Mais uma voz a juntar-se a nós
Passo pela livraria Martins, em Lisboa, e capto esta imagem. Capas de oito livros de autores contemporâneos, com duas características comuns: todos são portugueses, todos escrevem sem recurso ao famigerado aborto ortográfico que transformou as regras anteriores no caos actual - que o digm os professores, incapazes de impor norma alguma num cenário de inúmeras "facultatividades", duplas grafias e supressão generalizada de consoantes, quer sejam supostamente mudas, quer sejam bem articuladas. Depois do cê de "contacto" ter ido às malvas, o de "corrupção" vai pelo mesmo caminho - como nos têm narrado Nuno Pacheco e Francisco Valada, entre outros resistentes da luta contra esta aberração.
Longe de serem os únicos, como a foto documenta. Afonso Cruz (A Boneca de Kokoschka), Carmen Garcia (Tudo o que Ouço é Coração), David Machado (Debaixo da Pele), Frederico Pedreira (Sonata Para Surdos), João Tordo (Biografia Involuntária dos Amantes), Lídia Jorge (O Dia dos Prodígios), Margarida Fonseca Santos (De Nome, Esperança) e Tiago Rebelo (O Tempo dos Amores Perfeitos) também resistem.
Oito. Mas podiam ser oitenta. Ou oitocentos. Podiam ser até antigos defensores assumidos do impropriamente chamado "acordo ortográfico", como o jornalista e ensaista brasileiro Sérgio Rodrigues, que numa excelente entrevista ao Expresso (conduzida por Christiana Martins) reconhece ter mudado de posição. Agora diz claramente, sem papas na língua: «O acordo ortográfico não fez nada ou muito pouco no sentido de nos aproximar. Acho até que teve alguns efeitos colaterais indesejados de nos afastar, por resistências a questões que o acordo tentou resolver e não foi muito hábil. (...) Fez mais mal do que bem, na verdade. E talvez não haja mesmo nada a fazer, a não ser cada um seguir o seu caminho.»
Felicito-o por exprimir hoje a convicção que muitos já tínhamos desde o primeiro dia. Mais uma voz a juntar-se a nós.