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Delito de Opinião

Saga bancária - último acto

José Meireles Graça, 22.09.24

Não honrei o e-mail delirante sobre a minha suposta condição de pessoa politicamente exposta com uma resposta: de toda a evidência estes numerosos funcionários não sabem interpretar o que leem e seria gastar cera com ruim defunto.

A 12 de Setembro respondi ao tal gerente de conta (ou do balcão, ou lá o que é), nos seguintes termos:

Noto o S/ e-mail, que figura abaixo, de 27 de Agosto último.

Conforme reiteradamente informado está fora de hipótese deslocar-me à Vossa loja de xxx, ou a qualquer outra, por considerar semelhante exigência um abuso.

Razão pela qual agradeço o encerramento da minha conta há anos aberta nesse Balcão (cujo saldo é actualmente, de 0,00 Euros), bem como o cancelamento do cartão de débito que lhe está associado.

José xxx Graça

CC xxx

Contribuinte nº xxx

Travessa xxx, Guimarães

A isto o funcionário, obviamente zangado, respondeu com alguma insolência a 16 de Setembro:

Sr. José Graça, boa tarde.

Relativamente ao que me expõe, informo que para efeito de encerramento de conta, deverá dirigir-se a uma loja Bancoxxx, da sua preferência geográfica.

Não encerramos contas, com instruções à distância.

Att.,

xxx

No mesmo dia, respondi:

Boa tarde.

Temos então que sempre pude, à distância, fazer as transferências que entendi e, na última, reduzir o saldo disponível a zero Euros; mas não posso, à distância, cancelar a conta ainda que tenha (e continuará a ter) um saldo disponível de zero Euros.

Ficará então assim até à eternidade, imputrescível. Seria o caso de dizer, se fosse pessoa com inclinação para observações de gosto duvidoso, que sou titular de uma conta em odor de santidade.

Fique V. Ex.ª muito bem, que eu fico melhor graças a Deus.

E no dia seguinte, isto é, 17 de Setembro, o funcionário em questão respondeu com finura, tendo o cuidado de esclarecer que o fazia com “filosofias à parte”:

Sr. José Graça, bom dia.

De forma a que da minha parte este assunto fique encerrado, reitero posição do banco nos encerramentos de conta. O cliente tem que se dirigir á loja e assinar minuta para esse fim, de forma a que a área competente processe a instrução do cliente.

A iniciativa de encerramento em nada tem a ver com outras operações que pode processar à distancia.

Filosofias à parte, informo-o que enquanto não encerrar a sua conta permanece ligado ao BancoCtt, através de contrato comercial de conta à ordem.

Att.,

xxx

 

É mais que tempo de acabar com esta história e, sobrando-me muito para dizer, desisto.

Pergunta-se: Quem ganhou este braço de ferro?

Resposta: Eu não fui. Porque até mesmo para me divorciar é preciso fazer a mesma coisa que deu origem ao divórcio. O que figura afinal na coluna do saldo em Euros da conta não são dois zeros, são dois coraçõezinhos.

De modo que viverei doravante em estado de mancebia com outros bancos porque, para acabar com o casamento com o BancoCTT, seria, acha ele, preciso ir lá em pessoa e dizer, olhos nos olhos: já não te posso ver.

Saga bancária (11)

José Meireles Graça, 21.09.24

Ao e-mail publicado ontem respondi alguns dias mais tarde, a resposta mereceu uma resposta à qual respondi, uf, e amanhã publico os textos que ainda faltam até ao desenlace final porque já basta o que basta: não desejo que os leitores infinitamente pacientes que aqui chegaram ao cabo de 11 dias se vejam, ao 12º, tomados de desarranjos intestinais, tal o enjoo.

A 3 de Setembro o já mencionado Serviço de Reclamações envia-me o seguinte texto, não assinado, que vem com a lisonjeira novidade de eu ser uma “pessoa politicamente exposta”. É a primeira vez que, neste arrastado processo, tal alegação é feita, e recebi-a com perplexidade por ultimamente a única exposição de que me recordo é ao Sol, por tempo considerável é verdade, mas com adequada protecção.

Exmo. Sr. José xxx Graça,

Em resposta às suas comunicações e com o intuito de esclarecer eventuais dúvidas sobre o tema em questão, vimos pela presente missiva esclarecer que, de acordo com a Lei nº 83/2017, as instituições financeiras são obrigadas a adotar medidas de identificação e diligência relativamente aos seus clientes, representantes destes e beneficiários efetivos.

Neste contexto, o Banco xxx realiza a identificação de clientes que possam ser considerados Pessoas Politicamente Expostas (PEP). A este respeito, cumpre-nos informar que familiares próximos de um PEP, designadamente de um político em funções, são também eles Pessoas Politicamente Expostas (PEP).

Em estrito cumprimento das normas legais e regulamentares, as instituições financeiras devem realizar as devidas diligências para assegurar a atualidade, exatidão e completude da informação referente aos dados pessoais, profissionais e patrimoniais dos clientes, devendo as instituições financeiras adotar medidas reforçadas caso se tratem de Pessoas Politicamente Expostas (PEP).

Os procedimentos de atualização aludidos e a regularidade com que os mesmos devem ser executados estão exarados na lei suprarreferida, dos quais destacamos as seguintes obrigações que impendem sobre os Bancos:

  • Monitorizar em permanência e de forma reforçada as relações de negócio;
  • Adotar medidas necessárias que visem conhecer e comprovar a origem do património e de fundos;
  • Manter atualizada a informação dos clientes, sendo a periodicidade definida em função do grau de risco associado a cada cliente, mas não podendo ser superior a 5 anos ou, no caso de clientes PEP, superior a 1 ano.

Para que o Banco xxx possa cumprir tais obrigações e de forma a podermos manter a relação de negócio com V/Exa, solicitamos a sua colaboração para proceder à atualização dos seus dados, junto de uma Loja do Banco xxx, com brevidade.

Certos da sua melhor compreensão e sem outro assunto de momento, apresentamos-lhe os nossos cumprimentos.

Saga bancária (10)

José Meireles Graça, 20.09.24

A 22 de Agosto um novo funcionário, do serviço de Gestão de Reclamações, dirige-se-me:

Exmo. Senhor José Graça,

Confirmamos a receção do seu email que mereceu o nosso melhor cuidado e agradecemos desde já.

Relativamente à situação exposta, reiteramos os nossos esclarecimentos para os já vertidos nas comunicações anteriores.

