O referendo no Curdistão
Sempre fui favorável ao direito dos povos à sua autodeterminação. O caso dos curdos não é excepção. Por isso, nada a opor a que a sua independência seja decidida por referendo. Neste caso, não está, porém, em causa um único Estado, uma vez que o Curdistão espalha-se pelo menos por quatro Estados, abrangendo a Turquia, o Iraque, o Irão e a Síria. O referendo que ocorreu foi apenas no Curdistão iraquiano. É natural por isso que tenha tido imediatamente a oposição da Turquia, do Irão e da Síria. Estes países não se opuseram, no entanto, em defesa da legalidade internacional, por discordância com Boaventura Sousa Santos, como sugere o Pedro mais abaixo. Fizeram-no por recear que os curdos no seu território solicitem idênticos referendos para se juntar ao Curdistão iraquiano, se este proclamar a sua independência. E neste caso o país que receia mais esta situação é a Turquia, em cujo território se situa a esmagadora maioria dos curdos. Por isso, a Turquia ameaça o Curdistão iraquiano com uma intervenção militar, o que, convenhamos, tem muito pouco a ver com qualquer legalidade internacional. Pelo contrário, Netanyahu, que não tem quaisquer curdos no seu território, e a quem interessa imenso a desestabilização dos Estados muçulmanos da região, é claramente favorável ao referendo. Já os EUA dispensam bem mais sarilhos na zona, especialmente por saberem que a independência dos curdos no Norte do Iraque será provavelmente seguida pelos xiitas que são preponderantes no Sul, que rapidamente se aliarão ao Irão, reforçando assim consideravelmente o seu peso na região. Nas relações internacionais os países não se movem por princípios, movem-se por interesses.
Em qualquer caso, há uma coisa que tem que ser dita. Embora não deixando de considerar ilegal o referendo curdo, as autoridades do Iraque lidaram com ele de uma forma muito mais pacífica do que a Espanha está a lidar com o referendo na Catalunha. O que não deixa de ser motivo de espanto.