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Delito de Opinião

Livros de cabeceira (4) – série II

Ana CB, 17.08.24

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Longe vão os dias em que só lia um livro de cada vez, e de uma ponta à outra. Quando por acaso não tinha leituras novas, relia algum de que já não recordasse bem a história (porque não me agrada ler um livro de que já sei o final, salvo raras e honrosas excepções). Nessa altura tinha menos livros e mais tempo, o inverso do que possuo actualmente: os livros vão aumentando em número, e o tempo parece cada vez mais fugidio.

Para meu grande desgosto, tornei-me uma leitora errática. Tanto sou capaz de ler um livro em dois dias como arrastar uma leitura ao longo de meses, e aos solavancos. Horror dos horrores, há livros que leio até certo ponto e depois simplesmente desisto e abandono-os – alguns na esperança de mais tarde conseguir pegar-lhes, outros já a saber que não vale a pena insistir, não consigo digeri-los com um mínimo de prazer. E leitura que não me dá prazer, não vale a pena (só se for por razões profissionais). Há por aí muitos livros à espera que eu os descubra e goste deles.

Na minha mesa-de-cabeceira os livros demoram-se, e por várias razões. A principal é porque para ler um livro físico à noite preciso de ter a luz acesa, e o gesto de fechar o livro, pousá-lo e depois desligar o candeeiro tira-me daquela agradável sonolência em que as pálpebras pesam e o cérebro já está meio desligado. A outra é porque há livros que não são para ler de uma só vez.

É o caso de “Tal como és”, de Ryōkan, com tradução de Marta Morais a partir do japonês. Haiku é um dos meus géneros preferidos de poesia. Saborear estes pequenos poemas, frequentemente deliciosos, é relaxante e predispõe-me para uma noite tranquila. Veio substituir na minha mesa-de-cabeceira um outro, que muito aprecio, de poesia Tanka dos séculos IX-XI (uma forma de poesia essencialmente feminina, precursora do Haiku).

Um híbrido de poesia e conto é o livro de Aline Bei, “O peso do pássaro morto”. A escrita original desta autora brasileira é maravilhosa e tem a capacidade de evocar, com poucas palavras, imagens em que a dor é protagonista, sempre associada ao amor nas suas várias versões. Com uma sensibilidade tocante.

Writing down the bones”, de Natalie Goldberg, é uma inspiração para escrever melhor. E também o oposto de um livro chato e absolutista sobre o acto da escrita. Gosto de ler um ou dois dos seus capítulos leves e bem-humorados, sobretudo ao fim-de-semana de manhã, depois de acordar. Fico com vontade de desatar a escrever.

Quanto aos livros de Virginia Woolf e Olga Tokarczuk, o título é o mesmo, “Viagens”, mas o conteúdo muito diferente. Enquanto a escritora inglesa descreve, em cartas e no seu diário, partes do que foi vendo nas suas viagens pela Europa, entrelaçadas com considerações sobre ela própria, os outros e o mundo, Olga Tokarczuk conta pequenas histórias – ficcionadas ou não, frequentemente estranhas, intercaladas com pequenos apontamentos – sobre pessoas em viagem, ou simplesmente a deslocarem-se de um ponto para outro; personagens com motivações várias, em épocas várias, um caldeirão humano onde cabe tudo, e sem ordem aparente. Em comum entre as duas escritoras, o facto de as viagens conduzirem à reflexão.

Invisíveis na fotografia mas presentes no smartphone que a tirou, dois outros livros que leio actualmente em formato de ebook. A obra de grande fôlego de Simon Sebag Montefiore “O mundo - Uma história da humanidade”, que degusto em doses homeopáticas e me tem vindo a mostrar que afinal não sei nada de História. E o recente livro de Carmen Posadas, escrito a meias com o seu irmão Gervasio, cujo título revelador é “Hoje caviar, amanhã sardinhas”. Num tom divertido, os irmãos uruguaios desfiam as memórias da sua vida nos vários locais para onde o pai, um diplomata, ia sendo enviado.

Viagens ao vivo e a cores, viagens através dos livros, viagens interiores. De uma maneira ou outra, mesmo recostada na cama ou no sofá, acabo por estar sempre a viajar.

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