Ler (1)
«Il tempo per leggere, come il tempo per amare, dilata il tempo per vivere.»
Frase que li em 2021, numa livraria em Florença
Costumo ler vários livros ao mesmo tempo. Não em simultâneo, claro. Parece que só o nosso Presidente da República é capaz de tal proeza.
Divido-os em três segmentos, que baptizei cada qual a seu modo.
Tenho o chamado Livro do Dia, que sai comigo, anda comigo para onde eu for. É, em regra, o livro que uso nos transportes, nas deslocações, em fins-de-semana fora de casa. São livros que versam a actualidade, o imediato - geralmente ligados a obrigações profissionais. Ensaios, em regra. Ou biografias.
Livros da porta-para-fora. Que pouso à entrada de casa e a que permaneço indiferente dentro das paredes domésticas.
Depois, existe o chamado Livro da Noite. É o meu preferido, aquele que escolho com maior agrado.
São obras que aguardam em lista de espera. E que tanto posso ler em escassos dias - aconteceu muito recentemente com os fascinantes Diários, de Sylvia Plath - ou durante mais de um mês - sucedeu no final do ano passado com o copioso e tentacular E Tudo o Vento Levou, leitura que fui adiando e afinal se me revelou uma das mais inspiradoras desta década de 20.
O Livro da Noite costuma ser de ficção. Anoto-o a lápis, como se fôssemos dialogando. Essas anotações são-me úteis quando quero escrever acerca dele.
E é o livro que mais me prende.
Para o Verão que vai chegar tenho os dois volumes iniciais de Em Busca do Tempo Perdido e os três da Guerra e Paz entre os que aguardam a minha visita.
Existe, enfim, aquele a que costumo chamar o Livro da Insónia. Que não tem de ser bom ou mau. Pode até ser péssimo. E tem função meramente utilitária, como o nome indica: ajudar a convocar o sono. Seja qual for o género, desde que não demore a trazer-me de volta o João Pestana.
São livros que só frequento de madrugada, quando o sono se interrompe ou tarda a chegar. É um método que não aconselho a ninguém, pois existe o risco de este livro se tornar mais fascinante do que o próprio Livro da Noite. Foi assim que abri, um pouco por acaso, a Lolita, de Nabokov, ou A Laranja Mecânica, de Burgess - e fiquei bem desperto a lê-los. Ao ponto de se terem tornado livros da minha vida. A insónia prevaleceu, mas por bons motivos.
Aliás o que seria de nós, leitores, sem noites de insónia?
Hei-de desenvolver o tema noutro texto desta série que agora começa. Hei-de falar de Livros de Verão e Livros de Inverno. E das anotações que faço em cada livro. Mas hoje fico-me por aqui. Sem qualquer ressaca de insónia, após nove horas de uma noite bem dormida. Desde a adolescência que não dormia tanto.
Mais logo tenho outro Livro da Noite para inaugurar. Ainda não escolhi qual é.