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Delito de Opinião

Azeite muito gorduroso

Sérgio de Almeida Correia, 16.01.16

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Se eu fosse ministro das Finanças teria tido vergonha de receber uma carta de uma comissária europeia a recriminar-me em 2014, ter saído no final de 2015 sem nada ter feito para resolver a situação e ainda ser acusado por uma ex-ministra das Finanças do meu partido de varrer para debaixo do tapete e colocar o prestígio pessoal acima do interesse nacional. Se tivesse sido primeiro-ministro teria tido vergonha de dizer que me estava a lixar para as eleições e depois deixar um problema que eu sabia que tinha urgência em ser resolvido arrastar-se para não prejudicar o resultado eleitoral, sabendo que iria prejudicar o país e os contribuintes mais do que aquilo que seria exigível se o assunto ficasse para outros resolverem ao soar do gongo. Se fosse Presidente da República teria alertado para a situação descrita e não me teria empenhado numa solução de governo conivente com o arrastamento da situação. Se agora fosse oposição procuraria falar de tudo menos do que não fiz durante um anos e devia ter feito para não serem os socialistas a solucionarem e depois virem dizer que foram eles a resolver apesar dos custos financeiros acrescidos. E, finalmente, se agora fosse governo procuraria resolver tudo o que ficou pendente, sem fazer mais ondas, limpava o galheteiro para o azeite não continuar a escorrer e a sujar a toalha, com pouco falatório e evitando mais acusações, mas deixando tudo devidamente documentado e discriminado na factura que há-de ser remetida aos portugueses. De preferência num papel limpo e sem mais manchas de gordura.

Como não sou nada disso tenho que me limitar a ler e a tirar as minhas conclusões.

Regresso à normalidade

José António Abreu, 30.12.15

Lentamente, os contornos do caso Banif vão ficando mais claros. O processo foi fechado antes de 1 de Janeiro de 2016, evitando as novas regras europeias para a resolução bancária, que forçam uma contribuição dos maiores depositantes e dos detentores de dívida sénior. Ao contrário do que sucedeu no Novo Banco, a venda do «banco bom» foi restringida a entidades com licença bancária, o que permitiu um excelente negócio ao Santander - e um péssimo negócio para os contribuintes. Para grande satisfação dos principais bancos, o Fundo de Resolução foi não apenas poupado a contributos desagradáveis (o que forçou o ministro das Finanças a declarações de veracidade questionável) mas capitalizado - ambas as coisas, mais uma vez, à custa dos contribuintes. Com a ajuda de uma comunicação social acéfala ou alinhada (não sei o que será pior), o ónus de toda a situação foi empurrado para o governo PSD-CDS.

Resta admitir mérito a quem o merece. A operação foi excelentemente montada e perfeitamente executada. Até já se percebe o apoio de Fernando Ulrich (quase sempre alinhado com o PSD) à formação de um governo liderado por António Costa: enquanto o PS é de confiança, a versão do PSD liderada por Passos Coelho e Maria Luís Albuquerque demonstrara não saber respeitar os costumes e as hierarquias da República.

Factos

Sérgio de Almeida Correia, 23.12.15

1. O orçamento rectificativo foi aprovado no Parlamento com os votos contra do BE, do PCP, dos Verdes, do PAN e do CDS-PP;

2. O PSD absteve-se logo na primeira votação em que o Governo não podia contar com os votos da esquerda radical;

3. A abstenção do PSD acontece depois de Passos Coelho ter afirmado que “admito que não teria uma solução muito diferente desta que foi adoptada, na medida em que não foi possível identificar ao longo destes anos um comprador para o Banif”;

4. A abstenção do PSD pode, no entanto, ser entendida como um sinal de coerência relativamente aos últimos anos quanto à capacidade de decisão e à responsabilidade do partido para resolver o problema do BANIF;  

5. Na primeira oportunidade que surgiu o CDS-PP voltou a aliar-se à esquerda radical que antes tanto criticou e à qual, repetidas vezes, acusou de falta de sentido de Estado;

6. O CDS-PP não tem nada a ver com o que aconteceu nos últimos três anos em relação ao BANIF porque o seu supervisor foi para o Parlamento Europeu;

7. O CDS-PP esclareceu que votou contra porque tem "dúvidas legítimas e fundadas em primeiro lugar sobre se esta é a única solução possível", desconhecendo-se quais as soluções que em três anos o partido propôs para o Banif, nem qual a solução que neste momento proporia;

