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Delito de Opinião

10 de Junho

José Meireles Graça, 13.06.25

No Natal e na Páscoa todos, incluindo ateus e agnósticos, celebram as efemérides na certeza inconsciente de que são as da nossa identidade enquanto cristãos. Não muçulmanos, nem budistas, nem sikhs, nem outra coisa qualquer – cristãos.

Larga pertença, essa. Há outras, como a nacional, que consiste em, por ter nascido aqui e crescido no meio de modos próprios de ser, de falar, de pensar, de comer, de conviver, e de crer e descrer, sabermos que somos irremediavelmente Portugueses, até mesmo os que arrastam pela vida o grande desgosto de não terem nascido Ingleses ou Americanos.

Ser Português quer dizer muitíssimas coisas para muitíssimas pessoas agudas, mas para mim, que sou simples e chão, basta-me o saber que em qualquer lugar no estrangeiro sou estrangeiro. E é claro que não tenho dúvidas de que, em que pese o justificadíssimo desporto nacional que os melhores de nós tradicionalmente praticam, e que é o de cascar em todos e em tudo o que achamos explica o nosso atraso relativo, nós Portugueses não temos qualquer problema de identidade – se alguma coisa temos é identidade a mais, não a menos.

De modo que há algumas datas em que se celebra esta identidade. E mesmo que nelas o comum do cidadão não ouça os discursos, nem tenha excessiva curiosidade pelas cerimónias, uns e outras tradicionalmente chatas, e prefira ir à praia, ao passeio ou à batota, ninguém levaria a bem que não se fizesse nada. Temos uns mestres de cerimónias que elegemos para esse efeito, entre outros, dos quais o Presidente da República é o mais representativo.

O 10 de Junho é um dia desses. O pretexto é a data da morte de Camões, o poeta da portugalidade por antonomásia, e está muito bem assim.

Sucede porém que este ano o discurso do  orador convidado (oradora, a escritora Jorge) causou repulsa a muitíssimas pessoas de direita e, imagino, a algumas de esquerda que não deem nada para o peditório da autoflagelação. Repulsa porquê? Vamos ver.

O admirável João Pedro Marques, aqui, demoliu metodicamente tudo o que de factualmente errado a arenga continha, e é muito.

O que sobra, além da floresta de erros? Começa bem, com um longo e muitíssimo bem escrito exórdio sobre a vida, obra, importância e actualidade de Camões, sem esquecer o que dizem investigações recentes sobre a sua vida e obra.

Mas depois começa a psicologizar os três monstros literários da época e de sempre (além do próprio, Shakespeare e Cervantes) e não é que, com citações criteriosamente escolhidas, os preclaros anunciavam os malefícios para a humanidade dos três impérios de que eram nacionais, e antecipavam o opróbrio e a ignomínia com que a historiografia revisionista e woke hoje, a golpes de ignorância e descontextualização, cobre as impressionantes realizações das Descobertas e da expansão e conquistas que se lhes seguiram? Quais conquistas o quê? As crueldades, a subjugação, a exploração, a pilhagem, tudo o que caracterizou a história da humanidade e que quando se “deram novos mundos ao mundo” se amplificou gigantescamente, precisava mesmo era de um tribunal internacional de Haia, que infelizmente não estava disponível à época. Não faz mal, realizamos agora o julgamento e, no caso de sermos brancos e de nacionalidades com passado imperialista, devemos fazer um acto de contrição e expiar a nossa culpa indemnizando os tetranetos das vítimas, mesmo que não saibamos bem quais dos nossos ascendentes andaram a pôr o mundo a ferro e fogo, e quais dos habitantes das regiões antigamente oprimidas descendem dos Adões e Evas que naqueles tempos pregressos gozavam em aldeias de palhotas os benefícios das suas inocentes, pacíficas e tranquilas existências.

Lídia Jorge sobre os Romanos não disse nada. Fez muito bem porque no tempo deles Portugal não existia e Portugal era o assunto do discurso. Mas na verdade a lógica que amarra ao pelourinho da abominação os conquistadores vale por maioria de razão para a civilização Romana, que assentava na escravatura, e não sei se na prosa de Cícero, ou nos versos de Virgílio, não haverá condenações avant la lettre – é procurar bem.

Camões está afinal entre nós hoje não porque a sua epopeia faça parte da nossa história e da nossa memória colectiva, mas porque anunciava “o fim de ciclo que se seguiu ao tempo da Renascença malograda”, que evidentemente se relaciona com os dias que estamos a viver.

“O poder demente, aliado ao triunfalismo tecnológico, faz que a cada manhã, ao irmos ao encontro das notícias da noite, sintamos como a Terra redonda é disputada por vários pescoços em competição, como se mais uma vez se tratasse de um berloque”.

Confesso: quando de manhã vou ao encontro das notícias da noite no meu “écran de bolso” não vejo nada desses pescoços e pavores e portanto peço licença para não seguir a opinião que Lídia preopina de ser contra isso, e por isso, que vale a pena que Portugal e as Comunidades Portuguesas usem o nome de um poeta por patrono.

Nem compro o resto do discurso, um longo arrazoado segundo o qual a cultura digital subverteu a regra da exemplaridade. “O escolhido passou a ser o menos exemplar, o menos preparado, o menos moderado, o que mais ofende”.

É verdade. A essa escumalha infecta que pulula nas redes sociais deu-lhe ultimamente para guinar para a direita. Deve ser por não lerem Camões. Nem Lídia Jorge.

Hino, Camões, 10 de Junho

Pedro Correia, 10.06.25

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Penso há muito que o Hino Nacional devia ter versos de Luís de Camões. Sendo o Dia de Portugal assinalado a 10 de Junho, em evocação da data da morte do nosso maior poeta, faz todo o sentido.

Não desfazendo, claro, no vate Lopes de Mendonça, autor da letra do presente hino. Mas entre Camões e Mendonça, prefiro o primeiro.

A música de Alfredo Keil, naturalmente, deve manter-se.

Victor

Sérgio de Almeida Correia, 23.06.24

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Não poderia faltar. Por isso lá estive. 

Onde? Perguntar-me-ão.

Ali, na Casa Garden, paredes-meias com o Jardim Luís de Camões, onde está o espartano busto do dito, gravado no tempo da antecâmara feita na solidez da rocha que o protege das intempéries.

Ontem esteve lá o Victor. O autor, em 1989, da capa do I Glossário Jurídico Luso-Chinês. Nessa altura ninguém sabia quem era ele. E ainda hoje não sabem. Os portugueses. Os outros sabem.

Pois bem, o Victor lançou um livro, imaginem só, com todos os desenhos que fez para os cartazes do Dez de Junho. Desde 1990. Falhou dois anos. Houve um espírito menor iletrado que passou pelo Instituto Cultural sem ter percebido quem era o Victor.

A bem dizer não é um livro. É uma enciclopédia. Uma novela. Um filme. Está lá tudo. Até o quase de que quase nunca ninguém fala. Mais a senhora dona Amália e o Eusébio.

