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Delito de Opinião

Aeroporto Che Guevara

Pedro Correia, 15.05.24

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Aqueles que já andam aí aos gritinhos contra a atribuição do nome do nosso maior poeta, Luís de Camões, ao futuro aeroporto que servirá Lisboa são os mesmos que urraram nos anos 90 quando outro governo atribuiu o nome de Vasco da Gama à maior ponte sobre o Tejo. 

Mas bateriam palminhas se houvesse um aeroporto Che Guevara lá nessa margem sul onde um antigo ministro socialista jurou que nunca nasceria obra de tal envergadura. Ainda o escuto a bradar, em francês macarrónico: «Jamais! Jamais!»

Isso queriam eles.

Olhar para os animais e ignorar as pessoas

Pedro Correia, 15.05.24

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Sempre que se anuncia uma grande obra pública, o PAN está contra. Invocando motivos ambientais.

Após 55 anos de estudos, avaliações, documentos de todo o género, relatórios intermináveis, acaba de ser enfim anunciada a localização do futuro aeroporto que servirá Lisboa: o actual campo de tiro de Alcochete - na verdade pertencente aos concelhos do Montijo (75%) e de Benavente. 

Reacção imediata do partido animalista? Quer mais estudos, mais relatórios, mais papelada, mais discussão, mais demora, mais paralisia. Como se cinco décadas e meia não bastassem. Porque - alega Inês Sousa Real - a decisão agora anunciada «não tem em consideração as preocupações ambientais nem a qualidade de vida das populações, nomeadamente quanto à produção de ruído».

 

Extraordinário. Nunca me lembro de ver este partido insurgir-se contra a manutenção do aeroporto da Portela, situado dentro do perímetro da cidade de Lisboa, rodeado de áreas residenciais. Cada vez que um avião descola da velha pista inaugurada em 1942 lança mais de uma centena de emissões de CO2 sobre a cidade. Acrescidos de «óxidos de azoto, partículas ultrafinas (penetram profundamente nos pulmões e são absorvidas pela corrente sanguínea, chegando a todo o organismo) e compostos orgânicos voláteis», como sublinha Pedro Nunes, da associação ambientalista Zero.

Além da poluição atmosférica, com péssimas consequências para o sistema respiratório, a manutenção da Portela provoca gravíssimos danos auditivos a quem vive ou trabalha na zona dos corredores aéreos. Cerca de 388 mil pessoas são directamente afectadas pela poluição sonora. Segundo a Zero, o nível de ruído dos aviões é «quase quatro vezes maior do que o limite previsto na lei». Incluindo durante a madrugada, quando há dezenas de descolagens e aterragens. Sei do que falo, porque vivo no bairro de Alvalade, talvez o mais afectado.

Sem esquecer que constitui ameaça gravíssima para a segurança dos lisboetas. Em concreto, para os 400 mil que frequentam diariamente as áreas percorridas a baixa atitude pelas aeronaves. Incluindo funcionários e utentes do Hospital de Santa Maria e da Biblioteca Nacional, além dos alunos de várias faculdades da Universidade de Lisboa e outros estabelecimentos de ensino, como o Colégio Moderno, o Colégio de Santa Doroteia e o Externato de São Vicente de Paulo.

 

Factor de perigo permanente: nestas décadas, esteve várias vezes para acontecer uma tragédia de dimensão incalculável sobre o centro da cidade. «Até ao fim do período de concessão do aeroporto, 2062, a probabilidade acumulada de haver um acidente aéreo grave em Lisboa é de aproximadamente 52%. Alguma desta probabilidade é de que o acidente aconteça dentro do aeroporto, mas em larga medida é fora, principalmente sob os corredores aéreos», acentua ainda Pedro Nunes, no Público

É poluição ambiental que não preocupa o PAN.

É poluição sonora que não preocupa o PAN.