Apresentamos os nossos melhores cumprimentos, 

xxx

E no dia 27 o mesmo indivíduo que espoletou esta saga, e a quem já me havia dirigido por escrito, envia-me (e, pela redacção, julgo que a outros recalcitrantes) o seguinte texto:

Prezada (o) Cliente, boa tarde.

Com o propósito de procedermos a uma atualização de dados, solicita-se que se desloquem à loja de xxx.

Aguardamos a sua visita.

Att.,

xxx.

 

Saga bancária (9)

José Meireles Graça, 19.09.24

No dia seguinte, isto é, 21 de Agosto, respondi ao tal dirigente com o qual tive um relacionamento cordial:

Boa tarde xxx.

Alguém me ligou, de facto (acho que já é a terceira ou quarta pessoa), mas não retive o nome. Como a senhora não disse nada de novo para além do cansado mantra que já conheço, e não vejo absolutamente nenhuma razão razoável para mudar de opinião ou atitude, a conversa não terminou, nem podia, bem.

A sua convicção de que é preciso o cliente deslocar-se para ir a uma agência, estacionar, tirar uma ficha, esperar o tempo que for preciso, tudo para mostrar um cartão a um funcionário porque o cidadão em geral, e o cliente do banco em particular, é um mentiroso salvo prova em contrário, assenta no equívoco de imaginar que a imposição que o BdP faz aos bancos pode ser cumprida de qualquer maneira, sem critérios de razoabilidade.

Nem aliás se entende se com a melhoria do homebanking se admite a desnecessidade da deslocação por que razão não seria suficiente a informação, que reiteradamente já prestei por e-mail, da nova data de validade para o mesmo número de cartão que sempre tive.

De resto, isto tem um lado cómico: o meu cartão foi renovado da última vez via internet. Não tive de ir, como era tradicional, a um serviço público. O Estado está mais à frente do que alguma banca comercial, parece (não toda, nem sequer a de propriedade pública).

O assunto, para mim, é de princípio: Não estou disposto a cumprir exigências ilegais. No passado dia 20 recebi um e-mail (mais um), desta vez duma senhora xxx, a quem respondi com algum detalhe, inclusivamente explicando (coisa que aliás já havia feito há muito) por que razão a legislação invocada não pode ser interpretada do modo superficial e ligeiro como o estão a fazer – anexo cópia desses e-mails.

Esta senhora vem, também ela, com ameaças, o que é pouco menos do que fantástico: acaso os trabalhadores do banco se julgam agentes de polícia, ou magistrados, ou qualquer dos funcionários públicos que, no âmbito de determinadas funções, detêm poderes de citação para comparência? (e lembro, para o caso de ser necessário, que esta história começou com uma ameaça telefónica, no caso do que creio ser o gerente de xxx, que tem o gatilho leve para uma arma que julga ser mais do que de fulminantes).

Para ser perfeitamente explícito, xxx: Não vou a agência nenhuma mostrar qualquer cartão porque não estou disposto, nem preciso, de ceder a procedimentos de bullying, como é o caso quando se diz, na prática, “ou fazes o que não temos o direito de exigir ou exercemos sanções que não temos o direito de praticar”; posso mostrá-lo, como já reiteradamente dito, em minha casa ou em qualquer dos meus dois locais de trabalho.

Confio em que entenderá.

Cordiais cumprimentos.

José etc.

Saga bancária (8)

José Meireles Graça, 18.09.24

No mesmo dia, respondi à tal funcionária. Já há vários envolvidos, todos a escamotear o problema essencial, que é o de exigirem a deslocação para um procedimento que pode ser realizado, e já é por outros bancos, sem a necessidade de deslocações, tudo embrulhado em supostas legalidades e em ameaças. E como os destinatários são diferentes nada melhor do que copiar aqui e além parágrafos já utilizados, correndo aliás o risco de até ficarem puídos de tanto uso. Como segue:

Boa tarde xxx.

Não sei de que “contacto” está a falar porque já recebi telefonemas de três funcionários diferentes e já enviei vários e-mails recentemente, sempre sobre este assunto, nomeadamente para o V/ serviço de reclamações.

Mais uma vez (já dei esta explicação a vários funcionários e serviços Vossos, incluindo por escrito, que teimosamente a ignoram):

A lei que referem tem 191 artigos e destina-se a combater o branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo. Só isto já bastaria para considerar grotesca e até insultuosa a invocação de uma tal lei para me obrigar a incómodos, perdas de tempo, deslocações e despesas para exibir um documento a um funcionário cujo tempo decerto poderia ser destinado a actividades mais úteis. Nela existe apenas um artigo invocável a este propósito, o 23º, que reza, na alínea d): “Existam dúvidas sobre a veracidade ou a adequação dos dados de identificação dos clientes previamente obtidos”.

Claro que VV. Exªs não têm dúvidas, nem razão para a as ter, apenas inventaram uma maneira cómoda para os vossos serviços, e incómoda para os clientes, de passarem a imagem, imagino que para a entidade de supervisão, de grande empenho no referido combate. E cabe lembrar que a minha conta nesse banco apenas é movimentada, a crédito, com uma pensão mensal de reforma, não sendo alegável, suponho, que com a Segurança Social se corra o risco de branqueamento de capitais ou terrorismo, e, a débito, com transferências insignificativas sempre para a mesmo titular de outra conta noutro banco, a qual se distingue por ter a certamente discutível felicidade de coabitar comigo, ou outros débitos modestos da Via Verde, ou ainda ocasionais despesas.

Por outro lado, o Aviso que referem é da entidade supervisora dos bancos, que certamente na exigência AOS BANCOS de dados actualizados dos clientes não estabelece procedimentos que impliquem necessariamente deslocações de cidadãos para fins estritamente burocráticos. De resto, nos Vossos vaguíssimos textos falam de Leis e Avisos que jamais transcrevem ou invocam senão genericamente ou, num caso, de razões de alegada “segurança” que não é definida nem se imagina o que seja. Para o cliente comum, habituado ao respeito acéfalo de instruções e exigências abusivas, servirá; para mim não. E, já agora, aproveito para informar que, ao contrário do que parecem acreditar, há bancos que aceitam, como é razoável, a simples informação do cliente, no site respectivo, sobre a actualização da sua situação, nomeadamente no caso de caducidade do documento de identificação; e que, sendo sócio-gerente de duas sociedades, nunca os bancos com que elas trabalham entenderam razoável “citar-me” para me deslocar às agências fosse para o que fosse.

Mesmo assim, e se insistirem na absurda pretensão de contemplarem fisicamente o meu cartão de cidadão, estarei disponível na minha residência ou nos meus dois locais de trabalho em horas úteis.

