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Delito de Opinião

Resistência em alemão (10)

Cristina Torrão, 04.03.23

OS QUATRO MÁRTIRES DE LÜBECK

4 - Karl-Friedrich Stellbrink

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Imagem daqui

O pastor luterano Karl-Friedrich Stellbrink é o mais polémico dos Mártires de Lübeck, pois começou por apoiar a política de Hitler e filiar-se no NSDAP (Partido Nazi).

Nasceu a 28 de Outubro de 1894 em Münster. Já depois de ter iniciado estudos de Teologia, com formação orientada para missões no estrangeiro, foi alistado, em Fevereiro de 1915, na 1ª Guerra Mundial. Devido a um ferimento grave, cerca de um ano mais tarde, que lhe paralisou a mão esquerda, foi dispensado do serviço militar e colocado em Berlim, a exercer serviço social ligado à Igreja Evangélica Luterana, enquanto concluía os seus estudos.

Casou a 5 de Março de 1921 com a professora Hildegard Dieckmeyer e, mês e meio mais tarde, foi enviado em missão para o Brasil. Exerceu funções pastorais junto das comunidades alemãs, em vários locais do Rio Grande Sul. O casal esteve oito anos no Brasil, país onde nasceram quatro dos seus cinco filhos. Depois de umas férias na Alemanha, no Verão de 1929, Karl-Friedrich Stellbrink resolveu ficar e foi colocado numa pequena comunidade do estado de Thüringen.

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Karl-Friedrich Stellbrink e família

Stellbrink apoiou efusivamente a subida de Hitler ao poder, acreditando numa simbiose vantajosa entre o cristianismo e o nazismo. Para isso, terá contribuído o facto de Hitler, numa primeira fase, sublinhar ser cristão e usar citações bíblicas na sua propaganda. Na Primavera de 1934, Stellbrink mudou-se para Lübeck, onde exerceu as funções de chefe da Igreja Evangélica Luterana daquela cidade. E aqui se deu a reviravolta na sua vida. As razões terão sido de várias ordens, como, por exemplo, as ondas anticlericais que se faziam sentir, tanto a nível do partido, como a nível estatal. Também se geravam conflitos entre a Juventude Evangélica Luterana e a Juventude Hitleriana, à qual os seus filhos pertenciam, mas que acabaram por deixar. E quando, no funeral de uma personalidade nazi de Lübeck, o crucifixo na parede da capela do cemitério foi coberto por uma manta, Stellbrink desligou-se definitivamente do NSDAP. Em 1937, começou a ser vigiado pela Gestapo.

A partir de 1941, tomando conhecimento da eutanásia praticada em relação a cidadãos considerados inúteis, Karl-Friedrich Stellbrink entrou em contacto com o capelão católico Johannes Prassek, envolvendo-se no movimento antinazi da Igreja do Sagrado Coração de Jesus.

Na noite de 28 para 29 de Março (Domingo de Ramos) de 1942, houve um ataque aéreo dos Aliados à cidade de Lübeck, no qual morreram 320 pessoas, ficando 700 feridas e 16.000 desalojadas. Nesse Domingo de Ramos, na missa da “Confirmação” dos jovens luteranos (o equivalente à segunda comunhão dos católicos), o pastor Stellbrink criticou duramente a política do regime. Segundo um relatório da Gestapo, ele terá considerado serem os ataques dos Aliados o castigo de Deus sobre a política nazi.

Passados dez dias, foi preso pela Gestapo. A sua remuneração foi cortada e a sua família isolada, sem qualquer ajuda da Igreja Evangélica Luterana. Junto com os três sacerdotes católicos da Igreja do Sagrado Coração de Jesus (Eduard Müller, Johannes Prassek e Hermann Lange), Stellbrink foi condenado à morte, num processo de três dias, presidido pelo Segundo Senado do Tribunal do Povo de Berlim, que se deslocara a Lübeck para o efeito. Os quatro prelados foram então transferidos para a prisão Holstenglacis, em Hamburgo, onde foram executados pela guilhotina, no espaço de três minutos uns dos outros, a 10 de Novembro de 1943. Só depois da guerra, a 18 de Junho de 1945, a Igreja Luterana decidiu conceder uma reforma por viuvez a Hildegard Dieckmeyer.

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Placa de homenagem aos quatro mártires de Lübeck, na prisão Holstenglacis de Hamburgo

O destino conjunto dos três prelados católicos e do pastor protestante representa, hoje em dia, um papel importante no ecumenismo alemão. Na cerimónia de beatificação dos padres Eduard Müller, Johannes Prassek e Hermann Lange, em 2011, o pastor Karl-Friedrich Stellbrink foi igualmente dignificado pelo cardeal Walter Kasper, que presidiu ao evento.

Porém, Karl-Friedrich Stellbrink permanece polémico. O historiador Hansjörg Buss reclama uma discussão sobre o seu carácter e o seu verdadeiro significado na História alemã, pois classifica-o de nacionalista exacerbado, racista e opositor da democracia. Estando, porém, fora de dúvida ele ter sido uma vítima do terror nazi, há ruas com o seu nome em Hamburgo, Lübeck e outros locais. Além disso, está incluído na ala de homenagem aos Mártires de Lübeck, anexa à igreja do Sagrado Coração de Jesus.

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Ala de homenagem aos Mártires de Lübeck

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