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Delito de Opinião

A instalação

Paulo Sousa, 01.11.25

Não era para aqui postar sobre a instalação da Junta de Freguesia do Juncal, que decorreu ontem à noite, mas a toque de caixa do postal do nosso jpt, aqui vai um breve relato do que me pareceu mais relevante.

Por se tratar de uma Freguesia sem as dezenas de milhares de fregueses que os Olivais tem, o executivo é composto por três elementos. Tudo correu linearmente, sem sobressaltos nem surpresas. No final discursou o novo Presidente da Junta e a nova Presidente da Assembleia de Freguesia. Nada haveria a reportar, não fossem duas frases neste último discurso. E dir-me-ão: Não são precisas duas, pois basta uma frase para tornar um discurso memorável. É verdade, mas para não ser injusto no relato, importa um pequeno enquadramento prévio. Como já disse, a terra é pequena e os relacionamentos funcionam em circuitos da mesma proporção. É fácil ter gente que se tem por amiga em listas que se opõem e as frases que aqui nos trazem foram proferidas não em desagravo da campanha, que correu de forma ordeira, mas como caloroso cumprimento entre quase compadres, um como cabeça de lista derrotado e o outro a já referida oradora.

Ouvindo a primeira destas duas frases, o público entendeu que o agora líder da oposição também a terá convidado para que pertencesse à sua lista. Explicou que não pode aceitar porque já estava comprometida, desde o dia anterior, com a lista que acabou por vencer. E em seguida todos ouvimos um “Devias ter-me convidado mais cedo."

Alguém vindo de fora que assistisse à instalação poderia julgar estar perante um caso dum apego maior ao cargo, à participação, do que às cores partidárias, ou até, à identificação para com a respectiva equipa e cabeça de lista. Eu, que gosto de viver em paz e, por isso, me tento abster de julgamentos de intenções, entendi que o único propósito era o de relevar o facto de duas pessoas próximas estarem em listas oponentes.

Só mais tarde é que dei por mim a pensar que aquela última frase destruiu uma teoria que frequentemente defendo. Até à instalação de ontem à noite, estava praticamente convencido que relativamente às suas congéneres femininas, os gajos demoram sempre mais tempo a apanhar o que anda pelo ar. Quando nós pensamos que alguma coisa que foi dita, insinuada ou apenas imaginada, pode desencadear um ou vários cenários e interpretações, já elas sabem o que fazer ou dizer no dobro dessas hipóteses.

E foi por isso que fiquei intrigado. Ela disse o que disse, sem se aperceber do que disse, o que derrete a minha teoria, ou será que tenho razão e todos assistimos a verdadeiro momento chutzpá ao vivo?

As autárquicas 2025, o rescaldo

Paulo Sousa, 16.10.25

Olhando para os resultados das autárquicas do passado dia 12 na nossa região, é fácil de concluir que o caso de Porto de Mós foi em muito idêntico ao de Alcobaça. Os dois Presidentes em funções, Jorge Vala e Hermínio Rodrigues, ambos do PSD, apresentaram-se a votos e além de terem conseguido ganhar, também reforçaram muito significativamente os seus resultados. Nestes dois concelhos vizinhos os sete mandatos foram atribuídos de forma idêntica, cinco vereadores para o PSD, um para o PS e outro para o Chega.

Quase tirado a papel químico, esta é uma expressão ultrapassada vinda de um tempo antigo, o PS apresentou-se nos dois Municípios com candidatos praticamente desconhecidos, e que em toda a campanha nunca conseguiram mostrar que aspiravam a algo mais do que marcar presença. Fernando Gomes e Diogo Ramalho terão alcançado os piores resultados de sempre do Partido Socialista em cada um dos seus concelhos. O primeiro é um auto-denominado empresário de sucesso e o outro mestre pelo ISCTE e funcionário da Administração Pública.

A Nazaré é um caso diferente. Apesar de ser um tradicional bastião socialista, o Chega tinha sido o mais votado nas Legislativas de Maio passado. Não há dúvida que a sucessão dos cabeças de lista do PS, que tinha a Câmara, não correu bem. O anterior Presidente socialista, Walter Chicharro, atraído por um lugar elegível para a Assembleia da República, interrompeu o seu mandato e entregou os destinos da Câmara ao seu vice. A mudança poderá não ter agradado aos eleitores, o que juntamente com a crise no sistema de saneamento, que levou a várias interdições da praia durante o Verão, acabaram por permitir a vitória do PSD, embora com os mesmos três mandatos que o PS. O sétimo vereador foi atribuído ao Chega.

Nestes três Municípios, tal como no resto do país, a votação no Chega não chegou a metade dos votos das recentes Legislativas.

Ainda sobre Porto de Mós, a Iniciativa Liberal conseguiu um mandato para a Assembleia Municipal e dois para a Assembleia de Freguesia da Mira de Aire, tendo aí ficado à frente do PS.

Relativamente à Junta de Freguesia do Juncal, o vencedor foi Vítor Raimundo pelo PSD, que em 2021 tinha deixado escapar a vitória por apenas nove votos, numa eleição em que havia uma lista independente. Desta vez, já com o cabeça de lista desses independentes em segundo lugar, conseguiu vencer Júlio Ribeiro, que se apresentou sob a sigla do PS.

