José Adelino Maltez: «O homem é o único animal que sabe que vai morrer»
Quem fala assim... (15)
«As estúpidas Constituições políticas que vamos tendo esquecem o primeiro dos direitos: o direito à felicidade»
Fala sem papas na língua: sugere a Maria da Fonte como novo hino nacional e sonha «destruir o sistema informático de todos os ministérios das Finanças». Politólogo, professor catedrático, comentador nos órgãos de informação, José Adelino Maltez respondeu sem hesitar a todas as perguntas que lhe fiz, já lá vão uns anos.
Tem medo de quê?
De ter medo.
Gostaria de viver num hotel?
Só durante um mês.
A sua bebida preferida?
Coca-Cola light.
Tem alguma pedra no sapato?
Quando tenho, uso sandálias.
Que número calça?
42. E meio.
Que livro anda a ler?
Já não tenho idade para ler. Ando a reler.
Tem muitos livros à cabeceira?
Tenho sempre dois. O Homem Revoltado, de Camus - ando a relê-lo há 35 anos, todos os dias. E A Cidadela, de Saint-Exupéry.
A sua personagem de ficção favorita?
Fernão Mendes Minto, que escreveu um dos melhores livros de sempre em Portugal. Ninguém sabe se aquilo é verdade ou mentira, mas também não interessa. Como dizia Armindo Monteiro, que foi ministro de Salazar, a História é o género literário mais próximo da ficção.
Rir é o melhor remédio?
Não há melhor remédio: é o máximo de racionalidade, como sublinhou Henri Bergson na sua tese de doutoramento. Se conseguir rir-me de mim mesmo, sou um homem superior.
Gosta mais de conduzir ou de ser conduzido?
Só gosto de conduzir se a máquina for dependente do meu corpo. Por isso gosto tanto de bicicleta.
É bom transgredir os limites?
O homem é o único animal que sabe que vai morrer. Por isso inventou Deus: para tentar transgredir os limites do mistério.
Qual é o seu prato favorito?
Leitãozinho da Bairrada.
Qual é o pecado capital que pratica com mais frequência?
O pecado clássico de Ícaro: querer voar com asas de cera. O orgulho de não reconhecer os limites.
A sua cor preferida?
Azul, como é evidente.
É evidente porquê?
É a síntese da cor do universo. O céu é azul.
Costuma cantar no duche?
Costumo assobiar.
E a música da sua vida?
A Maria da Fonte.
Sugere alguma alteração ao hino nacional?
Sugiro o hino da Maria da Fonte.
Com que figura pública gostaria de jantar esta noite?
Com o Papa.
As aparências iludem?
As dos mantos diáfanos da fantasia que ocultam a verdade.
Qual é a peça de vestuário que prefere?
O meu chapeuzinho.
O seu maior sonho?
Amar e ser amado.
E o maior pesadelo?
O fanatismo e a ignorância.
O que o irrita profundamente?
A falta de sentido de humor dos gajos do estadão.
Qual a melhor forma de relaxar?
Cada um tem a sua. Para mim é estacionar à beira-mar. Ou à beira do Tejo.
O que faria se fosse milionário?
Contratava cem hackers e mandava-os destruir o sistema informático de todos os ministérios das Finanças.
Casamentos gay: de acordo?
Cada um deve fazer o que lhe apetecer. Mas não usurpem uma instituição que não foi feita para eles.
Uma mulher bonita?
Apetece-me parafrasear Fernando Pessoa: todas as mulheres bonitas são ridículas, mas mais ridículo ainda é não haver mulheres bonitas.
Acredita no paraíso?
O professor Sérgio Buarque de Holanda já dizia que os portugueses gostam de procurar o paraíso na Terra. A procura do paraíso, aqui e agora, é o que mais nos falta. As estúpidas Constituições políticas que vamos tendo esquecem o primeiro dos direitos: o direito à felicidade.
Tem um lema?
Viver como penso sem pensar como vivo.
Entrevista publicada no Diário de Notícias (19 de Abril de 2008)