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Delito de Opinião

O suplente

Pedro Correia, 11.11.23

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O facto de António Costa ter sugerido o nome de Mário Centeno - com o consentimento do próprio, presume-se - para rumar do Banco de Portugal (BdP) à chefia do Governo, como assumido suplente dele, diz tudo sobre a independência do ex-titular da pasta das Finanças.

Haver um ministro disposto a transitar sem etapa intermédia do posto governativo para o comando da entidade que regula e supervisiona o nosso sistema financeiro, como aconteceu com Centeno, já era mau. Que a mesma figura estivesse agora disposta a fazer a rota inversa, regressando por uns quantos meses ao Executivo como substituto ocasional de Costa, pior ainda.

Centeno devia desmentir com vigor as mais recentes notícias em torno do seu nome ou afastar-se do Banco de Portugal. Para não ferir ainda mais esta instituição na sua idoneidade. Mas nem vale a pena alimentar tal ilusão. A famosa "ética republicana" anda ausente em parte incerta. O governador do BdP vai continuar a fingir que é isento. E alguns de nós vamos continuar a fingir que acreditamos nisso.

O governador insensato

Sérgio de Almeida Correia, 18.11.22

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Por mais que tente não consigo perceber as razões para que um indivíduo como Carlos Costa, um burocrata competente, sem que isto queira dizer que cumpriu sempre bem o seu papel, e que para todos os efeitos serviu o país, em pleno período de reforma, em vez de aproveitar o tempo para estar com a família e os amigos, gozar os rendimentos, passear, ler bons livros, ver melhor teatro e cinema, visitar museus, instruir-se, resolva fazer um livro a meias para, pretensamente, apresentar as suas memórias.

Depois de tudo o que aconteceu, das suas exibições no parlamento, do que disse ao que fez e ao que não fez e devia ter feito, o bom senso recomendaria que procurasse ser o mais discreto possível, antes que a borrasca chegasse e os vidros começassem a estalar. 

Podem chamar-lhe um livro de memórias, autobiografia, ou outra coisa qualquer. Para o caso é absolutamente indiferente. Porque na verdade não se trata de nenhum livro de memórias. E é pena. Com o que terá visto e aprendido ao longo da vida, com a sua experiência e pelos lugares por onde andou, o senhor governador podia, e devia, ter apresentado algo muito melhor. Ou ter ficado quieto, que teria sido o mais recomendável, a ver se os portugueses se esqueciam dele e eram poupados ao que apresentou.

Trata-se, efectivamente, de uma tentativa de composição e aperfeiçoamento da sua imagem e de um claro ajuste de contas para a posteridade. Pena que não lhe tivesse saído bem. Não é, pois, um livro de memórias. Que ninguém vá ao engano.

A minha opinião vale o que vale, mas a gravidade e a desfaçatez do que ali se registou é de pasmar.

No capítulo 5 (A passagem pela Caixa e o regresso à Europa), a propósito do seu tempo na Caixa Geral de Depósitos, que continua a ser uma referência do que não devia ser, a dada altura escreve-se o seguinte:

"Macau foi outra conversa. A CGD detinha o Banco Nacional Ultramarino (BNU) que, por via do acordo de regresso do território de Macau à soberania chinesa, se mantinha como um banco emissor de moeda — um fator de grande importância nas relações de Portugal com a China desde 1901. Sendo Carlos Costa o presidente do Conselho de Administração do BNU, era a sua assinatura que aparecia nas notas da pataca macaense. Costa vai dar grande importância a Macau, por ver aí uma possibilidade de explorar o importantíssimo mercado chinês devido ao prestígio do BNU na comunidade macaense. Por seu impulso, a CGD abre um escritório de representação na praça financeira de Xangai. Queria ir mais longe, mas recebeu um conselho para não o fazer.