Finalmente, repito o que já anteriormente comuniquei, por escrito como é meu hábito porque palavras leva-as o vento: O meu CC, de nº xxx, foi tempestivamente renovado, tendo agora a validade de 03/08/2031; a minha morada, número telefónico e restantes dados permanecem os mesmos que já existiam ainda antes de o Banco xxx ter nascido.

Saga bancária (7)

José Meireles Graça, 17.09.24

Ia prestes responder (ao e-mail que publiquei ontem) mas, no mesmo dia, escreveu-me o tal dirigente simpático, aparentemente na sequência do telefonema anteriormente referido:

Bom dia José,

Agradeço o seu mail e lamento a situação. A exigência da atualização periódica de dados de cliente é uma imposição do Banco de Portugal e estamos a trabalhar para que passe a ser possível de a fazer remotamente na app.  Até lá não temos mesmo melhor alternativa que não seja presencial. De qualquer forma disseram-me que lhe iam ligar para ver a melhor forma de atualizarmos os seus dados com o menor incomodo possível e dentro daquilo que o regulador considera como processo válido.

Por favor avise-me assim que lhe ligarem.  Queria saber como correu.

Obrigado,

xxx

Saga bancária (6)

José Meireles Graça, 16.09.24

Em 20 de Agosto novo e-mail, de outro serviço, na sequência de um telefonema entretanto recebido em que, entre outras coisas já ditas e reditas, informei a funcionária que, se escrevo ao Banco, espero ser respondido da mesma forma e não com telefonemas.

Nesse texto não se argumenta nada de novo, não se rebate nada, e repete-se no essencial a mesma cassete: anda cá porque sim, queremos ver-te e ao teu cartão, e se não vens bloqueamos-te a conta olaré.

Era como segue:

Exmo. Senhor José Graça.

Agradecemos o seu contacto, ao qual dedicámos a nossa melhor atenção.

Relativamente ao exposto, e no seguimento do contacto telefónico, cumpre informar V. Exa. que de acordo com o estipulado na Lei 83/2017, de 18 agosto e no Aviso do Banco de Portugal nº 2/2018, de 26 de setembro, as instituições financeiras são obrigadas a deter informação completa e permanentemente atualizada dos seus clientes. Neste contexto, o Banco CTT tem vindo a sensibilizar V. Exa. para a obrigatoriedade de proceder presencialmente, junto de um Balcão Banco CTT da Sua conveniência, à atualização dos dados do Seu Cartão de Cidadão, que se encontra expirado desde 28-08-2017, não sendo possível a atualização por outro meio que não a apresentação presencial pelo titular.

Adicionalmente esclarecemos que, apesar de nos indicar que já renovou o Seu Cartão de Cidadão, o mesmo ainda não foi apresentado junto de uma Loja Banco CTT. Na ausência da atualização do referido, poderá ocorrer o bloqueio temporário do acesso à Sua Conta Bancária impossibilitando a movimentação.

Sem outro assunto de momento, apresentamos os nossos melhores cumprimentos

xxx

Saga bancária (5)

José Meireles Graça, 15.09.24

Lembrei-me nesta maré de em determinada altura ter tido uma simpática troca de correspondência com um alto dirigente do banco objecto desta saga, a propósito de um problema que foi resolvido a contento. E por isso resolvi metê-lo, se isso quisesse, ao barulho. Daí que lhe enviasse um e-mail, no mesmo dia 15, rezando o seguinte:

Boa noite.

Em tempos (Fevereiro de 2021) tive uma amável troca de correspondência consigo, seguida de uma conversa telefónica.

Guardei a impressão de deter uma noção correctíssima do que deve ser um Banco nas suas relações com os clientes.

Não me parece que os seus serviços, pelo menos no meu caso, o acompanhem. É isso que se depreende da troca de e-mails com o V/ serviço de reclamações que figura abaixo.

Os meus mais cordiais cumprimentos.

José etc. etc.

Saga bancária (4)

José Meireles Graça, 14.09.24

Ao e-mail ontem transcrito respondi nos termos que figuram abaixo, e nesta altura dos acontecimentos já começava a perder a considerável paciência com que a Divina Providência me dotou.

Ex.ma Sra. xxx:

VV. Exªs têm o desplante de me notificar para comparecer num dos vossos balcões/lojas para o efeito de exibir o meu Cartão de Cidadão, que “se encontra expirado”.

Ou seja, acham normal que vá perder tempo e dinheiro a um dos vossos estabelecimentos (anteriormente o de xxx, agora, aparentemente, outro qualquer) para o efeito de cumprir uma exigência meramente burocrática, no caso “razões de segurança”, sem indicação de nenhuma disposição legal que permita ou imponha ao Banco semelhante exigência, ou de que “segurança” se trata.

A do Banco não é porque nada lhe devo ou devi; e a minha também não porque dela eu, e não o Banco, sou juiz.

Se a tal invocação da “segurança” é feita ao abrigo da Lei 83/2017, como fizeram em 2018, lembro que esta se destina a combater o branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo, o que bastaria para considerar grotesca e até insultuosa a invocação de uma tal lei para me obrigar a incomodar-me para exibir um documento a um funcionário cujo tempo decerto poderia ser destinado a actividades mais úteis.

Nessa Lei apenas encontrei um artº, o 23º, que remotamente poderiam invocar, quando reza, na alínea d): “Existam dúvidas sobre a veracidade ou a adequação dos dados de identificação dos clientes previamente obtidos”. 

Claro que VV. Exªs não têm dúvidas, nem razão para a as ter, apenas inventaram uma maneira cómoda para os vossos serviços, e incómoda para os clientes, de passarem a imagem, imagino que para a entidade de supervisão, de grande empenho no referido combate.

De resto, o saldo médio da minha conta e os montantes dos levantamentos e das transferências, pela modéstia, se alguma coisa recomendam é que não me aborreçam com disparates.

Não se encontra o Cartão em apreço caducado porque foi tempestivamente renovado, como já informado pelo meu e-mail de 12/8/24 para esse serviço.

Acrescento agora que a minha assinatura continua igual, porque não fui entretanto vítima de qualquer acidente de índole vascular ou outra que me tivesse alterado a escrita, e que eu próprio guardo as feições com que tenho vivido desde a primeira e todas as várias vezes que perdi tempo com inutilidades no vosso balcão de xxx.

Aproveito para assinalar que V. Exª parece ter o deplorável hábito de responder a e-mails sem os identificar nem accionar o dispositivo para que na resposta sejam transcritos. 

