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Delito de Opinião

Nove horas

João Sousa, 17.01.22

Um familiar debate-se, há coisa de um mês, com determinado sintoma físico (razoavelmente incomodativo) que começou esporádico ainda no ano do covid, tem reaparecido com regularidade e para o qual o SNS, na pessoa do centro de saúde local ou da urgência do hospital regional que já teve de visitar um par de vezes, não conseguiu ainda identificar a causa (se se esforçou muito por isso, não o sei - doutores House não parecem abundar no nosso SNS). Foram-lhe sendo receitados antibióticos e analgésicos, talvez para parecer que algo está a ser feito.

Na última quinzena, juntaram-se aos sintomas habituais fortes dores abdominais, para as quais já nem os analgésicos de dose cavalar receitados parecem ser suficientes e o obrigaram a dormir (o pouco que foi conseguindo dormir) sentado num sofá pois deitar-se não é suportável.

Com a ausência de melhorias (e escrever isto é ser um tanto eufemístico), conseguiu hoje arrastar-se (de novo) ao seu centro de saúde onde a médica, perante o evoluir do seu estado, acho por bem instá-lo a recorrer (de novo) às urgências hospitalares, entregou-lhe uma carta para ele entregar aos serviços do hospital na qual (supõe-se, pois estava fechada) descreveu o seu caso, e até o aconselhou a não almoçar pois receava haver uma possibilidade de ele ter que ser submetido a uma cirurgia de urgência.

Deu entrada no hospital às 14:03, onde na triagem lhe atribuíram a "pulseira verde" porque, e cito, "ele não estava em risco de vida evidente". Às 19:35, ainda nada mais lhe tinha sido feito. A carta da médica de família, se chegou a ser aberta, terá por certo sido lançada para o monte de folhetos do Lidl que alguém, daqui a dias, levará para o contentor da reciclagem. E o tempo de espera para os "pulseiras verdes" serem atendidos por um médico era, quando ele chegou, de nove horas. Repito: nove horas. Com um pouco de azar, este texto ainda é publicado antes que isso aconteça.

Quando eu era jovem, ingénuo e acreditava em coisas, pensava que suportávamos um SNS para cuidar da saúde do cidadão. Quando eu próprio tive o azar de entrar no seu sistema, mudei de opinião: o SNS não cuida da saúde do cidadão, o que faz é gerir a saúde do contribuinte. Agora, começo a suspeitar de que nem isso: o SNS não gere a saúde do contribuinte, gere a vida do contribuinte.

E eu gostava de saber onde está agora o jornalismo que, noutros tempos, noticiava qualquer ambulância que avariasse. Costa, esse, vai-se mostrando bastante satisfeito com a sua obra.

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