Abril: canções de protesto (12)
Nam ne nuzhna voina (Nogu Svelo!, 2022)
Rússia
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Nam ne nuzhna voina (Nogu Svelo!, 2022)
Rússia
Yo me Enamoré (Los Minúsculos, 2018)
Nicarágua
Правілы (Nizkiz, 2020)
Bielorrússia
A Marcha (Azagaia, 2007)
Moçambique
Te odeio 2016 (MC Kappa)
Angola
Devuélveme mi País (Carlos Puchi e outros, 2014)
Venezuela
Glory to Hong Kong (coro anónimo, 2019)
Hong Kong
Baraye (Shervin Hajipour, 2022)
Irão
Mordaza (Luis Enrique e Erick Nicoya, 2018)
Nicarágua
Patria y Vida (Yotuel Romero, Descemer Bueno, Maykel Osorbo, El Funky, 2021)
Cuba
Canto do Desertor (Luís Cília, 1964)
Portugal
Abandono (Amália Rodrigues, 1962)
Portugal
O mês de Abril é muito antigo. Antes de Janeiro e Fevereiro serem acrescentados ao final do ano pelo rei Numa Pompilius, por volta de 700 aC, Abril já era o segundo mês do ano civil romano (Março era o primeiro). Por volta de 450 aC, Abril foi reorganizado no quarto período e recebeu 29 dias. Com a introdução do calendário gregoriano pelo Papa Gregório XIII em 1582, um dia extra foi adicionado. Mas ter certeza sobre a origem de uma palavra que existe desde antes de 1150 não é assim tão simples. Existem algumas teorias comuns por trás da nomenclatura "April". Uma é que o nome tem origem no latim Aprilis, derivado da palavra latina aperire e que significa “abrir” - poderia ser uma referência à abertura ou desabrochar de flores e árvores, ocorrência comum durante todo o mês no Hemisfério Norte.
Outra teoria sustenta que, como os meses costumam receber nomes de deuses e deusas, e como Aphrilis é derivado do grego Afrodite, Αφροδίτη, é possível que o mês tenha recebido o nome da deusa grega do amor, a deusa a quem os romanos chamavam Vénus.
Há muitos anos que não se celebrava um aniversário da Revolução que derrubou a ditadura do Estado Novo, num enquadramento tão propício a apreciarmos os valores democráticos. E não me refiro apenas à guerra em curso.
A liberdade a que este dia de há 48 anos abriu a porta foi celebrada com as cerimónias protocolares habituais, mas, talvez sem o destaque merecido, foi celebrada também pelo fim da obrigatoriedade do uso da máscara.
Imagem DN
Nestes cerca de dois anos que passaram, as máscaras impostas pela pandemia, que agora parece recuar, além de terem escondido indiscriminadamente lábios e sorrisos, perturbaram a forma como comunicamos, atrasaram a aprendizagem da fala aos mais novos, fizeram que muitas crianças não se recordem dos sorrisos das suas educadoras, impediram que reconhecêssemos amigos com que nos cruzámos, atrapalharam e reduziram a quantidade dos beijos dados pelos amantes e alteraram a forma como nos cumprimentamos.
É claro que também ocultaram os dentes cariados e falhos dos mais humildes, proporcionaram-nos uma desculpa para podermos ignorar pessoas que não queríamos realmente cumprimentar e até, talvez apenas, ajudaram-nos a entender melhor o que é o mau hálito.
Como animais de hábitos que somos desenvolvemos alertas visuais sempre que num espaço público víamos alguém sem o devido resguardo facial. Agora, e desde este Abril de 2022 já estamos a desenvolver o alerta contrário.
As máscaras não vão desaparecer instantaneamente, não serão proibidas, nem mesmo aos que insistem em usá-la abaixo do queixo, mas o seu uso passará a depender do entendimento de cada um. E isso é uma excelente forma de celebrar a liberdade.