8. Os registos dizem que CDS-PP integrou com o PSD o XIX Governo Constitucional que permitiu a nacionalização do BANIF através de uma injecção de dinheiro público de 1100 milhões de euros, mas neste momento há dúvidas no Largo do Caldas sobre se o partido chegou a fazer parte de algum governo de coligação com o PSD; 

9. Em momentos críticos do regime os amantes do "bloco central" ainda são capazes de se entenderem e de trocarem algumas carícias;

10. A cronometragem dos tempos das intervenções parlamentares deve ser concessionada a uma entidade independente e manter-se visível e acessível ao público e a todos os senhores deputados enquanto durarem os debates, única forma de se evitarem mais figuras tristes até ao final da legislatura.

O que importa saber

Sérgio de Almeida Correia, 23.12.15

Que a ex-ministra e o Banco de Portugal troquem acusações mútuas sobre a respectiva responsabilidade é o normal. E fazer uma auditoria "independente" em Portugal, mesmo externa, não deve ser fácil, porque haverá sempre alguém a tentar ocultar, dissimular, a proteger-se (e aos seus), a sacudir a água do capote e a apontar o dedo ao vizinho. Por isso creio que com ou sem auditoria o mais importante é saber para onde foi o dinheiro que foi enterrado no Banif. E para isto, como sabemos quando é que o Estado lá meteu a massa, só será preciso apurar (1) a quem foram concedidos os créditos, (2) as contas para onde foram e de onde sumiram, (3) por quem foram autorizados e (4) quando foram concedidos. O resto apurar-se-á por si, incluindo o que for mentira.

 

 

Oposição a sério, precisa-se.

Luís Menezes Leitão, 23.12.15

Aquando do verdadeiro golpe que constituiu a criação deste governo, Passos Coelho garantiu que o líder do PS não poderia esperar o apoio do PSD e CDS no futuro. E assegurou que António Costa deveria demitir-se se alguma vez precisasse dos votos do PSD. Palavra dada tem que ser palavra honrada. É por isso que, se o PCP, que apoiou a formação deste governo, não viabiliza o orçamento rectificativo, muito menos o PSD ou o CDS o podem viabilizar. Se, como tudo indica, o PSD viabilizar o orçamento rectificativo, acho que deve ser Passos Coelho a demitir-se da liderança. O país precisa de uma oposição a sério a este governo e não de partidos amorfos, que vêem o seu próprio governo ser derrubado e vêm logo a seguir oferecer a outra face, apoiando quem os derrubou. E não me venham com a treta do interesse nacional. O interesse nacional é precisamente que não sejam gastos os 3.000 milhões que se quer meter no BANIF, agravando o défice e a dívida. O voto do PSD a favor deste orçamento só demonstrará uma coisa: que António Costa tem todas as condições para ser primeiro-ministro. Pedro Passos Coelho é que não tem manifestamente condições para continuar a liderar a oposição.

O meu BdP

Helena Sacadura Cabral, 22.12.15

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Cresci como economista no Banco de Portugal e o que hoje sei devo-o muito àquela instituição onde servi - e gosto de utilizar esta expressão - durante mais de 18 anos. Trabalhei com vários governadores, de Jacinto Nunes a Silva Lopes, destacando apenas estes porque foram aqueles que mais me marcaram. 

Tenho um enorme orgulho de por lá ter passado, num tempo difícil e com a primeira intervenção da troika. Felizmente já não estava na casa à época de Vítor Constâncio, que apenas conheci como colega.

Entristece-me ver o que se está agora a passar com o actual governador que apenas conheci num contacto informal, resultante de um pedido que lhe fiz para ser recebida. Fiquei, confesso, com óptima impressão sua, apesar de saber que o problema que lhe pus não iria ocupar a sua atenção. Mas eu cumpri com o que entendia devia fazer e ele fez o mesmo recebendo-me.
O Banco de Portugal foi uma instituição que deu ao país, talvez, dos melhores economistas que tivemos. Hoje parece ter um enquadramento diferente daquele que tinha no meu tempo.
Mas se quisermos perceber, de facto, o que se passou na Banca desde o caso BPN, então teremos que ouvir mais do que Carlos Costa. Teremos que ouvir também Constâncio porque os problemas, a meu ver, começaram ainda no seu tempo e ninguém melhor do que ele para os esclarecer. 
Uma instituição não se degrada apenas pela política de um governador. Degrada-se por muitas outras razões mais. E uma Comissão de Inquérito sobre o Banif terá todo o interesse em conhecer como é que tudo começou. E estar atenta à CGD e à sua evolução, porque também ela poderá explicar alguns pontos desta brisa que varreu a banca nacional. 
A Comissão de Inquérito se quiser levar por diante um trabalho exemplar tem que andar para trás e explicar aos cidadãos contribuintes o que encontrou, o que se fez no passado e as razões que levaram o governo a entender como melhor solução salvar os depositantes, mas sobrecarregar aqueles que pagam impostos.