«Recordo-me de que na altura um importante empresário, cliente do BNU Macau, que fazia parte do Comité Permanente do Politburo do Partido Comunista Chinês [76] e da Assembleia Popular Nacional da China[77]), me disse: “Tenho uma grande dívida de gratidão para com o BNU/CGD que acreditou e financiou a minha família em tempos muito difíceis e considero desejável a expansão da presença do BNU na China. Mas ainda não estão criadas as condições para a CGD ir para Pequim porque a capital sofre de vários problemas: corrupção, especulação imobiliária, penetração nos meios suburbanos do narcotráfico alimentado por redes oriundas de um país vizinho e problemas ambientais, a que acresce um sistema jurídico pouco seguro.” Depois de cuidada ponderação das informações recolhidas, optou-se por uma entrada gradual e foi solicitada autorização para a abertura de um escritório de representação em Xangai, que foi inaugurado em 2006. [78]»

Carlos Costa nunca o confirmou, mas o empresário em questão será o atual chefe do Governo de Macau, Ho Iat-seng (também conhecido como Ho Teng-iat), que na altura era o CEO do grupo industrial Ho Tin. Posteriormente, problemas diagnosticados por aquele importante dirigente chinês, nomeadamente a corrupção e o crescente tráfico de droga nas grandes cidades, começaram a ser duramente combatidos pela liderança do presidente Xi Jinping.»"

Depois, nas notas finais do capítulo, escreveu-se o seguinte:

"76 O Partido Comunista Chinês tem três órgãos centrais de decisão que podem ser hierarquizados da seguinte forma: o Comité Permanente do Politburo Central (7 membros), o Politburo (25 membros) e o Comité Central (376). O Comité Permanente é o órgão mais poderoso do Partido Comunista Chinês.

77 Também conhecido por Congresso Nacional do Povo. É a sede do poder legislativo da República Popular da China e os seus membros são designados pelo Partido Comunista Chinês.

78 Entrevista a Carlos Costa, 22 de julho de 2020."

Quando li esta passagem e as notas citadas fiquei logo elucidado sobre o grau de rigor do livro. Numa obra com a importância que lhe foi atribuída pelo autor, pela comunicação social e por antigos governantes, fiquei pasmado com a falta de rigor e a dimensão das asneiras. Não admira que a sua gestão no Banco de Portugal tivesse, e continue a dar, o brado que deu. Se o rigor do livro foi o mesmo que utilizou na gestão do Banco de Portugal ficamos todos esclarecidos.

Acontece, que eu saiba, que nenhum empresário de Macau, até hoje, fez parte do Comité Permanente do Politburo do Partido Comunista Chinês, que é só o órgão mais importante do Partido e do próprio Estado chinês atenta a submissão deste e da própria Constituição chinesa ao PCC. Em 2005, na sequência do 16.º Congresso do PCC, era composto por nove membros (Hu Jintao, Wu Bangguo, Wen Jiabao, Jia Qinglin, Zeng Qinghong, Huang Ju, que faleceu no decurso do mandato, em 2007, Wu Guanzheng, Li Changchun e Luo Gan), e nenhum deles se chamava Ho Iat Seng ou era de Macau.

O actual Chefe do Executivo nunca teve estatuto para fazer parte desse órgão. E se lá estivesse estado e depois se tornasse Chefe do Executivo de Macau, isso corresponderia a uma grande despromoção. Ninguém esclareceu o dr. Carlos Costa e o autor do livro sobre estes detalhes

Também não passaria pela cabeça de ninguém, embora tivesse passado pela do "biografado" e pela do autor do livro, que um membro do Comité Permanente do Politburo do PCC andasse "à conversa" com Carlos Costa, sabe-se lá em que língua e em que circunstâncias (no Clube Militar, entre croquetes?; numa sauna?), dando-lhe conselhos sobre quando e onde abrir sucursais, filiais ou eventualmente escritórios de representação do BNU na China.    