É um sério factor de risco que não preocupa o PAN, mais atento às avezinhas de Benavente do que aos seres humanos. E aos potenciais danos atmosféricos no campo de tiro de Alcochete do que aos reais danos para quem tem o seu lar, as suas salas de aula, o seu comércio ou o seu posto de trabalho em Lisboa.

Inversão total do que devem ser as prioridades de um partido político, esta de pôr os animais à frente das pessoas. Tento compreender tal lógica, mas confesso: não sou capaz.

Estudos para quê?

João Pedro Pimenta, 07.12.23

Estudos, comissões, avaliações, para quê? Sim, para quê fazer estudos de custos, expropriações, segurança e impacto ambiental e ir para Alcochete ou Vendas Novas? O sr. O'Leary e a Ryanair é que sabem qual a "solução óbvia" para o novo aeroporto de Lisboa, custeado pelo estado português, como é evidente. Como diria um primo do meu avô, "o que é preciso é homens para cavar e lavrar a terra, não precisam de estudar para nada".

Aparentemente não é só no Kremlin que se tecem declarações de anexação de Portugal sob o efeito de álcool. Em Dublin devem sofrer do mesmo problema.

A culpa é de Montenegro

Pedro Correia, 08.07.22

Ainda bem que Luís Montenegro foi enfim eleito presidente do PSD.

António Costa estava desde 2015 à espera deste momento.

Montenegro vai decidir a localização do futuro aeroporto de Lisboa, como o primeiro-ministro já revelou.

Obviamente, este longo impasse de sete anos é culpa exclusiva do maior partido da oposição. E do próprio Montenegro, que tardou tanto tempo a chegar lá.

O Novo Aeroporto de Lisboa

jpt, 04.07.22

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Razões de paternidade convocam-me para que, daqui a algumas semanas, cruze o Trancão rumo a Inglaterra. Pesquiso as rotas possíveis e enfrento os preços. Desiludo-me com os caríssimos comboios e as sinuosas camionetas. Acarinho a ideia de subir aos bombeiros da Encarnação, mochila às costas e nas mãos o dístico "United Kingdom", num convicto "hei-de lá chegar" - entre várias outras do tipo, não cruzei eu tudo aquilo, polegar ao alto das framboesas de Inverness às maçãs de Leicester em apenas um dia?, e não foi assim há tanto tempo, parece-me...

Mas, enfim, rendo-me aos tempos. E vasculho as viagens aéreas, apartando-me de "companhias de bandeira", claro está. Nisso acabrunho-me face aos "low cost" que não o são assim tanto. A minha primeira pesquisa é a mais lógica: subir a Avenida de Berlim até à Portela, apanhar o avião até Londres, beber um sumo de laranja em Notting Hill (imaginando um choque com a Julia Roberts) e no dia seguinte seguir ao meu destino paternal.

Para pernoitar por lá telefono a uma queridíssima amiga, há décadas vivendo na cidade. A qual de imediato se disponibiliza para me aboletar. E, sabendo que cada euro me é precioso, logo me aconselha sobre as minhas várias opções. Pois se poupa no preço do avião e depois paga-se ainda mais nos transportes subsequentes... Digo-lhe que tendo para um vôo para um aeroporto mais excêntrico. Ela, muito viajada, tem uma aplicação telefónica apropriada e logo me explica rotas terrestres e preços até sua casa. E antes explica-me, "do aeroporto até cá a casa é como de Santarém a Cascais"...

Enfim, escolherei outra rota, mais "maneirinha" à bolsa, desembocarei noutro sítio qualquer. Pois nem todas as viagens terminam naquilo do sair do aeroporto, mochila nas costas, e descer a Avenida até casa. Como, nisso privilegiado, até já fiz.

Servirá de algo partilhar estas memórias e presentes com as nossas "elites"?