Mas ontem o Victor falou. Disse umas palavras com tudo aquilo que lhe ia na alma. Emocionou-se. Eu vi. E foi como se a noite anterior ainda não tivesse acabado. E o Álvaro, o Miguel e eu, que quase nunca estamos com o Victor, tivemos o privilégio de nos termos encontrado com ele de véspera. Mais o Nelson. Até parecia que tinha sido combinado. Ah, les grands esprits. Sauf moi.

E depois, aquela cumplicidade no olhar, tão querida e descomprometida, de quem já fez o caminho das pedras sem se perder. E voltou sempre. Deixando tudo no mesmo sítio, seguindo a ordem natural das coisas, a natureza dos homens, a beleza das mulheres, e o respeito por tudo aquilo que nos rodeia. O respeito e a gratidão.

O Victor sublinhou-o. Eu também o sublinho.

A ética dos homens livres, que sabem qual o preço da sua liberdade e o custo da ousadia, medem isso mesmo. Lêem todos o mesmo painel que o Victor registou. São três palavras muito simples, e que dizem tudo. Liberdade, respeito e gratidão.

A ordem dos factores não é aleatória. Não se nasce antes de morrer. Embora haja alguns que conseguem morrer sem nunca terem nascido. E mandam.

O Victor é tudo isso. Porque o talento dos grandes nunca sai desses parâmetros. Não há cagança, há discrição. Não há serodismo, há História.

Tal e qual como na profundidade do olhar do mocho, protegido na sua terna penugem, atravessando a cortina do tempo na verticalidade dos anos. Um após outro.

E depois, o Victor é um tipo de uma generosidade extrema, de uma alma imensa, com uma portugalidade tão vincada que me faz sentir o quanto sou pequenino, o quanto somos todos menores perante um traço maior que nos define nos cinco continentes. Para todo o sempre.

É claro que gostei do livro (obrigado pela dedicatória e o autógrafo), do momento, de sentir o quanto o Victor estava emocionado.

E recordei-me daquele dia de manhã em que me telefonou porque tinha levado o quadro errado, porque o meu não estava na galeria, estava em casa dele. Agora está em Cascais, onde pertence.

Mas não foi por isso que fiquei grato ao Victor, nem é por tal que escrevo estas linhas.

Eu escrevo porque gosto de cumprir as minhas obrigações.

Neste caso é mais do que uma obrigação. E ao contrário da minha sombra, eu não tenho gosto em deixar uma obrigação por cumprir. Cumpri-las também me dá gozo, me dá prazer, e é um acto intrínseco de liberdade.  Como quando bebo um gin & tonic e fumo um charuto. 

E escrevo aqui e agora, nesta hora de onde não avisto o golfo de Sorrento, porque os cartazes do Dez de Junho do Victor deverão, a partir de hoje, percorrer o mundo. E depois deverão ser expostos na Assembleia da República, no Museu da Presidência, percorrendo as escolas de Portugal e ilhas. Espero que a Isabel Moreira esteja atenta.

Espero que o outro Victor, o de Tóquio, ainda os possa acolher na nossa Embaixada. E que eu possa lá ir. Mais a outra sombra que me acompanha.

E que em Lisboa, no Porto, em Paris, em São Paulo, em San José, na Horta, talvez no Peter´s, onde for, encontrem um espaço e um mecenas, já que há tantos nas revistas, para pagar o transporte dos cartazes. Para que todos possam ver e conhecer o Victor. Em toda a sua simplicidade.

O que lá está não pode ser descrito. Não vemos todos a mesma coisa. E sabemos haver gente com olhos que não vê, e cegos que vêem para lá dos limites da Eternidade. Ou que viam. Como o meu padrinho Fernando Luís. Ou o Jorge Luís Borges. Que saudade, de ambos, meu Deus.

Em rigor, a razão de escrever estas linhas é que também há coisas que têm de ser ditas. Para que não se pense, um dia, que os portugueses importantes de Macau, e aqui agradeço ao anónimo, são pequenos lucíferes anões, milionários, sem pátria, que têm tempo de antena à segunda, terça e quarta-feira sempre com o mesmo fato e a mesma gravata.

Até porque o Victor não usa gravata. Não sei mesmo se ele sabe o que isso é, embora eu goste muito gravatas. De boas gravatas. E faça gosto em usá-las. Quando posso. Até se desfazerem. Às vezes depois disso.

Não, o que aqui me traz é muito mais importante do que tudo isso, só tendo paralelo na generosidade do Victor. E o Carlos irmão que me perdoe com toda a sua simpatia.

Porque o que é mesmo importante aqui ficar escrito, e os meus amigos que me desculpem, a começar pelo José Manuel, o Rui e o Luís, que já cá não estão, é que o Victor, que é igualmente um amigo, é o maior português de Macau desde os tempos do Camilo Pessanha. Isto tinha de ficar escrito.

E isto é tão rigoroso quanto a minha saudade pela Mélita, a minha paixão pela música do Brel, o encanto pela Loren, pela poesia do Fernando, a escrita do José ou do António, ou a minha paixão pela ternura da M.T. e os meus amigos.

O Victor é uma espécie de Serge Gainsbourg que fala português. Sabe rir em chinês e ainda pisca o olho aos amigos.

Não falo nelas porque nisso ele é como eu, e eu não sei quem é a sua Jane Birkin. Não temos tempo para lhes piscar os olhos porque gostamos de os ter bem abertos quando mergulhamos no seu olhar. E nos perdemos até reencontrarmos o caminho de volta.

Tirando isso, que acima ficou escrito para memória futura, recomendo-vos que façam uma visita à Catarina Cottinelli e à Casa Garden.

Certamente que já não encontrarão por lá a Amélia, nem o Carlos, que têm outras vidas, e já fizeram o seu trabalho, como outros também o fizeram, a partir do Porto, para trazerem, e entregarem, verdade seja dita, o Victor a Portugal e aos portugueses.

E uma vez mais, no mesmo dia em que Portugal estraçalhou os nossos amigos turcos em Dortmund, sob a batuta de um inspirado capitão, recomendo-vos a liberdade, o olhar, a generosidade, o encanto e a serenidade de um português de Macau.

Português como nós. Quer dizer, um bocadinho maior do que nós. 

Coisas que todos os milionários querem comprar, mas que só está ao alcance de espíritos superiores.

De génios na sua arte. De talentos que não se mercadejam. De gente como o Victor.

Saravah, Victor. A bênção, Senhor.

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P.S. Fez bem em estar presente o cônsul-geral de Portugal, Alexandre Leitão. Amanhã, provavelmente, será também caricaturado. Como muitos outros o foram. Mas só os imbecis não são suficentemente inteligentes para não se rirem da sua própria caricatura.

10 de Junho

Pedro Correia, 10.06.23

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Estátua de Vasco da Gama em Sines

 

Os Lusíadas, obra maior da nossa literatura, tem duas personagens principais: Vasco da Gama e o Velho do Restelo.

Lendo as alegadas redes sociais, por estes dias, diria que somos todos netos ou bisnetos do Velho do Restelo, não descendentes do heróico navegador que ligou Lisboa à Índia. Faz toda a diferença. 

