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Delito de Opinião

Que força é essa, camarada?

Pedro Correia, 02.09.16

Rita-Rato[2].jpg

 

"Que força é essa
que força é essa
que trazes nos braços
que só te serve para obedecer
que só te manda obedecer?"

 

O PCP fala sempre em nome da "classe trabalhadora". Mas muitos dos seus dirigentes não têm experiência do mundo laboral: a única entidade patronal que conheceram foi o próprio partido, de que são diligentes funcionários.

É o caso de Rita Rato, que em 2009 irrompeu no Parlamento como símbolo do "rejuvenescimento" do partido. A renovação foi apenas etária: nada do que a simpática deputada alentejana disse ou fez até hoje difere um milímetro do que disseram ou fizeram os comunistas de gerações precedentes.

Numa entrevista de quatro páginas concedida à jornalista Céu Neves e hoje publicada no Diário de Notícias - coincidindo com o início de mais uma Festa do Avante! -, Rita Rato, hoje com 33 anos, alude ao seu percurso profissional. Pouco depois de se ter licenciado em Ciência Política e Relações Internacionais fez um estágio não remunerado no Secretariado Técnico dos Assuntos para o Processo Eleitoral e trabalhou "uns meses numa seguradora". Tirando isso, o mundo do trabalho para ela circunscreveu-se ao reduto partidário. Como acontece aliás com muitos deputados e membros do Comité Central do PCP, apresentados profissionalmente  como  "empregados", "intelectuais" (biombos eufemísticos) ou "licenciados em" , como se licenciatura fosse profissão.

 

Rita, sendo deputada, entrega parte do salário ao partido. Está há sete anos no Parlamento e confessa que nunca votou contra a orientação do partido, sequer em questões menores. Talvez até nem lhe tenha ocorrido questionar, através dos discretíssimos circuitos internos que filtram qualquer indício de discussão na Soeiro Pereira Gomes, por que motivo um partido que tanto apregoa a igualdade só teve homens nas funções de secretário-geral e líder parlamentar. Ou por que razão ainda hoje, dos 149 membros com assento no Comité Central comunista, menos de 25% são mulheres.

Até para conceder esta entrevista a jovem parlamentar informou previamente a estrutura dirigente do partido - gesto que justifica com estas cândidas palavras, sem um aparente sobressalto de dúvida metódica: "Sim, até porque não estou a dar esta entrevista a título individual. Sou deputada do PCP e é na ligação com o PCP que estas coisas se tratam."

 

Conclusão: a assalariada Rita Rato, defensora nominal dos direitos dos trabalhadores, é uma trabalhadora-modelo, daquelas que fariam os sonhos de qualquer patrão. Acata obedientemente as orientações superiores, não cria conflitos laborais, contenta-se com um salário modesto e não imagina sequer a vida fora da conspícua estabilidade que lhe é proporcionada pela entidade patronal, aparentemente alheada do real valor da sua "força de trabalho", para recorrer ao jargão do velho Marx.

Chego ao fim desta longa entrevista e vêm-me à memória aqueles versos do Sérgio Godinho: "Não me digas que nunca sentiste / uma força a crescer-te nos dedos / e uma raiva a nascer-te nos dentes / Não me digas que não me compreendes."

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