Conseguiram

Sérgio de Almeida Correia, 13.05.19

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(créditos: Público/DR)

Há sensivelmente dez meses deixei nota neste espaço sobre o mau serviço que era prestado aos utentes do Aeroporto Humberto Delgado, vulgo Aeroporto de Lisboa

Esta semana, a Bloomberg divulgou a lista dos melhores e dos piores aeroportos do mundo. 

Pois bem, entre os dez piores aeroportos do mundo o Aeroporto de Lisboa conseguiu ser o pior. Isto é, o 132.º e último lugar. O Porto ficou em 125.º. E não me venham dizer que há muitos outros aeroportos importantes entre os piores, como Londres-Gatwick e Paris-Orly, porque a gravidade do caso não muda de figura, visto que o movimento daqueles não tem comparação com os nossos.

Se o objectivo da privatização da ANA por parte da antiga ministra das Finanças e do ex-primeiro-ministro Passos Coelho era prestar um péssimo serviço ao país, o objectivo foi plenamente conseguido, não ficando atrás do que se fez com os CTT

E tome-se nota de que não sou, por princípio, contra as privatizações. Mas em tudo na vida só há duas maneiras de fazer as coisas: bem feitas ou mal feitas. Neste caso, assim o penso desde a primeira hora, foram mesmo mal feitas e enganando-se os contribuintes e utentes. E para quê? Os resultados estão à vista de todos.

Terceiro-mundismo aeroportuário

Sérgio de Almeida Correia, 11.07.18

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(créditos: O Jornal Económico) 

Como todos os anos entro e/ou saio mais de uma dezena de vezes de aeroportos em todo o mundo, sempre vou reparando no que vejo lá fora e no que encontro em Lisboa. No mês passado, no espaço de quinze dias, usei por quatro vezes o Aeroporto Humberto Delgado, antes chamado da Portela, mas que todos conhecem como de Lisboa. E embora já tivesse pensado aqui deixar umas linhas, vicissitudes várias roubaram-me o tempo e a disposição.

Há dias, um amigo queixou-se do mesmo que eu vira, e por que passei, e depois dele foram muitos mais. Pelo que aqui estou.

Trata-se de mais uma situação que não prima pela novidade mas que se tem vindo a agravar ano após ano, sendo que os momentos mais gritantes coincidem, mera coincidência, claro, com os meses estivais, mas que também é possível observar noutros períodos do ano (Natal, Páscoa, Carnaval, semanas de feriados e "pontes")

A privatização da ANA, à semelhança do que aconteceu com outras empresas em que a presença do Estado sempre se fizera sentir, serviu, entre outras coisas, umas úteis outras perfeitamente inúteis, e outras ainda entre a inutilidade e o crime, para o Governo de Passos Coelho e algumas das suas luminárias se arvorarem em estrelas, com os resultados que o correr dos meses e dos anos acabou por ir revelando. No caso da ANA, uma vez mais, foi-nos vendido gato por lebre, e disso a imprensa foi dando conta, como aconteceu com os tais 3.080 milhões de euros que Maria Luís Albuquerque ufana anunciou, mas que no final foram apenas cerca de um terço e que acabaram por ficar fora do défice de 2012 por ordem do Eurostat, comprometendo as flores que se anunciavam e que contribuíram para que Portugal falhasse a meta

Esse tempo já lá vai, o Governo mudou, sem que, todavia, se vejam melhorias notáveis no funcionamento da estrutura aeroportuária que serve Lisboa.

Se o espaço já por si era exíguo, mais limitado ficou depois das obras com o aparecimento de uma nova série de lojas, algumas mínimas e com corredores estreitos, sem que os preços praticados, ao nível dos comes e bebes, fossem compatíveis com o nível de vida do país e as tradicionais más condições de atendimento e serviço, e pior ficou com a quantidade de gente que demanda o aeroporto. 

