Quando o cão morde no homem
Cada vez me convenço mais que o país e o mundo que povoam o tempo de antena dos doutos tudólogos acampados noite após noite nas pantalhas nada tem a ver com o mesmo país e o mesmo mundo reflectidos nos telediários das estações que lhes dão guarida.
Voltei a perceber isso ontem à noite quando o Jornal da Noite da SIC foi incapaz de narrar algo mais relevante aos seus telespectadores do que o facto de uma menina ter sido mordida por um cão.
Sempre me garantiram que notícia era o homem abocanhar o animal e não o contrário. Afinal eu e muitos andávamos iludidos. Qualquer irrelevância ascende hoje à dignidade de foco central de um bloco informativo.
E se ainda me sobrassem dúvidas, teriam ficado desfeitas ao ouvir este destaque noticioso logo após a já mencionada peça de abertura: "Julia Roberts foi a Madrid e emocionou-se ao conhecer Cristiano Ronaldo."
Senti por isso que ontem, à sua maneira insólita, os estúdios de Carnaxide produziram uma espécie de 25 de Abril jornalístico. Cruzando uma linha fronteiriça sem retorno. Nada voltará a ser como já foi.