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Delito de Opinião

Na substituição de Jerónimo de Sousa

jpt, 10.11.22

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(Fotografia de Miguel Valle de Figueiredo)

O PCP substitui o secretário-geral. O processo é menos relevante do que os anteriores semelhantes - Cunhal foi um vulto maior e Carvalhas liderou um partido bem mais relevante do que o é hoje. E tem esta dimensão de farsa, a da rábula da "construção biográfica" do novo secretário-geral, apressadamente enfarinhado como padeiro, carpinteiro (que não aprendiz) e até de acólito católico - esta última uma dimensão bem interessante, até exemplar, que ainda não vi analisada. Enfim, adornos curriculares ridículos mas menos graves - pois desprovidos de dimensões administrativas e até jurídicas - do que os antes cometidos por ministros alemães. E não só... 

Mas nesta substituição o que mais me impressiona é a reincidência do elogio generalizado ao anterior secretário-geral do PCP. Mais uma vez - como quando tombou doente e foi operado - é quase unânime a vontade de o elogiar, sua integridade, gentileza, educação e coerente pertinência, a sua democraticidade, o seu "contributo". Vem isso dos responsáveis políticos do país e dos articulistas mais mediáticos, bem como dos feixes de cidadãos opinadores nas "redes sociais". Não me parece necessário, nem mesmo justo, convocar toda a história do movimento comunista internacional (qual "Livro Negro do Comunismo") para a confrontar com Jerónimo de Sousa, e dever-se-á respeitar a especificidade histórica do PCP e a autonomia deste seu secretário-geral. Mas esta saudação generalizada, verdadeira ovação à saída, esconde a realidade das concepções defendidas pelo PCP sob a direcção deste seu secretário-geral, as mundividências protegidas e promovidas, as leituras da História e, assim, os anseios de futuro.

Vou-me repetir - pois já aqui perorei mais longamente sobre o assunto. Em 2022 - ou seja, não num recuado tempo, de desconhecimento produzido pelas repressões e censuras -, logo após o começo da guerra na Ucrânia, o PCP de Jerónimo de Sousa proclamou, invocando-a, a "notável solução que a União Soviética encontrou para a questão das nacionalidades e o respeito pelos povos e suas culturas". Esta é uma consideração inaceitável, que se diria "negacionista" se viesse de outros recantos da paisagem política. E é, também, horrível. E é este homem, responsável pelo partido que promove esta ignomínia, que as pessoas vêm saudar, em nome de uns quaisquer dotes pessoais, que até dizem "carácter", e de um "legado" democratizador.

É uma paisagem intelectual patética.

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