Ainda menos que esse membro da Comissão Permanente do Politburo do PCC lhe confidenciasse que o BNU não devia abrir nenhum escritório em Pequim porque "a capital sofre de vários problemas: corrupção, especulação imobiliária, penetração nos meios suburbanos do narcotráfico alimentado por redes oriundas de um país vizinho e problemas ambientais, a que acresce um sistema jurídico pouco seguro."

É claro que, logo a seguir, em 2006, o BNU foi abrir um escritório em Xangai, onde não havia corrupção, nem especulação imobiliária, nem narcotráfico, e, presume-se, o sistema jurídico seria muito mais seguro do que em Pequim.

Há mais coisas, embora não seja aconselhável continuar. O tempo de quem lê é precioso e é preciso respeitar quem vem a este blogue dar-se ao trabalho de me ler.

Em todo o caso, por aquela parte já se percebe que o grau de pesporrência, delírio e ignorância do senhor governador sobre algumas matérias está ao nível de um antigo primeiro-ministro a quem ele também se refere, e a falta de conhecimento do autor do livro sobre o PCC, sobre o qual se permitiu escrever, "esclarecer" e publicar, dizem tudo sobre a qualidade da "obra" que o dr. Marques Mendes (uma sumidade com elevado grau de coerência nas suas análises ao longo dos anos) apresentou, tecendo os maiores encómios, e a cujo lançamento antigos primeiros-ministros e um ex-Presidente da República se deram ao trabalho de assistir. 

Não sei o que o Governo de Macau e a RPC irão dizer sobre as revelações do senhor governador em relação a um governante estrangeiro em funções. Ou o que pensarão o MNE e o embaixador de Portugal na RPC sobre isto. Nada disso é da minha conta, embora me pareça bem que todos leiam as "memórias" do senhor governador. Não acreditem é em tudo o que lerem.

Quanto ao mais, toda aquela gente que é visada que se queixe da sua falta de senso. Que tristeza. Pobre país.

[Dizem-me que foram dois, não apenas um ex-PR que lá esteve. Ainda pior.]  

Não há coincidências

João Sousa, 25.06.20

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No dia em que o país andou a discutir o folhetim do treinador do Benfica, em que os jornais descreveram detalhadamente o esboroar do PAN e em que António Costa veio às televisões anunciar com voz grossa o reaperto de confinamentos - o governo, por entre os pingos da chuva, aproveitou para formalizar num sussurro a nomeação de Centeno para o Banco de Portugal.

As amnésias de Constâncio

João Pedro Pimenta, 01.04.19

Só hoje vi melhor as figuras de Vítor Constâncio nas suas respostas à comissão parlamentar sobre as suas responsabilidades nos dez anos em que exerceu o cargo de presidente do Banco de Portugal. Constâncio não tem qualquer memória da sua actividade de dez anos naquela cadeira e nem tem memória dos avisos que recebeu e das pessoas com quem falou de assuntos delicados. A mesma atitude de "não me lembro de nada" e "não tenho ideia" que já tínhamos visto a Zeinal Bava e Ricardo Salgado, e já agora, ao ainda titular Carlos Costa. A conclusão a que chego é que aquelas salas têm uma propensão para a amnésia. É melhor fazerem as audições noutro lado.

É bom recordar que Constâncio, tido como "genial" e "brilhante" (se vivesse 100 anos antes seria a inspiração directa para o "talentoso Pacheco", de A Correspondência de Fradique Mendes, de Eça), era líder do PS em 1987. Cavaco Silva ganhou as legislativas desse ano com 50% dos votos. O PS, liderado pela ex-Presidente do BdP, teve 22%, e a CDU de Álvaro Cunhal, já sem o MDP-CDE, ligeiramente mais de 12%. Ramalho Eanes e Adriano Moreira, respectivamente à frente do PRD e do CDS, e hoje tidos como referências morais da política portuguesa, não chegaram em conjunto aos 10%. Antes de estarmos sempre a verberar os políticos, que não caem do céu nem surgem por magia, podíamos antes questionar as escolhas dos eleitores portugueses.

