O biombo espanhol
O Sérgio de Almeida Correia já publicou dois postais ("Derrotados", "Vencedores") sobre as eleições de ontem, que tornarão redundante o que eu venha acrescentar. Ainda por cima há um ano (13 de Março de 2024), logo após as eleições legislativas que catapultaram o CHEGA, escrevi o postal “A Léria Explicativa”, que a mim me parece ter sido escrito hoje.
Ainda assim deixo algumas notas da minha "noite eleitoral" televisiva:
1. A IL - partido no qual votei - aumentou a sua representação parlamentar, e isso num contexto de óbvia pressão para o “voto útil” na coligação gerida por Montenegro. O óptimo é o maior inimigo do bom. Foi bom! E se se associar ao geronte PSD constituirá uma maioria relativa, superior aos restos da “esquerda” sobrevivente ao descalabro de ontem. Ou seja, poderá pressionar para que se façam necessárias reformas, às quais o PSD é sempre renitente.
2. Os plantéis de comentadores eleitorais nas diferentes estações televisivas tendem à imutabilidade, com uma ou outra ascensão vinda das “academias”. É denotativo pois com a proliferação de programas noticiosos têm surgido vários novos comentadores televisivos. Mas para os “dias grandes” - para os “finais de Taça” - os velhadas mantêm-se a “titulares”. (Nisso um pequeno detalhe: Miguel Sousa Tavares, o arquétipo da arrogância, desvalorizou o parceiro Bugalho num “Você é muito novo!” e levou pela medida grande, tanto que embatucou…).
Ora esses velhadas, na sua costumeira pesporrência, continuam a perorar as suas inanidades sociológicas. A mais repetida de todas é a ladainha de que um milhão e trezentos mil portugueses votam no CHEGA porque “estão zangados”. E continuamos nisto, a ouvir “doutores” a afirmar a irracionalidade dos motivos que levam compatriotas a votar nos partidos de quem esses “doutores” não gostam. (Há meses notei o mesmo entre intelectuais moçambicanos - Mia Couto, Agualusa, que entre esses serão os mais conhecidos por cá - que reduziam o voto em Venâncio Mondlane à “zanga” e “ira” de “jovens”, no sentido de “imaturos” e “ignorantes”). Enfim, um tipo que vai à televisão comentar eleições nacionais - e presumo que seja pago para tal - poderia (deveria?) ter algo mais … "racional”, reflectido e lido, para dizer.
3. Como é já costume o PCP salientou ter resistido à campanha falsária de que é vítima. E festejou, nisso aparentando até júbilo, os seus feitos eleitorais: perdeu 25% dos deputados (já nem enche o celebrizado “táxi”). Nesse continuado rumo descendente é notável que o seu veterano António Filipe, consagrado russófilo radical, foi apeado do seu lugar parlamentar. Terá agora mais tempo para “twittar” loas a Putin e quejandos.
4. Mariana Mortágua reencarnará Katar Moreira? Ou Américo Duarte? Sozinha contra o parlamento e ciosa de estar ela correcta diante daquele “ninho de lacraus” (“homens”, “brancos”, “heterossexuais”, mesmo aqueles deputados que não o sejam). A irrelevância do BE - que muito foi um fenómeno geracional - é coisa antiga. Tem agora constatação numérica.
5. O PS desmanchou-se. Já no meu postal a que acima aludo eu o dissera. Só o biombo espanhol vem impedindo que os agentes políticos portugueses percebam a realidade circundante: nos países do Sul da Europa os regimes que comportavam “socialismos mediterrânicos” foram transformados, sendo arrasados os partidos centrais - muito devido ao beco sem saída imposto pelas práticas dos socialistas clientelares. Repito, só a perenidade do duo PP-PSOE vem sustentando o nosso “Bloco Central”. E só isso poderá fazer compreender a mediocridade (e maldade) das sucessivas direcções socialistas - um PS que vem tendo este desbragado XXI e mantém como presidente uma figura tétrica como o açoriano César?
Estavam à espera de quê? O biombo espanhol foi atirado ao chão…