Presidenciáveis (56)
João Soares
Transporta a política nos genes: teve um avô ministro, a mãe foi deputada constituinte, o pai chegou duas vezes a primeiro-ministro e ocupou durante uma década o Palácio de Belém. Privilégio por um lado, mas também um pesado fardo: por mais que faça, será sempre comparado desfavoravelmente com Mário Soares, protagonista de circunstâncias históricas excepcionais e, portanto, irrepetíveis.
Mas João Barroso Soares - 65 anos, signo Virgem - foi um dos melhores presidentes da câmara de Lisboa: bastou-lhe ter posto fim ao decrépito Casal Ventoso, miserável chaga a céu aberto na capital de outrora, para lhe valer um lugar de relevo na galeria dos alcaides alfacinhas.
Opositor muito jovem à ditadura, sem transitar pela extrema-esquerda, é um social-democrata da velha guarda, admirador de Clement Attlee, Willy Brandt e Olof Palme - todos ideologicamente apedrejados noutras eras pelo pecado de serem "reformistas" à luz do esquerdismo dominante nos circuitos intelectuais. Hoje nenhum deles seria bem visto na Comissão Europeia presidida por Jean-Claude Juncker, mesmo respeitando o rigoroso dress code da agremiação, que não tolera políticos sem gravata.
Durante décadas foi considerado júnior. Agora que é sénior, João Soares continua demasiado novo para escrever memórias após ter sido autarca, eurodeputado e um dos mais viajados parlamentares da Assembleia da República - sem o menor receio de andar de avião, apesar de quase ter perdido a vida num grave acidente aéreo no sul de Angola.
Poderá ser ele o candidato presidencial que tantos socialistas reclamam? O seu amigo Manuel Alegre é capaz de incentivá-lo com versos de um poema intitulado "Bairro Ocidental", inserido no novíssimo livro com o mesmo nome: "Na Eurolândia tudo é permitido / bruxela-se um país berlina-se outro / um dia ao acordares estás eurodido / e o teu país efemizado é só um couto."
Prós - Nunca foi apoiante de José Sócrates e até concorreu contra ele, com manifesto insucesso, numa eleição interna do PS. Os monárquicos veriam com bons olhos esta sucessão dinástica: depois dos Bragança, os Soares. Alegre dedicar-lhe-ia em rigoroso exclusivo outra quadra, talvez assim: "Quem já foi feliz em princípio / na Praça do Município / poderá sê-lo também / no Palácio de Belém."
Contras - Perdeu contendas autárquicas contra Santana Lopes (em Lisboa) e Fernando Seara (em Sintra): é uma péssima carta de recomendação. Nas cimeiras lusófonas, José Eduardo dos Santos evitaria cumprimentar este "tuga" que tomou partido contra o MPLA no conflito angolano e até tem um filho chamado Jonas, em homenagem ao desaparecido líder da Unita. O pai Mário torceria o nariz a esta candidatura: acha o filho excessivamente moderado.