A nível nacional, José Luís Carneiro estará aliviado pela derrota do PS em Lisboa, que assim afasta da ribalta a narrativa pedronunista. Dificilmente afastará a facção derrotada dos acólitos do anterior Secretário Geral, mas pelo menos terão de mudar de narrativa. Talvez se estivesse a referir à queda dessa facção interna, quando, mesmo perante mais uma derrota eleitoral do partido, tivesse afirmado que o PS está de volta. Quando o disse, não estaria a querer enganar o país, mas a falar para dentro do partido.

Este homem ri de quê?

Pedro Correia, 15.10.25

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Paulo Raimundo em conferência de imprensa na noite de domingo, 12 de Outubro, após o Partido Comunista Português ter sido copiosamente derrotado nas duas últimas capitais de distrito que ainda dominava - Évora, onde foi terceiro, e Setúbal, onde ficou em quarto - e ter perdido o último bastião autárquico a norte do Tejo (Sobral de Monte Agraço). Viu fugir mais de um terço das autarquias vermelhas, já muito escassas: Alcácer do Sal, Benavente, Grândola, Monforte, Santiago do Cacém, Serpa, Viana do Alentejo e Vidigueira - além das antes mencionadas.

Assim se vê a decadência do PC.

E no entanto, ele vai rindo. E os camaradas também. Falta saber de quê.

Chega, Chega, Chega, Chega, Chega, Chega, Chega, Chega, Chega, Chega

Pedro Correia, 14.10.25

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Ontem à tarde acompanhei, em dois canais de notícias, debates pós-eleitorais com vários comentadores a analisar as autárquicas. Em ambos o Chega "venceu" por maioria absoluta. Nenhum outro teve sequer um tempo de antena aproximado. 

O debate da SIC Notícias durou 26 minutos. Período em que o Chega foi mencionado 52 vezes (uma a cada 30 segundos), deixando todos os outros a larga distância. O segundo foi o PS (24 vezes) e o PSD fechou o "pódio" (12 vezes). Os restantes? Bloco de Esquerda seis vezes, AD cinco, CDS três, PCP uma.

O debate da CNN Portugal durou 19 minutos. Com domínio ainda mais esmagador do partido de André Ventura: mencionado 44 vezes. Aqui também o PS em segundo (18 vezes). Depois o BE com sete, o PSD com apenas três. A conta completou-se com singelas menções à AD e ao Livre: uma cada.

Nada mais.

 

Assisto, perplexo, a este frenesim comentadeiro em torno do Chega nos mesmos canais que passam o tempo a "denunciá-lo". Atracção e repulsa em simultâneo, com incompreensível desproporção face a outras forças políticas.

Ouvindo estes debates, dir-se-ia que Ventura foi o grande triunfador destas autárquicas em que afinal perdeu cerca de 800 mil votos na comparação com as legislativas de 18 de Maio e venceu em apenas três municípios, perdendo nos restantes 305. Dez vezes abaixo da marca que previu.

Em número de presidências de câmara, o Chega estacionou em sexto - atrás do PSD (135), do PS (128), dos movimentos independentes (20), da CDU (12) e do CDS (7). Contrariando em toda a linha o que Ventura anunciara poucos dias antes do escrutínio: seria «impensável» ficar abaixo de comunistas e centristas. Mas ficou. 

Não pode queixar-se, porém. Nos canais de notícias, os comentadores continuarão infatigavelmente a falar dele e do seu partido - dando-lhe palco, dando-lhe gás. Como se vencesse em toda a linha, mesmo quando perde. Como se os outros quase nem existissem, mesmo quando ganham. 

Nos intervalos, a tribo comentadeira queixa-se do "extremismo" e do "populismo". Que vão medrando precisamente com o prestimoso auxílio destes canais.

As minhas autárquicas

Maria Dulce Fernandes, 13.10.25

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Os meus netos foram comigo aos votos. Ele ainda não está politizado, felizmente. Ela já tem algumas ideias, quase todas boas, passadas por mim [LOL]

Qual não foi o espanto da minha neta, quando reparou onde eu estava a colocar as cruzes - "Avó! Estás a ver onde estás a votar?" "Estou sim. Creio que estou a votar como deve ser." "Mas Avó, tu detestas esse partido! Disseste um dia que se votasses nele, era capaz de te cair uma mão"!

"Nestas eleições para as autarquias, para além da filiação partidária, existem pessoas capazes e que muito têm feito pelo concelho e pelas freguesias. A nossa Junta de Freguesia tem funcionado com pessoas preocupadas, que têm feito muito pela zona e pelos seus habitantes, e que têm uma agenda de trabalhos extraordinária que, em os conhecendo como conhecemos há já alguns anos, não temos dúvidas que é para realizar com toda a brevidade possível e necessária. Funcionam muito bem e estamos todos contentes com o seu trabalho. Mexer para quê"? Por vezes tem de se votar em pessoas com capacidades reconhecidas, independentemente dos partidos. Entendes?" "Sim, entendo... Mas não te vai cair uma mãozinha, pois não?"