Para ou de algumas portas de embarque o problema maior é o que se anda, tarefa sempre desagradável com bagagem de mão, a que se segue o tempo de espera nos balcões dos passaportes e nos tapetes da bagagem, para quem chega. Este é um problema antigo, embora ultimamente me pareça que desaparece menos bagagem e há menos furtos. Para quem parte a dificuldade maior está em fazer o check-in, caso não o tenha realizado online, e entrar na zona reservada, visto que aqui as filas para verificação da bagagem de mão são intermináveis, praticamente a todas as horas e, por vezes, com algum "fundamentalismo" à mistura (em Inglaterra, França ou na Alemanha acaba por ser pior), como a embirração com os recarregadores portáteis (power banks), a que se soma o calor. Dir-se-ia que a poupança de energia com o ar-condicionado é permanente, o que leva a que muitas vezes quem embarca quando chega ao avião esteja nas condições ideais para tomar um banho, o que não é seguramente o mais agradável quando se têm em perspectiva dois ou mais voos de longo curso, não se viaja na primeira classe do A380 e o período de trânsito entre voos não dá para tomar um duche a meio do percurso.

Tem, pois, toda a razão o Presidente da Câmara Municipal de Lisboa quando se mostra preocupado com o estado em que se encontra o Aeroporto de Lisboa. Pena é que na actual situação a simples preocupação não seja suficiente para resolver este problema de terceiro-mundismo militante em que a ANA, privatizada ou não, e quem a privatizou, coisa que aos utentes pouco interessa, nos meteu em termos de serviço.

Importante seria que com o Governo e a Administração da concessionária fosse encontrada uma solução que não envergonhe o país e melhore as condições de acolhimento e circulação para quem chega e para os que partem. Falar do passado, só por si, não resolve, nunca resolveu, os problemas. É conveniente que alguma coisa se faça sob pena de quem está se limitar a gerir o que foi mal feito e o que ficou por fazer, dando emprego aos medíocres do costume, sem que nada de útil e actual seja concretizado num prazo razoável para benefício de todos.

Pelo Aeroporto Sacadura Cabral

Pedro Correia, 11.04.17

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 Artur Sacadura Cabral (1881-1924)

 

Corre de momento por aí uma petição pública para que o futuro aeroporto do Montijo, adaptado a voos comerciais, receba o nome de Artur de Sacadura Freire Cabral, um dos pioneiros da aviação portuguesa. Contrariando o impulso do Presidente da República, que sem consultar ninguém se apressou a sugerir o nome do antigo Presidente da República Mário Soares.

Estou plenamente de acordo com esta homenagem a Sacadura Cabral, que com Carlos Viegas Gago Coutinho fez em 1922 a primeira travessia aérea do Atlântico Sul, unindo Portugal ao Brasil. Aliás os brasileiros preservam com carinho a memória destes dois aviadores, que tão esquecidos têm sido cá na terra - sobretudo Sacadura Cabral, que em Lisboa dá apenas nome a uma artéria secundária, entalada entre o Campo Pequeno e a Avenida de Roma.

"O futuro Aeroporto do Montijo, situado na actual Base Aérea N.º 6 da Força Aérea Portuguesa, do ponto de vista histórico terá toda a lógica chamar-se de Aeroporto Sacadura Cabral, pois aquando do tempo da Aviação Naval (1917-1952) que aqui operava chamava-se a nível oficial Centro de Aviação Naval Comandante Sacadura Cabral. O planeamento e as suas obras foram conduzidos pela nossa Marinha desde os anos 30, que culminaram na sua inauguração e baptismo com o nome deste intrépido aviador naval. (...) Assim, perante os factos históricos, seria de boa justiça dar novamente o seu nome inicial de Sacadura Cabral ao futuro Aeroporto do Montijo", refere o texto da petição.

Que naturalmente já subscrevi.

