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Delito de Opinião

Moita Flores: «Não devemos marchar contra os canhões mas pela liberdade»

Quem fala assim... (42)

Pedro Correia, 03.07.21

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«O mau humor com humor se paga»

 

Francisco Moita Flores já foi inspector da Judiciária, argumentista de séries televisivas, presidente de câmara. Hoje é mais conhecido como escritor. Quando o contactei para esta entrevista telefónica, prontificou-se de imediato a responder. Sem fugir a nenhuma pergunta. «Irrita-me profundamente a ignorância voluntária», disse este antigo polícia que não aprecia policiais.

 

Qual foi a maior decepção que sofreu até hoje?

Um dia em que vim de propósito de Paris a Lisboa, metendo-me no primeiro avião só para ver jogar o Sporting. Se o meu clube ganhasse, tornava-se campeão nacional. Nesse domingo, que jamais esquecerei, caíu imensa chuva. E o Benfica ganhou 6-3.

Gostaria de viver num hotel?

Não.

Porquê?

Tenho um grande sentido tribal na minha relação com as coisas. Preciso sempre dos cheiros de uma casa.

A sua bebida preferida?

Água.

Que número calça?

42.

Que livro anda a ler?

Releio as Máscaras de Salazar, do Fernando Dacosta. Sou amigo dele, gosto da escrita dele.

A sua personagem de ficção favorita?

Charles Foster Kane, personagem central de Citizen Kane. Criação genial de Orson Welles num dos melhores filmes de sempre.

Gosta de livros policiais?

Não desgosto.

Mas...

Não é um dos grandes prazeres da minha vida. Estou sempre a comparar as minhas opções narrativas com as dos autores que vou lendo. Muitas vezes não conferem. 

O criminoso volta sempre ao local do crime?

Não. Isso faz parte de uma certa literatura romântica e foi exacerbado pelo Conan Doyle.

A sua cor preferida?

Verde, obviamente.

E a música da sua vida?

São tantas... Mozart acompanha-me com frequência. Gosto muito daquela alegria, da dimensão dramática daquela música. Costumo escrever com Mozart em fundo.

Sugere alguma alteração ao hino nacional?

Aquela história de marchar contra os canhões chateia-me um bocado. Era capaz de mudar isso, até porque os canhões usam-se cada vez menos. Devemos marchar não contra os canhões mas pela paz e pela liberdade.

Que pecado capital pratica com mais frequência?

Sou pouco pecador...

Seja sincero...

Talvez a luxúria, por vezes, quando era mais novo. Sou um pouco epicurista.

Com quem gostaria de jantar esta noite?

Com António Lobo Antunes: sou um apaixonado pela escrita dele. E com Rui Rio: é um grande autarca, um homem público com uma dimensão invulgar.

Humor com humor se paga?

Sim. E sobretudo o mau humor com humor se paga.

O maior sonho?

Gostaria de descer a cortilheira dos Andes de comboio. Julgo tratar-se de uma paisagem lindíssima. É uma viagem que tenho eternamente adiada.

O maior pesadelo?

Pesadelos, não tenho. A minha maior preocupação é a saúde dos meus filhos e dos meus netos.

O que o irrita profundamente?

A ignorância voluntária. Deixa-me completamente fora de mim.

Gosta mais de conduzir ou de ser conduzido?

Gosto mais de ser conduzido. Sou muito preguiçoso a conduzir.

Casamentos gay. de acordo?

Desde que não me aborreçam, convivo bem com gays. Mas nunca percebi bem essa reivindicação, que me parece mais folclore do que uma necessidade.

Um exemplo de mulher bonita na política?

Gosto muito da Ségolène Royal.

Acredita no paraíso?

Acredito no Cinema Paraíso. Foi um dos mais belos filmes que vi em toda a minha vida.

Tem um lema de vida?

Disciplina e trabalho. São valores que em Portugal não estão na moda. Mas continuo a cultivá-los.

 

Entrevista publicada no Diário de Notícias (2 de Junho de 2007)

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