Mas como o V/ funcionário de xxx, Dr. xxx, conforme anteriormente já referi, formulou telefonicamente a ameaça de cancelamento da conta, informo o seguinte:

Estou disponível, em dia e hora com aviso prévio, para receber um funcionário vosso, na minha residência ou no meu local de trabalho, para lhe exibir o meu Cartão de Cidadão actual, cujos dados são exactamente os mesmos que serviram para abertura da conta, salvo na data de validade, que é agora, como já igualmente informado, 03/08/2031.

Uma nota final: Ao contrário do que diz, não sou “solicitante” de coisa alguma. Esse Banco não é uma repartição do Estado nem uma autoridade pública, e pesa-me lembrar que está a falar com um cliente, não um cidadão que lhe reconheça qualquer espécie de autoridade. 

Receba V. Exª, de cumprimentos, quanto baste.

José etc. etc.

CC nº xxx

Contribuinte nº xxx

Travessa etc. etc.

Saga bancária (3)

José Meireles Graça, 13.09.24

A 14 de Agosto o serviço de reclamações respondeu como abaixo se transcreve. Estas “razões de segurança” eram uma novidade, metida a martelo num texto redigido em burocratês de gramaticalidade duvidosa. 

Exmo. Senhor José Graça,

Confirmamos a receção do seu email que mereceu o nosso melhor cuidado e agradecemos desde já.

Relativamente à situação exposta, cumpre informar que, por razões de segurança, qualquer alteração dos dados pessoais fornecidos no ato de abertura de conta, apenas poderão ser efetuadas presencialmente, junto de uma Loja Banco CTT, pelo solicitante.

Apresentamos os nossos melhores cumprimentos,

xxx 

Saga bancária (2)

José Meireles Graça, 12.09.24

Tudo começou com um telefonema a horas próprias de um gerente de conta (creio ser essa a designação) que informou este modestíssimo cliente da obrigação de comparecer na agência para mostrar o novo cartão de cidadão por o anterior estar caducado. Acordado pelo telefonema (tenho horários anómalos) esclareci abruptamente que não tinha a mais remota intenção de fazer semelhante coisa. O homem não apreciou o tom, decerto por não estar habituado, e cresceu com a ameaça de, em caso de incumprimento, bloquear a conta.

Na sequência do que enviei para o serviço de reclamações, em 12 do passado mês, o seguinte e-mail:

Boa tarde.

Acabo de receber um telefonema de um V/ funcionário da agência de xxx, seguido de uma mensagem SMS assinada provavelmente pelo mesmo funcionário, xxx.

Na mensagem informa-se apenas que o meu cartão de cidadão está caducado, solicitando-se actualização, no telefonema exigia-se a deslocação a xxx para “actualização de dados”, referindo-se àquela caducidade e, imagino, outros dados constantes da minha ficha de cliente.

Informei o funcionário que o novo cartão tinha o mesmo número e estar fora de questão deslocar-me a xxx para semelhante propósito, considerando um abuso a exigência.

Como, em troca, recebi a ameaça de bloqueio da conta, venho esclarecer:

i) O meu CC tem, como disse telefonicamente, o mesmo número que sempre teve, actualmente tendo validade até 03/08/2031;

ii) Todos os outros dados porventura existentes estão actualizados, não tendo havido quaisquer mudanças, nomeadamente de residência, que o Banco deva conhecer;

iii) Não vejo nenhuma razão razoável para o Banco se comportar como um departamento de polícia, tribunal ou outro organismo público com competência para exigir comparência, no caso para verificar fisicamente a veracidade de uma informação que pode ser prestada, se solicitada, por esta ou outra via que não implique despesas, incómodos e perdas de tempo;

Ficando a aguardar notícias, apresento os meus melhores cumprimentos.

José etc. etc.

CC xxx

Morada xxx

Tlm xxx

Saga bancária (1)

José Meireles Graça, 11.09.24

Portugal é um torrãozinho de açúcar, dizia já não sei que personagem de Eça.

Essa alegada doçura (da mesma natureza da que orna algumas declarações e discursos de Marcelo quando calha puxar o lustro ao patrioteirismo) vem de muitas coisas, a primeira das quais é o conformismo e o respeitinho dos poderes.

Não os grandes poderes. Esses, com excepção do dos tribunais e do Ministério Público, estão devidamente arregimentados nos partidos da Oposição e nos do Governo, cuja disputa faz com que ninguém respeite excessivamente, quando saibam, o que Suas Ex.ªs andam a fazer.

O cidadão comum não ignora que não tem nenhuma verdadeira defesa contra o polícia mal disposto que exorbita dos seus poderes e competências; a Câmara que o massacra com exigências intermináveis para conceder a abençoada licença; os prazos que o cidadão cumpre sob ameaça de multa mas que qualquer serviço público pode ignorar sem sanções; o funcionário que aplica mal uma lei que não sabe interpretar; a Autoridade Tributária que pode cometer todo o tipo de exacções e abusos porque, em nome do “combate” à fuga fiscal se deixou pelo caminho o Estado de Direito; o veto de gaveta; e todo o rosário de atropelos em que a Administração Pública é tradicionalmente fértil.

Isto é assim porque sempre assim foi e porque o chefe tem todo o interesse em agradar às chefias e aos subordinados, e não aos cidadãos, dos quais não precisa para viver; e porque os costumes ditam que ninguém, salvo no caso de crimes, é sancionado por coisa alguma.

Modernamente há abundância de companhias majestáticas, públicas ou privadas, às vezes em situação de aparente concorrência, que com frequência operam sob a “supervisão” de entidades teoricamente independentes. E a comunicação social noticia com gáudio quando há multas, de montantes às vezes impressionantes, as quais revertem para o Estado ou para a entidade que as aplica e não para os cidadãos directamente ofendidos, se os houver.

Os supervisores, porém, tendem a ser farinha do mesmo saco dos supervisionados. O que faz que quem reclame tenha à sua espera um calvário de língua de pau em que o ponto de vista do reclamado é tratado como se tivesse um peso necessariamente mais elevado que o do reclamante.

Hoje os bancos são companhias dessas, majestáticas, sob a férula da agência local do BCE, que continua a ter a designação tradicional de BdP. E como o país tem a memória recente da magra barriga que foi obrigado a encostar ao balcão da inépcia ou da loucura interesseira da gestão bancária para nele, no balcão, depositar as gorduras que não tinha, ficou aberta a porta para todo o pequeno e grande abuso – tudo, desde que para garantir que não voltemos a passar pelos mesmos assados.