 

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Monumento de homenagem a Gago Coutinho e Sacadura Cabral no Recife (Brasil)

Pequena anedota (verídica) sobre um certo traço da índole alemã

José Navarro de Andrade, 10.03.12

Gerhard Richter, "Mustangs", 1964

 

Talvez porque o tráfego do aeroporto de Frankfurt seja dos mais intensos e extenuantes da Europa, os controladores aéreos têm fama de arrogantes e impacientes. Depois de conduzirem os pilotos durante a fase de aterragem, limitam-se a informar qual é a porta para onde devem dirigir o avião, presumindo que sabem a sua localização e como hão-de lá chegar, prescindindo de fornecer mais orientações.

Uma vez sucedeu este diálogo entre a torre de controlo e um 747 da British Airways (BA):

[estas conversas são convencionalmente em inglês em toda a parte, mas faz-se aqui uma tradução nada técnica e muito leiga]

BA – Frankfurt, já desobstruímos a pista de aterragem.

Torre – BA, circule até à porta Alpha Um-Sete.

O avião saíu do taxiway [zona de circulação da pista] e parou.

Torre – BA, não sabe para onde deve ir?

BA – Por favor aguarde torre, estou a verificar a localização da porta.

Torre (denotando ríspida altivez) – BA, nunca esteve em Frankfurt?

BA (voz calma) – Sim, estive aqui duas vezes em 1944, mas estava escuro… e não aterrei.

O aeromorto de Beja vai crescer não sei quantos e tal por cento

Rui Rocha, 08.10.11
 

As estimativas elaboradas pelo governo de Sócrates pecaram sempre por defeito. No caso do aeromorto de Beja, o número de passageiros previsto para 2009 era de 178.000 (cento e setenta e oito mil). Imagino-os, aos irresponsáveis pelos estudo de viabilidade, a discutir, noite dentro, o modelo de previsão e os seus resultados. 100.000 (cem mil) terá dito um. 200.000 (duzentos mil) terá gritado outro. Nem pensar, são 180.000 (cento e oitenta mil) ter-se-á indignado um terceiro. E depois, a decisão política do próprio Sócrates, tomada entre colunas de fumo mal dormidas: Na, na, na, isso são números muito redondos, próprios de tecnocratas, ponham lá 178.000 (cento e setenta e oito mil). O número real, entre 22 de Maio e 31 de Julho deste ano, foi de 164 passageiros (cento e sessenta e quatro; uma centena, seis dezenas e quatro unidades). É um defeito de previsão do caraças. É um buraco onde cabem 10 milhões (dez milhões) de portugueses e ainda sobra espaço para o Jardim fazer um comício e dançar o bailinho. Mas, nem tudo são más notícias. É possível que entre Outubro e Novembro aterrem no aeroporto 1.200 (mil e duzentos) passageiros. Isto é, em média, 19,67 passageiros por dia, se incluirmos o feriado de 5 de Outubro e o dia de finados. Eu, que não sei fazer contas, digo que será um crescimento de não sei quantos e tal por cento face aos meses anteriores, o que é de facto extraordinário. Mas, nem tudo são rosas. Algo me diz que os números são de tal maneira impressionantes que é praticamente impossível manter este brutal ritmo de crescimento durante muito tempo. 

Pode a Espanha ter 52 aeroportos?

Rui Rocha, 18.09.11

É a pergunta que Paco Nadal coloca no seu blog:

¿Hasta cuando durará la paranoia de nuestro políticos locales por poner una aeropuerto en cada ciudad de más de 50.000 habitantes? La reseca de aquella década en que todos éramos ricos sigue dejando cadáveres en la cuneta, y el sector del transporte es una alegoría ejemplar de aquella histeria derrochadora.

Vale a pena ler o retrato que ali é feito sobre a utização de aeroportos como Castellon ou Ciudad Real. Até porque por cá também tivemos (ou temos) a mesma febre de construção a que Nadal se refere. De aeroportos e não só. E não falta até quem ainda agora proponha aeródromos regionais.