Seixal 2025

João Sousa, 10.10.25

Lembrei-me desta cena do clássico Aeroplano quando, na manhã de quarta-feira, tentei atravessar a estação da Fertagus no Fogueteiro. Em distribuição de folhetos de propaganda,  gente do PS, AD e Bloco (e penso ter visto também um elemento da IL) empatava a vida dos passageiros. O PS, com precisão militar, chegou a colocar batalhões nas duas saídas laterais para evitar tentativas de evasão. Do Chega não vi ninguém, mas creio que há algumas semanas que anda por ali um carro de campanha (considerando que vou àquela estação um par de vezes por semana, faço esta extrapolação com bastante confiança).

A única força política que não vi lá com folhetos - foi a CDU. Nem tenho visto muitos "meios humanos" aplicados pela CDU nestas autárquicas. Por exemplo, ao contrário do que é habitual, não ouvi nenhum carro de campanha aqui no bairro. Pelo que vejo nos sítios que frequento (entre o Seixal e Fernão Ferro), a CDU tem-se limitado a uma campanha bastante conservadora: cartazes nas ruas e folhetos no correio, mas pouco mais além disso. Podem especular se a CDU não estará a gastar pouco por ter confiança na vitória. Eu acredito no contrário: que a CDU está, isso sim, a considerar a câmara do Seixal como muito provavelmente perdida, e por isso evita enterrar aqui muito dinheiro.

(Por conversas que tenho tido com pessoas próximas do PCP, também Setúbal e Palmela são autarquias que o partido encara com bastante apreensão).

Já em 2021 especulei que o PS investira muito em propaganda por sentir que tinha uma forte possibilidade de ganhar a Câmara do Seixal. Acabou por ficar em segundo, com menos 7% (cerca de 4000 votos de diferença). Este ano, voltou a investir fortemente, começando logo em Fevereiro com uma campanha "teaser":

teaser de campanha

Mas talvez a confiança do PS tenha sido prematura...

Depois daquele arranque de campanha, aconteceram as legislativas que chocaram tantos com a vitória do Chega no concelho do Seixal. É verdade que a distância entre o Chega e o PS foi inferior a 0,5%, mas a vitória do Chega em Fernão Ferro foi mais do que clara, tendo o PS (que até ficou em terceiro, atrás da AD) menos quase 10% dos votos. Fernão Ferro é uma freguesia que tem crescido em população, e muita dessa população vem de Lisboa e arredores. Vindo de fora, muito desse eleitorado não tem a "fidelidade autárquica" das outras freguesias, limitando-se a transferir para essas eleições o seu voto legislativo: não será por acaso que, desde 2017, a freguesia de Fernão Ferro é socialista (a única do concelho).

É claro que resultados de legislativas não são extrapoláveis para autárquicas (o próprio André Ventura o disse recentemente). Mas o resultado das legislativas aqui no concelho, a maneira como ele foi obtido, e o facto de a candidata do Chega no Seixal ser uma das suas vice-presidentes, faz-me crer que André Ventura está a investir bastante aqui nas autárquicas. E seria irónico que, após tantos anos de tentativas, o PS visse, finalmente, a CDU perder a câmara do Seixal - mas para o Chega.

As autárquicas 2025 em Porto de Mós

Paulo Sousa, 10.10.25

A campanha aqui por Porto de Mós tem andado muito calma, especialmente se comparada com a de há quatro anos. O terceiro mandato de Jorge Vala, pelo PSD, parece ser uma inevitabilidade. Já aqui tinha reportado que os elogios à sua governação alargam-se até ao candidato da CDU.

Foram realizados três debates entre os candidatos à Câmara, sendo que o candidato do PS compareceu apenas no terceiro. Assisti ao mesmo durante uns minutos via Facebook e reparei que Fernando Gomes (tive de fazer agora uma pausa para ir procurar o nome dele, uma vez que ainda não o memorizei) repetiu várias vezes a palavra “lunático”, normalmente na incluída na frase “e eu é que sou o lunático!”. Mais tarde li um comentário de alguém que se deu a esse trabalho e contou 22 repetições dessa expressão. Se não soubesse qual o candidato de cada partido, diria que era Fernando Gomes que se apresentava pelo Chega e não o motorista de pesados e organista de bailes Licínio Ferraria. A promessa eleitoral mais proeminente do PS é fazer o que ainda não foi feito. Segundo esse comentário que li, os dois primeiros debates terão sido os que correram melhor ao candidato socialista.

Acreditando nos mentideros, Fernando Gomes, autoproclamado empresário de sucesso, com a esposa e filhos a viver em Amsterdão, terá sido imposto pela distrital do partido. No primeiro momento seria o candidato à Junta da Mira de Aire, mas muito rapidamente foi lançado para a Câmara.

A Iniciativa Liberal irá pela primeira vez concorrer à Câmara e à Assembleia. Para a Junta de Freguesia, e pelo que me recordo, concorre apenas em Mira de Aire. O candidato à Câmara é Marcos Ramos. Compareceu em todos os debates mas só neste último é que foi possível constatar que a sua candidatura é uma afronta a quem gosta de caracterizar a IL como o partido dos ricos e burgueses, uma vez que, olhando para todo o espectro político, é o único que não apresenta uma barriga saliente.