 

Quiosque do dia

Pedro Correia, 22.12.15

O regresso do arco da governação.

Luís Menezes Leitão, 22.12.15

Nos últimos tempos houve muitas vozes que se congratularam com o fim do arco da governação, tendo até António Costa proclamado que tinha derrubado o muro de Berlim quando chamou o BE e o PCP a apoiar o seu governo. É, no entanto, evidente que o coração do PS, com o seu europeísmo militante, balança muito mais no sentido do PSD e do CDS do que no sentido das posições do PCP e do BE. Por isso, o mais provável é que o PCP e o BE acabem nesta história a fazer a figura de maridos enganados, apoiando entusiasticamente o governo PS, para ele depois cair nos braços do PSD e do CDS.

 

Este caso do BANIF é a prova provada dessa situação. António Costa tomou a decisão que o establishment europeu pretendia e Cavaco Silva já tinha pedido, quando lhe exigiu que "assegurasse a estabilidade do sistema financeiro". É uma decisão da qual eu pessoalmente discordo, mas que é típica dos partidos do arco da governação, que empenham sempre todo o dinheiro que o país não tem, numa vã tentativa de salvar bancos falidos. Nesta lógica, nem sequer se percebe para que é que se instituiu um Fundo de Garantia dos Depósitos, já que nunca será accionado, uma vez que o Estado é generoso e está sempre disponível para salvar os bancos.

 

Não admira por isso que Passos Coelho tenha vindo a correr apoiar a decisão de António Costa. Já Jerónimo de Sousa correctamente recusou-se a passar essa factura para os contribuintes, anunciando o voto contra no OE rectificativo. Já o Bloco de Esquerda condicionou o seu voto favorável a novas exigências, que Costa terá que cumprir. É, por isso, óbvio que o Orçamento Rectificativo vai ser aprovado é com os votos da direita, colocando António Costa na posição de Alexis Tsipras, com os apoiantes do governo a votar contra as suas medidas, que só são aprovadas pela oposição. Nessas condições, prevêem-se eleições a curto prazo.

 

Em qualquer caso, parafraseando Mark Twain, é manifesto que a anunciada morte do arco da governação foi um exagero. O arco da governação está bem vivo e recomenda-se.

Like a Boss

Rui Rocha, 21.12.15

Hoje ainda não eram 8.30 e já estava na agéncia do BANIF aqui perto de casa. Custa um bocadinho levantar assim cedo, mas nestas coisas o exemplo deve vir de cima. Entrei, escolhi o maior gabinete, sentei-me, pus os pés em cima da secretária e pedi à colaboradora da caixa que me trouxesse um cafezinho. Deviam ter visto a cara dela. Que não sei quê, que chamava a polícia, que me pusesse dali para fora! Mas pronto. Temos de compreender a situação. Foi tudo tão rápido que é natural que o pessoal ainda não conheça o novo patrão.

A força de acreditar.

Luís Menezes Leitão, 21.12.15

 

Eu sempre tive a certeza de que o governo e o Banco de Portugal iriam resolver com sabedoria e eficácia a questão do BANIF. Como se viu, só vai ser preciso os contribuintes gastarem € 2.255 milhões de euros para que outro banco possa comprar por € 150 milhões um banco que tem € 12 788 milhões de activos (cerca de 7% do PIB) e € 6 271 milhões de depósitos, para além de um passivo que não deve ter grande relevo. Feliz o comprador que fez este negócio. Felizes os trabalhadores e depositantes, que vão poder continuar a trabalhar no balcão onde sempre estiveram. Felizes os credores, que vêem fugir os activos do seu devedor na resolução, mas ganham a seu benefício a maior credibilidade do sistema financeiro. E felizes os contribuintes, que podem continuar a pagar os seus impostos com alegria, sabendo-se que eles se destinam a ser gastos numa operação altamente meritória, como o é a resolução bancária. Gosto imenso de uma história com final feliz. A natureza ensina-nos a acreditar. E eu acredito, como sempre acreditei.