Eis uma reflexão para este 10 de Junho.

Ler (4)

Psicopátria em dez romances portugueses

Pedro Correia, 10.06.22

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Neste 10 de Junho, apetece-me escrever sobre escritores portugueses. Para mencionar os romances do século XX escritos no nosso idioma que captam as luzes e sombras da portugalidade. Do ponto de vista histórico, social e até geográfico.

Conjunto de romances capazes de proporcionar ao leitor uma visão abrangente da nossa Psicopátria. Ignoro se já foi tema para tese de doutoramento, mas a ideia aqui fica.

 

Entre as melhores narrativas portuguesas do século passado constam obras que descrevem o homem enquanto ser introspectivo - é o caso de Para Sempre, de Vergílio Ferreira. Ou o definem como membro da sociedade - sucede com Nome de Guerra, de Almada Negreiros. Ou o projectam no mundo e aí o entregam à sua sorte - temos como expoente A Selva, de Ferreira de Castro. Ou retiram coordenadas espaciais e temporais para exporem o ser humano na sua nudez elementar perante um cataclismo global - acontece no emblemático Ensaio Sobre a Cegueira, de José Saramago.

Mas a Psicopátria surge noutros romances que nos desvendam enquanto povo neste concreto chão que nos coube em sorte e foi moldando um carácter colectivo.

Se me pedirem para indicar dez, são estes: Cerromaior (1943), de Manuel da Fonseca, Mau Tempo no Canal (1944), de Vitorino Nemésio, A Sibila (1954), de Agustina Bessa-Luís, A Casa Grande de Romarigães (1957), de Aquilino Ribeiro, Barranco de Cegos (1961), de Alves Redol, A Torre da Barbela (1964), de Ruben A., O Delfim (1968), de José Cardoso Pires, O Milagre Segundo Salomé (1975), de José Rodrigues Miguéis, Sinais de Fogo (1979), de Jorge de Sena, e O Esplendor de Portugal (1997), de António Lobo Antunes.

Cada qual no seu estilo, constitui uma ode em prosa à portugalidade. Num tempo e num espaço muito precisos.

 

Escrevo com a satisfação de saber agora reeditado, na histórica Bertrand, esse monumento à língua portuguesa que é A Casa Grande de Romarigães.

O autor, com excessiva modéstia, procurou desvalorizar esta obra chamando-lhe «crónica romanceada». É definição que desconsidera um dos melhores romances escritos neste idioma de Camões, Vieira e Pessoa. Romance sobre o apogeu e decadência de um solar brasonado no Alto Minho e da família que o foi habitando ao longo de sucessivas gerações. Na peculiar sintaxe barroca de mestre Aquilino, semeada de coloquialismos e neologismos da sua lavra. Com diálogos saborosíssimos e episódios exemplares que nos perduram na memória.

Romance que ironiza sobre o País mas sente imensa ternura por ele. Como muitos de nós fazemos, afinal.

Hoje é dia de

Maria Dulce Fernandes, 10.06.22

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Hoje celebra-se O Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas 

"O Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas é assinalado anualmente a 10 de Junho, data da morte de Luís de Camões. Este dia presta homenagem a Portugal, aos portugueses, à cultura lusófona e à presença portuguesa por todo o mundo.

O 10 de Junho começou por ser um feriado municipal em Lisboa, dedicado a Camões. Foi elevado pelo Estado Novo a feriado nacional, como «Dia de Camões, de Portugal e da Raça». Com o 25 de Abril, passou a ter a actual designação"

.

O 10 de Junho era o dia do piquenique da família. De toda a família, aquela em que nascemos e aquela que escolhemos. Conforme o tempo que fazia, decidíamo-nos entre o Parque das Merendas de Sintra, o Parque de  Cascais (Ribeira dos Mochos), a Lagoa de Albufeira ou a Figueirinha. Era obrigatório todos os participantes contribuírem com um prato cozinhado, pão, água e vinho, levarem mantas, copos e talheres. A minha mãe levava galinhas pré-cozinhadas, uma caixinha com sangue, o pacote de arroz, um garrafão de água e um Campingaz. Depois era a magia da colher de pau e zás! Lumus! E a cabidela era de chorar por mais. A galinha macia, o arroz malandro, o sabor um regalo.

Um dos meus maiores desgostos, culinariamente falando, é não ter "mão" para misturar o sangue e muitas vezes fica talhado. Sabe bem, mas não é a mesma coisa. Imperdoável.  

Camões tinha olho para as coisas. Sabia das voltas que a vida dá e que quanto maior é a subida, maior é o trambolhão.  

Perdigão perdeu a pena
Não há mal que lhe não venha.

Perdigão que o pensamento
Subiu a um alto lugar,
Perde a pena do voar,
Ganha a pena do tormento.
Não tem no ar nem no vento
Asas com que se sustenha:
Não há mal que lhe não venha.

Quis voar a u~a alta torre,
Mas achou-se desasado;
E, vendo-se depenado,
De puro penado morre.
Se a queixumes se socorre,
Lança no fogo mais lenha:
Não há mal que lhe não venha.

 

Um abraço para as comunidades portuguesas por esse mundo fora, especialmente Rio de Janeiro, Luanda, Amsterdam e Geilenkirchen na Alemanha.

 

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A 10 de Junho celebra-se O Dia dos Alcoólicos Anónimos

"Foi a 10 de Junho de 1935, nos EUA, que se realizou a primeira reunião em que alcoólicos procuraram ajudar-se mutuamente. Desde então a mensagem de esperança da recuperação do alcoolismo expandiu-se, chegando a mais de 180 países e ajudando mais de dois milhões de mulheres e homens alcoólicos, em mais de 109 mil grupos que se reúnem regularmente.

Em Portugal, Alcoólicos Anónimos tem uma estrutura consolidada, mantendo activos 85 grupos e realizando perto de 190 reuniões semanalmente, distribuídas pelo continente e regiões autónomas, levando ao alcoólico que ainda sofre uma mensagem de esperança. Além das reuniões destinadas exclusivamente a alcoólicos, são organizadas regularmente reuniões abertas a não-alcoólicos, familiares, técnicos de saúde e outros profissionais e entidades."

Trabalhar com álcool ali à mão e não poder beber é um suplício tantálico para quem procura a resposta a todos os problemas existenciais no fundo de uma garrafa de vinho. É uma luta diária e são mais os dias em que se perde. Vejo-os lutar e cair e erguer-se para mais um dia, que em sendo bom, pode durar dois ou três. Alguns há cujo funcionamento já depende da ingestão da bebida e sabem que se o fizerem com conta peso e medida vão enganando os menos atentos e passam pela chuva sem grande molha, mas se chega a recaída sabem que a encharcada é difícil de reabilitar. É um dos grandes males da nossa era, mas não é recente e não irá desaparecer facilmente. 