Uma nota final para outro debate, o da Junta da minha Freguesia do Juncal, onde, às páginas tantas, o candidato do PS sentiu necessidade de dizer “nunca fui do PS” acrescentando que está simplesmente a concorrer sob a sigla do PS. Não sei se o disse de forma consciente e deliberada ou simplesmente espontânea, mas permitiu-me confirmar a dinâmica de perda do partido que há muito pouco tempo nos governava com uma maioria absoluta.

Quarta-feira passada houve porco no espeto, imperial e vinho em box à frente do Salão Paroquial, por conta do PSD e hoje será no Parque Verde, servido pela lista que se candidata sob a sigla do PS.

Adoro eleições autárquicas.

Justiça e jornalismo, viveiros de populistas

Pedro Correia, 10.10.25

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Encerra hoje a campanha eleitoral para as autárquicas do próximo domingo. Ignorada em larga medida pela generalidade dos órgãos de informação, que adoptaram a mesma grelha editorial aplicada às eleições para a Assembleia da República. Vigora a lei do menor esforço: as equipas de reportagem seguem a agenda diária dos "líderes", mesmo sabendo que nenhum deles é candidato a lugar algum neste escrutínio. Estão em Vinhais, Alcobaça ou Alhos Vedros integrados na comitiva dos caudilhos partidários como se caminhassem numa rua de Lisboa. Não fazem qualquer pergunta de âmbito local ou regional: só se interessam pela politiquice nacional.

Toda a campanha foi percorrida por temas laterais. Desde a ardilosa travessia mediterrânica da doutora Mortágua até ao famigerado "caso Spinumviva" - enésima intromissão do Ministério Público em campanhas eleitorais, repetindo o sucedido em Março. Na altura o tiro saiu-lhes pela culatra: a AD ampliou o elenco parlamentar e o PS sofreu a mais humilhante derrota da sua história. Faltam 48 horas para sabermos se isto vai repetir-se, desta vez no plano autárquico. 

Agora que tanto se fala em populismo, aqui fica o sucinto balanço desta campanha em que foi notória a falta de sintonia entre o país mediático e o país real. Tanto o manifesto desinteresse dos jornalistas pelo Portugal profundo como a crescente politização dos órgãos de investigação criminal apenas contribuem para o aumento das forças populistas que uns e outros dizem desprezar.

André Ventura certamente agradecerá: desta vez nem precisou de protagonizar nenhum psicodrama hospitalar para levar a água ao seu moinho. A desvalorização do carácter local e regional desta campanha beneficia o Chega, menos implantado no terreno do que as forças políticas tradicionais. E a instrumentalização de jornais e televisões pelas habituais fontes anónimas do Ministério Público contaminou fatalmente o debate político, induzindo a noção de que a "roubalheira" é endémica neste país carente de uma falange salvadora contra a "impunidade".

Depois não se queixem.

Tesouros das Autárquicas - 3

Paulo Sousa, 17.09.25

"Em Porto de Mós há pouco para inventar. Quando me perguntam por projectos, olho para o que está feito pela Câmara e confesso que tenho pouco a acrescentar. Não me quero desviar nem um milímetro de quem tem feito um bom trabalho. (...) O que posso mudar no concelho quando a Câmara está a fazer um bom trabalho? (...) Não posso acrescentar muito mais, a não ser elogiar o trabalho. (...) Perguntam-me ainda o que pode ser feito, mas é difícil. Quem chega a Porto de Mós vê uma vila bonita, há bons jardins, temos bicicletas instaladas para as pessoas andarem gratuitamente, temos uma Zona Industrial que esgotou... Não há farpa para atirar. A câmara tem obra feita e uma visão de futuro. Estamos dentro dos melhores concelhos do país. Há que reconhecê-lo.

Telmo Cipriano, candidato da CDU à Câmara de Porto de Mós

Tesouros das Autárquicas - 2

Paulo Sousa, 16.09.25

"A CDU, caso vença as eleições, vai tentar dar sequência ao que tem sido feito. Na equipa que ganha não se mexe. A sensação que temos é que [o presidente Jorge Vala] irá para o terceiro mandato e, se isso acontecer, será pelo presidente que é, uma pessoa sempre acessível, sempre pronta a avançar com novos projectos. Sou candidato da CDU, mas não vejo onde colocar defeitos. É um presidente muito acessível, que em princípio vai vencer e bem. (...) Não há por onde apontar defeitos."

Telmo Cipriano, candidato da CDU à Câmara de Porto de Mós

Estranhos companheiros de percurso

Pedro Correia, 29.07.25

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A política faz estranhos companheiros de percurso. Um antigo fiel escudeiro do inenarrável Bruno de Carvalho no Sporting foi escolhido para candidato do Chega à Câmara Municipal de Lisboa por um antigo fiel escudeiro do imprestável Luís Filipe Vieira no Benfica. 

A clubite partidária une agora o que o fanatismo futebolístico separava. Mas nada garante que eles vivam felizes para sempre.

