De Miguel a 28.07.2014 às 13:49
Timor-Leste... hoje vemos Xanana Gusmão andando ao lado de um ditador... o que significa um Nobel da Paz, o que significa Timor-Leste? Nada, Pedro, nada absolutamente nada. Timor-Leste é o melhor exemplo de realpolitik : os timorenses zelaram pelos SEUS interesses, e agora continuam a zelar por eles; eles já viram em que direcção o vento sopra, e o alísio não passa por Portugal. Ao menos a "causa" serviu de mote para um belo poema da Sophia, não foi completamente inútil a nossa defesa dos timorenses.
"O problema é que esse murro não se limitou a agredir desnecessariamente Portugal: foi também um golpe de misericórdia para a CPLP."
O CPLP vai emergir disto mais forte, com mais recursos, com mais dinheiro, um dos maiores produtores de petróleo do mundo. Que golpe de misericórdia? Acha que o mundo livre vai criar um embargo a estes ditadores? Desde quando é que as coisas funcionam assim? Os embargos são para pequenas nações que não chateiam ninguém, como Cuba e Coreia do Norte; produtores de petróleo, produtores de gás natural não podem ser alvos de embargos; as democracias fazem vista grossa porque precisam deles, e os ditadores sabem disso. Enquanto a economia ditar tudo, a CPLP será forte. Infelizmente não há evidência de estar para breve uma mudança de paradigma moral.
De Risota a 28.07.2014 às 15:38
"Os embargos são para pequenas nações que não chateiam ninguém, como Cuba e Coreia do Norte"
A Coreia do Norte é uma "pequena nação"... dotada de tecnologia nuclear. Não deve tardar muito para que os nossos "pragmáticos" advoguem também a entrada dessa monarquia comunista na CPLP.
De Miguel a 29.07.2014 às 00:13
Qualquer nação hoje pode adquirir armas nucleares ou a tecnologia para as produzir, é uma questão de vontade. A Coreia do Norte não me preocupa mais do que a Rússia, a Alemanha, a França, os EUA, o Iraque ou seja quem for, até porque todo o ditador quer manter-se no poder para sempre e a ameaça nuclear é maneira mais rápida de incomodar quem tem a capacidade para lhe terminar a festa. Mas a Coreia do Norte, como a Cuba, não tem interesse económico, não tem recursos naturais, são dois dos países mais pobres do mundo, que se querem manter fechados para sempre de forma a durar o regime até ao fim dos tempos, que evitam incidentes internacionais de forma a não perder um centímetro do poder que têm domesticamente.
Por oposição, temos a Rússia, a Arábia Saudita, a Guiné Equatorial e dezenas de outras ditaduras e semi-ditaduras que são toleradas pelas democracias por causa dos seus recursos naturais. Países que abertamente desafiam as democracias porque sabem que se podem safar apenas com um raspanete. Esses países não têm de se preocupar. As democracias fazem uns discursos, condenam simbolicamente, queixam-se, mas na hora de fazer um gesto a sério, olha, lá está a França a vender dois navios de guerra à Rússia afinal de contas.
Caro Miguel: se a ditadura da Guiné Equatorial, onde não se fala português nem existe o respeito mínimo pelos direitos humanos, é aceite como membro da CPLP por que motivo o mesmo direito não é reconhecido a esse pobre país (snif, snif), sem recursos naturais (snif, snif) nem interesse económico (snif, snif) que é a Coreia 'Atómica' do Norte?
É uma injustiça o ditador Kim ser preterido pela lusofonia que acolhe o ditador Teodoro tão generosamente no seu seio. Para onde caminhará o mundo se começa a haver discriminações tão gritantes entre ditadores?
De Risota a 29.07.2014 às 08:05
"A Coreia do Norte não me preocupa mais do que a Rússia, a Alemanha, a França, os EUA, o Iraque ou seja quem for, até porque todo o ditador quer manter-se no poder para sempre e a ameaça nuclear é maneira mais rápida de incomodar quem tem a capacidade para lhe terminar a festa."
Ditadores na Alemanha, França, EUA... são aos molhos.
Caro Miguel, estamos em desacordo. A CPLP só tem razão de existir se for uma comunidade baseada na língua, na cultura comum, nos afectos forjados ao longo de séculos, nos laços de sangue que superaram todas as contingências históricas. Se você estiver na Praia, ou em São Tomé, ou em Luanda, ou em Salvador da Baía ou em Porto Alegre ou Manaus (ou até mesmo em Díli ou Bissau), sente que se encontra num território que prolonga o nosso espaço afectivo. São gestos, são falas, são hábitos, são usos e costumes, é uma maneira de ser.