 

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No 10 de Junho celebra-se O Dia do Ice Tea

"As origens do Lipton Chá Gelado remontam ao nosso estimado Sir Thomas Lipton. Após abrir a primeira mercearia em Glasgow em 1871, onde vendia chá aos seus clientes, viu o potencial que existia na aromática bebida e decidiu comprar várias plantações de chá no Ceilão (hoje, Sri Lanka). Foi o início de uma revolução que o levaria a democratizar o acesso ao consumo de chá, acreditando que o chá deveria ser desfrutado por toda a gente, e não apenas pelas classes mais ricas. Sir Thomas encontrou formas menos dispendiosas de embalar e transportar o chá, tornando-o disponível às pessoas comuns. O chá Lipton revelou-se um sucesso imediato, chegando rapidamente ao mundo inteiro. Hoje é apreciado por milhões de pessoas.

A grande oportunidade para o Chá Gelado chegaria 25 anos depois, durante a Feira Mundial de St. Louis em 1904. O tempo quente inspirou Richard Blechynden, dono de uma plantação de chá, a juntar gelo às amostras de chá que distribuía aos visitantes. O resultado refrescante e surpreendente foi um êxito imediato. Esta oferta promocional colocou o Chá Gelado no topo das preferências"

Caseiro, gelado, com limão e hortelã! Há lá coisa melhor para acompanhar a leitura, numa espreguiçadeira à sombra com o mar a brincar ali em baixo? Sou fã!

 

(Imagens do Google)

De longe, muito longe

Sérgio de Almeida Correia, 10.06.21

10 de Junho, o dia do Noddy nos país dos brinquedos

Paulo Sousa, 09.06.21

Segundo o Observador, a Câmara Municipal de Lisboa enviou para a Embaixada da Federação Russa, o nome, morada e contacto telefónico dos organizadores de uma manifestação de apoio ao opositor russo Navalny.

Sendo que dois deles têm dupla nacionalidade, russa e portuguesa, o mesmo equivale a dizer que poderá ter criado um problema para os respectivos familiares que lá vivam. Os manifestantes em causa ficam também a saber que uma viagem à Rússia lhes poderá causar alguns problemas de saúde. De acordo com as ancestrais práticas russas e soviéticas, o envio para a Sibéria é reservado às(aos) respectivas(os) viúvas(os).

Confrontado com o facto consumado, Fernando Medina terá respondido inicialmente que os promotores deveriam “ter o cuidado de não facultar informações pessoais que excedam o estritamente necessário para o cumprimento dos preceitos legais indicados”. Os líderes russos são tão previsíveis a despachar empecilhos para onde eles não chateiam, como os socialistas portugueses o são a descartar responsabilidades. Há coisas que nunca mudam.

Porém, o líder do município da capital não quis deixar o assunto assim. Arregaçou as mangas e enviou um email à “Embaixada da Federação Russa e ao Ministério do Estrangeiro Russo(!)” exigindo que apagassem os dados pessoais dos organizadores da manifestação.

O Noddy no país dos brinquedos não faria melhor. Os russos sabem bem que se não apagarem os dados, o Noddy irá chamar o Sr. Lei e para lhes dar uma lição.

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Obviamente que este assunto não terá qualquer consequência política, até porque em caso de aperto Fernando Medida poderá sempre usar o argumento infalível de que “foi sem querer”. E se mesmo assim não for suficiente, surgirá o Professor Marcelo a garantir que tudo será apurado até às últimas consequências. Vai ficar tudo ficar bem.

Hoje a Selecção ganhou e amanhã é 10 de Junho. Espero que possam aproveitar a ponte.

Viva Portugal! Viva o país do Noddy!

Palavras dos leitores

Pedro Correia, 11.06.20

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Sobre a minha proposta aqui expressa ontem, de alteração da letra do Hino Nacional, substituindo os versos de Lopes de Mendonça por um poema de Camões, houve quem concordasse e discordasse.

Fica um resumo.

 

«Nos dias que correm, o que faria sentido seriam versos de Bocage.»

Sampy

«Não sei se há textos de Camões cujo ritmo e métrica acertem com o ritmo e métrica da música de Alfredo Keil. Os textos de Camões já musicados, de Os Lusíadas ou quaisquer outros, não tiveram muita sorte quanto a música...»

JAB

«Excelente sugestão. Tudo o que nos livrasse desta cópia bera da Marselhesa (a música também não é a ideal, mas a coisa de "marchar contra os canhões" é bem pior).»

JPT

«Seria também pertinente e justo conter passagens de Pessoa... e, premiando a justiça da coisa, de Saramago. Poderá alguém achar que estarei a desprestigiar o poeta [Camões], mas acho que estou a elevá-lo, colocando-o com uma importância semelhante àqueles dois personagens das artes e de valor incomensurável.»

El Profesor

«Assim em abstracto, sem uma proposta concreta de quais os versos a utilizar, e a que passo da música, o pensamento do Pedro Correia de nada vale. Mais valera não o exprimir.»

Luís Lavoura

Arbitrariedade informal

Sérgio de Almeida Correia, 10.06.20

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Há dias era a Associação dos Advogados de Macau, fugindo à regra, que apelava aos seus membros para reportarem e denunciarem todas as situações de abuso, imposição de restrições e impedimentos ao exercício do mandato forense. O advogado Pedro Leal, um dos mais conhecidos e reputados penalistas locais, chegou a referir que por vezes anda 48 ou 72 horas à procura de uma pessoa; que quando se liga à procura de alguém a polícia diz que não está lá ninguém, e "andam a omitir constantemente a situação". A Polícia Judiciária desmentiu todas essas acusações num estranho comunicado para dizer que cumpre a lei.

Depois, foi a actuação perfeitamente desproporcionada e despropositada no Largo do Senado, por parte de agentes policiais, no final de tarde e noite de 4 de Junho de 2020. Não há quem não diga que está a cumprir "rigorosamente" a Lei Básica. Até quando se quer tapar o sol com uma peneira, considerando-se, para justificar a dualidade de critérios, que uma manifestação de apoio ao Governo Central não é uma manifestação, e como tal pode estar sujeita a outras regras.   

Ontem foi revelado no Telejornal da TDM (a partir do minuto 4:57) que uma rapariga de 19 anos foi abordada por dois agentes da PJ à paisana, obrigada a identificar-se, sem que estivesse a manifestar-se ou a fazer algo de ilegal, intimada a mostrar os seus pertences, e depois levada para uma carrinha, onde estavam mais cinco agentes à paisana, e transportada de Macau para a Taipa, sendo depois interrogada pela PJ no seu edifício do Cotai. Obrigada a assinar os documentos que lhe deram, em que dava o seu "consentimento" ao que os agentes quisessem fazer, questionaram-na sobre a sua vida pessoal e cívica, tendo-lhe sido pedido que desbloqueasse o telemóvel para que os fulanos pudessem ler o conteúdo das suas mensagens. No final, relatava esta manhã o Macau Daily Times, os agentes disseram-lhe que "ainda é jovem", que se concentrasse nos seus estudos e se deixasse de política.

Contactada pelos jornalistas da TDM sobre o triste episódio, a mesma Polícia Judiciária, que diz cumprir escrupulosamente a Lei Básica, confirmou o episódio e veio esclarecer que tinha sido qualquer coisa como uma "investigação informal". Nada de oficial, portanto. Não há crise. Cumpre-se a lei, dizem. 