A noite política mais longa do ano

Pedro Correia, 05.10.21

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O presidente do PSD, que vira mais vezes baterias contra os comentadores do que contra o primeiro-ministro, não resistiu à tentação: no discurso de vitória da coligação anti-PS em Lisboa disparou contra esse alvo de estimação, acentuando que a reviravolta na capital do país ocorreu «contra as sondagens e alguns comentadores». Não mencionou nomes, nem era necessário: naquelas entrelinhas o nome de Marques Mendes quase parecia iluminado com luzinhas de néon.

Mendes foi um dos protagonistas do comentário político na noite eleitoral autárquica da SIC. Em estúdio, havia dois conselheiros de Estado – evidenciando que o canal do senador Balsemão joga cada vez mais forte no terreno institucional. Ambos, reconheça-se, habitualmente nada simpáticos para Rui Rio. Cada qual por seu motivo.

Fiel ao seu estilo, Marques Mendes antecipou «uma surpresa» quando todos os canais noticiosos estavam ainda impedidos por lei de divulgarem as sondagens à boca das urnas que já conheciam muito antes das 21 horas. Mensagem cifrada, que os espectadores mais atentos logo descodificaram: havia ali uma derrocada em perspectiva.

De facto, o maior derrotado da noite era Fernando Medina, o alcaide de Lisboa, que todos os canais sempre trataram com extrema complacência nos meses precedentes. Ao ponto de figurar entre os comentadores fixos da TVI24 até data bem recente. Como se fosse ele também já conselheiro de Estado.

Rei morto, rei posto: o protagonismo pela positiva coube desta vez a outros autarcas. Um sorridente José Manuel Silva, antigo bastonário dos Médicos, proclamando: «Já recolocámos Coimbra no mapa.» Um eufórico Santana Lopes, na Figueira, falando como se resumisse um lema do seu percurso de décadas: «Cair, levantar.» Um ainda aturdido Carlos Moedas, com Medina vencido, antecipando outros combates: «Este novo ciclo começa em Lisboa mas não vai acabar em Lisboa.»

As noites eleitorais nas televisões têm os seus momentos dignos de antologia. A do passado domingo, por exemplo, trouxe à tona um dos candidatos que andaram mais ausentes em toda a campanha: Basílio Horta, em Sintra. Ninguém deu por ele em debate algum apesar de liderar o segundo concelho mais populoso do país. Teimosia dele ou omissão escandalosa dos canais? A verdade é que na noite política mais longa do ano tivemos Sérgio Sousa Pinto na TVI24 a enviar-lhe um abraço amistoso em directo e uma ansiosa Ana Gomes na SIC Notícias exprimindo muita vontade de que o camarada Basílio vencesse (sim, venceu, embora perdendo a maioria absoluta).

Na vertente informativa, o apontamento de antologia ocorreu quando fomos informados por uma repórter no terreno: «A abstenção aqui foi de 48%, o que quer dizer que a taxa de participação chegou aos 52%.»  Quem disse que somos fracos a fazer contas?

E por falar em aritmética: como é que num país apenas com 8,4 milhões de habitantes maiores de 18 anos “mais de 9 milhões de portugueses foram chamados a votar?” Mistério que nem um conselheiro de Estado é capaz de esclarecer.

 

Texto publicado no semanário Novo

As autárquicas na minha terra - VIII

Paulo Sousa, 29.09.21

Como tenho vindo a relatar em postas anteriores, na eleição para a Câmara Municipal de Porto de Mós assistiu-se a uma tentativa do ex-presidente João Salgueiro (PS) reconquistar o que considerava ser seu. Não fosse por limitação legal e em 2017 ter-se-ia apresentado pela quarta vez como candidato. Importa referir que, além destes três mandatos, já acumulava mais três  como vereador pelo PSD, totalizando assim 24 anos de vida autárquica.

O incumbente, Jorge Vala (PSD), conquistou há quatro anos a presidência disputando nessa altura a eleição com uma lista do PS e outra independente, tendo por isso sido o presidente eleito com menos votos de sempre. O regresso de João Salgueiro à liça fez com que esta eleição acabasse por ser, para Jorge Vala, o seu maior desafio eleitoral de sempre.

Outro facto, de que já aqui fiz referência, foi a candidatura de um dos filhos do ex-presidente à Junta de Freguesia onde reside. David Carreira, perdão, David Salgueiro, já fez parte da lista para as legislativas por Leiria e não esconde a sua ambição política.

A única sondagem conhecida (estudo sociopolítico) foi divulgada dois meses antes do acto eleitoral e apresentou então uma vantagem de 4% para João Salgueiro. Sem mais detalhes, esta informação foi como um murro no estômago dos apoiantes do actual presidente e provavelmente um grande fôlego para as hostes do desafiante. Os 4% de margem de erro e uma incorrecta proporção das entrevistas feitas em cada freguesia relativamente ao seu peso demográfico quase passaram despercebidos.

O tempo foi passando, os hinos de campanha perturbaram grandemente o silêncio que só existe nas terras pequenas, foram feitos os normais porta-a-porta, folhetos seguiram pelo correio, foram visitadas algumas empresas, escolas e outras instituições, realizaram-se dois debates no Cine-Teatro, muitas fezes foram despejadas sobre o ventilador das redes sociais, muitas ofensas foram proferidas, bastantes mentiras foram ditas, entremeadas com algumas verdades, foram feitos desmentidos, por vezes até desmentidos aos desmentidos, foram prometidas obras, algum chão foi pintado de preto, tudo normal e nada de novo, portanto.

