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Delito de Opinião

Pulido Valente "in memoriam"

Pedro Correia, 28.02.20

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«Encontrei muitos políticos desde 25 de Abril, não encontrei nenhum que não ficasse reprovado num exame elementar de História de Portugal. (...) Fora Marx e Lenine, não abriram os clássicos. Dos grandes sistemas políticos acumularam penosamente meia dúzia de noções triviais, destinadas ao jornal e ao comício.»

 

«Só por milagre o dr. Sampaio, o dr. Soares e o dr. Amaral, seus amigos, afilhados e sequazes, não acabariam colectiva e patrioticamente sentados à mesa do orçamento, esperando pela auspiciosa chegada do dr. Sousa Franco que não tardará. (...) Todos gostam das mesmas situações ambíguas e esfumadas, todos se distinguem na mesma arte subtil de conciliar o inconciliável e justificar o injustificável, e todos padecem da mesma gravidade cordata, parlapatona e pomposa, que em Portugal revela fatalmente o estadista. Não são inimigos, nem sequer adversários: são compadres. E esta é a sua República. Sua - muito deles.»

 

«Entre quadros partidários profissionais, militares, políticos e os fala-baratos do costume, o 25 de Abril não revelou ou produziu ainda um dirigente genuinamente operário ou popular de estatura. Quem se espantará?»

 

«Em Portugal o doutoramento continua a ser um tremendo privilégio. Habilita os seus venturosos possuidores ao adereço distinto de "sr. professor", confere-lhes um pequeno feudo vitalício na Universidade, promove-os a lugares de direcção académica, e quase sempre indica-os aos órgãos de soberania como desejáveis pastoreadores da nação.»

 

«Houve um tempo em que os Governos e as Universidades consideravam um sociólogo o lamentável cruzamento de um socialista e de um astrólogo. (...) Estudar uma sociedade parecia aos Governos implicar o perigoso propósito de a mudar - temeridade que geralmente não acontecia aos sociólogos. Por outro lado, a Universidade pensava sobre a sociologia o mesmo que sobre os horóscopos: à força de generalizações e trivialidades, era realmente impossível não se acertar algumas vezes.»

 

«Tendo muito pouco, o povo quer logicamente alguma coisa e, quando é livre de decidir, recusa sempre a aventura revolucionária, porque vive num curto espaço antes da privação, do desemprego ou da miséria. Os "sonhos" que o intelectual em causa confessa alimentar de "privilégio" sem limites e de "grandeza que não há" não são sonhos do povo, são sonhos do pequeno-burguês socialmente frustrado. A ideologia da revolução não passa de uma ideologia pequeno-burguesa.»

 

«Se os Governos caíssem por causa do descontentamento, o salazarismo tinha caído trinta vezes depois de 1945. Se a agitação fizesse cair Governos, o liberalismo não tinha passado de 1834 e a República de 1911. Se os Governos precisassem para sobreviver de uma sólida base social de apoio, Portugal não era governado desde o fim do século XVIII.»

 

Citações extraídas do livro O País das Maravilhas (Intervenção, 1979)

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