Palavras para recordar (57)
ANTÓNIO MARINHO E PINTO
Diário Económico, 14 de Agosto de 2014
«Candidato-me ao lugar de primeiro-ministro, sem dúvida.»
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ANTÓNIO MARINHO E PINTO
Diário Económico, 14 de Agosto de 2014
«Candidato-me ao lugar de primeiro-ministro, sem dúvida.»
Por uma vez, estou de acordo com Marinho e Pinto. É chocante o absentismo crónico dos eurodeputados, principescamente remunerados pelos contribuintes dos seus países. Nem 5% marcaram presença no plenário que fazia a avaliação da anterior presidência europeia - ainda por cima sabendo-se que compete ao Parlamento Europeu fiscalizar o desempenho do Conselho Europeu, o que aumentava a responsabilidade de quem não se dignou comparecer no hemiciclo de Estrasburgo, onde havia mais de 700 lugares vazios.
Só a folha que assinala o registo de presenças não estava vazia: constavam lá 703 assinaturas de eurodeputados, que se limitaram a pôr o gatafunho no papel antes de darem de frosques. Não se admirem se algumas destas sumidades aparecerem um dia destes na televisão a debitar lições de ética de política aos compatriotas que lhes pagam os salários.
São capazes disso e de muito mais.
«Salário de 4.800 euros não permite padrões de vida muito elevados em Lisboa.»
António Marinho Pinto
Não é inesperada mas não deixa de ser irónica, a forma como os mais estridentes críticos das 'jogadas' na política são os seus mais perfeitos executantes.
1. Espero que os portugueses continuem a seguir com atenção o trajecto político de Marinho e Pinto. Admito que não seja fácil, tal a rapidez com que troca de fato e aparece num novo facto. Se há coisa que um cata-vento político mantenha é a coerência. Sempre a girar, nem dá tempo para avisar.
2. O Sol titula na primeira página de hoje que "Seguro prepara surpresa" e acrescenta que o secretário-geral do PS tem na manga uma "avalancha de entradas nos últimos dias". Aguardo confirmação da cartada. Oxalá que nenhum dos novos esteja já morto e que essa avalancha de entradas não seja mais um acto de homenagem dos sobrevivos. Pensava que a decisão de um indivíduo se inscrever como simpatizante ou militante de um partido era um acto solitário, uma decisão individual, eminentemente livre e racional, tomada no último reduto da solidão, no fundo da sua consciência. Tretas.
3. Carlos Moedas diz que lhe entregaram uma pasta "chave para o crescimento da Europa", depois do novo presidente da Comissão ter dito que as pastas chave foram entregues a mulheres. Não discuto pastas em função do sexo, matéria em que quer Junker quer Moedas estarão mais à-vontade. Penso, sim, que Moedas tem uma boa oportunidade para demonstrar que é bem melhor do que aquilo que aparentou ser no Governo de Passos Coelho. O interesse nacional obriga a que lhe seja dado o benefício da dúvida.
4. O trabalho efectuado tem sido registado. A disponibilidade e vontade de melhorar idem. E pessoalmente só tenho a dizer bem de quem lá trabalha e ali me tem atendido. De qualquer modo, não deixa de ser irónico que seja o antigo chefe de gabinete de Miguel Relvas a dar conta da situação a que se chegou no Consulado Geral de Portugal em Macau e Hong Kong: menos "treze funcionários nos últimos dois anos (incluindo uma chefia)" e dificuldades "materiais – com estações de tratamento de dados biométricos continua e reiteradamente avariadas – a acrescer à questão de 2014 ser justamente o primeiro ano coincidente com a renovação obrigatória dos documentos de identificação". Fica mais claro porque renovar um cartão de cidadão ou tirar um passaporte leva vários meses. A redução de funcionários não constitui novidade. A recorrência nas avarias da estação de tratamento de dados biométricos sim. Está visto que o secretário de Estado José Cesário, apesar das constantes viagens que faz a Macau, não é o homem indicado para efectuar as reparações nos consulados. Sabe-se que o MNE vive noutro mundo, mas Passos Coelho podia já ter compreendido isso. Perceber de canos não é o mesmo que saber de circuitos de alta tecnologia. A Cesário não se lhe pode exigir mais.
«O Parlamento Europeu é um faz de conta, não manda nada.»
António Marinho Pinto, dois meses depois de se estrear como eurodeputado
Parecia impossível mas conseguimos mesmo exportar o Marinho e Pinto.