Muitos atropelos são insignificantes por si. Mas espanta que à boleia de grandiloquências (no caso o “combate” à lavagem de dinheiro e ao terrorismo) milhares de cidadãos clientes dos bancos (lembro: ter conta bancária, hoje, é praticamente indispensável para receber o ordenado, a pensão ou o subsídio, ou ainda outros fins) sejam forçados, periodicamente, a ir ao banco mostrar um cartão renovado porque o anterior caducou e a informação sobre a nova data de validade tem de ser prestada presencialmente porque o cidadão, como é geralmente sabido, é mentiroso e desonesto salvo prova em contrário.

Destes cidadãos há alguns peguilhentos, embora sejamos poucos, que configuram aquelas areias que nem por serem insignificantes deixam de às vezes encravar maquinarias.

A partir de amanhã transcrevo uma longa novela de troca de correspondência que prova o ponto. Tenciono repartir por vários posts porque ninguém lê seguidas mais de duas páginas A4, a menos que o assunto seja particularmente interessante – o que não é o caso.

Chutado borda fora

Sérgio de Almeida Correia, 19.01.22

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Quando há menos de um ano foi apontado como Chairman do Credit Suisse Group, poucos imaginariam que o percurso profissional de António Horta-Osório seria quebrado de uma forma que tem tanto de abrupta como de humilhante. Pelo que aconteceu, mas também pela repercussão internacional da sua saída (New York Times, WSJ, BBC, Reuters, Bloomberg...).

O banqueiro é um dos raros portugueses cujo trabalho, empenho e competência o projectaram para o topo da sua área profissional a nível mundial, o que lhe valeu múltiplos encómios, dentro e fora de casa. A relação dos prémios e condecorações que lhe foram conferidas é por isso mesmo impressionante, e até a honra de ter sido feito Cavaleiro da Ordem do Império Britânico, passando a ostentar o título de “Sir”, lhe foi outorgada pela Rainha Isabel II.

Tal só se compreende, ademais, porque os serviços prestados à sociedade foram de um nível de excepção e só ao alcance de muito poucos, sendo certo que o seu grau de exigência, cometimento para com a obtenção de resultados e sentido do dever o impulsionaram para tal.

Naturalmente que tudo isso foi obtido, para além do seu próprio esforço e aptidões, com o contributo de todos os outros que compuseram as suas equipas e o ajudaram a atingir tão elevado patamar. 

Tudo isso torna ainda mais incompreensível a forma como se deixou apanhar em pecadilhos, ou talvez sejam mais do que isso, que aqui e ali foram manchando o seu percurso, a sua credibilidade e a sua reputação. O que de bem, excelente e extraordinário por si foi conseguido, todavia, continuará registado.

Não obstante a sua actual dupla nacionalidade, é e foi o facto de ter saído de um país pequeno, remediado e periférico, e que por isso mesmo teve de enfrentar barreiras e preconceitos que pouparam muitos dos seus pares, que mais motivou a atenção dos outros e deu luz ao seu êxito.

Compreende-se por isso que quem tivesse lido a edição de ontem, 18 de Janeiro, do Financial Times não poderia deixar de ficar impressionado com o espaço que foi dado a Horta-Osório e à sua saída do Credit Suisse.

Com fotografia e chamada à primeira página, depois com uma coluna na página 5 (Horta Osório quits C Suisse over Covid rule breach, de Owen Walker), mais dois terços da página sete, ocupando toda a parte superior (“Torquemada”of Credit Suisse makes his fate, de Owen Walker e Stephen Morris), a que se juntam um artigo de opinião de Brooke Masters, na página 17 (Horta-Osório’s departure is the revenge of revenge of the rank and file), e uma nota na página 18, na secção Lex (C Suisse/Horta-Osório:Wimbledon test fail), a demissão do banqueiro tinha tudo para não passar despercebida.

Algumas das frases que se podem respigar da leitura dos textos que referi não deixam margem para dúvida sobre os erros que lhe são apontados, agravados pela forma como escolheu comportar-se aos olhos de terceiros – “Horta-Osório was known as Torquemada — after the Castilian friar who led the Spanish Inquisition — for the zeal with which he held people to account.”; “(…) he was imperious and self-satisfied, particularly after he was knighted over the summer for his work at Lloyds. Many at the bank were heartily sick of him even before the Covid revelations.”; “He is leaving his mark — in exactly the wrong way.”.

E tudo para quê? Para acabar pedindo desculpa, uma vez mais, saindo pela porta pequena, acusado de desrespeitar regras básicas, desvalorizando condutas próprias que a outros exigia, esquecendo-se de quem era e do que representava, deslustrando a confiança por tantos depositada e o respeito conquistado ao longo dos anos.

Se Horta-Osório fosse um bandalho ou um criminoso sem escrúpulos, como se revelaram alguns dos seus pares e muitos dos que nos governaram e governam, ou um tipo desprovido de educação, ética ou valores; se fosse alguém que não tivesse alcançado com mérito tudo o que obteve; que necessitasse de algo que impreterivelmente lhe fizesse falta, ou se padecesse de alguma tara, ainda poderia, embora com dificuldade, compreender certos comportamentos. Mas não foi o caso.

E é isso que a mim, simples mortal, que diariamente prossigo um combate cada vez mais solitário pela valorização pessoal, pela crença no outro, pela integridade, pela decência, pelo direito de todos ao mérito e ao sol, mais confusão me faz.

Saber o que pode levar um homem com a inteligência, o brilho e o estatuto de Horta-Osório a falhar tão clamorosamente, em questões tão corriqueiras e que se teriam por adquiridas para qualquer cidadão, dando cabo de um passado notável no intervalo entre o riscar de um fósforo e o eclodir da chama, será sempre para mim motivo de reflexão e permanente interrogação.

Uma bofetada na justiça portuguesa

João Rendeiro

Pedro Correia, 13.10.21

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A nossa memória colectiva é frágil. Muitos já esqueceram aquele tempo em que meio país andava rendido a Rendeiro, prestando-lhe tributo e vassalagem. Bonzos da opinião mediática e sumidades da alta-roda social sucumbiram ao charme discreto do fundador do Banco Privado Português – entidade que se especializou a gerir grandes fortunas. Chamavam-lhe "o banqueiro dos ricos".

