Psicodrama à mesa
"Os portugueses sabem comer bem e apreciam boa comida." Oiço esta frase desde sempre e há muitos anos que a contesto.
Penso cada vez mais o contrário. E tenho a prova por estes dias. Janto num dos restaurantes que servem melhor peixe e marisco em Lagos. Fica junto à lota, os frutos do mar desembarcam praticamente do barco para a cozinha.
Aqui só como peixe, devo confessar. Apesar disso, nas mesas em redor escuto insistentes pedidos de gente a suplicar por "bitoque" e "picanha". O que me deixa estarrecido.
Há dois dias, um miúdo malcriado pôs-se a fazer birra, dizendo que só comia piza. Com palavrinhas doces, os pais procuravam convencê-lo que ali não havia disso: o "melhor" que se arranjava era um hambúrger.
Ao fim de muito tempo, lá acabaram num consenso: o puto acedeu mas o pai da criancinha teve de implorar por um prato "cheio de batatas fritas" para calar o palerma do filho. Que daqui a uns anos andará obeso e a competir no campeonato nacional do colesterol.
Enquanto este psicodrama decorria, eu degustava um petisco bem algarvio: barriga de atum, acompanhada com batata cozida e salada mista, temperada a meu gosto. Pensando: a instrução gastronómica faz parte da educação integral. Os pais que começam por falhar aqui, acabam por falhar em quase tudo.
Depois são capazes de culpar tudo e todos: o Estado, o Governo, os partidos, os políticos, sei lá o quê.
Mas a culpa é só deles - e dos péssimos exemplos que dão aos filhos.