Ao cuidado dos que nos abanam

João Carvalho, 13.04.11

«O presidente da Mota-Engil, António Mota, criticou hoje a "falta de planeamento" em Portugal ao nível das grandes obras públicas, o que justifica uma maior aposta do seu grupo na internacionalização.

Na sua opinião, uma das razões para a Mota-Engil investir na internacionalização é a "indefinição quanto a grandes projetos de investimento", como o comboio de alta velocidade e o novo aeroporto.

"Nós não planeamos, Portugal não tem um planeamento estratégico naquilo que são infraestruturas" — lamentou.»

É verdade e António Mota não fez qualquer descoberta: Portugal tem sido incapaz de qualquer planeamento, estratégico ou não, e isso é um mal que vem de longe. Já quanto à internacionalização do grupo que trata por tu as grandes obras públicas, o melhor que podemos fazer é desejar-lhe felicidades e que mande de lá saudades. Porque o que menos precisamos por cá (há muito tempo) é da Mota-Engil, do BES, da Brisa, da Lusoponte e de todos aqueles do costume que vivem à mesa do Orçamento do Estado e que querem abanar-nos mais um bocado para ver se ainda cai algum.

A bitola do ministro

João Carvalho, 03.05.10

Se derem atenção a este post do Paulo Gorjão mais abaixo e a estas palavras do actual ministro das Obras Públicas, hão-de reparar que ele não se limita a insistir em obras que ele devia saber que não poderão avançar. Hão-de reparar que ele não se limita a defender um aeroporto que está por estudar, porque a aviação comercial mudou completamente em dois anos. Hão-de reparar que ele não se limita a defender a projecção de Portugal na rede ferroviária transeuropeia de alta velocidade, como se o TGV atravessasse a Espanha de avião por as linhas serem diferentes do resto da Europa.

Não. Hão-de reparar que ele não se limita a isso. Há mais qualquer coisa nele que começamos a descobrir e que se relaciona com comboios. Não sei se é a bitola estreita.

A esquerda fez outras contas? Então apresente-as.

Luís M. Jorge, 02.05.10

Vasco Pulido Valente propõe hoje uma dúzia de decisões para reagir à catástrofe que se aproxima. Algumas parecem-me justas, outras obrigatórias, outras são um insulto dirigido à classe média de um país que precisa de a fortalecer. Analisemos por partes.

1.º Reduzir o número de feriados. Quatro chegam: o Natal, o Ano Novo, o Dia de Portugal e a Sexta-feira Santa. [...]

Concordo. Um mês de férias é mais que suficiente para uma pessoa honesta.

2.º Fechar empresas públicas: as que são inteiramente substituíveis (por exemplo, a EPUL e a RTP) e as que perdem dinheiro sem qualquer resultado relevante ou benéfico (a lista é infinita).

Concordo em parte. A EPUL perdeu a sua função social, se alguma vez a teve, e foi até há pouco dirigida por uma quadrilha de malfeitores. A RTP é um sorvedouro e continua a acumular prejuizos. O único serviço público que nos presta é o de levar ao colo as potestades do governo que lhe paga. Quem já trabalhou, como eu, com altos funcionários da casa reconhecerá sem esforço a sua criminosa incompetência. No entanto, discordo da anunciada privatização dos CTT, uma empresa lucrativa que presta um serviço público relevante.

3.º Fechar as fundações e pseudofundações que o Governo sustenta, quer directamente (ou seja, do centro), quer através das câmaras.

Concordo em princípio. As fundações devem ser criadas e sustentadas por privados. Seria útil que não se confundissem com agremiações de boys.

4.ºVender as propriedades do Estado que não servem um interesse nacional evidente (quartéis, prédios, matas, florestas, por aí fora).

Concordo com reservas. No caso das matas e florestas, por exemplo, há que assegurar a sua limpeza e manutenção em condições eficientes. Defendo uma avaliação casuística.

5.º Vender os submarinos e outro armamento inútil ou excessivo.