Eu sei que ultimamente o clima se adensou, que passámos a ter uma Comissão de Defesa da Segurança do Estado, para uma cidade com menos de 700.000 habitantes, sem problemas de segurança e com milhares de câmaras de televisão nas ruas, parques de estacionamento e edifícios; e que em Abril deste ano, aquando da discussão das Linhas de Acção Governativa, se anunciou a criação de um Gabinete da Comissão de Defesa da Segurança do Estado, que deveria entrar em funcionamento "o mais rápido possível", e que muitos de nós já suspeitam dos movimentos nas ruas de algumas pessoas, e que não sabemos se são bandidos ou agentes policiais, porque todos andam "à civil", nem por que razão nos seguem e fotografam se cumprimos a lei e vivemos "às claras" (falo por mim).

De uma forma ou de outra, muitos já começaram a sentir o clima de medo, insegurança e arbítrio típico dos estado policiais. Cada dia que passa confirma-se, embora ainda nenhum livreiro (desconfio que já não haja cá nenhum) tenha sido raptado.

A Comissária dos Negócios Estrangeiros enche páginas de jornais, fazendo de conta que se tratam de artigos de opinião, normais, quero dizer, ao mesmo tempo que uma jovem estudante é tratada como uma criminosa, numa acção típica de uma polícia política, que identifica, vasculha e intimida sem razão aparente e por mera suspeita de simpatia para com os movimentos pró-democráticos.

Se não há uma polícia política, informalmente e sob diversas capas há quem faça as vezes dela, e esteja aí para fazer cumprir o princípio "um país, dois sistemas" de acordo com a sua própria interpretação. 

Há quem pense que tudo isto é normal, aceitável, e diga que os residentes, alguns nascidos aqui, são apenas "convidados". E que como tal têm é de ignorar garantias, direitos cívicos e os desvirtuamentos do que foi acordado porque isto é um "assunto interno". Enfim, devem ficar calados e participar na festa. Ou largarem casas e vidas e zarparem para outras paragens. 

Oficialmente é tudo sorrisos, croquetes e palmadinhas, seja no Dez de Junho, que hoje também se comemora numa versão "mini" devido ao Covid-19 (enquanto as equipas dos barcos-dragão vão treinando sem máscara e não respeitando distâncias entre remadores), seja em todos os restantes dias do ano. A gente está (quase) toda contentinha, apesar de quando em vez aparecer alguém, quando a coisa se torna demasiado grosseira, a queixar-se.

Sem querer pedir demasiado, e porque Camões continua, timidamente, entre nós, quero aproveitar esta oportunidade para alertar os nossos investigadores para a necessidade de se saber qual a contribuição que demos – todos, dos comerciantes e empresários aos magistrados, dos funcionários públicos aos jornalistas, dos advogados aos diplomatas, dos políticos aos militares – para a arquitectura do actual estado policial e para a preparação desta guarda pretoriana que na RAEM nos vigia e pastoreia nas ruas, nos escritórios e nas redes sociais. 

A menos que haja interesse de Portugal em que todos acabemos, justa ou injustamente, como é norma, por levar por tabela, ficando eternamente conotados, para o melhor e para o pior, sem que se separe o trigo do joio, com os tratos de polé que têm sido dados nos últimos anos, na RAEM, aos direitos fundamentais, liberdades e garantias dos residentes.

Hino, Camões, 10 de Junho

Pedro Correia, 10.06.20

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Penso há muito que o Hino Nacional devia ter versos de Camões. Sendo o Dia de Portugal assinalado a 10 de Junho, em evocação da data da morte do nosso maior poeta, faz todo o sentido.

Não desfazendo, claro, no vate Lopes de Mendonça, autor da letra do presente hino. Mas entre Camões e Mendonça, prefiro o primeiro.

A música de Alfredo Keil, naturalmente, deve manter-se.

Sete anos

Pedro Correia, 10.06.20

Mais logo publicarei a última nota inserida na rubrica "Sugestão: um livro por dia" . Faço-o após sete anos consecutivos, colocando assim um ponto final naquela que é, porventura, a mais antiga série ininterrupta de postais subordinada ao mesmo título e ao mesmo tema da blogosfera portuguesa. Desde Maio de 2013, trouxe aqui mais de 2500 pistas de leitura - dos mais diversos géneros, das mais diversas proveniências, dos mais diferentes autores. Tendo como fio condutor, salvo muito esporádicas excepções que só serviram para confirmar a regra, a recusa da escrita acordística, cheia de consoantes mutiladas, que continua a ser rejeitada pela larga maioria dos nossos escritores.

Termino por cansaço natural e porque tudo tem necessariamente de chegar ao fim. Assim farei, simbolicamente, neste 10 de Junho - um Dia de Portugal em formato minimal, outra experiência inédita deste ano que tem sido fértil em inovações. Fica desde já o aviso porque os leitores do DELITO - que durante tanto tempo me incentivaram a prosseguir - merecem esta atenção.

Falta acrescentar que, dos títulos que aqui fui destacando ao longo de todo este tempo, só menos de 5% me chegaram às mãos por ofertas espontâneas de autores ou editoras. Nem nunca solicitei o envio de obra alguma - para reforçar a minha independência de critério e a minha integral liberdade de escolha.

Espero que tenham gostado. Este extenso inventário aqui permanecerá, para memória futura. Agora é tempo de virar a página.

Sousa e o 10 de Junho

jpt, 03.06.20

Declara o presidente Sousa que o "10 de Junho será como achei que deveria ser o 25 de Abril e o 1º de Maio", e que a cerimónia do Dia de Portugal contará apenas com oito presenças. Isto ultrapassa tudo, em termos de aleivosia hipócrita. O desplante deste nosso presidente é mesmo ofensivo. O homem goza com o povo, connosco. E o povo julga que ele está a brincar, com simpatia. Mas está a desprezar ...

Não sou jurista mas julgo saber que não se pode dizer do PR o que se pensa, há limites legais específicos, julgo por ter a função uma dimensão simbólica. Ficam assim reticências (...) para que cada um imagine o que penso do cidadão que foi eleito para este cargo.

O homem tem uma agenda política que não está totalmente cumprida, terá que ser continuada. Palmadas nos ombros, abraços e beijos às turbas, servem para a cumprir. Enquanto isso: preservar o Regime, impedir a "república de juízes". E nisso protelar os processos instaurados à elite financeira e ao antigo poder socialista, e trancar o viés investigador sobre o grão-crime político-económico. Nisso é o aliado natural do actual governo.

Novas investigações não existem, isso está cumprido. Mas o resto é comprido pois ainda há gente a preservar. Entretanto vai gozando connosco. E as pessoas gostam ...

 
 

O discurso do 10 de Junho (3)

jpt, 12.06.19

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Discurso de João Miguel Tavares em Cabo Verde.

