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Delito de Opinião

O dia em que os maus nos encerraram a Disneylandia

Rui Rocha, 14.11.15

Um dos aspectos mais perturbadores de alguns testemunhos vistos nas televisões é o da incapacidade que temos para reconhecer a barbárie quando nos cruzamos com ela. Uma das pessoas referia que esperou uns momentos para ver se as balas eram a sério. Outra dizia que lhe parecia estar a assistir a um filme. Esta é simultaneamente a melhor homenagem que podemos fazer àquilo a que chamamos Ocidente e a nota que revela a nossa maior fragilidade. Há, certamente, violência nas nossas sociedades. Mas essa violência é marginal nas nossas vidas. Marginal no sentido que não toma conta do nosso dia-a-dia. Marginal no sentido de que a consideramos inadmissível. Em geral, para nós, "parisienses", a violência é a dos filmes. A dos filmes a que assistimos desde crianças e que os nossos pais, para nos sossegarem, nos diziam que era a fingir. Como eram a fingir os tiros que dávamos uns aos outros nas lutas de índios e cowboys com que entretínhamos as tardes dos Verões em que éramos meninos. Ou as pistolas de fulminantes que tu e eu tivemos ou as Nerfs que demos aos nossos filhos. Temos a felicidade (tivemos?) de viver num tempo e numa época em que a violência é (foi?) de tal forma distante e inofensiva que fizemos dela parte das nossas ficções e brincadeiras.É por isso que estamos tão indefesos quando ela nos rebenta à porta de casa. Não acreditamos, sequer, que seja possível. Viola não só as nossas regras, os nossos códigos, como, sobretudo, a nossa experiência de vida. Não é por acaso que alguns de nós só se apercebem da gravidade real da situação, ou melhor, da grave realidade que ela tem, quando constatamos, chocados, que hoje em Paris, por causa dos maus, nos fecharam a Disneylandia.

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