Nada disso encontra nesse estado orwelliano que é a Guiné Equatorial, onde a língua portuguesa (e tudo quanto a ela é naturalmente associado) prima pela ausência. Não faz parte da esfera lusófona, ponto final. A adesão deste país à CPLP abre uma caixa de Pandora: a partir de agora todos podem entrar. Um espaço onde todos cabem é um espaço sem valor algum. Ou seja, a CPLP em nada se distinguirá a partir de agora de um vulgar clube de negócios.
De Miguel a 29.07.2014 às 00:41
"Se você estiver na Praia, ou em São Tomé, ou em Luanda, ou em Salvador da Baía ou em Porto Alegre ou Manaus (ou até mesmo em Díli ou Bissau), sente que se encontra num território que prolonga o nosso espaço afectivo."
Porquê?
Se estivesse na Praia ou em Luanda ou Salvador da Baía não perceberia patavina nenhuma porque estariam a falar um crioulo qualquer, ou uma língua africana, ou um português com um sotaque espesso e um vocabulário cada mais removido do de Portugal. Só portugueses iludidos é que pensam que nesses países o português é língua do quotidiano e não uma mera ferramenta burocrática, como o é em Portugal: basta ouvir os emigrantes, nos comboios ou na rua, para se perceber que eles só falam português quando precisam, de resto usam outras línguas entre ele, o que faz todo o sentido. Mas, muito bem, iria para a Praia e Manaus; e depois? Se calhar estariam a ouvir música que detesto (como detesto Fado) e a falar sobre futebol (a única força unificadora da lusofonia; por acaso também detesto), a qualquer instante poderia ser assaltado e assassinado por grupos de miúdos desalojados, nunca saberia se de um momento para o outro não haveria um golpe de estado, e eu estaria a sentir-me miserável e sozinho, pensando em ir para a Islândia ouvir um concerto dos Sigur Ros, ou para os EUA para poder discutir William H. Gass com alguém. Esse é o meu espaço afectivo, aquele que eu criei, apesar da lavagem cerebral de lusofonia que me tentaram impingir. Eu não acredito na lusofonia, eu não preciso de 300 milhões de falantes de português; eu não respeito menos o norueguês por ter apenas 5 milhões, ou o checo por ter 10 - eu leio com mais gosto Kundera, Seifert e Havel do que muitos poetas e romancistas cabo-verdianos, brasileiros e portugueses. Acima de tudo eu admiro uma cultura de excelência e vejo muito pouco dela por essa tal lusofonia afora.
De Costa a 29.07.2014 às 02:18
Compreendo o seu ponto de vista. Do "império" de outros tempos visitei apenas e muito brevemente três lugares. E há muito tempo, já. Na América Latina, em África e na Ásia. Em nenhum caso posso afirmar que os conheço; estive lá, por um punhado de dias, é (foi) tudo. Mas não deixa de ser estranho, num deles - e então ainda "sob administração portuguesa" -, ter que entrar numa dependência bancária e, vá lá, numa livraria, para encontrar alguém que falasse português. Noutro, como escreve, o receio de ser assaltado por indigentes, com bem pouco a perder e supostamente um tal vocabulário "removido", era uma constante e um aviso taxativo. Na verdade foi onde se fala um crioulo que me senti mais próximo e mais aceite, na relação humana, talvez porque isso fosse numas ilhas, ao largo que não propriamente em África.
Outros, ainda que longe de puros, deixaram por onde colonizaram um legado. Hábitos, tradições, tiques (se o quiser) civilizacionais. Nós de facto, parece, cuspimos e deixámos servilmente cuspir no nosso passado e teremos deixado, como legado, o fervor por este ou aquele clube da ex-metrópole. Magro legado (e, para cúmulo, deixámos a mais acesa defesa formal da nossa língua àqueles que mais ferozmente parecem dedicar-se à crítica cerrada ao ex-colonizador).
Haverá excelência na lusofonia (há). Como tudo, ou quase, o que de bom se confia, mesmo que apenas simbolicamente, a Portugal e aos portugueses, tende a ser - fora a ocasional e por definição efémera moda - desprezado. Ignorado, largamente, na melhor hipótese.
Terreno fértil, para as guinés equatoriais. E não só.
Costa
De Miguel a 30.07.2014 às 01:18
"Haverá excelência na lusofonia (há)."
