a todo o momento por qualquer "comentador residente" em estúdio, os jornalistas figuram hoje no posto mais baixo da cadeia informativa.

Problema exclusivo deles? Não: é um problema dos cidadãos que tantas vezes preferem ser "informados" pelo que "se vai dizendo" nas redes sociais e elegem as televisões que mais transformam notícias em "entretenimento".

Um problema do País, portanto.

His master's voice de Agosto

Pedro Correia, 19.08.19

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«A greve [dos motoristas de veículos pesados e de materiais perigosos] é completamente injusta. (...) Não faz sentido.»

«O que é que as pessoas que estão a passar férias no Algarve têm a ver com esta greve? Absolutamente nada.»

«A requisição civil é perfeitamente justificada.»

«O Governo está a fazer aquilo que qualquer Governo deveria fazer.»

«Esta é uma situação em que qualquer Governo teria muita dificuldade em lidar de outra maneira que não seja esta.»

«Houve, deliberadamente, da parte dos sindicatos e dos trabalhadores, uma "greve de zelo" aos serviços [mínimos] que estavam a prestar.»

«Os sindicatos vieram dizer que não se devem utilizar as forças armadas. Então qual é a solução para tentar resolver isto?»

«O que está em causa não justifica a greve que está a colocar o País nesta situação.»

 

Nicolau Santos, presidente do Conselho de Administração da Lusa por nomeação governamental e "comentador político", aludindo à greve dos camionistas

SIC Notícias, 13 de Agosto