Há alguns meses, comprei uma antologia de contos intitulada Legends, de 1998. Editada por Robert Silverberg, Legends junta contos de fantasia de alguns dos melhores escritores do género da actualidade. Entre estes figuram, por exemplo, George R.R. Martin, autor da consagrada série A Song of Ice and Fire - o conto The Hedge Knight foi o que me levou a comprar a antologia, e só por si vale os sete euros e vinte cêntimos que custou o livro - ou Robert Jordan, falecido em 2007, autor da série The Wheel of Time. E, claro, Terry Pratchett, com um conto saído directamente da série de fantasia que o celebrizou - Discworld. O conto publicado nesta antologia intitula-se The Sea and Little Fishes, e é a coisa mais divertida que já li desde The Hitchhiker's Guide to the Galaxy, de Douglas Adams. Discworld é, para todos os efeitos, um marco na literatura de fantasia, pela sua longevidade - já conta com trinta e nove livros publicados desde 1983 - e pelo seu inigualável sentido de humor, a satirizar naquele mundo plano assente em quatro enormes elefantes que viajam pelo Universo empoleirados na carapaça da gigantesca tartaruga Great A'Tuin clássicos da literatura, como Tolkien ou Lewis, como inúmeras referências da cultura popular.
A minha curiosidade quanto ao universo de Discworld era já antiga, e aquele conto foi a gota de água. Dada a minha incapacidade (não é só minha, mas adiante) de fazer e cumprir as tradicionais resoluções de ano novo - deixar de fumar, comer melhor, dormir mais, fazer exercício, tirar carta de condução, etc. -, decidi fazer desta série literária de Pratchett a minha resolução para 2012 - começar a ler Discworld, partindo do primeiro livro - The Colour of Magic - e ver até onde consigo ir sem estar necessariamente a fazer uma maratona e lendo outras coisas nos entretantos. Não que a série tenha necessariamente de ser lida por ordem cronológica - simplesmente preciso de alguma ordem, ou a coisa cedo descarrila. Ainda não comprei o primeiro volume, mas um vale de compras de uma livraria que recebi no Natal levou-me a comprar o décimo, Moving Pictures. Tem sido resistir a lê-lo de fio a pavio - aliás, tem sido impossível, dado que já li algumas páginas do início. Deixo aos leitores do Delito a seguinte passagem, que é capaz de dar uma ideia do estilo do autor e do seu mundo fantástico:
There's a saying that all roads lead to Ankh-Morpork, greatest of Discworld cities.
At least, there's a saying that there's a saying that all roads lead to Ankh-Morpork.
And it's wrong. All roads lead away from Ankh-Morpork, but sometimes people just walk along them the wrong way.
Poets long ago gave up trying to describe the city. Now the more cunning ones try to excuse it. They say, well, maybe it is smelly, maybe it is overcrowded, maybe it is a bit like Hell would be if they shut the fires off and stabbed a herd of incontinent cows there for a year, but you must admit that it full of sheer, vibrant, dynamic life. And this is true, even though it is poets that are saying it. But people who aren't poets say, so what? Mattresses tend to be full of life, too, and no-one writes odes to them. Citizens hate living there and, if they have to move away on business or adventure or, more usually, until some statute of limitations runs out, can't wait to get back so they can enjoy hating living there some more. They put stickers on the back of their carts saying 'Ankh-Morpork - Loathe It or Leave It'. They call it The Big Wahooni, after the fruit.
Every so often a ruler of the city builds a wall around Ankh-Morpork, ostensibly to keep enemies out. But Ankh-Morpork doesn't fear enemies. In fact it welcomes enemies, provided they are enemies with money to spend. It has survived flood, fire, hordes, revolutions and dragons. Sometimes by accident, admittedly, but it has survived them. The cheerful and irrecoverably venal spirit of the city has been proof against anything...
Until now.
Antes desta descrição há um diálogo hilariante de um fantasma com a Morte (um dos protagonistas da série), mas este texto já vai longo. 2012 pode ser o ano terrível que os comentadores andam a anunciar na imprensa todos os dias, mas pelo menos em termos literários espero que o meu 2012 seja bastante divertido.