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Costa vs. Costa

José António Abreu, 19.02.16

A recusa do governo de Passos Coelho em salvar o BES foi o ataque mais forte das últimas décadas ao status quo político-financeiro-empresarial - i.e., à oligarquia que se habituou a dominar o país. Hoje, Costa (António) ataca Costa (Carlos) não porque este tenha cometido erros mas porque a sua acção (e, por conseguinte, os seus eventuais erros) não decorre dos interesses dos socialistas e/ou dos amigos dos socialistas. Mais: não decorre sequer dos interesses do governo (deste ou do anterior). É aliás sintomático que os socialistas teimem numa solução para os «lesados» do BES sem avançarem com uma proposta clara e, mais importante, sem explicarem (de preferência evitando a necessidade de uma série infinita de erratas) quanto poderia ela custar aos contribuintes. Para Costa (António), interessa acima de tudo docilizar o Banco de Portugal e surgir como o fautor de uma «solução» conciliatória que esconda dos eleitores o preço dessa conciliação. Estabelecer um precedente, numa situação de fragilidade do sistema bancário, não o preocupa. Costa (António) trabalha no presente, manobrando instante a instante.

Depois há ainda outro motivo. Costa (António) tem procurado espicaçar Passos Coelho, alternando acusações com propostas de concertação. Passos, ciente de que não deve ajudar os socialistas numa área em que são peritos incontestados (inventar desculpas e eximir responsabilidades), tem mantido a pose de estadista. Isto não interessa ao governo, urgentemente necessitado de um adversário. Costa (Carlos) encaixa no papel. E, se a situação for bem manobrada, até poderá permitir expulsar Passos Coelho da toca, de modo a ser desgastado antes de começarem a sair os primeiros números da execução orçamental.

O meu BdP

Helena Sacadura Cabral, 22.12.15

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Cresci como economista no Banco de Portugal e o que hoje sei devo-o muito àquela instituição onde servi - e gosto de utilizar esta expressão - durante mais de 18 anos. Trabalhei com vários governadores, de Jacinto Nunes a Silva Lopes, destacando apenas estes porque foram aqueles que mais me marcaram. 

Tenho um enorme orgulho de por lá ter passado, num tempo difícil e com a primeira intervenção da troika. Felizmente já não estava na casa à época de Vítor Constâncio, que apenas conheci como colega.

Entristece-me ver o que se está agora a passar com o actual governador que apenas conheci num contacto informal, resultante de um pedido que lhe fiz para ser recebida. Fiquei, confesso, com óptima impressão sua, apesar de saber que o problema que lhe pus não iria ocupar a sua atenção. Mas eu cumpri com o que entendia devia fazer e ele fez o mesmo recebendo-me.
O Banco de Portugal foi uma instituição que deu ao país, talvez, dos melhores economistas que tivemos. Hoje parece ter um enquadramento diferente daquele que tinha no meu tempo.
Mas se quisermos perceber, de facto, o que se passou na Banca desde o caso BPN, então teremos que ouvir mais do que Carlos Costa. Teremos que ouvir também Constâncio porque os problemas, a meu ver, começaram ainda no seu tempo e ninguém melhor do que ele para os esclarecer. 
Uma instituição não se degrada apenas pela política de um governador. Degrada-se por muitas outras razões mais. E uma Comissão de Inquérito sobre o Banif terá todo o interesse em conhecer como é que tudo começou. E estar atenta à CGD e à sua evolução, porque também ela poderá explicar alguns pontos desta brisa que varreu a banca nacional. 
A Comissão de Inquérito se quiser levar por diante um trabalho exemplar tem que andar para trás e explicar aos cidadãos contribuintes o que encontrou, o que se fez no passado e as razões que levaram o governo a entender como melhor solução salvar os depositantes, mas sobrecarregar aqueles que pagam impostos.