Chegado o grande dia e fechadas as urnas, foi à frente de uns frangos assados que recebi a primeira de várias mensagens e que dizia: “Mesa de voto 2 Câmara PSD 220 PS 185”. Depois de um branco à maneira, abriu-se então a segunda garrafa de vinho. Estando a primeira vazia nunca seria um acto precoce, mas, a natureza ligeiramente gaseificada de “O tal vinho da Lixa” obrigou a uma atenção especial para que a rolha não saísse disparada e pudesse parecer uma celebração antecipada. E nestas coisas não vale a pena correr riscos, até porque os comensais eram do tipo “não sou supersticioso, porque isso dá azar”.

Assim, enquanto mais mensagens de outras mesas de voto iam chegando, os votos no Jorge Vala iam subindo e “O tal vinho da Lixa” ia descendo. Finda a segunda garrafa entendeu-se necessário seguir para a sede de campanha, no centro da sede do concelho.

Lá chegados, o entusiasmo era visível. Ainda não havia nada de definitivo, mas sentia-se que as coisas estavam a correr bem. Menos de meia hora depois chegou a confirmação: “O Jorge ganhou!”. Houve logo quem dissesse que a democracia era uma coisa maravilhosa, especialmente quando permite que as forças do mal sejam derrotadas, mas isso terá sido um ligeiro exagero no calor das celebrações.

Choviam abraços por todos os lados e os sorrisos eram omnipresentes. O Jorge ganhou e o medo acabou. E a dinastia derrapou. Este presidente não grita nem assinala quem não o aplaude. O passado não entendeu que já não tinha futuro.

Depois, alguém trouxe o camião que fez de palco durante a campanha e estacionou-o em frente à sede. Para mais tarde lembrar, tiraram-se fotos e eram várias as video-chamadas. Até internacionais.

Meia dúzia de foguetes depois, seguiram-se vários discursos, onde o slogan da campanha não podia faltar: Porto de Mós, O sítio certo!

Em oposição ao que a lista opositora representava, a noite acabou a gritar-se: Futuro! Futuro! Futuro!

Agora é só esperar.

 

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Resultados autárquicas 2021 - Porto de Mós, o sítio certo!

As autárquicas na minha terra - VII

Paulo Sousa, 26.09.21

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Quando a democracia era por cá uma absoluta novidade, terá sido diferente. Nesse tempo a política nacional entrava pelo quotidiano adentro de cada português, dominando os temas de conversas nos balcões dos cafés, nos locais de trabalho e nas refeições em família.

Com o passar dos anos, instalou-se a sensação de rotina que, sendo positiva por traduzir um costume enraizado, tem levado a uma indiferença que se manifesta também pela abstenção crescente. Podemos apontar como principal causa os equilíbrios estabelecidos pelos partidos que, como quem tranca as portas da casa, afastam os cidadãos daquela peça de teatro, de deixas previsíveis e enfadonhas, esvaziando e enfraquecendo assim as conquistas democráticas.

Apesar de isto se repetir em todos os actos eleitorais, as eleições autárquicas tem uma capacidade especial em desencadear um envolvimento popular intenso.

Qualquer partido que concorra aos diversos órgãos autárquicos e em todas as freguesias do concelho de Porto de Mós, necessita de angariar pelo menos 200 pessoas. Só para a Junta de Freguesia onde resido foram apresentadas cinco candidaturas e isso permite-nos aferir como é que, num meio mais ou menos rural como este, se torna quase impossível não ter pelo menos um familiar, um vizinho, um colega de escola, um amigo ou um ex-amigo, nos elencos das várias candidaturas, arrastando assim para dentro de cada campanha eleitoral velhas afinidades e conflitos.

Se a discussão do englobamentos dos rendimentos prediais no IRS, o apoio aos fornecedores da TAP ou o estatuto político administrativo dos Açores, podem ser assuntos estéreis de interesse para o cidadão comum, o mesmo não acontece quando estamos a falar num buraco à frente da porta, de uma mágoa antiga para com um fulano que está “a sujar” uma das listas, ou o modo como a mulher do Presidente a Junta respondeu a alguém na semana passada. Estes últimos, ao contrário dos primeiros, têm todo o potencial de definir o sentido de voto.

A tradicional forma de passar a mensagem do que se fez, ficou por fazer ou que se promete resolver, envolve um porta-à-porta a distribuir panfletos, acompanhado de carros decorados com as caras dos candidatos, bandeiras a esvoaçar e com alto-falantes a debitar o hino de campanha em contínuo, deixando atrás da sua passagem todos os cães a ladrar num alvoroço.

Mais recentemente, a troca de argumentos para angariar apoiantes chegou às redes sociais, e, como não podia deixar de ser, isso aumentou o nível do confronto entre as diferentes candidaturas e levou a que a agressividade subisse em flecha. Bem sabemos como se torna fácil teclar afirmações que nunca seriam ditas cara-a-cara e que, no momento seguinte, parecem legitimar uma reacção igualmente exagerada a estas, iniciando assim uma espiral quase imparável.