Para um tipo como eu, português que passou duas décadas numa antiga colónia portuguesa, e que sonha com a hipótese de um dia (algo distante, se possível) lá ir morrer , e que ainda para mais por lá leccionou durante 15 anos, ler um texto destes, proferido num discurso comemorativo do dia nacional português, é momento de júbilo. O que Tavares diz sobre o colonialismo (português) mas não só, o que desmonta da perene ficção da "excepcionalidade portuguesa", o que se afasta explicitamente da loa "lusotropicalista", o que diz sobre "responsabilidades históricas" nacionais, o que diz sobre a reprodução das desigualdades no nosso território nacional, a perenidade da estratificação social que se alimenta dos fenómenos migratórios oriundos do anterior contexto colonial, o que diz sobre a necessidade de as combater, entendendo-as como fenómenos de "classe" ainda que sem descurar as suas componentes culturais e linguísticas, e, fundamentalmente (porque intelectual português), o que diz sobre o ensino multilinguístico, e a necessidade de fixar, preservar as línguas africanas e introduzi-las no ensino, em particular considerando a responsabilidade histórica de Portugal de nisso contribuir e de a isso proceder no próprio ensino oficial português, é um inusitado acto de civilização. Totalmente ao invés do pensamento dominante português, seja no espectro dos intelectuais profissionais, seja, e principalmente, no mundo das organizações estatais e para-estatais e seus funcionários.

Será talvez mais fácil perceber que Tavares aqui repudia a reemergência da ideologia racialista, actualmente conduzida pelos movimentos da esquerda neo-marxista, identitarista. Mas o que é importante perceber, que será talvez mais difícil de atingir às pessoas distantes destes contextos laborais, é que Tavares, em plena comemoração do dia de Portugal decorrida numa ex-colónia, clama pelo abandono - quem me dera que fosse definitivamente - da  noção de lusofonia, e todos os seus implícitos efectivos. Uma noção que é a cristalização dos pressupostos coloniais - não digo colonialistas, nem mesmo neo-colonialistas mas coloniais. Uma noção que foi desenvolvida pelos intelectuais socialistas no após-descolonização, e foi-o porque eles eram culturalmente herdeiros do Partido Republicano, o grande partido colonialista português (e convirá lembrar a tardia recusa do colonialismo pela oposição portuguesa: os comunistas, grosso modo, somente a partir de meados de 1950s, a "oposição democrática" de facto apenas desde finais de 1960s por Mário Soares, mas mesmo assim com  pouca adesão de outros, como se vê mesmo durante o início de 1970s). E que de imediato colheu agrado junto de outros núcleos intelectuais, desde os mais ligados ao antigo regime aos então oposicionistas brasileiros, que sonhavam um Brasil potência - algo que veio a encetar-se durante a presidência Lula.

É um grande texto, é uma grande reflexão, é uma grande visão. Vénia, caramba, vénia a João Miguel Tavares. O que está aqui é um verdadeiro discurso de "esquerda", naquele velho sentido que se lhe deu, "progressista", "crítico", "iluminador". Confesso que não esperava que surgisse em tamanho contexto, ainda para mais vindo de um tipo que conheço de nacos do "Governo Sombra" - programa que não sigo - e de textos de opinião no Público, de que às vezes gosto outras não tanto. 

E será também um texto que poderemos confrontar com o que os "lusófonos" do Estado ou com o Estado,  esse núcleo cultural e profissional PS, esses que durante estas últimas décadas têm usado uma lente ignorante e ineficaz nas relações com África (não apenas a das ex-colónias portuguesas), pensam sobre o real. Ou, por outras palavras, para perguntarmos: afinal quem é que é de "direita"?

Em suma, até porque escrevo isto de rajada, repito-me: minha Vénia a João Miguel Tavares. 

O apagão da SIC

Pedro Correia, 12.06.19

Com toda a franqueza: considerei chocante a censura dos serviços noticiosos da SIC, no 10 de Junho, ao discurso do presidente das comemorações do Dia de Portugal, o portalegrense João Miguel Tavares, proferido precisamente na cidade em que nasceu.

Ainda mais chocante por ter sido um discurso assumidamente polémico, que acendeu ânimos, polarizou opiniões e foi muito partilhado nas redes sociais. Só para a SIC parece não ter existido. Nem um vislumbre desta alocução no Primeiro Jornal de segunda-feira, transmitido pouco depois da conclusão das cerimónias, num bloco de cinco minutos que incluiu um directo de Portalegre. Nem um som no Jornal da Noite do mesmo dia, que dedicou sete minutos ao tema.

Dizem-me que este inaceitável apagão se deve ao facto de João Miguel Tavares ser comentador num canal concorrente da SIC. Nem quero acreditar.

O Discurso do 10 de Junho (2)

jpt, 11.06.19

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Acordo antes das 3 da manhã. Insone, mas estremunhado. Tanto que não consigo ler - nem o Integral 1 de Gil Jourdan com que me estou a deliciar. Coisas da idade, pois, como todas as manhãs, acordo de olhar embaciado, precisarei de trocar de óculos, está ... visto. E por isso, até porque a noite ainda será longa, trago o computador para a cama, coisa rara. E percorro o FB, passatempo que sonho soporífero. Nisso noto que lá longe, na Pátria Amada, imensa gente comenta o discurso de João Miguel Tavares nas cerimónias do 10 de Junho. Muitos encómios, dextros. E muitos apupos, canhotos. Tantos são estes que procuro o que também diz aquela gente que não está nas minhas ligações, os veros sinistros canhotos - os "conhecidos", administradores não executivos, bloguistas jugulares, deputados filósofos, esse malvado cerne nunca-ex-socratista. Estes pateiam, em uníssono e com vigor, o discurso do colega de Ricardo Araújo Pereira. Como tal vou ouvir o que o homem disse. E reconheço-lhe a argumentação, lembra-me outro discurso de 10 de Junho, um que fez época, e há bem pouco tempo. 

Na alvorada blogo sobre o assunto, o postal O Discurso do 10 de Junho. Aludo ao discurso de João Miguel Tavares e ao repúdio socialista que gerou. Um discurso que foi muito lido: o "Observador" anuncia que foi um texto imensamente partilhado (a esta hora que escrevo o sítio desse jornal anuncia 41 mil partilhas do texto). No discurso de Tavares reconheço o que há poucos anos outro convidado disse. Quase sem tirar nem por. E cito-o, deixando ligação para o seu texto, identificado na origem, mas deixando entender que se tratam das palavras de João Miguel Tavares - de facto são ... quase. Trata-se do discurso de 2012, de António Sampaio da Nóvoa. Que então foi apupado pelos apoiantes do governo em exercício - diga-se, com honestidade, que Nóvoa fez uma crítica ao "estado da arte" mas elidiu o processo que conduziu à penosa situação de então, um caso típico do "com a verdade me enganas". E deu-lhe também um tom corporativo, defendo a universidade, coisa legítima mas apoucando a abrangência da análise.