 

Deve ser tempo de dizer basta

Sérgio de Almeida Correia, 26.03.15

A culpa é de Carlos Costa. Também pode ter sido de Vítor Bento. Ou do Banco Central Europeu. Talvez dos bombeiros...; minha é que não foi. Ponto. Fui eu quem esteve à cabeceira da equipa do INEM. A controlar o soro e o cartão de ponto.

Enfim, depois de tudo o que aconteceu no BPN/SLN e na respectiva Comissão de Inquérito, e das criticas que aí foram feitas à supervisão do Banco de Portugal (em 2008, no auge do "socratismo", eu chamei-lhe "supervisão congolesa"), em especial por Nuno Melo (CDS/PP) e João Semedo (BE), não houve hipótese de modificar nada.

Estamos em 2015 e vê-se que durante sete anos, sete anos, porra, não foi um nem dois, ficou tudo na mesma. Os vícios são os mesmo de sempre. As explicações idem. O padrão é sempre o mesmo

E depois vem a gente que há décadas vegeta e mantém esta choldra em ponto-morto dizer que eu tenho asco. Tenho sim, tenho asco, muito asco. Tenho asco a quem politicamente é estruturalmente indecente. A gente politicamente desonesta. A gente que se alimenta do padrão para sobreviver e singrar. A gente que é ética e moralmente desestruturada (na minha perspectiva, é claro). À direita, à esquerda, em cima e em baixo.

(Quando me cansar de escrevê-lo, de dizê-lo, limitar-me-ei a articular com os maxilares doridos os movimentos que produziriam essas palavras. Como Marceau faria com o movimento, com o gesto. Ou como Herberto com as palavras. Em silêncio e às escuras para não incomodar os ouvidos e os olhos sensíveis da canalha)

Uma pequena frase

Sérgio de Almeida Correia, 11.12.14

carlos-costa-c180mch-c8a4.jpg(Hugo Correia, Reuters)

 

A Comissão de Inquérito ao caso BES ainda agora começou a funcionar, mas pela passadeira de inocuidades e vaidades que por estes dias desfila em S. Bento, há pequenas notas que vão sendo respigadas, aqui e ali, que revelam muito mais do que tudo aquilo que se possa imaginar para se compreender por que razão se chegou até hoje da forma como chegámos. Não me refiro à intrigalhada familiar exposta em praça pública, reveladora do baixo nível, e que não é por razões de extracção social, de alguns dos seus membros, nem aos desmentidos que já começaram a aparecer, como foi aquele que o Banco de Portugal sentiu necessidade de fazer face ao depoimento prestado por Ricardo Salgado. Tudo isso é do domínio do cómico, do novelesco, e está de acordo com a forma como o País foi gerido politica, económica e financeiramente pelas suas "elites" nas últimas décadas. Com o tempo que o espectáculo vai durar muita coisa haverá para acompanhar e ir comentando no virar dos dias. Por agora, registo que os senhores deputados parecem ter aprendido a lição de anteriores comissões, percebendo que é do interesse de todos esclarecer devidamente o que se passou, retirando as ilações necessárias para uma correcção de práticas e modelos, enfim, esforçando-se por cumprirem bem o seu papel. Aqui será justo realçar o conhecimento e a preparação que a jovem deputada do Bloco de Esquerda, Mariana Mortágua, tem revelado.

Mas aquele que para mim foi o momento mais marcante até agora de tudo o que se passou, tem muito pouco de técnico. É mais do domínio do conhecimento da natureza humana, sendo importante para se perceber quem depõe, a forma como pensa e como age. E sobre isto recorde-se o momento em que Ricardo Salgado esclarece que tendo sido sugerido ao Banco de Portugal o nome "do Amílcar" [Morais Pires] para dirigir o BES, Carlos Costa lhe pede dois dias para pensar. De acordo com o relato de Ricardo Salgado, dois dias depois o senhor governador do Banco de Portugal telefona-lhe e diz-lhe: "Será quem o Sr. Presidente quiser".