Rezam as crónicas que o lisboeta João Manuel Oliveira Rendeiro, 69 anos, nasceu em família de classe média oriunda de Aveiro. Licenciado em Economia na capital e doutorado no Reino Unido, fundou o BPP em 1996. O país, governado por António Guterres, atravessava um ciclo de ilusória prosperidade, culminado na Expo-98 e encerrado com o Euro-2004. Em pano de fundo, a nossa adesão ao sistema monetário europeu. Não faltaram compatriotas a imaginar que, por feitiçaria financeira, passaríamos a ter salários à moda da Alemanha.

À frente do BPP, Rendeiro foi um eficaz gestor de ilusões. Reservando o essencial dessa eficácia em proveito próprio: durante anos terá amealhado mais de 21 milhões de euros numa offshore com sede nas selectas Ilhas Virgens onde flutua a bandeira britânica. O esquema durou até deflagrar a gigantesca crise financeira de 2008: sem liquidez para satisfazer a clientela acumulada, o BPP entrou em colapso no final desse ano. Viria a ser extinto em 2010.

A falência deu origem a uma profusão de queixas-crime, com a demora do costume entre nós. Um desses processos, em que o antigo banqueiro foi condenado a cinco anos e oito meses de pena de prisão efectiva por falsidade informática e falsidade de documentos, chegou há pouco ao fim, já sem recurso. Mas não houve detenção imediata, como nos filmes: Rendeiro tratou de fugir, aproveitando-se da extrema tolerância da nossa magistratura, incapaz até de lhe apreender o passaporte, e da inacreditável lentidão da burocracia responsável pela execução de penas.

A ministra da Justiça reagiu com um dos suaves eufemismos a que nos habituou, admitindo haver “desconforto social”. A juíza de primeira instância que noutro processo o condenou a dez anos de prisão por fraude fiscal confessa que não detectara nele “qualquer indício de que tencionava empreender a fuga agora concretizada”. Rendeiro beneficiava da medida de coacção mais ligeira – a do termo de identidade e residência. Mesmo nunca tendo pago as coimas a que fora condenado em processos anteriores, movidos pelos reguladores financeiros.

Algures onde se refugiou, diz agir “em legítima defesa” e recusa figurar como “bode expiatório do sistema financeiro nacional”. Por outras palavras: não está disposto a pagar pelos graves ilícitos que cometeu. Dando uma sonora bofetada na justiça portuguesa. Alimentando a fogueira do populismo à solta nas redes sociais. E tornando tristemente irónicas as palavras do Presidente da República, que neste 5 de Outubro exigiu um país “mais rico, mais inclusivo e mais justo”.

 

Texto publicado no semanário Novo

Assalto no apartamento

José Meireles Graça, 14.05.21

A questão é uma hórrida embrulhada jurídica e não vale por isso a pena escabichá-la, o que seria aliás difícil por causa do jargão tribunaloico, em parte necessário porque é imperioso que em Direito as palavras e os argumentos tenham um significado preciso, e em parte dispensável porque a muralha linguística foi construída para os leigos acreditarem que nas cabeças dos agentes da Justiça mora uma ciência inacessível e profunda. De resto, os tribunais ocupam-se da interpretação e aplicação das leis, e não da justiça segundo o sentido que a palavra tem para pessoas bem formadas, pelo que não cabe aos juízes, e bem, apreciar o asneirol do legislador, o que tudo ajuda a que por vezes se embrulhem os processos em discussões bizantinas.

Como na história que o Observador narra houve decisões contraditórias, em casos pretéritos também, e em futuros presumivelmente, o presidente do STJ entendeu que a jurisprudência deveria ser uniformizada, pelo expediente de pôr mais togas supremas a debruçarem-se sobre o assunto. Entendeu bem: que quem compra casas para nelas viver não saiba bem que direitos tem, os que tem quem as vende, e que papel podem desempenhar no processo os bancos em caso de insolvência, deveria ser matéria de trigo limpo farinha Amparo, não uma jigajoga de acções, trapalhadas e recursos de resultado incerto, sempre com o pano de fundo de que toda a gente está em igualdade de circunstâncias para suportar os custos do recurso aos tribunais – uma evidente falsidade. Daí que de então para cá a questão da segurança jurídica neste tipo de situações tivesse ficado resolvida.

Do ponto de vista da justiça material, o caso não era difícil: é claro que estando de um lado um banco e do outro um cidadão que investiu na compra de um imóvel para lá viver, querer o banco ressarcir-se do dano que sofreu por ter feito uma má avaliação do risco, ou por simplesmente as coisas terem corrido mal, a expensas dos pobres diabos que foram apanhados de boa-fé no desenlace, é um claríssimo abuso.

Abuso que tem tantos precedentes, e tantas implicações sociais, que seria bom que o legislador se intrometesse: a esquerda à esquerda do PS achará que os bancos não têm razão por definição, porque são pela maior parte privados, devendo ser públicos; e não é impossível que a direita entenda o contrário, por reflexo ou porque parte do princípio que a liberdade contratual é o valor supremo, e regras específicas para quando os bancos intervenham em certos negócios um atropelo.

Isto acham eles. Já a mim, que não tenho albardas doutrinárias que me toldem nem o sentido de justiça nem o prático, me parece que a actividade bancária é hoje de tal modo hiper-regulamentada que, não fosse a experiência histórica de a gestão pública ser invariavelmente um desastre (a verdadeira génese dos problemas do BES, por exemplo, foi a nacionalização, não a personalidade concreta de Ricardo Salgado), bem poderia ser exclusivamente pública;  e que pretender que há liberdade contratual a negociar com um banco é uma piedosa ficção, a somar a várias (competência da gestão e razoabilidade dos respectivos prémios, por exemplo,  entre muitas outras – não me ocupo disso agora, que estou com falta de vagar). Donde, uma severa vergastada na arrogância bancária poderia ter o salutar resultado de diminuir o contencioso, incentivar mais prudência na avaliação do risco e, quiçá, contraditoriamente, levar o sistema a virar-se mais para a produção de outros bens e serviços e menos para a construção civil.

O poder judicial põe e o Poder dispõe. Porque o senhor Presidente do STJ não podia adivinhar o que o Governo viria, nas costas da opinião pública e na da publicada, a fazer. E o que está a fazer, para além de sonegar informação ao Parlamento, o que só por si deveria ser matéria para um severíssimo puxão de orelhas de quem (não) garante o regular funcionamento das instituições democráticas, só não é um escândalo porque os meus concidadãos, da coisa pública, não querem saber nada, excepto se forem funcionários públicos ou reformados ou pensionistas, caso em que pretendem aumentos.

