Saltar para: Post [1], Comentários [2], Pesquisa e Arquivos [3]

Delito de Opinião

O Aeroporto "Luís de Camões"

jpt, 15.05.24

vap.jpg

1. Da construção de aeroportos nada percebo. Diante do anúncio da construção do futuro serviço lisboeta ocorreu-me uma previsão e uma preocupação: a) já serei pasto de compostagem quando aquilo for inaugurado; b) que impacto poderá ter na Academia de Alcochete?
 
2. Na alvorada leio várias críticas, sarcásticas ou até indignadas. Não à construção, ou aos critérios da escolha - coisa mais complexas de abordar. Mas ao nome escolhido, o "Luís de Camões", matéria mais acessível ao perorar cidadão. Para mim a questão é simples, as estações aeroportuárias devem ser nomeadas como as ferroviárias: a estação do Rossio, o aeroporto da Portela de Sacavém... Sem mais.
 
Ainda assim, a dar-se um epónimo ao novo aeroporto poderia ser "Bartolomeu de Gusmão", recuperando-o até aos brasileiros, ou nisso "incentivando" o espírito daquilo da CPLP. Mas é óbvio que se tal acontecesse o jornal "Público", esta versão trimestral do presidente Rebelo de Sousa, a página "Buala", o partido LIVRE, a rede de "activistas", o professor Bethencourt, o colectivo CES coimbrão, as ramificações entre Campolide e as Forças Armadas, e outros, tudo se uniria a denunciar a inadequação dessa opção, dado o estatuto e vivência colonial do jesuítico Bartolomeu, desprovida que foi a sua vida de denúncias anti-racistas e de militâncias libertadoras.
 
Ou então, e seria a minha preferência, poder-se-ia escolher Aeroporto "Fernão Mendes Pinto", esse verdadeiro arquétipo do português histórico, o grande viajante errático, o maior narrador da tal "gesta". Mas também os "intelectuais orgânicos" e os "activistas" se ergueriam, avessos, pois ao mariola, por mais complexa de ambivalente seja a sua "Peregrinação", não se pode atribuir o estatuto de antepassado de Fanon, Said ou mesmo a condição de "subalterno".
 
3. Vêm estas aceradas críticas ao "Luís de Camões" de trabalhadores intelectuais, alguns sendo professores - universitários, liceais -, até mesmo pedagogos de questões literárias. São todos do mesmo universo "moral": a "esquerda", identidade que lhes servirá de unguento para o cieiro da alma, escalfeta do ânimo, pilates do intelecto. Pois se assim são nada sinistros seguem, lutam pelo "bem" e pelo "certo", capazes de análises profundas, assentes em conhecimentos desalienados. Invejo-os, deve ser bom ser tão bonito.
 
A nenhum destes intelectuais li críticas, resmungos que fossem, quando se percebeu que o antigo ministro da Cultura - o socratista Adão e Silva (um daqueles frenéticos publicistas que defenderam Sócrates até ao fim, como Galamba, Vale de Almeida, Câncio e quejandas execrandas figuras) - se esquecera de comemorar o quinto centenário de Camões, decidido para este ano.
 
As razões para tal são simples: não podem dizer mal da "esquerda", socratista ou outra, pois os "neoliberais" e os "fascistas" estão à espreita, sedentos... Daí que urge criticar, seja lá o que for, vindo da "direita", agora no governo. E, acima de tudo, não sabem que fazer do "Camões", agora que há estas críticas "decoloniais", "póscoloniais", e do próprio Professor Rebelo de Sousa.
 
4. Como tal, e ainda vamos só na madrugada seguinte, toca de criticar a opção, como "pirosa" ou coisa similar. E feita por um PM e seu governo, aos quais logo se aponta não serem militantes leitores, até especializados, de Camões.
 
De nada valerá dizer a estes sábios e pertinentes intelectuais que países nossos congéneres têm aeroportos nomeados por figuras grandes das culturas locais: "Aristóteles" (haverá melhor nome para um aeroporto?), "Liszt", "Prokofiev". Pois "com o piroso dos outros posso eu bem", logo ripostarão eles. E também de nada valerá opor-lhes o espúrio que é o habitual costume de nomear as instalações com nome de políticos, frenesim dos seus correligionários em busca de eternização (de Jan Smuts para Joanesburgo e daí para Oliver Tambo, para exemplo). Para além do extremo mau-gosto de chamar "Francisco Sá Carneiro" (já agora, o regime conseguiu ao fim de 45 anos ter uma versão sobre o incidente aéreo que o vitimou?) a um aeroporto inaugurado quando o antigo PM tinha... 11 anos.
 
Mas de nada valerá dizer-lhes isto. Pois são cultos, analíticos, pertinentes. De "esquerda", entenda-se. Ariscos aos poderes, julgam-se e dizem-se. Ariscos aos políticos, os de "direita", os que não lêem. Nem Camões nem o resto...
 
5. A estes intelectuais - universitários, liceais, liberais - desagrada o nome "Camões", pois "fascista", "colono" e, pior, "piroso". Mas a nenhum deles li críticas quando, há anos, o governo socratista mandou chamar "Humberto Delgado" ao aeroporto da Portela. Apupam este Montenegro e seus segundos por não terem lido Camões. Mas eles, os tais intelectuais, engoliram sem mais a mitografia do "reviralho", a grande democraticidade do afinal proto-generalíssimo Delgado. E, ainda que intelectuais - sábios e pertinentes -, não o leram. Nem aos seus elogios, ele homem feito, oficial instituído, II Guerra já avançada,  Wermacht URSS adentro, ao grande Adolf Hitler. Nada disso os incomodou...
 
Estes tipos não são ariscos. São bichanos... Uma "esquerda" bichana.
 
 
(Adenda: agradeço à equipa da SAPO o destaque dado a este postal.)

39 comentários

Comentar post

Pág. 1/3