Mas o relevante é que então foi completamente sufragado, aplaudido, pela oposição, pelos socialistas em particular - tanto que o então reitor acabou por ser o efectivo candidato presidencial do Partido Socialista, aquele discurso foi-lhe trampolim para uma (efémera) participação política mais explícita. Repito, hoje de madrugada citei-o sem referir o autor, e deixando entender que eram as palavras de Tavares, mas com ligação para o texto original, que tem no cabeçalho a identificação do autor:

"Portugal conseguiu sair de um longo ciclo de pobreza, marcado pelo atraso e pela sobrevivência. Quando pensávamos que este passado não voltaria mais, eis que a pobreza regressa (...) Começa a haver demasiados “portugais” dentro de Portugal. Começa a haver demasiadas desigualdades. E uma sociedade fragmentada é facilmente vencida pelo medo e pela radicalização. (...) não façamos, uma vez mais, o erro de pensar que a tempestade é passageira e que logo virá a bonança. Não virá. Tudo está a mudar à nossa volta. E nós também.
Afinal, a História ainda não tinha acabado. Precisamos de ideias novas que nos deem um horizonte de futuro. Precisamos de alternativas. Há sempre alternativas. (...) A democracia funda-se em coisas básicas e simples: igualdade de oportunidades; emprego para os que podem trabalhar; segurança para os que dela necessitam; fim dos privilégios para poucos; preservação das liberdades para todos. (...)  os sacrifícios têm de basear-se numa forte consciência do social, do interesse coletivo, uma consciência que fomos perdendo na vertigem do económico; pior ainda, que fomos perdendo para interesses e grupos, sem controlo, que concentram a riqueza no mundo e tomam decisões à margem de qualquer princípio ético ou democrático. É uma “realidade inaceitável”. (...)

Porque Portugal tem um problema de organização dentro de si: - Num sistema político cada vez mais bloqueado; - Numa sociedade com instituições enfraquecidas, sem independência, tomadas por uma burocracia e por uma promiscuidade que são fonte de corrupção e desperdício; - Numa economia frágil e sem uma verdadeira cultura empresarial. (...) Precisamos de transformar estes movimentos numa ação sobre o país, numa ação de reinvenção e de reforço da sociedade. ( ...) não estamos a conseguir aproveitar este potencial para reorganizar a nossa estrutura social e produtiva, para transformar as nossas instituições e empresas, para integrar uma geração qualificada que, assim, se vê empurrada para a precariedade e para o desemprego."

Estas palavras, a reflexão sobre os problemas estruturais portugueses, são, de outra forma, com outra ênfase porventura, aquilo que agora Tavares anunciou. A parecença é tão grande que durante o dia - tendo eu publicado no meu blog "O Flávio" e no colectivo Delito de Opinião, assim abarcando cerca de 2000 visitas - ninguém apontou ou protestou a disparidade autoral. Mesmo tendo o texto de Tavares sido tão partilhado. Mesmo tendo eu posto adenda ao postal (e também no facebook), apelando a que se lesse o texto original - assim percebendo a diferença autoral. Só agora, já noite longa, um comentador anónimo surge, irónico, num "vai-se ver foi o do outro. Boa partida". Mas não é uma partida ...

Na época, há sete anos, no olho do furacão da crise, o diagnóstico de Sampaio da Nóvoa sobre a situação estrutural portuguesa foi  aplaudida pelos socialistas, com enorme empenho. E agora, declarações tão similares, tão confundíveis - prova-o o meu postal -, são vituperadas, pelos videirinhos e seus apoiantes. Isto apenas mostra uma coisa. Há gente, imensa gente, que só está interessada nos seus cromos, na sua colecção. Apoiar o "nosso" Sampaio da Nóvoa, apupar o Tavares "deles" (e também o contrário). O país?, a tal "Pátria Amada"? Que  se lixe.

 

É óbvio que temos que dançar, nus. Para crescermos. Para transitar de etapa. E é ainda mais óbvio: os videirinhos não servem para essa dança.

 

O Discurso do 10 de Junho

jpt, 11.06.19

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As comemorações oficiais do 10 de Junho não são um acontecimento popular - uma "festa popular". Mas são um ritual - e a palavra não é pejorativa, como muitos a utilizam - de reafirmação identitária. Vivido pela população na placidez do quotidiano. O fundamental da sua coreografia actual - uma cerimónia até simples, no país, acoplada a uma outra, a realizar onde haja uma comunidade de emigrantes portugueses - é o modo como explicitamente denota a democracia como constitutiva do país, da sua identidade, assim afirmando-a. Pois o seu conteúdo central são os discursos: os presidenciais, que são esperados como relativamente protocolares, "cinzentos". E os de um convidado, oriundo da sociedade civil e assim algo autónomo, ao qual é entregue a responsabilidade de dizer algo relevante sobre o devir do país. 

É isto o actual 10 de Junho, dia do Portugal democrático. Não é o dia em que o Chefe de Estado fala ao país - e muito menos ao "seu" "povo" - reafirmando a sua visão e o seu programa. É o dia em que o Estado dá o palanque a alguém, assim ao país, para que este critique e desvende o presente e até, porventura, aponte alguns rumos. Que  alumie o que lhe for possível. Na sua relativa autonomia de intelectual.  Ao longo dos anos alguns dos convidados têm sido mais interessantes, outros menos, mas isso é normal - e julgo que muitos não se vêm conseguindo libertar o suficiente do "peso do simbólico" do dia. Mas também isso é normal, humano. Mas o realmente fundamental é este molde cerimonial, assim significando e celebrando a democracia. (E seria bom que alguns "democratas" que menorizam o cerimonial, e a data, por não corresponder a ajuntamentos populares pudessem perceber algo do real antes de perorarem).

Ontem o convidado reclamou-se, explicitamente, filho da democracia. Do que disse algumas coisas não gosto - não se pede aos políticos "deem-nos alguma coisa em que acreditar". Esse é um assunto que nos compete a nós, cidadãos, disseminar entre os ... políticos. Mas, de facto, o convidado fez o que lhe incumbia: proferiu o que considera relevante sobre o país, criticamente. A reacção do poder foi imediata: membros do governo, actuais deputados, antigos membros do governo, jornalistas e opinadores, uniram-se em invectivas, considerando as palavras proferidas como de "extrema-direita", arauto do populismo anti-democrático e, até, próprias de quem não gosta do país (ainda não li invectivas de "anti-patriotismo" mas lá chegarão). E colhem imenso apoio nessas proclamações - as quais procuram não só elidir o efeito do discurso como também demarcar o "quem" pode falar na data, estipular um perfil futuro. Entretanto os que não estão no poder celebram as suas palavras, anunciam-nas pertinentes.

