Oposição mais fofinha não há
O alegado "líder da oposição" é um caso de estudo. Num momento de evidente gestão caótica da pandemia, em que o Governo não cumpre uma das promessas feitas aos portugueses e falha todos os objectivos traçados, a principal preocupação de Rui Rio é não melindrar António Costa. Mesmo que o primeiro-ministro nem se preocupe em ocultar o imenso desprezo que sente por ele, como evidenciou na célebre entrevista ao Expresso, no Verão passado: «No dia em que a sua subsistência depender do PSD, este governo acabou.»
Quanto mais me bates, mais gosto de ti - parece suplicar Rio a Costa. Falando ontem aos jornalistas, nos Passos Perdidos da Assembleia da República, o presidente do PSD voltou a fazer um panegírico do seu suposto adversário: parecia falar mais como assessor do chefe do Governo do que como dirigente da oposição. «O primeiro-ministro não está a trabalhar 24 horas por dia, mas está a trabalhar muito, disso não tenho dúvida», declarou. Enquanto confirmava que a sua preocupação central é que Costa não fique a pensar mal dele: «O Governo pode queixar-se de tudo menos do PSD. Não temos obstaculizado em nada.»
Oposição mais fofinha não há. Este é o mesmo Rio que ainda há poucos dias se insurgia contra quem ousasse criticar a eventual precedência concedida ao primeiro-ministro no plano de vacinação. «Imaginemos que o primeiro-ministro do país ficava infectado e com sintomas e até tinha de ser hospitalizado, o que é que o País ganhava? Só perdíamos, não podemos estar com esta demagogia. A minha posição é fácil, para quem me conhece e está atento: eu discordo completamente da demagogia de não vacinar político nenhum.» E jurava que não recusaria a vacina para oferecê-la a um idoso e assim «fazer um brilharete».
Isto foi a 27 de Janeiro. Três dias depois, Rio acabou mesmo por «fazer um brilharete», declarando que o mandassem excluir de uma lista de 50 deputados pré-seleccionados para a vacina. Lá conseguiu assim o título noticioso que, na sua própria definição, o inclui no lote dos demagogos. Provavelmente nem reparou na contradição.
Já vai sendo tempo de Costa lhe conceder a esmola de uma atenção. O pobre homem que se esforça a todo o momento para lhe agradar, que verte palavras de admiração pela capacidade de trabalho do primeiro-ministro, que se preocupa com a hipótese de ver o chefe do Governo infectado com COVID-19 e assegura que o Executivo «pode queixar-se de tudo menos do PSD», bem merece um ligeiro afago, uma palavrinha doce, um sorriso contrafeito.
Não custa nada, António. Mostra lá ao Rui que afinal não o desprezas tanto assim.