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Delito de Opinião

Os meios e os fins

Pedro Correia, 22.10.20

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O pior da sociedade portuguesa começa a vir à superfície neste oitavo mês de pandemia: refiro-me ao inaceitável clima de delação, a pretexto do combate às infecções, que ameaça deteriorar as relações humanas, enquanto cada qual se encerra no seu casulo, desconfiando de tudo e todos. E nem a malha familiar está livre disto, quando já tivemos o Presidente da República advertindo contra os habituais reencontros natalícios, enquanto milhares de velhos vivem em efectiva reclusão dentro de supostos "lares" que se tornam antecâmaras de morte. Com os entes queridos mantidos à distância, como ontem o JPT nos relatava aqui, em texto de leitura obrigatória.

Inverte-se o ónus da prova, transforma-se em letra morta a garantia constitucional: todos somos culpados até prova em contrário. 

 

O que sucedeu há dias a um professor universitário comprova isto. Este docente da Faculdade de Arquitectura, em Lisboa, foi abordado à saída de uma aula, em pleno estabelecimento de ensino, por agentes da PSP, que lhe impuseram uma coima de cem euros por não ter usado máscara durante parte da sua exposição aos alunos, em que permanecera sentado. Apesar de só haver 20 estudantes na sala, cada um estar separado dos restantes por uma distância mínima de cinco metros e todos se encontrarem afastados do professor. Apesar de este só não ter usado máscara durante a primeira das quatro horas de duração da aula.

Denúncia anónima e cobarde. Incentivo à bufaria, vício de péssima memória na sociedade portuguesa. Inaceitável intromissão da PSP em instalações universitárias para punir comportamentos de professores ou alunos. Tudo isto devia causar indignação. Mas, a pretexto do respeitinho absoluto pelas normas sanitárias, que aliás vão mudando ao sabor das circunstâncias, acabamos por tolerar todas as prepotências, todas as arbitrariedades, toda a desproporção de meios sempre justificados pelos fins.

Começam assim, com casos isolados e em pequena escala. Mas sabemos muito bem onde podem desembocar. 

3 comentários

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    Pedro Correia 22.10.2020

    Você está a politizar isto, mas não faz qualquer sentido politizar ou partidarizar esta questão de cidadania. Que é muito mais abrangente do que esse funil em que tenta encaixá-la.
    Recuso a utilização sistemática desses rótulos simplistas (socialista, marxista, fascista...) que trava à partida qualquer debate e apenas serve para cavar trincheiras. Que nada mais são do que buracos fundos onde cada qual se mete e do qual muitas vezes já não consegue sair.
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    V. 22.10.2020

    Eu só uso esses rótulos porque é do seio dessa politização, que tomou conta das escolas e das universidades e colonizou todos os tipos de conhecimento, que estas ideias provêm. Eu de resto não tenho nenhum prazer em usá-las nem sou adepto de teorias da conspiração.

    Usá-las como epíteto e insulto já acho conveniente porque é para ver se as pessoas sentem vergonha. O tempo da imparcialidade (que esses clubes nunca tiveram) acabou. Agora é guerra.
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