Vivemos em sociedade e aceitamos as regras como moeda de troca pelos incontáveis benefícios de a ela pertencer. Diferentes regimes definem de forma diversa o ponto de equilíbrio entre o que deve ser decidido pela polis ou pelo indivíduo, e cada um de nós terá também diferentes entendimentos dessa relação.
O debate sobre o seu uso foi acalorado e não irá terminar de imediato. Foi interessante para procurarmos novos argumentos e novos critérios para definirmos essa mesma fronteira entre o nós e os outros. Não há uma resposta nem um critério único. Antes de Abril, antes do Abril de há 48 anos, haveria certamente um critério único, inequívoco e inquestionável. Depois desse Abril, foi definido um critério, foram cometidos erros (claro, somos governados por palermas) mas podemos manifestar a nossa discordância. Afirmar que somos governados por palermas, além de ser verdade, é também uma forma de celebrar Abril. E de cara destapada.
Lembrei-me de um dos Novos Contos da Montanha de Miguel Torga, que fui reler.
Fala da vida em Fronteira, uma terra que apenas dava à sua gente a água da fonte. Tudo o resto vinha de Fuentes, em Espanha.
Ali a vida era vivida de noite a tentar escapar aos guardas, que, de espingarda em riste, guardavam o ribeiro como podiam. Os contrabandistas, por seu lado, com carga às costas, passavam o ribeiro como conseguiam.
“E se por acaso se juntam na venda do Inácio uns e outros – guardas e contrabandistas –, fala-se honradamente de melhor maneira de ganhar o pão: se por conta do Estado a vigiar o ribeiro, se por conta da Vida a passar o ribeiro.”
O conto não é extenso, fala dos aldeões, dos guardas do Estado, de disparos a matar e também de amor.
Mas foi esta dualidade que me prendeu a atenção. Trabalhar por conta do Estado, neste caso a matar, ou por conta da Vida, a tentar escapar.
Esta pequena história é uma metáfora da relação entre o Estado, que quer controlar a população, e os aldeões, que apenas desejam sobreviver.
O guarda Robalo, atraído para tais funções pela garantia de ordenado certo e a reforma por inteiro, sem disso dar conta vive dentro de uma bolha. E isso aumenta-lhe o empenho. Afirma que dispararia até contra a sua própria mãe, que fosse.
Com o correr da acção a bolha onde vive irá rebentar, mas esta visão maniqueísta de que servir o Estado é atacar os prevaricadores faz por ignorar que do outro lado desenrola-se a Vida, e Vida, escrita por Torga, com V maiúsculo.
Do alto da sua ofuscada visão do mundo, o guarda Robalo, ignora que existe Vida para além do que a sua curta vivência lhe permite enxergar. E essa curta vivência e visão serve ao Estado que o alimenta e veste. Sem disso dar conta, ele é apenas um instrumento, bem instruído, que tem a Vida por adversária. No fim de contas, o Robalo é apenas um intermediário entre os seus donos que lhe tolheram a vontade e a sua bala que em brasa é disparada contra a Vida.
Este confronto é uma parábola cheia de metáforas escrita por um rebelde que viveu, e escreveu, incomodado com a capacidade dos que conseguem reduzir a realidade a um binómio de bons e maus, e de caminho asseguram o conforto próprio. Se sempre existiram desigualdades, para quê mudar isso, especialmente se se está do lado vantajoso?
Ignoram que a Vida já existia antes do Estado e que este lhe é apenas um acrescento, e não o contrário.
No regime actualmente em vigor em Portugal, a liberdade está refém do Estado. A liberdade de Abril não é a efectiva liberdade dos cidadãos, mas apenas a liberdade que o Estado entende dar aos cidadãos. O Estado, e os que por ele falam, decide a amplitude das escolhas possíveis. Os que por ele falam sabem que há opções, que mesmo que funcionem noutras paragens, cá seria uma irresponsabilidade escolhê-las, especialmente porque isso colocaria os cidadãos fora da sua esfera.
