20 anos
A memória é uma coisa tramada.
Diz-se que todos nos lembramos de onde estávamos a 11 de Setembro de 2001. Não serei excepção, claro, apesar de não ter a certeza de toda a memória que tenho daquela tarde ter acontecido exactamente como me lembro, e de haver alguns detalhes que não parecem bater certo (um dia talvez traga aqui a memória incompleta e incerta que tenho da primeira vez que vi The Matrix, sem dúvida o filme da minha vida). Tinha 16 anos. Lembro-me de ter chegado à aldeia, decerto vindo de Odemira apesar de as aulas ainda não terem começado (julgo que começavam sempre um pouco mais tarde em Setembro; não tenho memória do que terei ido fazer à vila, talvez qualquer coisa relacionada com as matrículas, talvez confirmar os horários). Não sei se regressei de autocarro; é provável que não, pois o autocarro não me permitiria chegar pouco antes das 14:00. Decerto terei tido boleia, mas de quem, não faço a mais pequena ideia.
Enfim, como dizia, lembro-me de chegar à aldeia, de a caminhar pela rua principal, e de ter visto várias pessoas de pé no interior do café a olhar fixamente para a televisão. Entrei e no pequeno ecrã vi duas torres, uma delas a arder. Alguém, não me lembro quem, explicou pouco depois que um avião tinha colidido contra a torre, mas não se sabia bem o que tinha acontecido, se teria sido acidente ou não. Mas em poucos minutos todas as dúvidas se dissiparam quando assistimos em directo à colisão de outro avião contra a segunda torre.
Fui para casa almoçar, liguei a televisão do meu quarto e continuei a acompanhar o directo a partir de Nova Iorque com a minha mãe. Lembro-me de vermos aquelas imagens juntos, das torres em chamas, dos relatos de outra colisão contra o Pentágono e de um quarto avião despenhado algures no campo. A minha mãe a dada altura comentou que com um estrago daqueles as torres deviam desabar; disse-lhe que talvez não, que o embate tinha sido bastante alto. Um palpite pouco informado que se desfez em poucos minutos, quando assistimos com horror ao desabamento da primeira torre. A segunda cairia pouco depois.
Até àquele dia nunca tinha prestado grande atenção às Torres Gémeas. Eram dois arranha-céus numa cidade distante e cheia de arranha-céus, e nada mais. Mas a partir dali nunca mais as esqueci. Hoje, ao ver filmes e séries anteriores a 2001, é impossível não reparar naquele par de edifícios, no vazio que a sua destruição deixou. E no simbolismo dessa destruição, que fez despertar imensa gente para a política, como eu despertei naquele dia. As minhas memórias do 11 de Setembro de 2001 podem ser imperfeitas e difusas, mas lembro-me perfeitamente da noção de que alguma coisa tinha acabado de mudar no mundo - e tenho a certeza de que tudo foi diferente a partir daquele momento.