Pensamento da semana
Alice nas Cidades, fascinante película de Wim Wenders estreada em 1974, inclui uma cena no alto do Empire State Building. Alice, a miúda mencionada no título, espreita Nova Iorque por uma lente de longo alcance. Recortando-se na linha do horizonte, as malogradas Torres Gémeas.
Basta esta cena para inserir o filme num patamar histórico: remete-nos para um mundo que já não existe. Wenders parece tê-lo rodado com esta premonição - tanto assim que optou pelo preto-e-branco, à época já anacrónico. Alice nas Cidades pertence ao século XX, que terminou a 11 de Setembro de 2001. E no entanto existe ali algo do nosso tempo: a errância, o desenraizamento, a desagregação dos núcleos familiares. Uma certa solidão existencial ditada pela fragilidade dos impérios e das ideologias. Revemos aqueles edifícios construídos para assaltar os céus, domínio dos deuses: vieram abaixo num par de horas. Como eles, tantas certezas inabaláveis cederam lugar à dúvida.
O essencial permanece invisível ao nosso olhar. Não há binóculo que o desvende.
Este pensamento acompanhou o DELITO durante toda a semana.