Que um banqueiro afectado se refira a quem fora proposto lhe suceder em termos que não são aqueles em que se refere a outros membros da sua própria família que integravam a administração do BES, e a quem provavelmente conhece há mais tempo, ao fim e ao cabo vincando a diferença social e o modo de ascensão "do Amílcar", não é de estranhar. Amílcar Morais Pires fizera um percurso diferente, não era do meio, não exibia os mesmo pergaminhos. Era um homem da casa que trabalhava há muito na instituição, subira a pulso, conhecia os cantos e, digo eu, era suficientemente grato para fazer o que lhe mandassem.

Mas o que para mim é mais penoso é ver que da mesma forma altiva e sobranceira com que Ricardo Salgado se refere a Amílcar Morais Pires, verificamos que o governador do Banco Portugal exibe o respeitinho parolo e subserviente que é a marca de toda uma geração, de que com razão se queixava O'Neill e que quarenta anos depois do 25 de Abril continua a marcar os dias. Repare-se que, nas palavras de Ricardo Salgado, Carlos Costa não o trata pelo nome próprio, nem por "dr.", como é típico nos meios nacionais. Para Carlos Costa, o governador do Banco de Portugal, Ricardo Salgado era (é?) o "Sr. Presidente"! E, quer se queira quer não, foi desta forma que o regulador Banco de Portugal sempre se comportou em relação a quem manda nos bancos.

Fosse agora no caso do BES, ou tivesse sido no caso do BPN, do BPP ou do BCP, esta forma acanhada e subserviente de lidar com quem tem o poder do dinheiro, que neste pequena frase se revela, é afinal a mesma que se encontra no modo como, por exemplo, jornalistas falam com presidentes de clubes de futebol ou com políticos. Bem sei que alguns, de presidentes de juntas de freguesia a presidentes de filiais de empresas, tal como antes acontecia com alguns governadores civis, ficam de "trombas" (a culpa é de Mário Soares) quando os tratam pelo nome ou pelo convencional "dr.", em vez de a eles se dirigirem pelo título do cargo que ocupam. Porém, esse será um problema deles decorrente da sua errada percepção das coisas, da sua própria falta de noção do ridículo.

No país de Boliqueime, "Será quem o Sr. Presidente quiser" é uma frase que é também um espelho do modo como alguns exercem o poder. Mesmo que o "Sr. Presidente" seja um qualquer pantomineiro de boas famílias, que foge ao fisco e bate na mulher, ele será sempre o "Sr. Presidente". E é também um reflexo da susceptibilidade de alguns que exercem o poder numa sociedade democrática se deixarem influenciar por atavismos pouco consentâneos com as regras de uma república democrática em que os cidadãos são todos iguais perante a lei. É esta maneira de estar na vida, de uns serem "o Amílcar" ou a Irene do leite-creme e outros o "Sr. Presidente", é este estado de espírito, esta mentalidade, que nos separa e faz a diferença entre uma nação civilizada e uma sociedade moldada no preconceito e no paroquialismo, incapaz de sair de si para se elevar. Das coisas mais corriqueiras às que têm que ver com o nosso destino colectivo, como é a supervisão bancária e a forma como o Banco de Portugal exerce as funções que lhe foram legamente cometidas. "Será o que o Sr. Presidente quiser" é hoje a nossa imagem. No BES, na Presidência da República, em S. Bento, nos Tribunais, no Estádio do SLB ou do Dragão, na Junta de Freguesia da Mexilhoeira ou até no caso dos "vistos gold". Por aqui se vê o espelho da nossa desgraça. Da nossa miséria. E de como estão errados os modelos sociais e educacionais que se têm vindo a cultivar. Até nisto conseguimos falhar.