Poderá haver um bom escritor, um bom cineasta, um bom jogador de futebol, um bom empresário, um bom cientista, um bom músico, mas apenas porque há pessoas boas a certas proezas e capacidades em todo o mundo; Saramago não foi um grande escritor por causa da Lusofonia; Fernando Meirelles não realizou o genial Cidade de Deus por causa da Lusofonia. A Lusofonia é um conceito, não é um agente, não pode decretar, Vou criar grandes pessoas, grandes génios. Eu duvido muito que a poesia de Jorge de Sena, que foi perseguido por brasileiros invejosos, deva muito à Lusofonia ou queira sequer fazer parte dela, dado o espírito independente e cínico dele. Eu duvido muito que os quadros da Paula Rego tenham que ver com a identidade multicontinental que a Lusofonia almeja criar. O que há é indivíduos extraordinários, agindo de acordo com a vontade de serem excelentes, por eles mesmos, se calhar nem em nome dos seus respectivos países quanto mais da Lusofonia, mas apenas deles mesmos. Acho que não nos devemos esquecer disso antes de atribuírmos à Lusofonia méritos que ela não merece. Antes de mais, atribuir o mérito a quem o merece.
Ainda estou para ver excelência atingida em nome da Lusofonia; o que vejo é pirosices como o acordo ortográfico, e nem isso consegue juntar o consenso de todos os países lusófonos. A Lusofonia é pura burocracia e burocracia nunca atinge excelência.
De Costa a 01.08.2014 às 13:13
Meu caro, não poderia estar mais de acordo consigo. Entre os lusófonos a excelência tende a ser alcançada apesar dessa condição prévia e não raras vezes impondo a saída desse espaço. Ou então será sempre uma excelênciazinha , paroquiana, remediada, frustrada. Perdida em invejas mesquinhas.
Ou isso, ou morta à nascença, ou antes de nascer. Já não no campo das artes e humanidades, anátemas, por cá, para certas cabeças consagradas (sendo certo que uma certa fauna, alegadamente "intelectual" , se considera com direito divino à mesa do orçamento; enfim, neste campo como noutros...), veja-se o destino entre nós - lusófonos entre os lusófonos - da investigação científica.
Se do que escrevi outra opinião lhe pareceu resultar, creia que foi falha minha.
Costa
De William Wallace a 29.07.2014 às 02:18
Mas lê esses autores todos em que língua ?

De Miguel a 30.07.2014 às 00:44
Em inglês, obviamente, pelo preço baixo dos livros e pela disponibilidade de autores; a selecção das editoras portuguesas deixa muito a desejar: Gass nem existe em português; Kundera tem títulos esgotados; Seifert, se alguma vez foi traduzido, já não consta nas estantes; de Havel encontrei algures uma trilogia de peças, por acaso pelo mesmo preço do que a colecção de 7 peças (que inclui a tal trilogia) em inglês que possuo.
De William Wallace a 30.07.2014 às 02:39
Então pode pedir nacionalidade de um país da Commonwealth, talvez o Zimbabué..............................

De Miguel a 30.07.2014 às 11:21
Lamento que essa seja a melhor resposta que consiga produzir.
Eu estou a falar do preço exorbitante dos livros em Portugal (pensemos apenas que a a Presença publicou 'Guerra e Paz' do Tolstoy em 4 volumes, cada um a 17,62 euros, contra os cerca de 13 euros que eu paguei pela edição em um volume da Oxford's World Classics - claramente feito para esmifrar um povo que já tem pouco dinheiro e que tem de pensar seriamente se vale a pena gastá-lo em algo supérfluo em vez de em contas e comida; são preços assim que vão estimular a leitura num povo que já por si não gosta muito de ler e que mostra preocupantes índices de analfabetismo em relação à União Europeia) e do facto de o catálogo de livros ser escasso, ou porque faltam traduções ou porque os livros se esgotaram (eu não percebo como é que um escritor popular como Kundera se esgota; na Inglaterra, não), e o melhor que consegue dizer a respeito destes problemas é, Se estás mal muda-te!
Eu posso mudar-me, mas em que é que isso vai resolver os graves problemas que afligem o mercado livreiro português?
De William Wallace a 30.07.2014 às 15:07
Mas provavelmente a edição Inglesa que corresponde a essa Portuguesa ficaria substancialmente mais cara e fazendo bem as contas seria ao mesmo preço.
É certo que o "conteúdo" seria o mesmo mas haveria decerto pormenores diferenciadores na Portuguesa que a valorizariam.