Que disse o convidado que tanto abespinha o poder actual (PS)? E que tanto encanta o não-poder actual (à direita do PS)? Disse

"Portugal conseguiu sair de um longo ciclo de pobreza, marcado pelo atraso e pela sobrevivência. Quando pensávamos que este passado não voltaria mais, eis que a pobreza regressa (...) Começa a haver demasiados “portugais” dentro de Portugal. Começa a haver demasiadas desigualdades. E uma sociedade fragmentada é facilmente vencida pelo medo e pela radicalização. (...) não façamos, uma vez mais, o erro de pensar que a tempestade é passageira e que logo virá a bonança. Não virá. Tudo está a mudar à nossa volta. E nós também.
Afinal, a História ainda não tinha acabado. Precisamos de ideias novas que nos deem um horizonte de futuro. Precisamos de alternativas. Há sempre alternativas. (...) A democracia funda-se em coisas básicas e simples: igualdade de oportunidades; emprego para os que podem trabalhar; segurança para os que dela necessitam; fim dos privilégios para poucos; preservação das liberdades para todos. (...)  os sacrifícios têm de basear-se numa forte consciência do social, do interesse coletivo, uma consciência que fomos perdendo na vertigem do económico; pior ainda, que fomos perdendo para interesses e grupos, sem controlo, que concentram a riqueza no mundo e tomam decisões à margem de qualquer princípio ético ou democrático. É uma “realidade inaceitável”. (...)

Porque Portugal tem um problema de organização dentro de si: - Num sistema político cada vez mais bloqueado; - Numa sociedade com instituições enfraquecidas, sem independência, tomadas por uma burocracia e por uma promiscuidade que são fonte de corrupção e desperdício; - Numa economia frágil e sem uma verdadeira cultura empresarial. (...) Precisamos de transformar estes movimentos numa ação sobre o país, numa ação de reinvenção e de reforço da sociedade. ( ...) não estamos a conseguir aproveitar este potencial para reorganizar a nossa estrutura social e produtiva, para transformar as nossas instituições e empresas, para integrar uma geração qualificada que, assim, se vê empurrada para a precariedade e para o desemprego."

Grosso modo, é este o resumo do que João Miguel Tavares disse ontem. Na cerimónia que consagra a crítica democrática como constitutiva da identidade nacional. Ao ler as reacções dos agentes do poder (militantes, simpatizantes e os sempre avençados) não só percebo, mais uma vez, o quão distantes estão da mentalidade democrática que se quer celebrar. Mas, ainda mais, percebo o quão intelectualmente desonestos são, ao refutarem estas palavras. Que tão elogiáveis, e até candidatáveis, seriam. Se proferidas por outrem.

Adenda: Convido os pacientes leitores a "clicarem" no trecho que cito, que tem a ligação para o texto completo, para que não se diga que o trunquei, adulterando-lhe o sentido. Pois essa consulta, mesmo que muito breve, permitirá perceber - bem mais do que o meu pobre texto - o quão visceral é a desonestidade dos apparatchiki socialistas, e seus correligionários, que logo encheram as redes sociais - e talvez a imprensa - vituperando o locutor de ontem.

Frases de 2019 (17)

Pedro Correia, 10.06.19

Portugal

Sérgio de Almeida Correia, 10.06.19

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(Getty Images)

"Porque na sociedade portuguesa actual, o medo, a reverência, o respeito temeroso, a passividade perante as instituições e os homens supostos deterem e dispensarem o poder-saber não foram ainda quebrados por novas forças de expressão da liberdade.

Numa palavra, o Portugal democrático de hoje é ainda uma sociedade de medo. É o medo que impede a crítica. Vivemos numa sociedade sem espírito crítico – que só nasce quando o interesse da comunidade prevalece sobre o dos grupos e das pessoas privadas. (...)

Portugal conhece uma democracia com um baixo grau de cidadania e liberdade" – José Gil, Portugal, Hoje – O Medo de Existir, Relógio D'Água, 2004, pp. 40-41 

 

Combatamos, pois, o medo. Sejamos cidadãos de corpo inteiro. Sejamos melhores portugueses. Onde quer que estejamos.

Sugestão ao Presidente: festejar um 10 de Junho em Olivença

Pedro Correia, 05.06.19

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Marcelo Rebelo de Sousa entrou no penúltimo ano do seu mandato com impressionantes níveis de popularidade – facto que só terá colhido de surpresa aqueles que, em qualquer banda ideológica, andam de passo trocado com a sociedade. Porque Portugal, naquele momento concreto, estava a precisar de um Presidente com estas características: alguém capaz de sorrir e de se comover em sintonia com o cidadão comum. Sem artifícios, sem poses estudadas, sem obedecer aos ditames das agências de comunicação. Porque Marcelo é mesmo assim. E nada melhor do que o senso comum dos portugueses para distinguir a boa moeda da má moeda, para usar uma expressão celebrizada pelo anterior inquilino do Palácio de Belém.

Seria muito interessante, a propósito, revisitar o que disseram e o que escreveram sobre Marcelo sobretudo aqueles que, acantonados num sector político afim ao do actual Chefe do Estado, o consideravam incapaz de ser a figura inspiradora e galvanizadora que se tem revelado nestes seus três anos no máximo posto político do País. Pintaram-no como imaturo e maquiavélico, recorreram a uma recordação infantil de António Guterres acerca de um irrequieto menino que tocava às campainhas de todas as portas. Houve até uma figura com décadas de lugar cativo no comentário político, acometida por uma visão nada inspiradora, que julgou detectar nele «falta de coragem» para se apresentar às urnas.

Marcelo encarregou-se de contrariar estes péssimos oráculos nos três anos que leva ao serviço do País, funcionando como efectivo traço de união entre todas as parcelas e todos os habitantes do território nacional. Graças a ele, temos hoje um Portugal mais confiante e menos crispado. E vale a pena sublinhar que o nosso primeiro Chefe do Estado especialista em direito constitucional alcançou este objectivo sem abdicar um milímetro dos poderes que a lei fundamental lhe confere: pelo contrário, reforçou o papel do Presidente da República no quadro institucional, quando a prática anterior ameaçava torná-lo mera figura decorativa, devolvendo assim a Constituição de 1976 ao espírito original, de matriz semipresidencialista.

Este Presidente capaz de passar uma noite na companhia de pessoas sem abrigo, de visitar “bairros problemáticos” onde por vezes nem a polícia entra ou de apontar a calcinada Beira Interior como local de férias, irá decerto continuar a surpreender-nos pela positiva. Travando assim o passo aos piores populismos, numa confirmação prática de que é possível aproximar os eleitos dos eleitores.

Ideias certamente não lhe faltam. Apesar disso, tomo a liberdade de lhe transmitir uma: celebrar um 10 de Junho em Olivença. Que, à luz da Constituição portuguesa e do direito internacional público (expresso na Acta Final do Congresso de Viena, em 1817), continua a ser de jure território nacional. Onde subsiste um valioso património histórico e cultural com a nossa marca e é notória a simpatia da população pelas suas seculares raízes alentejanas, o que aliás se traduz em números: desde 2014, mais de 800 oliventinos adquiriram a nacionalidade portuguesa e há turmas cheias de crianças a aprender português, apesar de ser ali apenas disciplina opcional.

Gostaria de ver Marcelo em Olivença, num 10 de Junho, confraternizando com os residentes nos 420 quilómetros quadrados do perímetro oliventino, onde se integram também as aldeias de São Jorge de Alor, São Domingos de Gusmão e São Bento da Contenda. Sem saudosismos nem nacionalismos bacocos. Com o seu espírito positivo e fraterno, de quem tem inequívoca vocação para estabelecer pontes. Esta seria mais uma.

 

Publicado originalmente no jornal Dia 15.