 

E isto é assim só com malta da nossa confiança, do Presidente aos banqueiros

Sérgio de Almeida Correia, 15.09.14

A falta que faz um especialista

Sérgio de Almeida Correia, 12.08.14

Com o Ministério das Finanças e o Banco de Portugal em silêncio, sabe-se lá porquê, com o Presidente da República ainda a pensar como vai justificar a actuação do supervisor depois das infelizes declarações que fez, e perante a catadupa de notícias sobre a actuação do Banco de Portugal, o empréstimo (a fundo perdido?) ao cair do pano que a SIC confirmou, a acta dada a conhecer por um escritório de advogados e os accionistas que se livraram do mau papel mesmo em cima do acontecimento, estou admirado com a ausência de Nuno Melo. Só com Marques Mendes a explicar as coisas os portugueses ficam sem o contraditório. Logo agora é que nos havia de acontecer uma coisa destas.

De rastos

Sérgio de Almeida Correia, 30.07.14

"Pasan los meses y el gobernador del Banco de Portugal, Carlos Costa, no mueve ficha. Espera que se vayan los inspectores de la UE, FMI y BCE que estaban supervisando el plan de rescate de Portugal y luego espera a junio a que el banco Espírito Santo cierre su ampliación de capital. Entonces llama a Salgado a su despacho para pedirle que se vaya del banco, él y todos los miembros de la familia. Salgado accede, pero le cuela como sustituto a su brazo derecho, Amílcar Moraes Pires. El desconcierto es total. ¿Cómo limpiar el banco con los mismos? Costa se acobarda, no se atreve a decir ni sí ni no y, en un comunicado bochornoso, afirma que son los accionistas quienes, el próximo 31 de julio, han de elegir a su dirección. Casi un mes de anarquía financiera alentada por el supervisor. Fernando Ulrich, presidente del banco BPI, lo resume: "Si querían construir la tormenta perfecta, no había mejor forma".

No era una tormenta, sino el diluvio. El desgobierno absoluto del BES, del Banco Central y de la economía del país. En siete días, el valor del banco cae un 41%. La desesperación llega a la misma familia, que tiene que vender las acciones para pagar el préstamo con que las había comprado. Pierden de su bolsillo 89 millones.

Costa tarda una semana en rectificar. Hay que salvar al BES; cortar ya con las relaciones obscenas entre el banco y las empresas de los Espírito Santo que durante años se peloteaban la deuda, cada vez más grande, extendiendo la metástasis por todos los rincones del grupo." - El Pais

 

Com uma imagem destas lá fora, será que o atento deputado jotinha, o tal que emite opiniões sem cerimónias, vai agora pedir uma comissão de inquérito à actuação do Banco de Portugal no caso BES?

 

P.S. Antes que venham os da praxe acusar-me de "socratista" e outros mimos do género, esclareço que quem agora pergunta teve em 2008 liberdade suficiente para escrever isto.

As estatísticas da realidade

Helena Sacadura Cabral, 22.05.12
Os números do Boletim Estatístico do Banco de Portugal revelam que a dívida do Estado à banca continua a crescer. Esse aumento foi de quase 12 mil milhões de euros em relação a Março do ano passado.

Foi em 2010 que a dívida do Estado à banca disparou e quase duplicou. De facto, passou de 22.887 milhões de euros em Dezembro de 2009 para 45.235 milhões no mesmo mês do ano seguinte.

Na segunda metade do ano passado, a mesma dívida reduziu-se ligeiramente, mas voltou a crescer no início de 2012.

Esta evolução deve-se ao endividamento progressivo da administração central.

A dívida à banca representa menos de um terço da dívida total do Estado mas foi a que mais cresceu nos últimos anos, ultrapassando mesmo o crescimento da dívida ao estrangeiro, que se situou nos 40% nos últimos quatro anos.

Pelo contrário, o crédito ao sector privado reduziu-se e essa quebra é maior a partir do final de 2010, ou seja quando a banca aumentou de forma mais expressiva o crédito concedido ao Estado.

Se em Dezembro de 2010, a dívida concedida pela banca a particulares ascendia a 157.341 milhões de euros, em Março ultimo ela estava nos 151.350 milhões. No mesmo período, o crédito concedido às empresas privadas passou de 144.858 milhões para 136.097 milhões de euros.