O problema principal das pessoas hoje em dia é que acham tudo "caro" em Portugal e fazendo-se bem as contas acaba por ficar ao mesmo preço ou ás vezes mais caro vindo de fora, além de que existe o prazer de comprar que está associado já para não falar que ás vezes entra-se numa loja á procura de (A) e encontra-se um artigo (B) que já se procurava á anos e ele está ali ás vezes por 1/5 do preço.
http://store.ferrari.com/en/accessories/clothing-accessories/gloves/mens-leather-fingerless-driving-gloves.html
Comprei umas luvas em Seia por 22 euros, só não tinham o lettering ferrari e não eram em pele sintética.
Quando muito poderia apontar que as edições portuguesas poderiam ser de má qualidade em termos de tradução.
Não sou muito de ler, nunca tive tempo nem dinheiro, agora tenho tempo mas não tenho dinheiro.
Comprei poucos livros na minha vida, sempre em Português, um por excepção era em inglês relacionado com a área em que trabalhava embora viesse a descobrir depois que era muito generalista, mas pronto na altura mandei-o vir de Inglaterra pela Bertrand e ficou ao mesmo preço que o anunciado pelo editor em Inglaterra.
De Miguel a 30.07.2014 às 21:41
"Mas provavelmente a edição Inglesa que corresponde a essa Portuguesa ficaria substancialmente mais cara e fazendo bem as contas seria ao mesmo preço. É certo que o "conteúdo" seria o mesmo mas haveria decerto pormenores diferenciadores na Portuguesa que a valorizariam."
Eu devo estar a desaprender o português porque não percebi nade deste parágrafo . Vou reiterar: existe uma edição inglesa, num volume, por 13 euros; existem uma edição portuguesa, em 4 volumes, 17,26 euros cada. Eu posso escolher gastar 13 euros num livro que quase não ocupa espaço; ou posso escolhar gastar 69,04 euros num livro para o qual tenho de dedicar uma prateleira inteira.
Que mais há a discutir?
De William Wallace a 31.07.2014 às 02:47
Eu entendi muito bem o que disse, apenas alertei para o facto de que PODERIA haver pormenores na Edição Portuguesa que justificariam esse valor e também que a edição inglesa (em quatro volumes) seria provavelmente ao mesmo preço da Portuguesa em 4 volumes e apenas não terá sido feita uma edição Portuguesa de apenas 1 volume por talvez se considerar que o publico alvo da mesma quererá ou desejará uma edição mais requintada (nem que seja só para expor lá em casa).
De Miguel a 31.07.2014 às 11:41
Pelo que folheei da edição em 4 volumes, não há nenhum valor acrescido. Creio que as principais razões são: 1) lucros; obrigar a comprar 4 volumes em vez de um; 2) e também uma percepção (não muito errada, creio) de que os portugueses gostam de edições grandes, enormes, por oposição aos livros de bolso (que são mais populares no estrageiro) talvez por uma pretensa questão de prestígio (uau, estão-me a ver com um calhamaço no comboio, devem estar todos muito impressionados) ou porque edições enormes justificam preços mais altos. Eu sou muito singelo no tocante a livros: edições de bolso, compactas para poupar espaço, leves e baratas. Os preços cobrados em Portugal por certos livros são simplesmente indecentes.
De Costa a 01.08.2014 às 13:51
Livros de bolso, entre nós, são coisa a desprezar. Um povo que não lê, ou lerá sobretudo a subliteratura do momento, quer capas vistosas e em casa, para encher a estante - se isso lhe ocorrer -, edições a metro, de capa rija e lombada gravada a ouro.
Quanto ao resto, é ver os preços da Penguin Popular Classics, por exemplo. E não é preciso a internet. Estão disponíveis por cá.
Costa
De Zé Metralha a 02.08.2014 às 23:51
... por isso a nova designação da sigla CPLP é Comunidade dos Países de Língua Petroleira...
De sampy a 28.07.2014 às 15:19
Este deve ser um dos posts mais confusos que o Pedro Correia produziu nos últimos meses. Parece que está difícil coordenar a ânsia de argumentar com a clareza das ideias.
É preciso ter uma imaginação fértil para visualisar um cenário em que a Venezuela, ou a Rússia, ou a Arábia Saudita pedissem a adesão à CPLP. Só faltaria mesmo ver a China ajoelhada a nossos pés, apelando à nossa magnanimidade. Se calhar, já faltou mais...
