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No Correio de Minho (o órgão de comunicação social oficial de Mesquita Machado e do partido socialista mais isento e pluralista de Braga) na edição online (notícia de 27 de Setembro):
Realizou-se ontem, em Braga, a Noite Branca. Dezenas de milhares de pessoas nas ruas do centro. Boa onda. Animação. Espectáculos, música. Tanta gente a dançar e muita mais a assistir. Mesquita Machado na esplanada da Taberna do Migaitas, mesmo ali ao pé da Sé Catedral. Mesquita não é mais velho no exercício do cargo autárquico do que a própria Sé mas pouco faltou. Charuto na mão, sorriso aberto sobre a barbicha de chibo, cabelo bem oleado e brilhantinoso. A imagem do dever comprido (é comprido mesmo). Enquanto passo mesmo ao lado, chega uma grande travessa à sua mesa e os olhos abrem-se-lhe muito de pura gosma. Nada de novo. Vai alambuzar-se tal como fez nos últimos trinta e tal anos. Seguimos viagem. Para as 23 está marcado o concerto da Mariza. A Praça do Município está cheia muito tempo antes do início. Nos écrans gigantes passam mensagens publicitárias da empresa dos cunhados de Vítor Sousa, o substituto que Mesquita Machado indigitou como candidato autárquico para que tudo possa continuar na mesma. O próprio Vítor Sousa aparece numa mensagem gravada. Impossível ouvir o que diz. A praça rebenta em assobios e gritos de chulo e ladrão. Toda a gente sabe que a realização desta Noite Branca a semanas das eleições autárquicas não é mais do que uma feliz coincidência. Mas as pessoas não são parvas (uma parte delas não é, pelo menos) e este tipo de aproveitamento descarado é ofensivo. Diz-se que Mesquita e a sua alcateia ganharam muito ao longo de todos estes anos, diz-se até que muito mais do que deviam. É certo que ganharam várias eleições. Mas é evidente também que ainda não ganharam vergonha.
O Moinho de Pão fica mesmo ao lado de um dos Tribunais de Braga. O seu ciclo de vida diário está alinhado pela agenda de magistrados e funcionários judiciais. Tipicamente, as mesas enchem-se até às 9h00, para um pequeno-almoço retemperador, sempre necessário depois do sono. Esse que, tratando-se de quem se trata, só poderá ter sido o dos justos. Depois, algures entre as dez e picos e as onze e tal, a sala volta a estar completa. Os mesmos que tomaram o pequeno-almoço, saboreiam um cafezinho e, quem sabe, uma nata dessas que o forno há dias colocado junto ao balcão mantém sempre quentes. Um consolo para o estômago, depois de consumados os adiamentos da praxe ou, dando-se o caso de um assomo anormal de produtividade, de terem sido forçados no remanso do gabinete alguns acordos que, se não compõem adequadamente os interesses das partes, sempre tornam menos negras as estatísticas da Justiça. O café repete-se depois do almoço e os que resistiram à nata matinal, consumidos pelo sentimento de culpa, acabam por ceder à tentação. O dia não acaba sem nova visita, esta à razão de chá e torradas, depois dos adiamentos e dos acordos vespertinos, num movimento de eterno retorno que se inicia com a abertura do ano judicial, este sinalizado por hossanas à Justiça, e que nunca mais acaba. Se tivesse por hábito fazer um registo das principais ocorrências do dia, hoje, o gerente do Moinho, que já foi o Jorge e agora será outro, anotaria um pouco mais de burburinho nas mesas dos magistrados e um prolongamento de cada visita para, aproximadamente, três quartos de hora. Sendo certo que, em dias normais, a duração média andará por escassos trinta e tal minutos. Quanto às mesas dos funcionários judiciais nada de muito novo teria para registar, a não ser uns sorrisinhos sacanas mal dissimulados pelo bigode do Mendes do 3º Juízo e pela barba do Lopes da 2ª Vara. Entretanto, amanhã, todas as rotinas serão retomadas. E nestas mesmas mesas se sentarão, no dia seguinte, alguns dos que ontem copiaram. É por essas e por outras que nunca tratei o Moinho de Pão pelo nome. Para mim, chamava-se CEJ, a abreviatura que encontrei para designar o Café onde é possível fazer Estudos profundos sobre a situação nos meios Judiciários. A partir de hoje, passei a chamar-lhe Nota Dez.
Longe vão os tempos em que o poder socialista, no país ou nas autarquias, era conotado (shame on you, gentinha mal intencionada) com o despesismo na gestão (imagine-se!) e com o favorecimento de grupos (incrível, não é?). Pois bem, se os governos de Sócrates acabaram definitivamente com esse mito, pela marca de transparência e competência que imprimiram na gestão do país (uma marca difícil de apagar como são difíceis de tirar as nódoas da fruta), ao nível autárquico alguém se destaca na aplicação de um novo modelo de socialismo científico. Falo de Mesquita Machado, o Presidente da Câmara de Braga. E digo que o modelo é novo porque MM só está no poder há trinta e tal anos e que é científico porque bate certo (e com força). Sempre pronto a aliar a protecção dos mais carenciados com a indispensável iniciativa privada, o executivo camarário bracarense autorizou a situação que faz capa no JN. O leitor mais desconfiado poderá questionar o facto de a dita rua dar acesso a uma praça em que está situado um bar que é explorado pelo filho de MM. E de a receita do bilhete de entrada na rua reverter a favor desse bar. Mas, aqui, caro leitor, tenho que adverti-lo com frontalidade. Este tipo de socialismo é inclusivo. E não podia excluir o espírito empreendedor do filho do autarca, pois não, caro leitor?