Catalunha: amarga derrota do separatismo
Os separatistas catalães sofreram uma das suas maiores derrotas nas eleições regionais de domingo, que o Partido Socialista venceu por margem confortável. Perderam mais de 200 mil votos em relação ao escrutínio anterior, realizado em 2021. E conseguiram apenas 61 lugares - repartidos por quatro siglas partidárias - num parlamento autonómico com 135 assentos. Os restantes 74 cabem a partir de agora às forças políticas constitucionalistas, que combatem o separatismo.
Em percentagem a diferença é ainda mais expressiva: 53,4% para os diversos partidos que advogam a organização territorial inscrita na matriz constitucional espanhola e 43,2% para os que querem romper com ela. Incluindo os 4,1% da CUP (extrema-esquerda) e os 3,8% da novíssima Aliança Catalã (extrema-direita).
Estas eleições confirmam uma evidência: existe em solo catalão uma facção separatista claramente minoritária, apostada em impor a sua cartilha ideológica à maioria dos habitantes da Catalunha, que não quer cortar os vínculos políticos com o Estado espanhol e se revê no actual quadro constitucional e estatutário.
Isto acontece enquanto alguns em Portugal teimam em reclamar aos gritos o «direito à autodeterminação», como se este não vigorasse já na Catalunha - autonomia dotada de mais poderes do que a esmagadora maioria dos Estados federados na União Europeia. Tem órgãos próprios em matéria política, judicial, policial, tributária, sanitária, educativa, linguística, cultural e desportiva.
Não existe democracia sem o império da lei. Neste caso, o conjunto do Estado espanhol - Catalunha incluída - rege-se pela Constituição de 1978 que, ao contrário da lei fundamental portuguesa, recebeu luz verde em referendo, com 95% de aprovação dos eleitores catalães (segunda maior percentagem a nível nacional). Rege-se ainda pelo Estatuto Autonómico da Catalunha, igualmente validado em referendo, a 25 de Outubro de 1979, com o voto favorável de 88% dos eleitores catalães. O mesmo sucedeu com o Estatuto Autonómico de 2006, que entrou em vigor precedido de referendo regional, realizado a 18 de Junho desse ano, com a aprovação de 73,9% dos catalães.
A comparação com Portugal é-nos desfavorável: nunca os eleitores da Madeira e dos Açores foram consultados para se pronunciarem nas urnas sobre os respectivos estatutos de autonomia política.
Nesta matéria, a Constituição portuguesa tem uma visão mais estreita do que a espanhola. A tal ponto que a nossa proíbe expressamente a existência de partidos regionais, em manifesta tentativa de dissuadir movimentos de índole separatista nas regiões autónomas. No seu artigo 51, parágrafo 4, a lei magna de 1976 é categórica: «Não podem constituir-se partidos que, pela sua designação ou pelos seus objectivos programáticos, tenham índole ou âmbito regional.» Interdição repetida, palavra a palavra, no artigo 9 da Lei dos Partidos Políticos.
Esta sim, é uma norma absurdamente restritiva à luz dos padrões europeus. Basta recordar que Alemanha e França, por exemplo, autorizam partidos regionalistas na Baviera e na Córsega.
Se queremos defender o "direito à autodeterminação", comecemos pela nossa própria casa, em defesa da revogação deste interdito constitucional.
Os que por cá dizem que a Constituição de Espanha é para rasgar são os mesmos que invocam a Constituição portuguesa com sacrossanta veneração. Os "direitos adquiridos" nas tábuas da lei afinal são só para alguns. Deste lado da fronteira, não do outro.