Os bons e os maus
O noticiário sobre a guerra continua a deitar areia para os olhos de muitas pessoas que confiam na possibilidade de uma vitória ucraniana. Existe profunda incompreensão sobre as raízes deste conflito, que é na realidade uma mistura de guerra civil e confronto indireto entre Rússia e Estados Unidos (aliás, a todo o momento pode tornar-se um conflito direto, basta um erro de cálculo). A derrota de Kiev está agora à vista, mais próxima após ter sido cometido o erro de invadir território russo. Esta manobra desesperada, celebrada nos nossos meios de comunicação, consumiu as derradeiras reservas do exército ucraniano, cujas baixas são insustentáveis. As linhas defensivas no Donbass, construídas ao longo de oito anos, ficaram desguarnecidas e estão a entrar em colapso.
Estes factos não podem ser compreendidos por uma opinião pública que foi sistematicamente convencida a ver esta guerra como a luta entre o bem e o mal, onde os bons venciam sempre e os maus nem sequer tinham botas ou eram forçados a tirar chips de máquinas de lavar roupa. Fomos muito enganados. O Ocidente subestimou de novo a Rússia e está sem opções para sair de forma airosa da situação.
Esta guerra foi um falhanço diplomático ou a ideia deliberada de gerir o colapso do império russo, esmagado pelas sanções da NATO? A questão será discutida muito depois de haver uma paz negociada e há indícios credíveis de que Washington queria derrubar o regime de Putin, para abrir os imensos recursos da Rússia à exploração ocidental. Quando falhou esta estratégia, surgiu a nova meta de enfraquecer e sangrar Moscovo, de conseguir uma espécie de guerra eterna que iria transformar o gigante nuclear num país fracassado. Agora, o objetivo é apenas sair disto, nem que seja preciso sacrificar os ucranianos. Depois das eleições americanas, será negociada uma partilha territorial que permita pelo menos defender os negócios.
Habituada a fantasias, a opinião pública continua a acreditar na vitória ucraniana, mas devia estar a pedir contas aos líderes ocidentais e a Boris Johnson em particular, que em Abril de 2022 convenceu os ucranianos a não assinarem um acordo de cessar-fogo com a Rússia que teria sido mais vantajoso do que a paz cartaginesa que se adivinha. A Ucrânia é um país de viúvas e órfãos, com um quinto da população a viver no exterior; perdeu centenas de milhares de soldados e está a recuar no campo de batalha; encontra-se falida e hipotecada por décadas a empresas ocidentais que vão generosamente reconstruir as suas ruínas.
imagem gerada por IA, Night Café