Os malefícios do tabaco
Olá Júlia, há que anos não te via. Estás óptima, qual é o segredo?
Nenhum, mas vejo que ainda fumas. Deixei vai para mais de três anos. Eu, a Aleksia e a PiuPiu. Fui a uma clínica, sabes? Maravilha.
A sério? E isso funciona?
Funciona. Vais lá, conversam contigo, dizem-te para ires fumar o último cigarro, depois fazem-te um tratamento com uma máquina de raios laser, não dói nada. Aquilo é nos dedos das mãos, no pescoço, nas orelhas, mais não sei onde… remédio santo: nunca mais fumei, nem eu nem elas, não custou nada.
Ah bom, e onde fica isso, que quero lá ir?
Fica em tal parte, é a clínica assim assim.
Lá fui. A coisa custava 198 Euros, de modo que o “não custa nada” é mais retórica, fui pensando.
A conversa era de chacha sobre as maravilhas de uma vida sã, a inferioridade do vício e o carácter inovador e científica e tecnologicamente avançadíssimo do tratamento.
Siga para o tratamento, ao que se seguiu uma cordialíssima despedida. E a verdade é que saí aliviado: vontade de fumar nenhuma, nem então nem até ao jantar. Depois, porém, um cigarro (ou dois) vinham a calhar para completar a refeição – pareceu-me.
O tratamento não funciona do mesmo modo para toda a gente, pensei. A dependência do vício deve estar ligada à quantidade de cigarros e, se calhar, à densidade das circunvoluções cerebrais – lembro-me que aquela Júlia era burra como um penedo e as duas filhas também não devem ser nenhumas águias.
O dia seguinte foi um tormento, estoicamente vencido com a ideia de que o desejo se iria atenuando.
Que nada. Ao fim do almoço no terceiro dia já trocava uma quota de uma sociedade (a mais pobrezinha) por um cigarro. E como tivesse confidenciado semelhante aflição à comensal, esta disse que, não lhe parecendo razoável o extremo de tal medida, o melhor era fumar um cigarro apaziguador.
Assim fiz, com dois, mas vencendo a tarde, teimosamente, sem nenhum. Depois do jantar, a majestosa e incontornável lógica situacional impôs-se: após as refeições o cigarro não é dispensável. Pelo menos um, e mais razoavelmente três.
Ao quarto dia foi meio maço. E, por pudor, não revelo quantos foram ao quinto.
A história (completamente ficcional) tem moral? Tem. Mas deixo-a para o leitor arguto.