Demasiados dos envolvidos sentem-se tão estimulados pelas afirmações eventualmente falsas, incorrectas ou incompletas e pelos seus desmentidos, que entram a pés juntos contra tudo o que mexe, esquecendo-se que no dia após as eleições terão de continuar a cruzar-se uns com os outros. Esquecem-se também que uma parte muito significativa do eleitorado está alheada desta batalha em linha e que o consecutivo baixar de nível levará apenas a que alguns indecisos se sintam repugnados e mudem para o lado oposto.

Nestas últimas semanas vi um pouco de tudo isto, vi quem, mesmo debaixo de agressões rudes e sob pressão dos mais próximos, se tenha revelado pela elevação, assim como candidatos a cargos de responsabilidade a chafurdar nas poças mais malcheirosas das redes sociais e também a destruir material de campanha dos opositores, algo que dificilmente aconteceria numa eleição nacional.

Por mais que os media queiram noticiar este acto eleitoral, e a forma como se vivem as autárquicas em Portugal, tal é a diversidade de casos e são tantas as particularidades vividas em cada um dos 300 concelhos e mais de 3000 freguesias do país, que não têm forma de o fazer.

À excepção de bruscas viragens que possam acontecer nos grandes centros, não acho que faça muito sentido interpretar a soma dos resultados de cada uma destas pequenas bolhas, estanques e autónomas, e extrapolá-los para o todo nacional, como se de um aplauso ou uma vaia ao governo se tratasse. Mas enquanto as assembleias de voto não fecham e se espera pelo início da contagem, o tempo é de suspense. Esperemos, portanto.

Semana de reflexão

João Sousa, 24.09.21

Há coisa de duas semanas, uma empresa de "investigação e estudos de mercado" (a Pitagórica) veio aqui ao bairro fazer uma sondagem sobre as autárquicas: se eu ia votar, se não ia votar, em votando se iria manter o sentido de voto, se eu pensava que o partido vencedor seria o mesmo ou um diferente, coisas do género. Isto pode não significar nada, mas a verdade é esta: nunca, desde que eu moro aqui, alguma empresa de sondagens alguma vez mostrou interesse em qualquer um dos meus votos. Sondagens sobre os meus hábitos de leitura, o meu consumo televisivo, a minha vida sexual, isso é mato: raro é o trimestre durante o qual não recebo o telefonema da praxe. Mas questões relacionadas com política - nunca.

Durante esta semana, o bairro foi regularmente sujeito aos raides de uma viatura de propaganda do PS. Na quarta-feira, a traquitana chegou mesmo a estacionar durante meia-hora aqui no cruzamento central, infernizando-nos o almoço com o altifalante. Além disso, no dia anterior, alguém encheu-me a caixa de correio com um jornal de campanha do PS: 24 páginas (que seguiram imediatamente para o Ecoponto) de conversa fiada que superavam, na quantidade, o próprio Boletim Municipal.

Este bairro não passa de quatro ruas, nenhuma delas com mais de trezentos metros, que se cruzam duas a duas numa espécie de jogo do galo. Raro é o prédio que tenha mais de três andares. É estranho tal investimento propagandístico do PS aqui. Aliás, a campanha do PS em todo o concelho tem sido bastante sobredimensionada, exibindo em largos cartazes o apoio de figuras mais ou menos públicas como um cozinheiro assíduo das televisões.

E o PS, por acaso ou talvez não, é cliente da Pitagórica.

O PS pode até admitir, como dizem nos jornais, perder 10 a 15 autarquias nestas eleições - mas estou convencido de que o PS tem genuínas esperanças de ganhar a Câmara do Seixal à CDU.

Não é incomum, quando digo a alguém que moro no Seixal, esse alguém fazer uma piada como "Eh pá, tu moras na terra vermelha". É uma certa ideia feita, esta, a de que o Seixal é um antro de comunistas. Acontece que não é, de todo, verdade. A autarquia, sim, tem sido comunista desde (talvez) sempre. Mas é-o em largo contraste com as eleições nacionais onde, desde pelo menos 2009 (não recuei mais, por falta de tempo, nas minhas investigações), o concelho é uma espécie de socialistão:

2009
PS: 34,82%
CDU: 19,17%

2011
PS: 28,72%
PSD: 24,87%
CDU: 18,86%

2015
PS: 34,09%
PSD: 23,14%
CDU: 17,85%

2019
PS: 38,80%
CDU: 15,13%

Nas autárquicas, apesar da manutenção do PCP no poder, é notório um contínuo encurtar da distância do PS:

2005
CDU: 44,74% (24.293 votos)
PS: 23,85% (12.950 votos)

2009
CDU: 47,85% (27.949 votos)
PS: 22,41% (13.090 votos)

2013
CDU: 43.42% (22.658 votos)
PS: 23,78% (12.409 votos)

2017
CDU: 36,87% (21.901 votos)
PS: 29,60% (17.582 votos)

O PS deve estar a sentir o cheiro de sangue na água. Acredito haver o sério risco de uma "vitória surpresa" do PS no Seixal que até serviria para atenuar o impacto mediático de algumas derrotas noutros locais. As mudanças demográficas aqui do concelho não estão, de todo, a ajudar a CDU - mas isto será (talvez) assunto para uma outra ocasião.