É preciso grande desorientação para comparar a situação de um país soberano em ditadura à de um território ocupado por país estrangeiro. Mas, para ter um mínimo de lógica, bastava que o autor abjurasse de quaisquer relações de Portugal com Jacarta e com a Fretilin, passadas ou presentes. Força, então.
E é preciso uma enorme inocência para acreditar que a independência de Timor-Leste se obteve graças à acima denominada acção quixotesca de Portugal e da comunidade internacional. Não teve que ver com o petróleo, não senhor...
É preciso bom domínio da estatística para considerar que o 166.o posto mundial traduz as potencialidades de negócio entre a Guiné e S. Tomé ou Angola. Ou era suposto estarmos a falar exclusivamente do nosso país?
É preciso dar um enorme valor às aparências para considerar que a ausência de Cavaco ou de Passos Coelho faria uma diferença significativa, tornando ipso facto a situação menos comprometedora, menos humilhante. Olha, um adepto do famoso "fumei mas não inalei"...
E é preciso lata para evocar o estaladão do presidente checo, que se pôs em bicos-de-pés, e do alto da sua moralidade e dignidade nos tratou por caloteiros. Afinal, é o próprio autor do post que trata de tentar emular o paspalho, tratando de distribuir lições de moral a torto e a direito, com uma autoridade que lhe advirá certamente por infusão divina, já que nós, os restantes portugueses que conhecemos a história do nosso país, que temos consciência da realidade da situação em que vivemos e que vamos lutando por sobreviver no dia-a-dia, não nos atrevemos a andar a vituperar as prostitutas...
De Também Discordo a 28.07.2014 às 16:25
De da Maia a 28.07.2014 às 22:39

Para compensar, coloco o polegar abaixo... e nem estou muito em desacordo com o Sampy sobre alguma matéria de facto.
Simplesmente, é incompreensível esta sua "indignação à indignação".
O Pedro deu alguns bons motivos, e nem seria preciso, para questionar toda a dignidade do processo, simbólica e não só. A resposta dada pelo Sampy não invalida esses motivos, e apenas aponta outros aspectos laterais.
A adesão da Guiné Equatorial à CPLP não arruma coisíssima nenhuma, pelo contrário, aumenta a indefinição de uma estrutura já de si mal definida, ao misturar-se herança cultural com herança política.
Podemos perceber a real politik pela rama, mas isso não significa abanar o ramalhete, ou ficar fãs dela, muito menos achar que quem a condena não tem razões para o fazer.
Se tiver uma loja aberta, tem obrigação de atender um arguido, enquanto cliente indistinto, mas isso não significa que aceda a tirar fotografias com ele... nem impede que continue a dizer se acha que ele é culpado ou não.
Quem representa, tem que saber o que representa.
Em particular tem que estar preparado para ser o único a levantar a mão, nem que fique isolado no meio de centenas. Não é agradável, mas é assim.
A representação do Estado tem regras. Se aparece o PR há um acordo do Estado e do Regime, se aparece o PM há ainda um acordo do Governo. A diplomacia entre Estados pode ser feita sem protagonizar esse compromisso completo.
O PR tem obrigação de representar também o "regime democrático", e é nessa função que aparece mal na fotografia, conforme o Pedro refere.
Claro que não é só a Guiné Equatorial que tem pena de morte, conforme o Jornal de Angola salienta. A crítica a um país com pena de morte não exclui muitos sorrisos em fotos com representantes os EUA, apesar da sua Guantanamo fora de todas as convenções internacionais.
Por isso, é claro que há algum cinismo na real politik, mas isso não impede que as duras críticas a ditaduras sejam válidas e contém na diplomacia.
Concluo que o nosso comentador Sampy tem um estômago de betão: não sentiu a mais leve azia perante a humilhação a que o representante máximo de Portugal, o Presidente da República, e o máximo representante do Governo português, o primeiro-ministro, foram sujeitos na cimeira de Díli - à qual não deviam ter comparecido por elementar decoro.
Era fácil antever que aquilo só podia terminar mal.
Ambos acabaram por fazer figura de corpo presente numa farsa: a adesão da Guiné Equatorial foi anunciada antes da indispensável anuência prévia de Portugal, ainda que para efeitos meramente formais, e o ditador de Malabo viu-se entronizado como novo membro da CPLO sem que tivesse havido ao menos um simulacro de votação à volta da mesa onde figurou desde o primeiro minuto como convidado de luxo. E sem que se desse ao trabalho de pronunciar uma só frase em português.
