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Delito de Opinião

Enquanto se discute esse tema candente do enquadramento das curvas das senhoras advogadas nos regulamentos

Sérgio de Almeida Correia, 20.12.13

"A decisão do Tribunal Constitucional (TC) foi a esperada. A sua unanimidade é, só por si, esclarecedora. O Governo apostou, de novo, no risco dos limites constitucionais e desvalorizou princípios essenciais do Estado de direito que existem antes e acima dos credores. A convergência das regras da Segurança Social (SS) e da Caixa das Aposentações (CGA) é correcta. Mas o executivo foi demasiado longe com a retrospectividade do cálculo de pensões já formadas. O défice não se resolve com o excesso. Portugal não é uma república das bananas nem das laranjas." - Bagão Félix, Público, 20/12/2013

 

Estas linhas de Bagão Félix sintetizam, no essencial, o problema e a razão do unânime chumbo. Dir-se-ia que a unanimidade nunca foi tão democrática, pois que, inclusivamente, permitiu que as conselheiras Fátima Mata-Mouros, indicada pelo CDS, e Maria José Rangel Mesquita, indicada pelo PSD, apresentassem declarações de voto* sublinhando a flagrante violação do princípio da proporcionalidade. E nem mesmo o presidente do TC se esqueceu de referir, a pedido dos jornalistas, que "nenhum tribunal digno desse nome aprecia uma norma sem levar em conta o contexto". Para depois não virem acusar o TC de insensibilidade, falta de apoio ao Governo e outros disparates do mesmo jaez.

Mais do que um chumbo e dos problemas que continuarão por resolver face à incompetência e impreparação de Passos Coelho e dos jotinhas que aquele colocou em lugares-chave do poder - no que em nada se distinguiu do seu antecessor, como múltiplas vezes avisei neste mesmo espaço há mais de dois anos -, mas também graças à falta de coragem do Presidente da República em tomar decisões nos momentos oportunos, optando sempre por deixar correr o marfim a ver se escapava incólume para a Coelha, enquanto o País continuava a afundar-se "para além da troika", a decisão ontem conhecida confirma que o TC está onde sempre esteve, independentemente de se saber quem indicou quem. Esta é uma boa notícia.

Os portugueses podem continuar a contar com o TC. Contudo, seria bom que os portugueses também compreendessem que não é ao TC que compete reformar as instituições, reformar os partidos políticos, reformar a classe política e os modelos de formação, recrutamento e selecção do pessoal político. Estas são tarefas que competem única e exclusivamente aos portugueses e que apelam a uma maior participação e envolvimento nas instituições que detêm o exclusivo da representação política no nosso sistema constitucional: os partidos. Por isso, se quiserem mudar alguma coisa, só têm um caminho e este passa por se inscreverem nos partidos, formarem novos partidos, se entenderem fazê-lo, participarem na formação das decisões, correrem com a malta que tomou conta dos partidos e começarem tudo do princípio preparando, agora sim, o pós-troika. Se necessário acabando de uma vez por todas com as "jotas" e integrando todos os que queiram participar e tenham mais de 18 anos nos próprios partidos.

Momento mais oportuno será difícil voltarem a ter. Oxalá tenham aprendido alguma coisa com o passado e com o que estão a passar.

 

* - Corrigido após oportuno reparo de um leitor

Não será antes um problema de entendimento?

Sérgio de Almeida Correia, 05.04.11

"O sucesso da democracia não é apenas questão de se ter a mais perfeita estrutura institucional que possamos imaginar. Inevitavelmente, ele também há-de depender dos nossos reais padrões de comportamento e do funcionamento das interacções políticas e sociais. Não se pense que se pode abandonar o problema nas mãos 'seguras' do puro virtuosismo institucional. O funcionamento das instituições democráticas, e o mesmo acontece com todas as instituições, depende da actividade dos agentes humanos no sentido de conseguirem utilizar as oportunidades conducentes a realizações razoáveis" - Amartya Sen, A Ideia de Justiça.

 

 

A mentira é hoje uma verdade. A mentira faz parte do nosso quotidiano. Mas não apenas a mentira. O enviesamento dos factos e da forma como os mesmos devem ser lidos é uma constante desse jogo em que os nossos líderes e dirigentes políticos se especializaram.

Começa no Presidente da República (no actual, que os anteriores tinham outro estilo, outro savoir faire), continua nos primeiros-ministros, nos ministros das Finanças, prossegue nos presidentes do PSD, continua, sempre numa vertigem descendente, nalguns senhores deputados, nos dirigentes da bola, e vai por aí fora até encontrar o seu apogeu nalguns profissionais do sindicalismo e da arruaça.

Mas quando um conselheiro de Estado, que já foi ministro das Finanças e é hoje comentador encartado, resolve sair à rua para esgrimir desta forma os seus argumentos com um primeiro-ministro demissionário que anda pelas ruas da amargura, será legítimo pensar que ou o senhor não tem a noção do seu papel de conselheiro, e nesse caso devia ficar calado, ou então está a desempenhar um papel para o qual foi "indicado" por aquele outro senhor que não imaginava que até os sistemas informáticos do Pentágono podiam ser pirateados. E que ainda hoje está convencido de que o pagamento voluntário de impostos limpa os favores de que não se desconfiou, quando seria legítimo acreditar que qualquer bom pai de família teria desconfiado, e se beneficiou, quando não se devia ter beneficiado. 

De um já havia a ideia, cada vez mais consistente, de que tinha dificuldades em ver os factos na sua crueza, sem óculos de correcção, e mais ainda em relatá-los a terceiros. Como os seus próprios eleitores.

Do outro tem-se hoje a certeza, pelas declarações que proferiu, que se assume, e ele que como bom cristão me perdoe se exagero, como um fala-barato esforçado, sem categoria para conselheiro de Estado, e que não se importa de colocar o órgão que ainda agora integrou, o único que até hoje ia passando incólume por entre os salpicos da lama - não obstante os múltiplos esforços em contrário de Alberto João Jardim -, ao nível de uma assembleia de accionistas de uma qualquer empresa dependente do Estado. Como uma PT, por exemplo. 

Depois das declarações do conselheiro Bagão Félix, e assumindo ele nesse filme, aparentemente, o papel de um Zeinal Bava inexperiente, os portugueses certamente que quererão saber quem será aquele que no Conselho de Estado assegurará o papel que antes era o de Rui Pedro Soares na PT. E por quem é que esse terá sido indicado. Temo o pior.

As declarações de Bagão Félix, pela oportunidade com que são feitas, são uma certidão de óbito do actual Conselho de Estado. Mais um prego, e dos bons, no caixão do regime democrático.

O Prof. Cavaco Silva já não precisa de se incomodar em discursar no próximo dia 25 de Abril. Bagão Félix, solícito e reverente, poupou-o a essa maçada. Pelas palavras que tão depressa profere como pelas que não profere e pelas escolhas que faz, o Presidente da República é o coveiro-mor do regime. Os outros, os que aí andam, a começar pelo rei da poncha, não passam de aprendizes.

E depois, quando o regime implodir, não se esqueçam de vir falar na Pátria. E de se queixarem.