Lido por aí

João Sousa, 20.09.21

"Palavra que me aconteceu: olhando um desses autedores que enxameiam algumas das nossas vias de comunicação (estou ou não em condições de elaborar um relatório policial?), dei por mim a pensar o que ofereciam politicamente à sua autarquia um par de jarras que sorria para a câmara enquanto em legenda se podia ler que estavam “juntos por si”.

Uma fracção de segundos depois é que reparei que não era de política que se tratava, mas sim de imobiliário. Os dois sorridentes da foto (até o imobiliário se encontra rendido às maravilhas do trabalho em equipa), aparentemente não me estavam a querer convencer a votar numa qualquer candidatura autárquica, mas sim só me queriam ajudar a comprar um apartamento. Enquanto duvidava da minha acuidade visual (ao longe), pensei que o busílis da confusão se encontrava menos na semelhança entre as duas actividades (autarca e agente imobiliário) do que no esgotamento de frases que queiram transmitir mais do que nada."

Fernando Proença, Jornal do Algarve (12/09/2021)

As autárquicas na minha terra - VI

Paulo Sousa, 19.09.21

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Na entrada para a última recta que terminará nas eleições do próximo domingo, os eventos promovidos pelas listas concorrentes estão ao rubro.

Estive hoje num comício aqui perto, na freguesia das Pedreiras, onde além das sandes de pernil de porco, sopa da pedra e minis, havia ainda animação a toque de concertinas e insufláveis para os mais novos. Excluindo a missa solene, em tudo se parecia com uma festa em honra de um qualquer orago deste nosso Portugal.

Depois dos discursos dos candidatos do PSD à Câmara e à Junta, falou ainda o senhor Rogério Vieira, o ainda Presidente da Freguesia. A lei que limita a três o número máximo de mandatos autárquicos, impede que se volte a candidatar, e por isso aproveitou a oportunidade para fazer como que um balanço e uma despedida do cargo.

Tendo sempre a dependência financeira e logística das Juntas relativamente às Câmaras Municipais como pano de fundo, noutras eleições, além da incógnita da respectiva vitória, o senhor Rogério teve sempre de lidar com a incerteza de quem viria a ser o Presidente de Câmara com o qual teria de trabalhar. Nos doze anos que agora terminam, foi candidato vencedor uma vez pelo PSD e outras duas por listas independentes. Lidou assim em dois mandatos com um presidente eleito pelo PS e mais recentemente com um do PSD.

O equilíbrio necessário para conseguir levar por diante todos os melhoramentos que ambicionou e sentiu serem necessários para a sua freguesia, exigiu-lhe sempre uma enorme sobriedade nas suas tomadas de posição em público.

O discurso que fez, resumiu esta delicada relação das Juntas com os Municípios, elencou uma imensa lista de obras, muitas delas que simplesmente anteciparam potenciais problemas e evitaram assim emergências posteriores, falou da falta de compreensão dos que preferem ficar em casa a disparar críticas mesmo sem saber a abrangência de cada problema, dos telefonemas que o arrancaram da cama a meio da noite, e também das muitas vezes que não respeitou a máxima que coloca a família em primeiro lugar.

O mesmo roteiro que, de quatro em quatro anos, fez de porta-a-porta a pedir um novo voto de confiança, repetiu-o mais recentemente a distribuir cinco máscaras por pessoa, quando estas estavam esgotadas em todo o lado.

Acrescentou que durante estes anos, nos mais de trezentos funerais realizados no cemitério que administra, só não pôde estar presente em cinco, tendo-se deslocado pessoalmente mais tarde a cada uma destas famílias enlutadas.

Aqui e ali, com alguma emoção à mistura, o senhor Rogério Vieira resumiu em breves minutos o que é ser-se Presidente da Junta numa freguesia rural, e que me atreveria a resumir como sendo um cuidador do território e dos seus habitantes, nas horas boas e nas horas más. É o cargo menos abonado de toda a pirâmide do estado, mas também o mais próximo de cada cidadão.

Discordei dele apenas num detalhe. Às páginas tantas disse que não era político, pois o que queria era apenas resolver os problemas dos seus fregueses. Este tipo de afirmação não é inédita, e é comum a quem não se sente confortável com as tricas e com as manobras nos bastidores das estruturas concelhias, distritais e nacionais dos partidos. Em vez disso prefere consumir a sua energia em melhorar a vida dos que o rodeiam. E discordei porque essa será a mais pura essência da política, e é praticada por muitas dezenas de cidadãos quase anónimos, que vivem longe do mundo mediático e que no fundo apenas se motivam com a força da consciência de pessoas boas que são. O senhor Rogério é um político e do melhor que há. Fazem falta pessoas assim noutras instâncias da hierarquia do Estado.

 

PS: Enquanto abandonava este comício, deparei-me com o rebentamento de uma conduta de água que corria abundante pela estrada. Um telefonema e um recado depois, foi desencadeada a acção necessária à resolução deste ruptura. Saí dali imaginando que o senhor Rogério já tinha interrompido a sandes de porco para acudir a mais uma ocorrência.