Sobre os bancos
1. Encontram-se quase todos em situação frágil, por erros próprios (empréstimos a «amigos», péssimas avaliações de risco, crença no crescimento contínuo e infinito da economia, empréstimos para evitar perdas decorrentes de empréstimos anteriores) e por políticas dos bancos centrais e dos governos que lhes permitiram «jogar» com uma percentagem demasiado elevada dos recursos captados.
2. Políticos e cidadãos adoraram e incentivaram esse «jogo», que abriu as portas ao crédito barato; naturalmente, uns e outros têm detestado receber a factura.
3. Enquanto se indignam com as perdas dos bancos, os políticos continuam a clamar por crédito barato e os Bancos Centrais continuam a tentar inventá-lo.
4. Das duas, uma: ou se exige que, independentemente da conjuntura, os bancos subam rácios de solvabilidade - e então necessitam de dinheiro e o crédito à economia desce e alguns (como o BANIF) entram em colapso - ou não se exigem rácios mais elevados - e então aumenta-se o risco de, no próximo solavanco da economia, estarem tão frágeis que acabem necessitando de muito mais dinheiro.
5. Para os bancos - e para os contribuintes - dos países onde a correcção dos desequilíbrios orçamentais obrigou à implementação de políticas de austeridade seria preferível adiar a exigência de rácios mais elevados; compreensivelmente, as regras de concorrência impedem-no (lição para futuro: os bancos devem opor-se a políticas públicas arriscadas, não incentivá-las).
6. O crescimento da economia permitiria diminuir as perdas dos bancos mas, se feito (ainda mais) à base de dívida, traria (ainda mais) problemas a prazo.
7. À falta de capacidade dos accionistas, restam duas fontes de capitalização: o Estado (i.e., os contribuintes) e os depositantes.
8. Considerando as necessidades totais, as garantias associadas aos depósitos são garantias dos contribuintes (i.e., deixar falir - atitude mais correcta do ponto de vista do mercado - pode ficar mais caro).
9. Como se vê pelo dinheiro já injectado na Caixa Geral de Depósitos, não é por serem públicos que os bancos escapam aos problemas; o «saque» aos contribuintes passa é mais despercebido.
Três notas ainda sobre o caso específico do BANIF:
1. Convém lembrar que a competência para aplicar processos de resolução é do Banco de Portugal, não do governo. Para além disso, podem ter existido motivos válidos (eleitoralistas existiram certamente, como existem sempre, qualquer que seja o partido no poder) para o governo PSD-CDS ter adiado uma solução. Por exemplo, recear que dois processos em simultâneo (BANIF e Novo Banco) levassem à dispersão de potenciais compradores e fizessem descer os valores propostos. Por exemplo, esperar que a recuperação económica viesse a tempo de permitir uma melhoria na recuperação de créditos e na venda de património, tornando o banco mais atractivo para compradores privados. Por exemplo, procurar evitar a solução, bastante dura, defendida pela Comissão Europeia. Ainda assim, é hoje claro que adiar foi um erro e que este não pode ser assacado apenas ao Banco de Portugal. O mínimo que Passos Coelho, Paulo Portas e Maria Luís Albuquerque devem fazer é admiti-lo.
2. A solução do governo socialista pode ser a menos má mas é também a mais conveniente para o comprador. Tanto no processo do Novo Banco como no da TAP - vide processo cancelado em 2012 - o governo PSD-CDS privilegiou (assumindo riscos) a existência de condições para a obtenção de um preço minimamente justo. Sendo certo que a decisão do BCE de retirar o estatuto de contraparte ao BANIF precipitou os acontecimentos, a opacidade que envolve a escolha do Santander não é bom sinal. Seria também interessante descobrir se quem fez sair a notícia da TVI que despoletou primeiro a corrida aos depósitos e depois a decisão do BCE acabou por lucrar (financeira ou politicamente) com a forma como o processo decorreu. Nota para fãs de teorias de conspiração: o Santander detém uma participação na Prisa, que controla a TVI.
3. Tem piada (ei, cada um diverte-se como pode) assistir ao desconforto do Bloco de Esquerda e do PCP com a via escolhida pelo governo que apoiam e legitimam. A votação do orçamento rectificativo mostra bem como são incapazes de partilhar momentos e decisões difíceis.