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Delito de Opinião

Políticos no divã - 8

Teresa Ribeiro, 07.02.14

- Não, doutor, ao contrário do que as pessoas gostam de insinuar, sempre fui muito coerente.

- Ai sim?

- (baixa a voz e destaca as palavras, em tom grave) Ainda eu brincava aos carrinhos com o meu irmão e já se revelava bem o meu pensamento político.

- (cofia a barba, verdadeiramente interessado) Isso é muito interessante. Importa-se de detalhar?

- Já nesse tempo, enquanto o Miguel se entretinha a brincar com tractores, retro-escavadoras e todas essas geringonças que estão associadas ao meio operário, já eu tinha paixão pelos carros de alta cilindrada.

- Há quem continue na vida adulta a coleccionar miniaturas de carros. É esse o seu caso?

- Não, desses tempos por acaso só fiquei com um (ataque de tosse)

- Algum modelo raro?

- (crispado) Não, nada que interesse.

- Toquei nalgum ponto sensível?

- (novo ataque de tosse. Exasperado, articula com dificuldade) É um táxi! É a miniatura de um táxi! Porra! Podemos mudar de assunto?!

- Dizia-me que na infância já revelava o seu pensamento político...

- Sim, nas minhas boas relações com o poder financeiro, por exemplo.

- Nas suas relações com o poder financeiro?! Mas está a falar de quê?

- Estou a falar da facilidade com que negociava o aumento da mesada, ou o reforço da minha colecção de cromos. Ou acha que a minha vocação para a diplomacia económica surgiu do nada?

- Bem, falemos do PP.

- Mas não estamos já a falar?

- Não, refiro-me ao PP.

- A mim?

- Não, falo DO PARTIDO!É extraordinária a dificuldade que tem em dissociar o partido da sua pessoa.

- Pfff! Isso é conversa do Anacoreta Correia. Acha que eu, vice-presidente de Portugal, perco cinco minutos com essas quezílias?

- Vice-presidente de Portugal? Mas... isso foi um erro dos espanhóis, um incidente (visivelmente preocupado) Não deve alimentar esse género de fantasias, porque...

- Eheheh!Não se assuste. Em política, não interessa o que se diz, mas a maneira como se diz.

- Onde é que quer chegar?

- (em tom didáctico) Quando eu digo "vice-presidente de Portugal" não estou realmente a pensar as palavras mas a degustá-las. Percebeu?

- Hum... a dimensão lúdica do poder... Freud explica.

- Além de que aquilo foi um lapsus linguae dos espanhóis. (com o olho a luzir) E isso, como o doutor sabe, Freud também explica.

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