Os jornais
Em papel estão a acabar. Dei-me conta disso ontem quando era preciso limpar a porta de vidro do recuperador de calor. Houve tempo em que cá em casa havia quem lesse o Público e o Expresso e este último, sem ter mais utilidades que o primeiro, tinha uma grande durabilidade – um só número chegava para um mínimo de 15 dias.
Isto de um ponto de vista meramente prático. Sentimentalmente, lembro-me de uma vez que estava a chegar fogo, no meu jardim, a um monte de detritos no sítio habitual, ver frei Anacleto Louçã (creio que no Público, que já na altura era um coio de esquerdistas sortidos) a ser consumido pelas chamas. Grande significado simbólico – o Torquemada do anticapitalismo a arder. E não poucas vezes, ao ir à maceira reciclada em depósito de velhas publicações, calhava ver artigos que me dava na bolha ler, antes de regressar abnegadamente a meus mal-agradecidos trabalhos.
Com o computador não posso acender lareiras nem fazer fogueiras no jardim, mas posso ler jornais a preços modicíssimos, quando não de graça, ainda que daqueles dois pasquins tire pouca coisa e pouca gente (Eugénia Galvão Teles, Daniel Bessa, Luís Aguiar-Conraria e mais um ou outro – do resto não quero saber, as minhas fontes são outras, e o meu jornal nacional também). Mas não vejo com bons olhos que não haja dinheiro para pagar bem a jornalistas, ainda que entenda que o Poder não deve (como aliás faz, miseravelmente) subsidiar entidades cujo principal requisito é dele serem independentes.
É isso que leva a que os jornalistas na sua maior parte sejam analfabetos, ademais veiculando opiniões arregimentadas travestidas de notícias? Não sei.
E também não sei se as exéquias dos jornais em papel são uma coisa boa. O que sei é que agora tenho de usar acendalhas caríssimas e para os vidros panos e esponjas, que também não saem de graça. Vem tudo dos supermercados, essas catedrais do capitalismo.
De modo que o mundo é um lugar desvairado, cheio de contradições. E agora com licença, que ainda não li completamente a ração do dia que a internet me traz.