Pois bem, de Bruxelas vem isto: “Tendo em vista o reforço da posição do credor hipotecário (mortgage lender/creditor) proceder-se-á à revisão do regime de preferência do direito de retenção no confronto com a hipoteca’, pode ler-se na parte dedicada às insolvências e ações executivas”.

Sabe-se, desde a resolução do BES, que a UE quer que os bancos portugueses sejam espanhóis, coisa que aliás em parte já acontece, para “ganharem dimensão”, e que entretanto o que existe seja regulado por um balcão do BCE, a que por tradição se continua a chamar Banco de Portugal. Quer também a diminuição da tíbia concorrência, para a inépcia se repoltrear no sucesso e os clientes poderem ser saudavelmente explorados. Isto com alguma caridade, se se quiser acreditar que quem rumina estas coisas não faz parte do sistema de portas giratórias entre as instâncias politicamente decidentes e as administrações dos bancos.

Este caso demonstra três coisas, todas irrelevantes: uma que Portugal é uma região europeia onde com generosidade uma casta de inimputáveis parasitas (a burocracia europeia, incluindo eurodeputados, é isso) permite uma bandeira, um Parlamento livre para determinar tudo menos o essencial, uma tradição culinária própria, o fado e o galo de Barcelos; outra é que a independência (isto é, a que pode ter uma pequena nação) já desapareceu há muito; e a última que, a troco de dinheiro, a desprezível escumalha que com geral satisfação nos rege abdica de tudo para ter os meios de manter sossegada aquela crescente parte da população que depende do Estado para a sua sobrevivência.

Pena o episódio não ter tido lugar há três semanas: daria um óptimo epitáfio.

Palheiro já existe, só falta a agulha

Pedro Correia, 13.05.21

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Na hora de gerirem participações empresariais com dinheiro emprestado, não se fazem rogados: é tudo à grande. Mas quando chega o momento de prestar contas, com o país de holofotes colocados apontados para eles, começam a gaguejar, têm súbitos lapsos de memória, fazem de conta que não é nada com eles. São “empresários” que nada empreendem e "gestores" que mal sabem gerir seja o que for: durante anos viveram de créditos sobre créditos, beneficiando de uma banca complacente, que emprestava primeiro e só pedia garantias depois. Como se adivinhassem, uns e outros, que no final do túnel, já sem luz, o Estado serviria de bóia de salvação. Com os contribuintes portugueses a pagar este buraco sem fundo.

Se algum mérito tem a comissão parlamentar de inquérito aos grandes devedores do Novo Banco (NB) é este: pôr ainda mais a nu as debilidades estruturais do nosso sistema financeiro, fazendo desfilar no palácio de São Bento alguns dos maiores responsáveis, directos e indirectos, pela derrocada de grupos empresariais que se alimentavam dos balões de oxigénio do BES antes de também este entrar em coma.

 

Não têm faltado intervenções patéticas. Mas nenhuma excedeu em desfaçatez a de Luís Filipe Vieira, que se diz muito espantado por ser o segundo maior devedor do NB – como se tivesse sido o último a saber – e sugere estar a ser perseguido por ser presidente do Benfica. Como se isto não lhe servisse de circunstância atenuante.

Basta recordar que em Outubro o primeiro-ministro António Costa e o presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Fernando Medina, aceitaram integrar a Comissão de Honra da sua recandidatura à liderança do clube encarnado. E que durante anos o actual presidente do Banco de Portugal, então ministro das Finanças, se sentava ao lado dele na tribuna principal do estádio da Luz – o mesmo Mário Centeno a quem, por ironia do destino, Vieira agora lança farpas envenenadas. Algumas de péssimo gosto, como quando confessou aos deputados, nesta segunda-feira, que gostaria de vê-lo “enforcado”. Por dizer algo com muito menos gravidade num estádio de futebol qualquer membro do plantel do Benfica receberia cartão vermelho e seria punido com vários jogos de suspensão.

 

Como é possível o empresário Vieira ter chegado a acumular dívidas de mais de 410 milhões de euros a uma instituição hoje comprovadamente descapitalizada e ainda por cima agir como virgem ofendida, como se fosse ele o credor? Por que tortuosas vias se movimenta alguém que declara apenas possuir em nome próprio um palheiro com logradouro enquanto se gaba de gozar “uma boa reforma” e prescinde até de remuneração no exercício da presidência da SAD do Benfica? Como é que o autoproclamado “homem do povo” degenera em campeão do calote?

Demasiadas perguntas ainda sem resposta. Se levarem esta missão a bom porto, doa a quem doer, os deputados contribuem para combater o pior dos populismos. E restituem alguma decência à vida pública portuguesa. Mas a missão que têm pela frente não é fácil. Palheiro, já existe. Agora falta lá encontrar a agulha.

Banco dos suspiros

José Meireles Graça, 17.02.21

Não sei se já tive oportunidade de informar que tenho um anjo da guarda negativo, que crismei de Segismundo num momento de inspiração. A qual talvez tenha sido induzida por obscuras forças do Além.

Descobri isso ao tempo em que jogava buraca. O galo persistente ao jogo (esse ou outro qualquer) tinha de ter uma explicação sobrenatural.

Dia sim dia não o Segismundo dá sinal de si. E hoje, consultando o meu misérrimo saldo bancário, descobri que ontem uma Netflix.ComAmsterdam – International havia debitado na minha conta 11,57€.

Sucede que não sou, nem nunca fui, cliente da Netflix; que não dei ordem de qualquer pagamento; que a conta em questão está apenas em meu nome; que tem apenas um cartão, de débito, associado; que não recebi nenhuma chamada telefónica com um código a autorizar semelhante pagamento; e que o cartão em apreço há muito que não é utilizado senão para fazer levantamentos nessas máquinas ATM que dão dinheiro às pessoas.

Inteirado telefonicamente o BancoCTT deste triste sucesso, e depois da troca de impressões surreal que rodeia estas interacções, concluiu-se pelo cancelamento imediato do cartão, a informação de que receberia um outro sem custos excepto uma taxa anual não sei quê (ou seja, não pago nada, salvo o que tiver de pagar) e que teria de me deslocar a uma agência para reclamar.

Assim fiz. E a funcionária que atendeu o “senhor José” (porra, quando foi que a geração mais bem formada de sempre desaprendeu as fórmulas correctas de tratamento?) explicou-me pacientemente tudo o que já sabia sobre a forma como estes débitos se processam, tratou de forma dubitativa a minha história e esclareceu que teria de preencher uma reclamação, que porém requeria uma queixa prévia na PSP. Acrescentou ainda que seria provável que me viesse a ser pedida uma declaração da Netflix certificando não ser cliente.