Várias décadas depois dos contos de Torga, as fardas e as balas são diferentes, mas o confronto ente o Estado e a Vida mantêm-se e nunca terminará. Cabe a cada um de nós escolher o lado onde se deve viver a Vida.
Uma revolução faz-se com gente boa e estafermos.
Com alguns filhos da puta e tolos também (muitos ainda andam por aí a darem-nos cabo da vida).
Depois, a história encarregar-se-á de colocar cada um no seu devido lugar. Sem caganças.
Se for sem sangue melhor. É mais pedagógico porque se prolonga no tempo.
Refina-se, sofre-se, não se apaga.
Transmite-se. Abrila-se todos os anos.
«Frio em Abril... Neve na Primavera...»
Às vezes questiono-me em que país - e em que planeta - vivem estes editores e difusores de informação, que nos telediários lisboetas apregoam como flores de estufa as frases que citei acima, todas proferidas em tom dramático.
Como se fossem notícia. Neste mês de Abril ou no de outro ano qualquer.
Figura nacional do mês
Completado o primeiro mês integral do segundo ano de mandato, o Presidente da República continua com uma popularidade estratosférica: 60% de opiniões positivas, segundo o barómetro mensal do Expresso. Quase duplicando a do primeiro-ministro, com quem continua a manter um impecável entendimento institucional, muito apreciado pelos portugueses.
Figura internacional do mês
O centrista Emmanuel Macron, que durante dois anos foi ministro da Economia do Executivo socialista tutelado por François Hollande, venceu a 23 de Abril a primeira volta da eleição presidencial francesa, impondo-se ao conservador François Fillon, ao pró-comunista Jean-Luc Mélenchon e ao socialista Benoit Hamon. Com 24% dos votos, este banqueiro de 39 anos é o favorito ao triunfo na segunda volta, que disputará a 7 de Maio com Marine Le Pen (21,3%).
Facto nacional do mês
Há oito anos que não acontecia: a taxa oficial do desemprego deixou enfim de ter dois dígitos, cifrando-se agora em 9,9%, segundo dados divulgados a 28 de Abril pelo Instituto Nacional de Estatística, com as estimativas provisórias referentes ao mês de Março a situar-se em 9,8%. Esta é a percentagem mais baixa de desempregados em Portugal desde Fevereiro de 2009, quando se cifrou em 9,7%.
Facto internacional do mês
Durante todo o mês de Abril, a crise política e social aprofundou-se na Venezuela. Com dezenas de mortos em protestos de rua reprimidos pela força militar convocada pelo Presidente Nicolás Maduro, saques de lojas, carência absoluta de víveres e medicamentos, perseguição a jornalistas e uma situação de caos económico no país, que apesar de exportar petróleo tem um PIB negativo de 18% e a mais alta taxa de inflação do mundo, avaliada em 1660%.
Frase nacional do mês
«A electricidade não é cara. As casas é que estão mal construídas.» Esta frase vem de um suspeito na matéria: o presidente da EDP, António Mexia, em entrevista concedida a 7 de Abril à TSF. Proferida talvez com involuntário sentido de humor no país da União Europeia que continua a praticar os preços mais elevados de luz e gás destinados ao consumo doméstico.
Frase internacional do mês
«Pensava que seria mais fácil. Tenho saudades da minha antiga vida.» Desabafo inesperado do novo inquilino da Casa Branca ao cumprirem-se os primeiros cem dias de mandato, a 28 de Abril. A frase surgiu numa entrevista à Reuters destinada a fazer um balanço do curto e já tão polémico trajecto presidencial do magnata que é hoje o homem mais poderoso do planeta mas suspira pela "vida antiga" que levava, afastado dos holofotes globais.
« Em que dia do mês calha a Páscoa »
Cidade sem carros, aeroporto sem aviões, Abril sem Primavera, Portugal sem austeridade, Lacerda sem contrato, Maria João Bastos sem Amélie, Ministro sem gravata, Piupiu sem Frajola, neném sem chupeta, queijo sem goiabada, Romeu sem Julieta, tralalá, tralalá...