Seis meses depois
Ucranianos resistem - por eles e por nós
Mariúpol, Abril de 2022
Faz hoje seis meses. Largas dezenas de milhares de soldados russos, apoiados na força aérea e divisões blindadas, invadiram território da Ucrânia - Estado independente e soberano, assim reconhecido pela comunidade internacional.
A mando de um tirano que decidiu trazer para o século XXI a política de canhoneira do século XIX, restaurando a lei do mais forte - a do que saca mais rápido do coldre, à traição, como fez com a Ucrânia nesta invasão não provocada, consumada no escuro de uma madrugada gélida. Sem pré-aviso, sem declaração de guerra.
Seguindo um guião inspirado no de Hitler na sua concepção de "espaço vital". Não a pretexto de reunir os povos germanófonos, mas russófonos. Não já de uma raça suprema, mas de um povo iluminado pela luz divina. Daí a Constituição em vigor na Rússia entoar hossanas à pátria «unida por uma história de mil anos, preservando a memória dos antepassados que [lhes] transmitiram os ideais e a fé em Deus». Hiper-nacionalismo de cariz imperial.
Dizia essa besta traiçoeira, escassos dias antes, que a tropa de Moscovo se limitava a «fazer exercícios militares puramente defensivos» no seu lado da fronteira.
Balanço destes seis meses trágicos que levaram a guerra ao coração da Europa?
Dezenas de milhares de mortos - não apenas ucranianos, mas também soldados invasores, quase todos oriundos das regiões mais remotas e pobres da Federação Russa. Mal organizados, mal equipados, mal alimentados. Comportando-se como abutres em rapina na terra conquistada - pilhando e violando tudo quanto viam pela frente, fazendo tábua rasa das convenções de Genebra e das próprias leis da guerra. Visando inúmeros alvos civis. Escolas, infantários, creches, hospitais, enfermarias, maternidades, igrejas, conventos, teatros, museus, salas de concerto, oficinas, lojas, habitações - tudo lhes serviu de pasto para as bombas homicidas.
Pelo menos dez milhões de desalojados.
Muitos no próprio território ucraniano, fugindo das ogivas criminosas, abençoadas pelo patriarca russo, um canalha de barbas brancas chamado Cirilo, perante quem o déspota do Kremlin ajoelha em devoção beata. «Matarás», incentiva esse clérigo, em inversão total do Sexto Mandamento.
Muitos mais no estrangeiro, onde têm conseguido refúgio nas nações vizinhas. Enquanto tantos outros, sobretudo no Donbass, são deportados à força pelos esbirros de Moscovo, que os conduzem aos confins da Sibéria, recriando os anos de chumbo do czarismo e do estalinismo.
Neste quadro, o tirano não hesita em colocar todo o continente à beira dum desastre nuclear, utilizando a central de Zaporíjia, em território ucraniano, como palco de guerra.
Putin abençoado pela hierarquia ortodoxa: aliança entre o estado e a igreja
Seis meses depois, a Ucrânia resiste.
No meio das atrocidades, continua de ânimo inquebrantável. Entre ruínas provocadas pela maior potência atómica do planeta, faz frente ao inimigo. Confirmando uma das mais poderosas leis da História: só é derrotado quem desiste de lutar.
E eles não desistem. Por eles e por nós.
Sabendo que mais vale morrer de pé do que viver de joelhos.
Putin não passará. Hoje isto é ainda mais certo do que em 24 de Fevereiro de 2022, esse dia da infâmia que manchará para sempre o povo russo. Como aconteceu a 23 de Agosto de 1939, data em que Estaline e Hitler selaram o pacto que apunhalou a Polónia, a Finlândia e os Estados bálticos - acto de vergonhosa traição que jamais se apagará.
Estaline com Ribbentrop, o chefe da diplomacia nazi (23 de Agosto de 1939)