Concordo, a menos que me demonstrem a necessidade desta tralha aparatosa.

6.ºDemolir e vender o autódromo do Estoril, o autódromo do Algarve e meia dúzia de estádios deficitários, sem indemnização a particulares.

Concordo. O autódromo ainda não foi vendido? Devia. Quanto aos estádios, só falta implodi-los e seviciar quem os ergueu.

Isto ajuda, mas não chega. É preciso continuar. Com o seguinte: 1.ºSuspender imediatamente os grandes projectos (o novo aeroporto, oTGV, a TTT).

Concordo, por partes: nos últimos 3 anos houve uma redução do tráfego aéreo em Portugal que contrariou as previsões do Governo. Os defensores do novo aeroporto devem um esclarecimento ao país. Quanto ao TGV, não gosto deste argumentário — ainda não chegámos à República Dominicana. E no que respeita à terceira travessia sobre o Tejo, espero que o primeiro-ministro consiga oferecer-nos o esboço de um motivo para a defender. Já basta o que basta.

2.º Não construir um único quilómetro de auto-estrada.

Concordo. Portugal é dos países europeus com mais auto-estradas por habitante e densidade geográfica. O dr. Jorge Coelho que me perdoe, mas se calhar já chegam.

3.º Proibir a contratação de mais funcionários públicos.

Discordo. Estas boutades pomposas só ocorrem a quem ignora o que é a gestão de recursos humanos.

4.º Eliminar serviços sem objecto ou mesmo nocivos (por exemplo, o Instituto do Livro).

Concordo em parte. É uma afirmação excessivamente genérica, e desconheço o exemplo.

5.º Congelar as promoções no funcionalismo, pelo menos, durante 5 anos.

Discordo. É imbecil e inexequível. Provocaria uma revolta sem benefícios. 700 mil portugueses não são uma manada de vacas.

6.º Acabar com o chamado “subsídio de férias” (para subsídio, já bastam as férias pagas).

Discordo. O subsídio de férias é o que separa muitos dos nossos compatriotas da mais abjecta miséria.

7.º Pôr um limite legal à despesa do Estado.

Discordo. Os limites legais são um substituto cego do bom senso. Prefiro mecanismos como os que obrigam todas as propostas de aumento da despesa do Estado à menção das suas fontes de financiamento.

8.º Aumentar o IVA dois por cento.

Discordo. Porquê 2 por cento? Já agora 5. Isto é treta: qualquer decisão semelhante tem que ser justificada a partir das suas consequências económicas.

9.º Regular a banca estrita e rigorosamente.

Mais conversa de chacha. Estrita e rigorosamente não quer dizer coisa alguma. O VPV propõe o fim do sigilo bancário? A limitação dos vencimentos e prémios? A tributação do envio de fundos para off-shores à semelhança do que se faz em Espanha? Ou, como parece, deseja uma declaração de intenções sem qualquer efeito prático?

 

Concluo: a crise financeira tem o mérito de nos fazer reflectir no que é essencial e acessório no governo do Estado. A direita, manifestamente, já começou. Se a esquerda fez outras contas, deve apresentá-las. O país não tem tempo nem pachorra para mais generalidades ideológicas.

 

Nota: li o artigo, mas por pura preguiça roubei estas citações ao Eduardo Pitta.

Nas asas da crise

João Carvalho, 19.04.10

O primeiro-ministro deve andar mortinho que lhe perguntem se acharia bom ter um TGV apontado a Espanha, pronto a minorar o caos que se instalou na Europa com os voos cancelados. (Claro que ele jamais iria referir que a linha espanhola não é de bitola europeia e que, por isso, a ligação com França não estaria resolvida.)

Problema seria perguntarem-lhe a seguir para que serve um aeroporto novo, quando há cada vez menos voos e menos companhias aéreas. O melhor mesmo é ele não se pôr a jeito para falar.