Não quereria estar na pele de quem tem de gerir este barco, tentando conciliar o interesse do país com a troika e uma certa ideologia. De facto, estes números podem ter várias leituras. A minha é preocupante. Mas eu só interpreto, não giro nem governo. E, sobretudo, tenho muito poucas ideologias. Sou uma tecnocrata, que é o pior que hoje se pode ser...

Um esclarecimento

Helena Sacadura Cabral, 20.05.12

 

Há alguns dias, julgo que no Correio da Manhã, li uma crónica do Juiz Rui Rangel, pessoa que admiro, na qual se afirmava que os empregados do Banco de Portugal, entre outros, haviam recebido os famigerados 13º e 14º meses. Não é verdade no que aos reformados - também eles empregados da casa -, respeita. 
Sou reformada daquela instituição e, até agora não recebi qualquer das referidas prestações.
Não sou porta voz do Banco, nem ninguém me encarregou de tal tarefa. Mas enquanto antiga trabalhadora julgo ser meu dever fazer esta clarificação.

Momento Cashconverters

Rui Rocha, 15.09.11

 

O Banco de Portugal (BdP) divulgou hoje as taxas máximas (TAEG) aplicáveis aos contratos de crédito aos consumidores no último trimestre deste ano.

 

Todos os limites máximos foram aumentados. A taxa do crédito pessoal, por exemplo, foi revista para uns tímidos 20,2%. A única excepção ao aumento dos limites registou-se nos cartões de crédito, mantendo-se nestes a razoabilíssima taxa máxima de 34,1%

 

A imposição de limites máximos é uma prática adoptada pelo BdP desde o final do ano passado. A aplicação de taxas superiores aos referidos limites é considerada usura. A aplicação de taxas inferiores não.

Quem fala assim não é Constâncio

Rui Rocha, 20.05.11

Tal como se pode ler aqui, e de acordo com o relatório anual ontem publicado pelo Banco de Portugal, foi o adiamento, em 2010, da correcção dos desequilíbrios orçamentais e externos da economia portuguesa - incluindo défices públicos acima do esperado - que fizeram com que Portugal ficasse exposto a uma avaliação negativa por parte dos mercados financeiros internacionais:

  • "Os investidores internacionais singularizaram a economia portuguesa principalmente em função do elevado nível de endividamento externo e do baixo crescimento tendencial, em conjugação com níveis do défice e da dívida pública relativamente altos e superiores ao esperado".
  • "(...) estes desenvolvimentos contribuíram para avolumar os receios dos investidores internacionais sobre a sustentabilidade das finanças públicas e sobre a dinâmica intertemporal da dívida externa, tornando inadiável o pedido de assistência financeira internacional".
  • "Em 2010 foi de novo adiado um ajustamento significativo dos desequilíbrios da economia portuguesa com (...) insuficiente consolidação das finanças públicas e (...) com uma política orçamental apenas ligeiramente restritiva".
  • "As medidas de consolidação importantes foram implementadas apenas a partir de meados de 2010, tornando limitado o seu impacto".

Ou seja, não só chegámos a 2010 com desequilíbrio orçamentais e externos (importa recordar quem esteve no governo nos últimos 6 anos) como, perante a crise internacional, foi adoptada a atitude errada pelo executivo liderado por José Sócrates. A realidade, sem eSPINhas, é esta. O resto é conversa para boy dormir.

A recuperação e a mudança

João Carvalho, 16.10.09

Obama consegue primeira vitória na regulação do sistema financeiro. Neste momento em que se procuram desesperadamente alguns sinais de que a crise está a ser vencida, espera-se que a União Europeia siga finalmente as pisadas dos EUA sobre o papel dos reguladores nos Estados-membros.

Já entre nós, até ver, mantém-se outra dúvida: será que Vítor Constâncio regula bem?