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Delito de Opinião

Fora da caixa (16)

Pedro Correia, 26.09.19

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«É fundamental aumentar as infraestruturas de transportes colectivos, nomeadamente ferrovia da área metropolitana... metropolitana... da área... da área metropolitana de Lisboa, estender a rede... a rede de metro para várias... para várias zonas... assim como... assim como na... também... aaa... no Porto...»

André Silva, na RTP (23 de Setembro) 

 

Tenho acompanhado com a atenção possível as intervenções do solitário deputado do PAN nesta campanha eleitoral. Dele direi que é um dos candidatos mais previsíveis: quando abre a boca é seguramente para advogar novas interdições ou um acréscimo da carga fiscal. E é também um dos que preenchem mais tempo de antena, recorrendo a um velho truque popularizado por certos treinadores de futebol: repete as palavras que vai dizendo, em jeito de falso gago. (Se fosse gago a valer não seria candidato do PAN, mas do Livre.)

Assim foi, uma vez mais, no debate que segunda-feira reuniu na RTP os seis líderes dos partidos com representação parlamentar. André Silva não defraudou as expectativas: mal a moderadora, Maria Flor Pedroso, lhe pediu que especificasse «medidas concretas» sobre o combate às alterações climáticas, o porta-voz do PAN anunciou sem rodeios, naquele seu estilo muito peculiar, que quer extorquir dinheiro dos portugueses. Para o remeter a outros continentes.

 

Segui com tanto interesse a oratória do deputado que acabei por transcrever na íntegra o que ele disse:

«Eu gostava de… dizer… algo sobre aquilo que Portugal pode fazer… aquilo que Portugal pode fazer… aaa… relativamente a todo o impacto mundial. Está estabelecido que devemos criar um fundo mundial de combate às alterações climáticas para ajudar os países menos ricos, chamados menos desenvolvidos, para fazer esse combate, essa adaptação, às alterações climáticas. Ainda só conseguimos cerca de 25%. Portugal… aaa… deverá… contribuir com… aaa… cerca de dois milhões e meio de euros e nós entendemos que Portugal pode reforçar… os portugueses podem, em vez de darem cada um 25 cêntimos, cada um dos portugueses pode dar um euro, uma contribuição de um euro, e aumentar em dez milhões de euros a contribuição que Portugal pode dar ao resto do mundo para este efeito. E é justo. É justo porque Portugal, enquanto país rico que é, sempre utilizou os recursos e sempre emitiu gases com efeito de estufa ao longo destas décadas muito mais que os outros países. E é justo que nós tenhamos essa… essa capacidade financeira e que somos um país rico, do norte geográfico, possamos fazer essa… possamos fazer essa… essa… essa contribuição… esse esforço que é possível para… do nosso ponto de vista… para os portugueses.»

 

Desembarcado de Marte, André Silva imagina Portugal como «país rico», apto a financiar outras nações para expiar supostos pecados ambientais.

Eis outro aspecto em que o porta-voz do PAN é muito previsível: na importação para o discurso político da retórica dos tele-evangelistas, sempre prontos a lançar anátemas sobre os hereges, sempre dispostos a anunciar a redenção aos devotos que comungam das tábuas da lei.

Só não o sabia também já disponível a sacar o dízimo tão à descarada, ainda antes de acolitar o PS na próxima solução governativa. Nisto, pelo menos, inovou. Hossana, aleluia: o paraíso há-de chegar.

Fora da caixa (4)

Pedro Correia, 08.09.19
 

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«Precisamos de outras bússolas.»

André Silva, em entrevista à TVI, 4 de Setembro

 

«Estou quase a chegar ao Bairro Alto!», gritava a mulher ao telemóvel, na carruagem do metropolitano.

Em redor dela, ficámos todos a saber que aquela matrona opulenta, de unhas de gel e tatuagem no lombo, mentia com desenfado na plena pujança dos seus decibéis: seguíamos algures entre as estações de Sete Rios e Praça de Espanha. Ali perto, só o Bairro Azul.

Vejam lá em quem aquilo me fez pensar: em André Silva. O porta-voz do PAN está cheio de razão: anda por aí muita gente carente de novas bússolas.

Fora da caixa (1)

Pedro Correia, 05.09.19

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«Há uma enorme confusão na definição ideológica dos outros partidos.»

André Silva

 

Espreitei parte da entrevista que o porta-voz do partido animalista deu ontem à noite à TVI. André Silva rejeita a dicotomia esquerda/direita e prefere «outras bússolas», segundo confessou, etiquetando de «progressista» o seu partido, assumidamente «pós-ideológico».

Convocado a descer da nuvem retórica, logo se apressou a desdizer o que dissera: «O PAN é um partido que se posiciona, acima de tudo, pela preservação dos ecossistemas.»

Tudo e o seu contrário, portanto. «Preservar os ecossistemas» é a definição perfeita de um partido conservador. O deputado único do PAN, que nesta entrevista se atreveu a acusar as restantes forças partidárias de fuga às respectivas matrizes ideológicas, devia olhar-se um pouco mais ao espelho. Não para acertar o nó da gravata, adereço que recusa usar talvez por lhe lembrar uma coleira, mas para ver a cara com que fica ao receber o ricochete dos tiros que dispara.

Ecologistas da treta

Pedro Correia, 26.08.19

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Lançaram-se agora contra as beatas de cigarros na via pública, dedicando-se a um passatempo que adoram praticar: multiplicar impostos, taxas, coimas e um cortejo de proibições - da colheita mecanizada de azeitonas à noite ao "culto da vaca feliz" (seja lá o que isso for).

São livres de agir assim: cada partido escolhe as suas prioridades consoante a visão de sociedade que propõe aos portugueses e os instrumentos legais adequados para o efeito.

O que não faz o menor sentido é terem aproveitado a tribuna parlamentar, palco privilegiado de promoção política, para darem mais visibilidade a esta iniciativa... enquanto o dirigente máximo do partido, o deputado André Silva, exibia um vistoso garrafão de cinco litros em plástico. Precisamente o material que nos nossos dias provoca mais catástrofes ambientais.

Apetece-me chamar-lhes ecologistas da treta. E faço-o já, antes que concebam uma nova multa também para isto.