António Marinho Pinto -- sem dinheiro, sem estrutura de apoio, sem máquina de campanha, quase sem cobertura jornalística, com uma sigla partidária ignorada até há dias por quase todos os portugueses -- ultrapassa o Bloco de Esquerda, que dispôs de amplos holofotes mediáticos. É eleito eurodeputado, como aqui previ a 26 de Janeiro, e pode até ver o MPT eleger um segundo representante para o Parlamento Europeu.
Mais que nunca, este resultado comprova que o quadro político português está pronto a ser reorganizado. Só precisa mesmo de alguém com talento oratório e comprovada capacidade de mostrar alguma diferença para mobilizar um importante fragmento da legião de descontentes, fartos de promessas traídas e das palavras já gastas pelo uso.
Dir-se-á que isso é negativo por representar o triunfo do populismo. Muito mais negativo é haver quase dois terços de eleitores que não reconhecem mérito suficiente a 16 forças eleitorais para confiarem o voto a qualquer delas.
Que qualificações ou pensamentos habilitam alguém como Marinho Pinto a falar na televisão sobre redes sociais?
(certo: é o "Prós e Contras"; já se sabe que o nível dos convidados não costuma, passe o eufemismo, ser elevado. Mas ainda assim)
Da mesma forma que sucedeu na Grécia e na Itália, a actual crise europeia é um terreno propício para a emergência eleitoral de movimentos populistas centrados em figuras mediáticas. Em Portugal isso acaba de ser ensaiado com a entrada de Marinho e Pinto na corrida para as eleições europeias na lista do MPT-Partido da Terra. Estou convencido de que Marinho e Pinto pode ter um grande resultado eleitoral. O seu discurso é altamente heterogéneo, fazendo apelo simultaneamente a valores de esquerda radical, como o combate aos privilégios, e a valores da direita mais conservadora, como no combate à adopção gay. Precisamente por esse motivo teve a inteligência de escolher para se apresentar a votos um partido considerado neutro em termos ideológicos, que apresenta como bandeiras coisas vagas como o humanismo ou a protecção da natureza, de que ninguém discordará. Por outro lado, o seu perfil de homem de convicções, que diz sempre o que pensa, fará a diferença perante candidatos políticos cata-vento habituados a tomar posições em sentido contrário ao que pensam pessoalmente, como se viu na votação recente da proposta de referendo. Se, por exemplo, o candidato do PSD for Paulo Rangel poderemos assistir a debates como este que se vê aqui.
Será um erro o PSD e o CDS não perceberem os riscos que correm. O seu discurso recente tem sido o de que a crise está a ficar para trás e os sacrifícios valeram a pena. Só que quem viu este mês o seu salário ou pensão brutalmente cortados não quer saber para nada se os juros da dívida caem ou não, receando é o que lhe possa acontecer amanhã. Quanto ao PS, não foi capaz de construir nenhuma alternativa, o PCP é o que sempre foi e a esquerda radical entretém-se a multiplicar partidos e movimentos. Estamos no terreno ideal para que um candidato como Marinho e Pinto prospere. Os partidos tradicionais que se cuidem.
Há uma série de piadas sobre o inferno como destino inevitável dos advogados. Quando vejo que elegem este animal selvagem como Bastonário, tendo a lembrar-me delas. E sim, estou a ser eufemística.
Como se não bastasse termos um Presidente da República com dúvidas sobre o seu poder (deve ter flashbacks com 1991), temos também um Bastonário de uma Ordem com a mania que é político. Eu explico devagarinho: para se chegar ao poder executivo, é preciso ser eleito para o Parlamento. Boa? Custa assim tanto entender?
O actual Bastonário da Ordem dos Advogados, agora reeleito por mais três anos, é como Saldanha Sanches era: um dos bons, um dos corajosos, um dos poucos sem medo de dizer o que tem de ser dito, quando tem de ser dito! É senhor de uma postura ímpar que faz cada vez mais falta nos dias que correm.
Sou ainda da opinião que o Bastonário dos Advogados tem de ser mais do que um mero executivo da política da Ordem, tem o dever de ser uma figura chave na sociedade, como legítimo representante de uma das suas mais relevantes classes, e Marinho Pinto sabe sê-lo com coragem e mestria, combatendo com a honestidade e galhardia que quero que seja reconhecida aos advogados.
Espero que agora os Velhos do Restelo se remetam ao silêncio. O tira-teimas não deixou margem para dúvidas.
Parabéns e força para António Marinho Pinto!