Informo com assumido orgulho que não mandei a funcionária para o diabo que a carregue, e que pelo contrário a informei supranumerariamente que era o que faltava ir à polícia por causa de 11, 57€ e que ia mazé apresentar queixa no Banco de Portugal.

Treteiro que sou: o problema da queixa à polícia não é o montante, mas a certeza de que não serviria para nada senão para perder tempo e receber passados uns longos tempos uma notificação de que o estrugido ficava a “aguardar a produção de melhor prova”; e do Banco de Portugal, sua função de supervisão, seu tratamento de reclamações, não digo nada, por pudor.

Lembrei-me de escrever à Netflix. E o diálogo com esta empresa, num “chat”, figura abaixo. Quem não tiver paciência para ler pode ir para a parte final, que é o que interessa. E para quem nem isso queira, antecipo a moralidade, em inglês que hoje estou cosmopolita: BancoCTT sucks; Netflix is OK.

You

My banking account has been charged yesterday with 11,57€, by NETFLIX.ComAmsterdam - International. However, I am not, nor have ever been, a NetFlix customer, and I haven't allowed any payment. My debt card has always been with me, and I don't use it for anything but getting cash on ATM machines. The bank asks for a declaration of NetFlix stating that I am not a customer nor have made any payment. Even though the bank is obviously finding excuses for not refunding, and acting in bad faith etc

 

Quime Ni�ovir Netflix

Thanks for contacting Netflix. How can I help?

 

You

Please read what I have written.

 

Quime Ni�ovir Netflix

my apologies that i can't see all of the details above. can you please tell me more about your concern?

 

You

Again: I've been charged with 11,57€ in my banking account by NETFLIX.COMAmsterdam - International. However, I am not a customer.

 

Quime Ni�ovir Netflix

let me help you with your concern just Please do not click/tap the "Back" button and respond in a timely manner to avoid auto disconnection of this chat.

 

Quime Ni�ovir Netflix

just to confirm that you don't have any Netflix account before, right?

 

You

Right.

 

Quime Ni�ovir Netflix

Now, let's try to locate the account by payment method where you have been charge,

 

Quime Ni�ovir Netflix

I’ll send a secured form to locate the account, okay?

 

You

OK

 

Quime Ni�ovir Netflix

okay

 

Quime Ni�ovir Netflix

please enter the information without a space in between

 

Quime Ni�ovir Netflix

and Please do not click/tap the "Back" button and respond in a timely manner to avoid auto disconnection of this chat.

 

Quime Ni�ovir Netflix

was the charge been take from a card? and if it is a card, can you please provide the last 4 digits?

 

You

xxxx

 

Quime Ni�ovir Netflix

as per checking that there is Unrecognized account link to the payment method you've provided. since this is an Unauthorized charge, we will block the card, cancel the account and have a refund on the last charge. in order to do so, i need your complete name, the cardholder's name the last 4 digits of the card and the preferred email?

 

You

Jose Xxxxx Xxxxxxx xx Meireles Graca, JOSE GRACA,xxxx, *************************

 

Quime Ni�ovir Netflix

let me process it for a moment and i'll let you know once i'm done. just please stay on the chat. ok?

 

Quime Ni�ovir Netflix

Please do not click/tap the "Back" button and respond in a timely manner to avoid auto disconnection of this chat.

 

You

OK

 

Quime Ni�ovir Netflix

okay

 

Quime Ni�ovir Netflix

i'm already done processing on it. i'd like to inform you that you may need to change your card numbers that this might have been use outside of Netflix transaction. Refund may take a few days depending on how quick your bank provides it and mostly that it arrives in 8 to 10 business days, and it rarely arrives in a maximum of 30 business days

 

Quime Ni�ovir Netflix

are you still there?

 

Quime Ni�ovir Netflix

Please do not click/tap the "Back" button and respond in a timely manner to avoid auto disconnection of this chat.

 

You

This card has been cancelled today as it has been the object of a fraudulent transaction, but OK, I hope the bank won't pose any difficulties. Thank you.

 

You

Yes, I'm still here.

 

Quime Ni�ovir Netflix

you're welcome

 

Quime Ni�ovir Netflix

that's great

 

Quime Ni�ovir Netflix

is there anything else i can help you with?

 

Quime Ni�ovir Netflix

For future concern, you can check help.netflix.com

 

You

No. Thank you very much, you've been most helpful.

 

Quime Ni�ovir Netflix

you're welcome

 

Quime Ni�ovir Netflix

Thank you so much for your time. Take care always. Bye. you can now click the "End" button on the screen.

Uma gestão para pobres

Sérgio de Almeida Correia, 11.02.21

"Nos depósitos, a CGD fará com que as contas CaixaPoupança Reformado, CaixaPoupança, CaixaPoupança Emigrante e CaixaProjecto vejam a sua remuneração baixar de 0,015% para 0,005%, a partir dos 250 euros. (...)

Na CGD, relativamente a cartões de débito, o custo da disponibilização sobe dos 18 para os 19 euros (mais imposto do selo) para os cartões do tipo Caixa Maiores Acompanhados, Caixa IU, Caixa Débito, Caixautomática Electron, Caixautomática Maestro, Maestro RE, Caixa Activa, Débito Nacional, Caixa Azul e Visa Electron RE.

O levantamento de dinheiro ao balcão com caderneta ficará também mais caro, dada a implementação de uma comissão única de 4,65 euros mais imposto do selo, que eleva o preço para 5,15 euros.

Atualmente, o levantamento ao balcão com caderneta custa 3,00 euros (3,12 com o imposto). (...)

Na CGD, as transferências efetuadas para outros bancos através do 'site' do banco ou da aplicação móvel vão aumentar de 80 para 95 cêntimos, a que se acresce o imposto do selo (99 cêntimos no total), tal como acontecerá em transferências internacionais."

Enquanto não os põem na TAP a mostrar que o seu valor tem asas, alguém tem de pagar os bónus do "bispo" Macedo e demais apóstolos.

Pena é que algumas instituições do Estado, das quais não se pode fugir, nos obriguem a ter uma conta na CGD.

Como era bom que fosse verdade

Paulo Sousa, 04.08.20

Depois de mais de quatro mil milhões de euros injectados na CGD desde 2011, com a justificação que era necessário existir um banco público para que o Estado podesse assegurar o financiamento de projectos que entendesse como sendo estratégicos, o lançamento do Banco Português de Fomento, exactamente com o mesmo propósito, abrirá certamente a porta à privatização da CGD.