Eu, confesso, tenho um estômago muito menos resistente. E não gosto de engolir tudo quanto me servem. Aqui fica lavrado o meu vigoroso protesto. Que Obiang seja um tirano, condenado por todas as organizações de direitos humanos, parece para alguns ser uma atenuante: daí entoarem-lhe hossanas em blogues e redes sociais. Parece até que desejariam ter um "líder" destes no Terreiro do Paço.
Lamento, mas sou muito antiquado: para mim ser ditador não é atenuante, é agravante.
De sampy a 29.07.2014 às 01:26
Senhor da Maia, está confundido: a minha indignação não é com a indignação; é com a sobranceria.
Percebo (e dela partilho) a indignação perante as tiranias e, concretamente, a representada por Teodoro Obiang. Mas manifestá-la num tom próprio de quem passou os últimos quarenta anos acampado diante da embaixada guineense ou de quem todos os meses envia um cheque para financiar as forças democráticas na oposição soa-me a reles hipocrisia.
Há razões, de facto, para a indignação. Mas parece-me demasiado fácil expô-las a partir do conforto do sofá de uma história pátria consolidada de 900 anos, enquanto nos mantemos quentinhos à lareira de uma UE e de uma NATO, docemente inconscientes do que os nossos parceiros lusófonos têm de fazer para sobreviverem como nações ou para conquistarem relevância.
Sim, é justo que nos indignemos com a prostituição. Nem nos fará bem ao fígado andarmos a visualizar fotografias delas com os seus clientes ou chulos. Mas gostaria de assistir a algum comedimento na hora de querer cuspir-lhes ou apedrejá-las. Gostaria de ver alguns comentadores duvidando em afirmar que as putas só o são por maus costumes ou por prazer. Gostaria de perceber em que é que atravessar para o outro lado da estrada e virar a cabeça se há-de ter por demonstração de dignidade ou ajudará a menina a considerar mudar de vida. Gostaria sobretudo de não ouvir o "Eu nunca serei prostituta!" enquanto se vai às compras com o dinheiro que a filha andou a ganhar durante a noite na Via Norte.
De da Maia a 29.07.2014 às 13:49
Bom, não há propriamente sobranceria, embora compreenda que possa parecer.
A crítica do Pedro é muito dirigida à diplomacia, à forma como o PR apareceu na fotografia. Ou seja, justamente, para quem se quis e quer fazer parecer muito incomodado com a entrada, a representação portuguesa afinal apareceu "com tudo", e até com mais que Angola e Brasil.
Portanto, esse incómodo parece de fachada.
Se Cavaco levou um "murro" de Obiang, parece que pôs a cara a jeito... e ainda levou Passos para dar a carinha também. Se calhar os murros são festinhas ou festarolas.
Por isso, ao alinhar na versão de que a representação portuguesa foi de contra vontade, ficam mal os murros. É mais fácil culpar a falha diplomática, do que assumir que Portugal só se fez esquisito para inglês ver.
Assim, a crítica do Pedro nos dois pontos foi à diplomacia, e não a entendi propriamente como sobranceria moral face a outros argumentos. A única sobranceria implícita é a de considerar que os valores humanos devem ser moralmente mais importantes do que quaisquer negócios, mas nisso penso que estamos de acordo. Ou seja, usando a sua comparação, até as prostitutas preferiam outra vida...
De sampy a 29.07.2014 às 15:22
Pois também nisso não estamos de acordo. Prefiro mil vezes a trapalhada diplomática portuguesa ao cinismo de brasileiros e angolanos, tentando esconder a mão que atira a pedra.
Se é para engolir o sapo, pois que se o engula. Sem disfarçar o nojo. Mas também sem fitas de catraio contrariado. Fazer-se substituir por prestimoso subalterno quando elas doem, isso é de velhacos.
A indignação com os murros é de quem não percebe que a vida é um combate de boxe. Certo, pode ferir a susceptibilidade de pessoas mais sensíveis. Essas, que desliguem a televisão e vão nanar. Bons sonhos.
De da Maia a 30.07.2014 às 13:03
Ninguém ficou bem na fotografia, é essa a questão da trapalhada.
O próprio Obiang viu-se exposto publicamente como "persona non grata".
Mas só quero reafirmar uma coisa. Na diplomacia não interessa o indivíduo, interessa o que representa. A estrutura diplomática deve ser quase militar, porque há efectivas guerras diplomáticas. Não é uma questão de coragem fazer avançar o capitão e resguardar o general, é uma questão de preservar as opções de comando.